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Acórdão do Tribunal (Quinta Secção) de 28 de Março de 1996. - Gemeente Emmen contra Belastingdienst Grote Ondernemingen. - Pedido de decisão prejudicial: Gerechtshof Leeuwarden - Países Baixos. - Sexta Directiva IVA - Artigo 13., B), alínea h) e artigo 4., n. 3, alínea b) - Entrega de terrenos para construção. - Processo C-468/93.
Colectânea da Jurisprudência 1996 página I-01721
Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória
++++
Disposições fiscais ° Harmonização das legislações ° Impostos sobre o volume de negócios ° Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado ° Isenções previstas na Sexta Directiva ° Isenção das entregas de bens imóveis não construídos que não sejam terrenos para construção ° Conceito de "terreno para construção" ° Definição que compete aos Estados-Membros
[Directiva 77/388 do Conselho, artigos 4. , n. 3, alínea b), e 13. , parte B, alínea h)]
O artigo 13. , parte B, alínea h), da Sexta Directiva 77/388 relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios, que prevê a isenção do imposto para as entregas de bens imóveis não construídos, exclui dessa isenção os "terrenos para construção previstos no n. 3, alínea b), do artigo 4. ". Dado que esta disposição remete expressamente para a definição de terreno para construção adoptada pelos Estados-Membros, compete a estes definir quais os terrenos que devem ser considerados terrenos para construção, tanto para a aplicação do artigo 4. , n. 3, alínea b), como para a do artigo 13. , parte B, alínea h), tendo em conta a remissão efectuada.
Consequentemente, não compete ao Tribunal de Justiça esclarecer qual o grau de urbanização que um bem imóvel não construído deve apresentar para ser qualificado como terreno para construção na acepção da directiva.
No processo C-468/93,
que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177. do Tratado CE, pelo Gerechtshof te Leeuwarden (Países Baixos), destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre
Gemeente Emmen
e
Belastingdienst Grote Ondernemingem,
uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação das disposições conjugadas dos artigos 13. , parte B, alínea h), e 4. , n. 3, alínea b), da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios ° Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme (JO L 145, p. 1; EE 09 F1 p. 54),
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),
composto por: D. A. O. Edward, presidente de secção, J.-P. Puissochet (relator), J. C. Moitinho de Almeida, G. Gulmann e M. Wathelet, juízes,
advogado-geral: N. Fennelly,
secretário: H. von Holstein, secretário adjunto,
vistas as observações escritas apresentadas:
° em representação da comuna de Emmen, por R. Brouwer e W. A. Rouwenhorst, consultores fiscais,
° em representação do Governo neerlandês, por M. A. Bos, consultor jurídico no Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente,
° em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por B. J. Drijber, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agente,
visto o relatório para audiência,
ouvidas as alegações da comuna de Emmen, representada por R. Brouwer e W. A. Rouwenhorst, do Governo neerlandês, representado por J. S. van den Oosterkamp, consultor jurídico adjunto no Ministério dos Negócios Estrangeiros, e G. D. van Norden, director no Ministério das Finanças, e da Comissão das Comunidades Europeias, representada por B. J. Drijber, na audiência de 9 de Novembro de 1995,
ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 14 de Dezembro de 1995,
profere o presente
Acórdão
1 Por decisão de 14 de Dezembro de 1993, entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 16 de Dezembro seguinte, o Gerechtshof te Leeuwarden submeteu ao Tribunal, nos termos do artigo 177. do Tratado CE, duas questões prejudiciais relativas à interpretação das disposições conjugadas dos artigos 13. , parte B, alínea h), e 4. , n. 3, alínea b), da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios ° Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme (JO L 145, p. 1; EE 09 F1 p. 54, a seguir "Sexta Directiva").
2 Estas questões foram suscitadas no âmbito de um litígio entre a comuna de Emmen e o Belastingdienst Grote Ondernemingen, Groningen (serviço de tributação de grandes empresas de Groningen, a seguir "Belastingdienst"), no qual a comuna de Emmen contesta a aplicação do imposto sobre o volume de negócios à entrega de bens imóveis não construídos, nos termos da legislação neerlandesa que deu execução ao artigo 13. , parte B, alínea h), da Sexta Directiva.
3 O artigo 13. , parte B, alínea h), dispõe:
"Sem prejuízo de outras disposições comunitárias, os Estados-Membros isentarão, nas condições por eles fixadas com o fim de assegurar a aplicação correcta e simples das isenções a seguir enunciadas e de evitar qualquer possível fraude, evasão e abuso:
...
h) as entregas de bens imóveis não construídos, com excepção das entregas de terrenos para construção previstas no n. 3, alínea b), do artigo 4. "
4 O artigo 4. , n. 3, alínea b), da Sexta Directiva dispõe, por outro lado:
"Os Estados-Membros podem também considerar sujeito passivo qualquer pessoa que realize, a título ocasional, uma operação relacionada com as actividades referidas no n. 2 e, designadamente, uma das seguintes operações:
...
b) a entrega de um terreno para construção.
Por terrenos para construção entendem-se os terrenos, urbanizados ou não, tal como são definidos pelos Estados-Membros."
5 Resulta dos elementos constantes dos autos que, nos Países Baixos, o conceito de "terreno para construção" na acepção da Sexta Directiva não foi expressamente definido pelo legislador.
6 O artigo 13. , parte B, alínea h), da Sexta Directiva foi transposto pelo artigo 11. , n. 1, alínea a), 1. , da Wet op de omzetbelasting de 1968 (lei do imposto sobre o volume de negócios, a seguir "WOB"), que dispõe:
"1. Estão isentos em condições a fixar por regulamento da administração pública:
a) a entrega de bens imóveis, com excepção:
1. da entrega de um bem imóvel transformado que tenha lugar antes ou, no máximo, dois anos após a primeira ocupação desse bem."
7 Na falta de um conceito legal de terreno para construção, o Hoge Raad entendeu que o imposto sobre o volume de negócios só é devido pela entrega de um bem imóvel não construído mas destinado a construção quando se trate de um terreno urbanizado. Ora, segundo a jurisprudência do Hoge Raad sobre a matéria, um terreno não construído deve ser considerado urbanizado se o solo desse terreno tiver sido preparado para a construção ou se tiver recebido equipamentos que lhe sejam exclusivamente destinados.
8 Afigura-se que esta interpretação é mais restritiva do que a anteriormente perfilhada pela administração neerlandesa, segundo a qual um bem imóvel não construído, cujas imediações tivessem sido objecto de trabalhos de preparação, deve ser considerado como terreno urbanizado.
9 Em Junho de 1992, a comuna de Emmen entregou oito bens imóveis não construídos, destinados à construção de habitações. Antes da entrega, o loteamento foi dotado de arruamentos e esgotos. Os terrenos foram ligados às redes de água, gás, electricidade, telecomunicações e televisão por cabo.
10 A comuna de Emmen pagou o montante total de 67 542 HFL a título de imposto sobre o volume de negócios, mas interpôs imediatamente recurso dessa tributação com o fundamento de que, devido aos trabalhos efectuados, os terrenos entregues não se tornaram "bens imóveis transformados", na acepção do artigo 11. , n. 1, alínea a), 1. , da WOB.
11 O Belastingdienst discorda da interpretação da comuna de Emmen e afirma que os terrenos em causa no processo constituem bens imóveis transformados na acepção da WOB. Efectivamente, segundo a administração fiscal neerlandesa, cada um dos lotes foi dotado de equipamentos que lhe estão exclusivamente afectos ou foi objecto de obras.
12 O litígio foi submetido ao Gerechtshof te Leeuwarden. Este órgão jurisdicional interroga-se sobre a possibilidade de adoptar uma interpretação restritiva do conceito de "bem transformado" quando se trata de terrenos para construção. Salienta que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, as excepções às disposições de isenção da Sexta Directiva não devem ser interpretadas restritivamente.
13 Considerando que o litígio respeita não só à aplicação da legislação neerlandesa, mas depende também da interpretação das disposições conjugadas dos artigos 13. , parte B, alínea h), e 4. , n. 3, alínea b), da Sexta Directiva, no que respeita ao conceito de "terrenos urbanizados", o órgão jurisdicional de reenvio suspendeu a instância e submeteu ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:
"I.a) Devem entender-se por 'terrenos urbanizados' , nos termos da alínea b) do n. 3 do artigo 4. da directiva, os terrenos cujo solo tenha sofrido uma elaboração e/ou em benefício dos quais se tenham tomado medidas que se traduzem exclusivamente num benefício dos mesmos?
I.b) Pode falar-se de 'terrenos urbanizados' , tendo em conta que devem ser interpretadas em sentido amplo as excepções às disposições de isenção, relativamente a terrenos que estejam compreendidos num plano de ocupação dos solos, como se referiu no ponto 2.3, e nos quais, antes da entrega e da primeira ocupação, se tenham realizado obras de infra-estrutura, tais como:
° abertura de valetas, instalação de uma rede de esgotos e construção de vias de acesso (que servirão para os trabalhos de construção);
° instalação para os fornecimentos públicos, como o descrito no ponto 2.3?
II. Em caso de resposta afirmativa à questão I.a), devem estar preenchidos os dois requisitos formulados na mesma?
Um terreno compreendido num plano de ocupação dos solos e no qual se tenham realizado as obras de infra-estrutura referidas na questão I.b), converte-se em terreno urbanizado pelo facto de se realizarem uma ou várias das obras a seguir referidas:
a) A instalação de tubagens para os fornecimentos públicos dentro dos limites do terreno.
b) A conexão de uma tubagem e um prolongamento ao colector até ao terreno ou inclusivamente dentro dos limites deste, bem como a conexão do terreno ao prolongamento.
c) A colocação de uma tampa de esgoto no colector, em proveito do terreno.
d) A elevação do terreno com terra.
e) A instalação de canalizações de drenagem nos termos do plano de ocupação dos solos, mas fora dos limites do terreno.
f) A cobertura com terra de uma vala situada dentro dos limites do terreno."
14 Com ambas as questões, o órgão jurisdicional de reenvio pretende, no essencial, saber se um bem imóvel não construído deve ser objecto de obras de infra-estrutura especiais para ser qualificado como "terreno para construção" na acepção da Sexta Directiva.
15 A comuna de Emmen considera que o conceito de bem imóvel transformado, na lei neerlandesa, deve ser interpretado em conformidade com a de terreno urbanizado constante do artigo 4. , n. 3, alínea b), da Sexta Directiva. Ora, este conceito só abrange os terrenos que se destinam a servir de local de implantação de um edifício e que, para este efeito, foram objecto de transformações substanciais.
16 O Governo neerlandês salienta que a definição de terrenos para construção é da competência dos Estados-Membros. O conceito de bem imóvel transformado, na lei dos Países Baixos, reveste, assim, um significado autónomo e não pode ser interpretado em função da expressão "terrenos urbanizados" da Sexta Directiva.
17 A Comissão alega que a aplicação de imposto às entregas de terrenos para construção constitui uma excepção à isenção de que beneficiam as entregas de bens imóveis não construídos. As referidas entregas são assim sujeitas ao regime geral da Sexta Directiva, que visa aplicar o imposto a todas as operações tributáveis, salvo as derrogações expressamente previstas. Nestas condições, embora a Sexta Directiva confie aos Estados-Membros a definição do conceito de terreno para construção, estes não podem dar-lhe uma interpretação restritiva. Para a Comissão, a economia deste conceito manda que os Estados-Membros considerem como terrenos para construção não apenas os terrenos já urbanizados, mas também todos os terrenos passíveis de construção, entendendo-se que lhes compete determinar os critérios nos termos dos quais um terreno reveste essa natureza.
18 A resposta sugerida pela Comissão, bem como, em certa medida, a da comuna de Emmen, equivalem, no essencial, a propor uma definição comunitária do conceito de terreno para construção, apenas competindo aos Estados-Membros estabelecer as respectivas condições de aplicação.
19 Deve em primeiro lugar salientar-se que, embora, conforme os termos do texto introdutório do artigo 13. , parte B, da Sexta Directiva, os Estados-Membros fixem as condições das isenções a fim de assegurar a sua aplicação correcta e simples e de evitar qualquer possível fraude, evasão e abuso, essas "condições" não podem incidir sobre a definição do conteúdo das isenções previstas (v. acórdãos de 19 de Janeiro de 1982, Becker, 8/81, Recueil, p. 53, n. 32, e de 13 de Julho de 1989, Henriksen, 173/88, Colect., p. 2763, n. 20).
20 No presente processo, como o Governo neerlandês correctamente salientou, o artigo 4. , n. 3, alínea b), da Sexta Directiva remete expressamente para as definições de terrenos para construção adoptadas pelos Estados-Membros. Daqui resulta que cabe a estes definir quais os terrenos que devem ser considerados terrenos para construção, tanto para a aplicação desta disposição como para a do artigo 13. , parte B, alínea h), tendo em conta a remissão efectuada.
21 Esta interpretação tem também apoio no facto de a proposta inicial, bem como a proposta alterada, da Sexta Directiva, apresentadas pela Comissão, incluírem uma definição comum de terrenos para construção. Contudo, o Conselho não adoptou qualquer destas propostas e acabou por remeter, quanto a este ponto, para as definições dos Estados-Membros.
22 Do resto, há que lembrar que o Tribunal de Justiça já declarou que, quando o legislador comunitário, num regulamento, remete implicitamente para os usos nacionais, não compete ao Tribunal de Justiça dar às expressões empregues uma definição comunitária uniforme (v. neste sentido, acórdão de 18 de Janeiro de 1984, Ekro, 327/82, Recueil, p. 107, n. 14).
23 A Comissão sugere, contudo, que a referência, no artigo 4. , n. 3, alínea b), a terrenos não urbanizados a par dos terrenos urbanizados implica que o legislador comunitário pretendeu impor às definições de terrenos para construção dos Estados-Membros determinados limites nos termos dos quais tais definições têm necessariamente de incluir os terrenos que não foram objecto de qualquer urbanização.
24 Nos termos do artigo 4. , n. 3, alínea b), da Sexta Directiva, "por terrenos para construção entendem-se os terrenos, urbanizados ou não, tal como são definidos pelos Estados-Membros". Resulta do emprego da conjunção "ou" que esta disposição é irrelevante para as transformações eventualmente sofridas pelos terrenos em causa. A expressão visa, por isso, os terrenos que, urbanizados ou não, são definidos pelos Estados-Membros como terrenos destinados à construção. Esta interpretação resulta, em especial, da versão neerlandesa da Sexta Directiva, que utiliza a fórmula "als zodanig omschreven al dan niet bouwrijp gemaakte terreinen", bem como das versões dinamarquesa, italiana e portuguesa, nas quais os termos "urbanizados ou não" figuram entre vírgulas, sem que as outras versões forneçam elementos em sentido contrário.
25 Por último, embora seja de jurisprudência constante que as isenções previstas no artigo 13. da Sexta Directiva constituem conceitos autónomos de direito comunitário (v. acórdão de 11 de Agosto de 1995, Bulthuis-Griffioen, C-453/93, Colect., p. I-2341, n. 18), e, em consequência, os Estados-Membros não possam alterar o seu conteúdo, em especial quando fixam as respectivas condições de aplicação, não pode ser esse o caso quando o Conselho confia precisamente a esses Estados a definição de determinados termos de uma isenção, embora devendo respeitar o objectivo prosseguido pelo artigo 13. , parte B, alínea h), da Sexta Directiva, que tem em vista isentar de imposto apenas as entregas de bens imóveis não construídos que não se destinam a servir de base a um edifício.
26 Resulta de tudo o que antecede que compete aos Estados-Membros definir o conceito de "terreno para construção" na acepção das disposições conjugadas dos artigos 13. , parte B, alínea h), e 4. , n. 3, alínea b), da Sexta Directiva. Consequentemente, não compete ao Tribunal de Justiça esclarecer qual o grau de urbanização que um bem imóvel não construído deve apresentar para ser qualificado como terreno para construção na acepção desta directiva.
Quanto às despesas
27 As despesas efectuadas pelo Governo neerlandês e pela Comissão das Comunidades Europeias, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.
Pelos fundamentos expostos,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),
pronunciando-se sobre as questões submetidas pelo Gerechtshof te Leeuwarden, por decisão de 14 de Dezembro de 1993, declara:
Compete aos Estados-Membros definir o conceito de "terreno para construção" na acepção das disposições conjugadas dos artigos 13. , parte B, alínea h), e 4. , n. 3, alínea b), da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios ° Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme. Consequentemente, não compete ao Tribunal de Justiça esclarecer qual o grau de urbanização que um bem imóvel não construído deve apresentar para ser qualificado como terreno para construção na acepção desta directiva.