(pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesarbeitsgericht)
«Artigo 39.° CE – Convenção colectiva – Subsídio complementar transitório a favor dos antigos trabalhadores civis das forças aliadas na Alemanha – Trabalhadores fronteiriços – Definição da base de cálculo do referido subsídio – Tomada em consideração fictícia do imposto sobre o salário alemão»
Sumário do acórdão
Livre circulação de pessoas – Trabalhadores – Igualdade de tratamento – Vantagens sociais – Subsídio temporário atribuído
aos trabalhadores em caso de despedimento – Dedução fictícia, em relação ao trabalhador que reside e é tributável noutro Estado‑Membro,
do imposto sobre o salário teoricamente devido no Estado de emprego – Inadmissibilidade – Justificação – Inexistência
Os artigos 39.° CE e 7.°, n.° 4, do Regulamento n.° 1612/68, relativo à livre circulação dos trabalhadores na Comunidade,
opõem‑se a uma regulamentação nacional prevista por uma convenção colectiva, segundo a qual o montante de uma prestação social
como um subsídio transitório complementar das prestações concedidas por desemprego, atribuída aos trabalhadores em caso de
despedimento, paga pelo Estado‑Membro de emprego a um trabalhador que reside e é sujeito passivo fiscal noutro Estado‑Membro,
é calculado de forma a que o imposto sobre o salário devido no Estado‑Membro de emprego seja ficticiamente deduzido na determinação
da base de cálculo do referido subsídio, quando, nos termos de uma convenção destinada a evitar a dupla tributação, os vencimentos,
salários e remunerações análogas pagos aos trabalhadores que não residam nesse Estado só são tributáveis no Estado‑Membro
de residência destes últimos.
As dificuldades administrativas que resultariam, para o Estado‑Membro de emprego, da aplicação de diferentes métodos de cálculo
do referido subsídio em função da residência do interessado, bem como as consequências orçamentais decorrentes do facto de
não se ter em conta o imposto sobre o salário nacional não podem justificar o desrespeito por parte desse Estado‑Membro das
obrigações que decorrem do Tratado.
(cf. n.os 29, 30, 37, disp.)
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção) 16 de Setembro de 2004(1)
«Artigo 39.° CE – Convenção colectiva – Subsídio complementar transitório a favor dos antigos trabalhadores civis das forças aliadas na Alemanha – Trabalhadores fronteiriços – Definição da base de cálculo do referido subsídio – Tomada em consideração fictícia do imposto sobre o salário alemão»
No processo C-400/02,
que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.° CE,
apresentado pelo Bundesarbeitsgericht (Alemanha), por decisão de 27 de Junho de 2002, entrado em 12 de Novembro de 2002, no processo
Gerard Merida
contra
Bundesrepublik Deutschland,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),,
composto por: C. W. A. Timmermans, presidente de secção, J.-P. Puissochet, J. N. Cunha Rodrigues (relator), R. Schintgen e
N. Colneric, juízes,
advogada-geral: C. Stix-Hackl, secretário: M.-F. Contet, administradora principal,
vistos os autos e após a audiência de 15 de Janeiro de 2004,vistas as observações apresentadas:
–
em representação de G. Merida, por F. Lorenz, Rechtsanwalt,
–
em representação da Bundesrepublik Deutschland, por W.-D. Plessing, na qualidade de agente, assistido por E. H. Neuert, Rechtsanwalt,
–
em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por G. Braun, R. Lyal e D. Martin, na qualidade de agentes,
ouvidas as conclusões da advogada-geral na audiência de 5 de Fevereiro de 2004,
profere o presente
Acórdão
1
O pedido de decisão prejudicial versa sobre a interpretação do artigo 39.° CE.
2
Este pedido foi apresentado no quadro de um litígio que opõe G. Merida, de nacionalidade francesa, à Bundesrepublik Deutschland
a propósito do cálculo do subsídio complementar transitório («Überbrückungsbeihilfe», a seguir «subsídio transitório») que
esta última pagou ao interessado nos termos da Tarifvertrag zur sozialen Sicherung der Arbeitnehmer bei den Stationierungsstreitkräften
im Gebiet der Bundesrepublik Deutschland (convenção colectiva relativa à segurança social dos trabalhadores das forças armadas
estacionadas no território da República Federal da Alemanha), de 31 de Agosto de 1971 (a seguir «TV SozSich»).
Enquadramento jurídico
A regulamentação comunitária
3
Nos termos do artigo 7.° do Regulamento (CEE) n.° 1612/68 do Conselho, de 15 de Outubro de 1968, relativo à livre circulação
dos trabalhadores na Comunidade (JO L 257, p. 2; EE 05 F1 p. 77):
«1. O trabalhador nacional de um Estado‑Membro não pode, no território de outros Estados‑Membros, sofrer, em razão da sua nacionalidade,
tratamento diferente daquele que é concedido aos trabalhadores nacionais no que respeita a todas as condições de emprego e
de trabalho, nomeadamente em matéria de remuneração, de despedimento e de reintegração profissional ou de reemprego, se ficar
desempregado.
[…]
4. São nulas todas e quaisquer cláusulas de convenção colectiva ou individual ou de qualquer outra regulamentação colectiva respeitantes
ao acesso ao emprego, ao emprego, à remuneração e às outras condições de trabalho e de despedimento, na medida em que prevejam
ou autorizem condições discriminatórias relativamente aos trabalhadores nacionais de outros Estados‑Membros.»
A regulamentação nacional
4
A TV SozSich estipula, no seu § 4, relativo ao subsídio transitório:
«1. O subsídio transitório é pago:
[...]
b)
em complemento das prestações do Bundesanstalt für Arbeit [instituto federal do emprego] por motivo de desemprego ou de medidas
de formação profissional (subsídio/auxílio de desemprego, pensão de sobrevivência),
[...]
3. a) (1) A base de cálculo do subsídio transitório pago em complemento da remuneração auferida por reclassificação (ponto
1 a) consiste na remuneração de base prevista no § 16, ponto 1 a, da [Tarifvertrag für die Arbeitnehmer bei den Stationierungsstreikräften
im Gebiet der Bundesrepublik Deutschland (convenção colectiva dos trabalhadores das forças armadas estacionadas no território
da República Federal da Alemanha), de 16 de Dezembro de 1966 (a seguir «TV AL II»)], auferida pelo trabalhador num mês civil
completo, à data do despedimento, com base no horário normal de trabalho contratualmente estabelecido [...].
[...]
3. b)
A base de cálculo do subsídio transitório pago em complemento das prestações do Bundesanstalt für Arbeit (ponto 1 b) [...]
consiste na base de cálculo prevista em a), deduzidos os descontos legais. O cálculo fictício dos imposto sobre o salário
e das contribuições para a segurança social deve assentar nos critérios fiscais e de segurança social aplicáveis ao trabalhador
à data do pagamento do subsídio transitório, embora sem ter em conta as deduções inscritas na folha de descontos (‘Lohnsteuerkarte’).
4. O subsídio transitório é de:
–
no primeiro ano seguinte à cessação da relação laboral, l00%,
–
a partir do segundo ano, 90%
da diferença entre a base de cálculo (ponto 3 a ou b) e as prestações mencionadas nos pontos 1 e 2 supra.
Se o subsídio transitório for pago em complemento das prestações do Bundesanstalt für Arbeit ou do seguro legal de doença
ou acidente, deve ser majorado do montante necessário para compensar o imposto sobre o salário.
[...]»
5
Nos termos do ponto 2 das Erläuterungen und Verfahrensrichtlinien zum TV SozSich – Neufassung 1992 (notas explicativas e orientações
processuais relativas à convenção colectiva – nova versão de 1992, a seguir «notas explicativas e orientações»):
«Quanto ao § 4, ponto 1:
[...]
2.6.5
As prestações de desemprego que um trabalhador fronteiriço originário de um país da União Europeia só possa obter no país
de residência são, em princípio, equivalentes às prestações do Bundesanstalt für Arbeit se o trabalhador fronteiriço pudesse
exercer, a partir da sua residência actual, uma actividade no mercado de trabalho alemão.
[...]
Quanto ao § 4, ponto 3:
[...]
2.8.5
Se, na data do despedimento, o trabalhador estivesse isento do imposto sobre o salário por força de uma convenção sobre dupla
tributação, deverão ser tidas em conta, na determinação da base de cálculo prevista no ponto 3 b, as deduções fiscais aplicáveis
a um trabalhador alemão comparável que resida na Alemanha.
[...]
Quanto ao § 4, ponto 4:
[...]
2.9.4
No caso de o trabalhador receber, nos termos do ponto 2.6.5, um subsídio transitório em complemento das prestações de um regime
de segurança social estrangeiro, o montante desse subsídio será calculado em função da prestação do Bundesanstalt für Arbeit
a que o interessado teria direito se residisse no território da República Federal da Alemanha. Caso o montante da prestação
que efectivamente recebe seja superior, a diferença deve ser deduzida nos termos do § 5.»
6
Nos termos do § 5 da TV SozSich, as prestações diferentes das previstas no § 4, ponto 1, a que o trabalhador tem direito são
tidas em conta para efeitos do pagamento do subsídio transitório.
7
A convenção celebrada entre a República Francesa e a República Federal da Alemanha para evitar a dupla tributação e que estabelece
regras de assistência administrativa e jurídica recíproca em matéria de imposto sobre os rendimentos e a fortuna, bem como
em matéria de imposto sobre comércio e indústria e de impostos sobre bens imóveis, concluída em 21 de Julho de 1959 e que
foi posteriormente modificada (a seguir «CDT»), dispõe no seu artigo 14.°, n.° 1:
«Os vencimentos, salários e remunerações análogas, bem como as pensões de reforma pagas pelos Estados contratantes […] a pessoas
singulares residentes no outro Estado em razão de serviços administrativos ou militares actuais ou anteriores, só são tributáveis
no primeiro Estado. Contudo, esta disposição não se aplica no caso de as remunerações serem pagas a pessoas que tenham a nacionalidade
do outro Estado sem serem, simultaneamente, nacionais do primeiro Estado; nesse caso, as remunerações só são tributáveis no
Estado em que essas pessoas têm residência.»
O litígio no processo principal e a questão prejudicial
8
Até 30 de Novembro de 1999, G. Merida ocupou um posto de trabalho civil nas forças armadas francesas estacionadas em Baden‑Baden
(Alemanha), ao mesmo tempo que residia em França. A TV AL II aplicava‑se ao contrato de trabalho do interessado e a sua remuneração
era‑lhe paga pelas autoridades alemãs em nome e por conta do seu empregador.
9
Nos termos do artigo 14.°, n.° 1, da CDT, após dedução das contribuições para a segurança social pagas na Alemanha, a remuneração
ilíquida auferida por G. Merida a título da sua actividade profissional era tributável em França. Uma vez que a taxa do imposto
sobre o salário francês era menor que a aplicável na Alemanha, G. Merida auferia um rendimento líquido superior ao de um trabalhador
que se encontrasse numa situação idêntica à sua, mas residisse neste último Estado‑Membro.
10
Na sequência da rescisão do seu contrato de trabalho, G. Merida beneficiou do subsídio transitório ao abrigo do § 4 da TV
SozSich. Ao determinarem a base de cálculo do referido subsídio, as autoridades alemãs deduziram da remuneração de base prevista
pela TV AL II «auferida pelo trabalhador num mês civil completo na data do despedimento» não apenas o montante das contribuições
para a segurança social alemãs, mas igualmente o imposto sobre o salário alemão, mediante um cálculo fictício. Por outro lado,
de acordo com as disposições do § 5 da TV SozSich e do ponto 2.9.4 das notas explicativas e orientações, as autoridades alemãs
deduziram do subsídio transitório pago a G. Merida o montante do subsídio de desemprego de que este beneficiou em França entre
22 de Fevereiro e final de Março de 2000.
11
Segundo G. Merida, a dedução fictícia do imposto sobre o salário alemão da sua remuneração de base, para efeitos da determinação
da base de cálculo do subsídio transitório, é ilícita. Efectivamente, nos termos da CDT, esse subsídio apenas pode ser tributado
em França e, no caso vertente, é objecto de uma dupla tributação ilícita. O cálculo fictício do salário líquido nos termos
do direito fiscal alemão para efeitos da determinação do montante do referido subsídio, além de contrariar o objectivo prosseguido
por este último, que consiste em compensar a perda de rendimentos na sequência do despedimento, viola o direito comunitário.
12
Tanto o órgão jurisdicional de primeira instância como o de recurso negaram provimento ao pedido de G. Merida, que interpôs
recurso de revista para o órgão jurisdicional de reenvio.
13
Segundo este último, nos termos do direito nacional, o órgão jurisdicional de recurso negou definitiva e acertadamente provimento
ao recurso que lhe foi submetido. Ao fazê‑lo, seguiu a jurisprudência do Bundesarbeitsgericht, segundo a qual, enquanto base
de cálculo do subsídio transitório, o salário líquido fictício devia ser determinado nos termos do § 4, n.° 3, alínea b),
da TV SozSich. A esse respeito, a Bundesrepublik Deutschland devia ter em conta, de forma fictícia, o imposto sobre o salário
alemão, mesmo no caso de G. Merida, embora este fosse residente e contribuinte fiscal em França.
14
Não pode, contudo, excluir‑se que os parceiros sociais tenham ignorado o artigo 39.° CE ao ter ficticiamente em conta o imposto
sobre o salário alemão, para efeitos da determinação da base de cálculo do subsídio transitório, mesmo tratando‑se de trabalhadores
residentes noutro Estado‑Membro.
15
A esse respeito, o órgão jurisdicional de reenvio refere que G. Merida se considera vítima de discriminação na medida em que,
apesar de, como quando trabalhava para as forças aliadas na Alemanha, ser obrigado a pagar imposto sobre os rendimentos por
força do direito fiscal francês em virtude de receber subsídio de desemprego em França e subsídio transitório na Alemanha,
deve ao mesmo tempo aceitar, como base de cálculo do montante deste último subsídio, um salário líquido fictício determinado
mediante as deduções previstas no direito fiscal alemão. Por conseguinte, está simultaneamente sujeito ao direito fiscal dos
dois Estados‑Membros, o que é contrário ao artigo 39.° CE.
16
O órgão jurisdicional de reenvio observa, por seu lado, que a tributação dos rendimentos pagos pela Bundesrepublik Deutschland
a G. Merida desde a rescisão do seu contrato de trabalho, como anteriormente, se rege pela CDT. O interessado não tem razão
quando se opõe ao simples facto de a base de cálculo aplicável ao montante ilíquido do subsídio transitório ser, no seu caso,
regulada de forma menos favorável do que no de um trabalhador que não seja trabalhador fronteiriço.
17
Não obstante, o Bundesarbeitsgericht decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:
«Existe violação do artigo 39.° CE se, para a determinação da base de cálculo do subsídio transitório, para efeitos do § 4,
ponto 1, alínea b), da TV SozSich, se tiver por fundamento o imposto fictício sobre o salário alemão [§ 4, ponto 3, alínea
b), segundo período, da TV SozSich] quando o antigo trabalhador resida no estrangeiro e seja contribuinte fiscal nesse país?»
Quanto à questão prejudicial
18
O artigo 39.° CE proíbe toda e qualquer discriminação em razão da nacionalidade, entre os trabalhadores dos Estados‑Membros,
no que diz respeito ao emprego, à remuneração e demais condições de trabalho.
19
Por outro lado, o artigo 7.°, n.° 4, do Regulamento n.° 1612/68, que explicita e põe em prática certos direitos que decorrem
do artigo 39.° CE para os trabalhadores migrantes (acórdão de 15 de Janeiro de 1998, Schöning‑Kougebetopoulou, C‑15/96, Colect.,
p. I‑47, n.° 12), dispõe que são nulas todas e quaisquer cláusulas de convenção colectiva respeitantes, nomeadamente, à remuneração
e às outras condições de trabalho e de despedimento, na medida em que prevejam ou autorizem condições discriminatórias relativamente
aos trabalhadores nacionais de outros Estados‑Membros.
20
Não é contestado que uma prestação como o subsídio transitório, que faz parte dos benefícios concedidos aos trabalhadores
em caso de despedimento, está abrangido pelo âmbito de aplicação material das disposições citadas no número precedente e que
um trabalhador fronteiriço na situação de G. Merida pode invocar essas disposições relativamente a um subsídio dessa natureza
(v., neste sentido, acórdão de 24 de Setembro de 1998, Comissão/França, C‑35/97, Colect., p. I‑5325, n.os 36, 40 e 41).
21
Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, a regra da igualdade de tratamento inscrita tanto no artigo 39.° CE
como no artigo 7.° do Regulamento n.° 1612/68 proíbe não apenas as discriminações ostensivas em razão da nacionalidade, mas
também todas as formas dissimuladas de discriminação que, aplicando outros critérios de distinção, conduzam na prática ao
mesmo resultado (v., nomeadamente, acórdão de 23 de Maio de 1996, O’Flynn, C‑237/94, Colect., p. I‑2617, n.° 17).
22
O princípio da não discriminação impõe não apenas que situações idênticas não sejam tratadas de modo diferente, mas igualmente
que situações diferentes não sejam tratadas de igual maneira (v., nomeadamente, acórdão de 17 de Julho de 1997, National Farmers’
Union e o., C‑354/95, Colect., p. I‑4559, n.° 61).
23
A menos que seja objectivamente justificada e proporcionada ao objectivo prosseguido, uma disposição de direito nacional deve
ser considerada indirectamente discriminatória quando seja susceptível, pela sua própria natureza, de afectar mais os trabalhadores
migrantes do que os trabalhadores nacionais e que, em consequência, cria o risco de desfavorecer mais particularmente os primeiros
(v., nomeadamente, acórdão O’Flynn, já referido, n.° 20).
24
Ora, no caso vertente, o facto de se ter em conta a título fictício o imposto sobre o salário alemão afecta desfavoravelmente
a situação dos trabalhadores fronteiriços. Com efeito, a dedução fictícia desse imposto na determinação da base de cálculo
do subsídio transitório prejudica as pessoas que, como G. Merida, residem e são contribuintes fiscais noutro Estado‑Membro
que não a República Federal da Alemanha, comparativamente aos trabalhadores que residem e são contribuintes fiscais neste
último Estado.
25
No caso destes últimos, a base de cálculo que serve para determinar o montante do subsídio transitório é determinada de forma
a corresponder ao salário líquido que, na inexistência de despedimento, seria devido ao interessado na data do pagamento desse
subsídio. Tal resultado é obtido deduzindo, mediante um cálculo fictício, além das contribuições para a segurança social,
o montante dos impostos devidos por força do direito fiscal alemão, que também regula a situação do interessado ao longo da
sua relação laboral.
26
Durante o primeiro ano seguinte à cessação da relação laboral, o subsídio transitório eleva‑se a 100% da diferença entre a
base de cálculo e o montante do subsídio de desemprego [hipótese do § 4, ponto 3, alínea b), da TV SozSich]. O § 4, ponto
4, segundo período, da TV SozSich garante, por outro lado, a neutralidade de qualquer eventual tributação que possa incidir
sobre o subsídio transitório, em razão nomeadamente da circunstância de o montante máximo da isenção de impostos na Alemanha
ser ultrapassado.
27
Por consequência, ao longo do primeiro ano seguinte à cessação da relação laboral, o rendimento dos antigos trabalhadores
que residam na Alemanha equivale ao que lhes seria pago enquanto trabalhadores activos.
28
Diversamente, tratando‑se de trabalhadores fronteiriços na situação de G. Merida, a dedução fictícia do imposto sobre o salário
alemão na determinação da base de cálculo do subsídio transitório não permite atingir o mesmo resultado através do pagamento
do referido subsídio, que é tributável em França nos termos do artigo 14.°, n.° 1, da CDT, como era o salário auferido por
G. Merida.
29
Para justificar a aplicação desse método de cálculo aos trabalhadores fronteiriços, as autoridades alemãs invocam as dificuldades
administrativas que resultariam da aplicação de diferentes métodos de cálculo em função da residência do interessado, bem
como as consequências orçamentais decorrentes do facto de não se ter em conta o imposto sobre o salário alemão.
30
Ora, tais objecções, assentes no aumento dos encargos financeiros e de eventuais dificuldades administrativas, devem ser rejeitadas.
Efectivamente, essas razões não podem, em qualquer caso, justificar o desrespeito das obrigações que para a República Federal
da Alemanha decorrem do Tratado CE (v., nomeadamente, acórdão de 15 de Janeiro de 2002, Gottardo, C‑55/00, Colect., p. I‑413,
n.° 38).
31
Na audiência, o Governo alemão declarou que o § 4, ponto 4, segundo período, da TV SozSich deve ser interpretado no sentido
de que uma pessoa na situação de G. Merida pode obter o reembolso, na Alemanha, do montante dos impostos eventualmente pagos
a título de subsídio transitório no Estado‑Membro de residência. Com efeito, a referida cláusula destina‑se a neutralizar
os impostos eventualmente devidos pelo interessado em razão do facto de receber esse subsídio, independentemente do Estado
em que o mesmo é pago.
32
Todavia, pressupondo‑a demonstrada, a circunstância de o montante dos impostos pagos no Estado‑Membro de residência ser reembolsado
a posteriori no Estado‑Membro de emprego não é susceptível de modificar a conclusão de que o facto de ser ter em conta, a título fictício,
o imposto sobre o salário alemão revela uma discriminação em detrimento dos trabalhadores na situação de G. Merida.
33
Na verdade, a dedução fictícia do imposto sobre o salário alemão na determinação da base de cálculo do subsídio transitório
não apresenta qualquer relação com o imposto sobre os rendimentos pago pelo trabalhador em França ao longo da sua relação
laboral, pelo que, mesmo que um montante equivalente ao imposto pago pelo beneficiário desse subsídio em França seja reembolsado
a posteriori na Alemanha, o referido subsídio pode, em definitivo, ser de valor inferior ao montante correspondente à diferença entre
a remuneração paga durante a vida activa e a prestação de desemprego de que beneficia o interessado.
34
Aliás, não foi contestado que é esse o caso no processo principal, em que a aplicação da dedução fictícia do imposto sobre
o salário alemão aos trabalhadores fronteiriços na situação de G. Merida leva a que, de facto, estes últimos sejam privados
de parte do rendimento líquido que auferiam quando trabalhavam nas forças armadas estacionadas na Alemanha, uma vez que essa
parte corresponde à diferença entre o montante do imposto sobre os rendimentos pago em França e o montante, mais elevado,
do imposto sobre o salário alemão, deduzido ficticiamente no cálculo do subsídio transitório.
35
Assim, no caso dos trabalhadores fronteiriços na situação de G. Merida, a aplicação fictícia da taxa alemã do imposto sobre
o salário impede que o pagamento do subsídio transitório compense, no primeiro ano seguinte à cessação da relação laboral,
a perda de salário consecutiva a essa cessação, contrariamente ao que acontece com os trabalhadores que residem na Alemanha.
36
Essa compensação poderia, em contrapartida, ser realizada se as autoridades alemãs determinassem a base de cálculo do subsídio
transitório, tributável em França nos termos do artigo 14.°, n.° 1, da CDT, sem deduzirem ficticiamente o imposto sobre o
salário alemão, o qual não era devido sobre o salário pago ao longo do período de actividade do interessado, e não reembolsando
o imposto sobre os rendimentos pago em França.
37
Nestas condições, deve responder‑se à questão colocada que os artigos 39.° CE e 7.°, n.° 4, do Regulamento n.° 1612/68 se
opõem a uma regulamentação nacional prevista por uma convenção colectiva, segundo a qual o montante de uma prestação social
como o subsídio transitório, paga pelo Estado‑Membro de emprego, é calculado de forma a que o imposto sobre o salário devido
nesse Estado seja ficticiamente deduzido na determinação da base de cálculo do referido subsídio, quando, nos termos de uma
convenção destinada a evitar a dupla tributação, os vencimentos, salários e remunerações análogas pagos aos trabalhadores
que não residam no Estado‑Membro de emprego só são tributáveis no Estado‑Membro de residência destes últimos.
Quanto às despesas
38
Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional
nacional, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas para apresentar observações ao Tribunal de Justiça,
que não as das referidas partes, não são reembolsáveis.
Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) declara:
Os artigos 39.° CE e 7.°, n.° 4, do Regulamento (CEE) n.° 1612/68 do Conselho, de 15 de Outubro de 1968, relativo à livre
circulação dos trabalhadores na Comunidade, opõem‑se a uma regulamentação nacional prevista por uma convenção colectiva, segundo
a qual o montante de uma prestação social como o subsídio transitório («Überbrückungsbeihilfe»), paga pelo Estado‑Membro de
emprego, é calculado de forma a que o imposto sobre o salário devido nesse Estado seja ficticiamente deduzido na determinação
da base de cálculo do referido subsídio, quando, nos termos de uma convenção destinada a evitar a dupla tributação, os vencimentos,
salários e remunerações análogas pagos aos trabalhadores que não residam no Estado‑Membro de emprego só são tributáveis no
Estado‑Membro de residência destes últimos.