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61991J0112

ACORDAO DO TRIBUNAL DE 26 DE JANEIRO DE 1993. - HANS WERNER CONTRA FINANZAMT AACHEN-INNENSTADT. - PEDIDO DE DECISAO PREJUDICIAL: FINANZGERICHT KOELN - ALEMANHA. - IMPOSTOS - RESIDENCIA DO CONTRIBUINTE. - PROCESSO C-112/91.

Colectânea da Jurisprudência 1993 página I-00429
Edição especial sueca página I-00007
Edição especial finlandesa página I-00007


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


++++

Livre circulação de pessoas - Liberdade de estabelecimento - Disposições do Tratado - Âmbito de aplicação pessoal - Nacional de um Estado-membro que exerce a sua actividade no território deste após aí ter efectuado a sua formação - Exclusão - Residência noutro Estado-membro - Irrelevância

(Tratado CEE, artigo 52. )

Sumário


Na falta de um elemento de extraterritorialidade suficiente para que possam aplicar-se as regras do Tratado relativas à liberdade de estabelecimento, e nomeadamente o princípio da não discriminação, deve interpretar-se o artigo 52. do Tratado no sentido de que não obsta a que um Estado-membro imponha uma carga fiscal mais pesada aos seus nacionais que, com base em qualificações e experiência profissionais adquiridas nesse Estado, exercem a sua actividade profissional no seu território e nele obtêm a totalidade ou a quase totalidade dos seus rendimentos ou nele possuem a totalidade ou a quase totalidade do seu património, quando não residam nesse Estado do que quando aí residam.

Partes


No processo C-112/91,

que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177. do Tratado CEE, pelo Finanzgericht Koeln (República Federal da Alemanha), destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre

Hans Werner

e

Finanzamt Aachen-Innenstadt,

uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação dos artigos 7. e 52. do Tratado CEE,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

composto por: O. Due, presidente, C. N. Kakouris, G. C. Rodríguez Iglesias, M. Zuleeg, J. L. Murray, presidentes de secção, G. F. Mancini, R. Joliet, F. A. Schockweiler, J. C. Moitinho de Almeida, F. Grévisse, M. Díez de Velasco, P. J. G. Kapteyn e D. A. O. Edward, juízes,

advogado-geral: M. Darmon

secretário: H. A. Ruehl, administrador principal

vistas as observações escritas apresentadas:

- em representação de Hans Werner, por Wolfgang Kaefer, consultor fiscal,

- em representação do Finanzamt Aachen-Innenstadt, por Hermann Kersten, Regierungsdirektor, na qualidade de agente,

- em representação do Governo belga, por R. Verhoeven, director-geral no Ministério das Finanças, na qualidade de agente,

- em representação do Governo alemão, por Ernst Roeder, Ministerialrat no Ministério federal da Economia, e Joachim Karl, Regierungsdirektor no mesmo ministério, na qualidade de agentes,

- em representação do Governo francês, por Edwige Belliard, directora adjunta dos Assuntos Jurídicos no Ministério dos Negócios Estrangeiros, e Géraud de Bergues, secretário adjunto principal no mesmo ministério, na qualidade de agentes,

- em representação do Governo italiano, pelo professor Luigi Ferrari Bravo, chefe do Serviço do Contencioso Diplomático do Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente, assistido por Pier Giorgio Ferri, avvocato dello Stato,

- em representação do Governo português, por Luís Inez Fernandes, director do Serviço dos Assuntos Jurídicos da Direcção-Geral das Comunidades Europeias, António Goucha Soares, membro do Serviço dos Assuntos Jurídicos da Direcção-Geral das Comunidades Europeias, e Maria Margarida Mesquita Palha, jurista do Centro de Estudos Fiscais do Ministério das Finanças, na qualidade de agentes,

- em representação do Governo do Reino Unido, por Christopher Vajda, barrister, e John Collins, do Treasury Solicitor' s Department, na qualidade de agente,

- em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por Henri Étienne, consultor jurídico principal, na qualidade de agente,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações de H. Werner, representado por W. Kaefer e Sass, advogado no foro de Munique, do Finanzamt Aachen-Innenstadt, do Governo alemão, do Governo francês, do Governo italiano, do Governo português, do Governo do Reino Unido e da Comissão, na audiência de 19 de Maio de 1992,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência 6 de Outubro de 1992,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por decisão de 10 de Janeiro de 1991, que deu entrada no Tribunal em 15 de Abril seguinte, o Finanzgericht Koeln (República Federal da Alemanha) submeteu, nos termos do artigo 177. do Tratado CEE, três questões relativas à interpretação das disposições deste Tratado relativas ao direito de estabelecimento e à proibição das discriminações em razão da nacionalidade, a fim de apreciar a compatibilidade com o direito comunitário de duas legislações nacionais adoptadas na matéria: uma relativa ao imposto sobre o rendimento e a outra relativa ao imposto sobre o património, que tratam de maneira diversa os contribuintes consoante residam ou não no território nacional.

2 Estas questões foram suscitadas no âmbito de um litígio que opõe H. Werner ao Finanzamt Aachen-Innenstadt (serviço de finanças de Aachen) a propósito das condições relativas à sujeição aos impostos constantes, por um lado, da Einkommensteuergesetz (lei do imposto sobre o rendimento) e, por outro, da Vermoegensteuergesetz (lei do imposto sobre o património).

3 Nos termos do § 1, n. 1, alínea 1), da Einkommensteuergesetz, as pessoas singulares que tenham domicílio na República Federal da Alemanha ou aí residam habitualmente estão aí sujeitas ao imposto sobre a totalidade dos seus rendimentos. Pelo contrário, nos termos do n. 4 do § 1, as pessoas singulares que não tenham domicílio na Alemanha, nem aí residam habitualmente, só estão sujeitas ao imposto relativamente à parte dos seus rendimentos obtida na Alemanha. Nos termos do § 49, n. 1, alínea 3), esses rendimentos de origem alemã são, nomeadamente, os rendimentos obtidos no exercício de uma actividade não assalariada que é ou foi exercida na Alemanha. No âmbito da tributação da totalidade dos rendimentos, é aplicada aos casais uma tabela preferencial, denominada splitting-tarif. Os contribuintes podem, além disso, deduzir dos seus rendimentos tributáveis certas despesas, como as contribuições para seguros de doença, de acidente e de responsabilidade civil, para o seguro obrigatório de velhice e para o seguro de desemprego, as pensões de alimentos, uma parte da poupança que constituíram para uma construção, o imposto a favor dos cultos, certas despesas de formação profissional. Estes benefícios são recusados àqueles cujos rendimentos só estão parcialmente sujeitos ao imposto. Além disso, são-lhes aplicadas certas taxas de imposição diferentes.

4 Disposições semelhantes constam da Vermoegensteuergesetz. Com efeito, esta legislação prevê, a favor dos contribuintes cujos rendimentos sejam integralmente tributados, abatimentos especiais nomeadamente quando os cônjuges são tributados conjuntamente ou quando os filhos são tributados conjuntamente com um dos cônjuges. Estas vantagens são recusadas aos que estão apenas parcialmente sujeitos ao imposto.

5 H. Werner, que tem a nacionalidade alemã, reside com a mulher nos Países Baixos desde 1961. Tal como resulta das observações das partes, é titular dos diplomas e das qualificações exigidas pela legislação alemã para exercer a profissão de dentista. Até ao mês de Outubro de 1981, exerceu essa actividade como assalariado num consultório dentário em Aachen (República Federal da Alemanha). Posteriormente, estabeleceu-se como dentista por conta própria, sempre em Aachen. Os seus rendimentos provêm exclusivamente desta actividade.

6 Aquando da liquidação do imposto para o exercício de 1982, o Finanzamt Aachen-Innenstadt considerou que H. Werner devia ser parcialmente sujeito ao imposto sobre o rendimento e ao imposto sobre o património, com fundamento em que não residia na Alemanha.

7 H. Werner, que pretendia beneficiar da splitting tarif no âmbito do imposto sobre o rendimento e das deduções no âmbito do imposto sobre o património, apresentou então reclamações relativas à liquidação desses dois impostos ao Finanzamt Aachen-Innenstadt. Alegou que a legislação fiscal alemã era contrária ao artigo 52. do Tratado. Essas reclamações foram indeferidas pelo Finanzamt. Foi nestas condições que recorreu para o Finanzgericht Koeln.

8 Esse órgão jurisdicional considerou necessário submeter três questões prejudiciais relativas à interpretação dos artigos 7. e 52. do Tratado. Essas questões estão assim redigidas:

"1) O âmbito do artigo 52. do Tratado CEE esgota-se no preceituado sobre o tratamento no território de um Estado-membro dos nacionais de outro Estado-membro ou contém além disso uma proibição de restrições à liberdade de estabelecimento?

2) Para o caso de o artigo 52. do Tratado CEE conter a proibição de restrições à liberdade de estabelecimento, vão contra esta proibição desvantagens fiscais resultantes de

o sujeito passivo residir num Estado-membro das Comunidades Europeias (Reino dos Países Baixos) e

obter a totalidade ou a quase totalidade (mais de 90%) dos seus rendimentos tributáveis noutro Estado-membro (a República Federal da Alemanha) ou, se for o caso, aí possuir o património sujeito a imposto, por se ter aí estabelecido profissionalmente e aí se ocupar como trabalhador independente?

Deve, consequentemente, o Estado-membro onde o sujeito passivo do imposto exerce uma actividade como trabalhador independente tratá-lo como contribuinte nacional?

3) Vai contra a proibição de discriminação indirecta prevista no artigo 7. do Tratado CEE a sujeição de um nacional da República Federal da Alemanha que se encontra na situação descrita no ponto 2 acima, com base nas normas nacionais reguladoras da sujeição parcial ao imposto, a uma carga fiscal essencialmente mais pesada que um sujeito passivo integralmente sujeito ao imposto e, no mais, nas mesmas condições?"

9 Para mais ampla exposição dos factos do litígio no processo principal, da regulamentação aplicável e das observações escritas apresentadas ao Tribunal, remete-se para o relatório para audiência. Estes elementos apenas serão adiante retomados na medida do necessário para a fundamentação da decisão do Tribunal.

Quanto ao direito de estabelecimento

10 Decorre dos autos que, com as primeira e segunda questões, o Finanzgericht Koeln pretende na realidade saber se o artigo 52. do Tratado se opõe a que um Estado-membro imponha uma carga fiscal mais pesada aos seus nacionais, que exercem a sua actividade profissional no seu território e que nele recebem a totalidade ou a quase totalidade dos seus rendimentos ou aí possuem a totalidade ou a quase totalidade do seu património, quando não residam nesse Estado do que quando aí residam.

11 O órgão jurisdicional nacional explica a este propósito que a jurisprudência do Tribunal o leva a ter dúvidas sobre a compatibilidade com o artigo 52. do tratamento fiscal distinto que a Einkommensteuergesetz e a Vermoegensteuergesetz reservam aos residentes e aos não residentes. A este respeito, apoia-se, antes de mais, no acórdão de 7 de Fevereiro de 1979, Knoors (115/78, Recueil, p. 399), para considerar que H. Werner, uma vez que se estabeleceu num país diferente daquele onde reside, se encontra numa situação equiparável à de todas as outras pessoas que beneficiam dos direitos e liberdades garantidos pelo Tratado. Invocando seguidamente o acórdão de 8 de Maio de 1990, Biehl (C-175/88, Colect., p. I-1779), considera que privar de vantagens fiscais restringe o direito de estabelecimento consagrado no artigo 52. Finalmente, salienta que, segundo o acórdão de 28 de Janeiro de 1986, Comissão/França (270/83, Colect., p. 273), uma desigualdade de tratamento no exercício dos direitos conferidos pelo Tratado não pode justificar-se nem pela falta de harmonização das disposições legislativas em matéria fiscal nem pelo respeito de uma convenção celebrada com outro Estado-membro, como, no caso vertente, a convenção de 16 de Junho de 1959 entre a República Federal da Alemanha e o Reino dos Países Baixos, para evitar a dupla tributação em matéria de imposto sobre o rendimento e sobre o património, bem como em relação a diversos outros impostos e que regula alguns outros aspectos de natureza fiscal (BGBl. 1960, II, p. 1781).

12 A título liminar, sublinhem-se as profundas diferenças entre as circunstâncias que estavam na base desta jurisprudência e as do caso em apreço no processo principal.

13 Antes de mais, importa salientar que, ao contrário do Sr. Knoors, nacional neerlandês que pretendia estabelecer-se nos Países Baixos invocando qualificações profissionais que tinha adquirido noutro Estado-membro, concretamente a Bélgica, H. Werner é um nacional alemão que se estabeleceu no seu Estado de origem com base em qualificações e experiência profissionais adquiridas neste Estado.

14 Seguidamente, o caso em apreço no processo principal também se afasta do caso que o Tribunal teve de decidir no acórdão Biehl, já referido. Com efeito, o Sr. Biehl era um nacional alemão a quem foi aplicada uma legislação fiscal luxemburguesa que ligava o eventual reembolso do excesso de imposto colectado a um critério de residência permanente no território do Grão-Ducado do Luxemburgo e prejudicava, por conseguinte, particularmente os contribuintes nacionais de outros Estados-membros, enquanto H. Werner é um nacional alemão que continua sujeito à legislação do Estado de que é nacional.

15 Por fim, as circunstâncias que estão na base do acórdão Comissão/França, já referido, são igualmente diferentes. Com efeito, este processo tinha por origem a aplicação de regras fiscais distintas a sociedades consoante a sua sede social se situasse em França ou noutro Estado-membro, tendo como resultado que, para estas últimas, o tratamento era menos favorável do que para as sociedades estabelecidas em França. Nos termos do artigo 58. do Tratado, as sociedades constituídas em conformidade com a legislação de um Estado-membro e que tenham a sua sede social, administração central ou estabelecimento principal na Comunidade são, para efeitos do disposto no capítulo relativo ao direito de estabelecimento, equiparadas às pessoas singulares nacionais dos Estados-membros. Neste contexto, como o Tribunal recordou nesse acórdão (n. 18), a sede corresponde, no caso das sociedades e na acepção já referida, à nacionalidade das pessoas singulares. Ora, o critério do tratamento fiscal diferente constante da legislação posta em causa por H. Werner reside não na nacionalidade das pessoas singulares, mas no lugar da residência.

16 Deve sublinhar-se que H. Werner é um nacional alemão que obteve na Alemanha os seus diplomas e qualificações profissionais, que sempre exerceu a sua actividade profissional nesse país e a quem foi aplicada a legislação fiscal alemã. O único elemento que sai do âmbito puramente nacional é o facto de H. Werner residir num Estado-membro diferente daquele onde exerce a sua actividade profissional.

17 Nestas condições, deve responder-se ao órgão jurisdicional nacional que o artigo 52. do Tratado CEE não obsta a que um Estado-membro imponha uma carga fiscal mais pesada aos seus nacionais, que exercem a sua actividade profissional no seu território e que nele obtêm a totalidade ou a quase totalidade dos seus rendimentos ou nele possuem a totalidade ou a quase totalidade do seu património, quando não residam nesse Estado do que quando aí residam.

Quanto à discriminação

18 Com a terceira questão, o Finanzgericht Koeln pretende saber se o artigo 7. do Tratado obsta a que um Estado-membro imponha uma carga fiscal mais pesada aos seus nacionais que exercem uma actividade profissional no seu território quando não residam nesse Estado do que quando aí residam.

19 A este respeito, o artigo 7. dispõe nomeadamente que, no âmbito de aplicação do Tratado, e sem prejuízo das suas disposições especiais, é proibida toda e qualquer discriminação em razão da nacionalidade.

20 Como o Tribunal afirmou no acórdão de 9 de Junho de 1977, Van Ameyde (90/76, Recueil, p. 1091, n. 27), o artigo 52. do Tratado garante, no domínio do direito de estabelecimento, a aplicação do princípio consagrado no artigo 7. desse Tratado, pelo que, quando uma regulamentação é compatível com o artigo 52. , é-o também com o artigo 7.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

21 As despesas efectuadas pelos Governos belga, alemão, francês, italiano, português e do Reino Unido, bem como pela Comissão, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

pronunciando-se sobre as questões submetidas pelo Finanzgericht Koeln, por decisão de 10 de Janeiro de 1991, declara:

O artigo 52. do Tratado CEE não obsta a que um Estado-membro imponha uma carga fiscal mais pesada aos seus nacionais, que exercem a sua actividade profissional no seu território e que nele obtêm a totalidade ou a quase totalidade dos seus rendimentos ou nele possuem a totalidade ou a quase totalidade do seu património, quando não residam nesse Estado do que quando aí residam.