Avis juridique important
Acórdão do Tribunal (Sexta Secção) de 24 de Outubro de 1996. - Elida Gibbs Ltd contra Commissioners of Customs and Excise. - Pedido de decisão prejudicial: Value Added Tax Tribunal, London - Reino Unido. - Imposto sobre o valor acrescentado - Sexta directiva - Cupões de reembolso e de desconto - Matéria colectável. - Processo C-317/94.
Colectânea da Jurisprudência 1996 página I-05339
Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória
++++
Disposições fiscais ° Harmonização das legislações ° Imposto sobre o volume de negócios ° Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado ° Matéria colectável ° Sistema de promoção de vendas que, posteriormente à aquisição pelo consumidor final, dá lugar a um reembolso pelo fabricante, mediante a apresentação de um cupão emitido por este ° Matéria colectável ao nível do fabricante constituída pelo preço de venda por este praticado, diminuído do montante reembolsado
[Directiva 77/388 do Conselho, artigo 11. , parte A, n. 1, alínea a), e parte C, n. 1]
Quando um fabricante
° emite um cupão de desconto, reembolsável pelo montante indicado no cupão pelo fabricante, ou por conta deste, em benefício do retalhista; esse cupão, distribuído a um cliente potencial no âmbito de uma campanha de promoção de vendas, pode ser aceite pelo retalhista como pagamento de determinado artigo; o fabricante vendeu esse artigo directamente ao retalhista ao "preço do fornecedor original" e o retalhista aceita o cupão do cliente aquando da venda do artigo e o apresenta ao fabricante, deste recebendo o montante indicado,
ou
° no âmbito e um plano de promoção, vende artigos directamente ao retalhista a "preço do fabricante"; um cupão de reembolso de um montante indicado na respectiva embalagem confere ao cliente, caso faça prova da compra de um desses artigos e satisfaça outras condições referidas no cupão, o direito de o apresentar ao fabricante e de receber em troca o montante indicado, e um cliente compra um artigo desse tipo a um retalhista, apresenta o cupão ao fabricante e recebe deste o montante indicado,
o artigo 11. , parte A, n. 1, alínea a), e parte C, n. 1, da Sexta Directiva deve ser interpretado no sentido de que a matéria colectável a ter em conta para determinar o imposto sobre o valor acrescentado devido pelo fabricante é igual ao preço de venda por este praticado, diminuído do montante indicado no cupão e reembolsado. O mesmo se passa se o fabricante fornecer inicialmente os artigos a um grossista, em vez de os fornecer directamente a retalhista.
Esta interpretação obedece ao princípio de que a matéria colectável do imposto sobre o valor acrescentado a cobrar pelas autoridades fiscais não pode ser superior à contrapartida efectivamente paga pelo consumidor final, sobre a qual foi calculado o imposto que recai sobre esse consumidor, e pelo princípio da neutralidade fiscal, que impõe que, no interior da cada país, mercadorias semelhantes suportem a mesma carga fiscal, qualquer que seja a extensão do circuito de produção e de distribuição.
A mesma interpretação não perturba o sistema do imposto sobre o valor acrescentado, uma vez que não é necessário reajustar a matéria colectável relativa às transacções intermédias. A matéria colectável mantém-se inalterável, dado que, no que respeita a essas transacções, a aplicação do princípio da neutralidade é garantida recorrendo ao regime de dedução previsto na directiva, que permite aos operadores intermédios da cadeia de distribuição restituírem apenas à administração fiscal a parte do imposto correspondente à diferença entre o preço por cada um pago ao respectivo fornecedor e o preço a que a mercadoria foi entregue ao comprador.
No processo C-317/94,
que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177. do Tratado CE, pelo Value Added Tax Tribunal, London, destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre
Elida Gibbs Ltd
e
Commissioners of Customs and Excise,
uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação do artigo 11. da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios ° Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme (JO L 145, p. 1; EE 09 F1 p. 54),
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sexta Secção),
composto por: G. F. Mancini, presidente de secção, C. N. Kakouris (relator) e G. Hirsch, juízes,
advogado-geral: N. Fennelly,
secretário: L. Hewlett, administradora,
vistas as observações escritas apresentadas:
° em representação da Elida Gibbs Ltd, por David Milne, QC, mandatado por Coopers & Lybrand, Chartered Accountants,
° em representação do Governo do Reino Unido, por Stephen Braviner, do Treasury Solicitor' s Department, na qualidade de agente, e Kenneth Parker, QC,
° em representação do Governo alemão, por Ernst Roeder, Ministerialrat no Ministério Federal da Economia, e Gereon Thiele, Assessor no mesmo ministério, na qualidade de agentes,
° em representação do Governo francês, por Edwige Belliard, directora adjunta na Direcção dos Assuntos Jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, e Jean-Louis Falconi, secretário dos Negócios Estrangeiros na mesma direcção, na qualidade de agentes,
° em representação do Governo italiano, pelo professor Umberto Leanza, chefe do serviço do contencioso diplomático do Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente, assistido por Maurizio Fiorilli, avvocato dello Stato,
° em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por Peter Oliver e Enrico Traversa, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes,
visto o relatório para audiência,
ouvidas as alegações da Elida Gibbs Ltd, representada por David Milne, mandatado por John Arnold de Moret & Young, Tax Advisers, do Governo do Reino Unido, representado por Kenneth Parker, do Governo helénico, representando por Fokion Georgakopoulos, consultor jurídico adjunto do Conselho Jurídico do Estado, e Anna Rokofyllou, consultora do ministro adjunto dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agentes, do Governo francês, representado por Gautier Mignot, secretário dos Negócios Estrangeiros na Direcção dos Assuntos Jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente, e da Comissão, representada por Peter Oliver e Enrico Traversa, na audiência de 25 de Abril de 1996,
ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 27 de Junho de 1996,
profere o presente
Acórdão
1 Por decisão de 30 de Novembro de 1994, entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 6 de Dezembro seguinte, o Value Added Tax Tribunal, London, submeteu ao Tribunal, nos termos do artigo 177. do Tratado CE, duas questões prejudiciais relativas à interpretação do artigo 11. da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios ° Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme (JO L 145, p. 1; EE 09 F1 p. 54, a seguir "Sexta Directiva").
2 Estas questões foram suscitadas no âmbito de um litígio entre a Elida Gibbs Ltd (a seguir "Gibbs") e os Commissioners of Customs and Excise (a seguir "Commissioners"), competentes em matéria de cobrança do imposto sobre o valor acrescentado no Reino Unido (a seguir "IVA"), a respeito da restituição de montantes pagos pela Gibbs a título de IVA.
Os sistemas de promoção em causa no processo principal
3 Resulta dos autos do processo principal que a Gibbs, filial da sociedade Unilever, produz artigos de toucador, 70% dos quais são vendidos a retalhistas e o restante a grossistas ou a armazéns de venda "cash and carry" para, em seguida, serem vendidos a retalhistas.
4 Para a promoção das vendas a retalho destinadas ao consumidor final, a Gibbs utiliza o sistema dos "cupões de desconto" ("money off"), de que existem duas variantes, o "plano de base" e o "plano especial retalhistas", ou o sistema de "cupões de reembolso" ("cash back").
5 Através dos cupões de desconto compreendidos no "plano de base", a Gibbs garante a promoção de um determinado produto durante um período limitado. Organiza a distribuição dos cupões ao público directamente ou sob a forma de cupões que devem ser destacados de publicações diversas (revistas, jornais, etc.). Cada cupão tem um valor nominal (por exemplo, 15 pence) e inclui instruções aos consumidores, que referem que o cupão pode ser apresentado como pagamento parcial de um ou vários artigos especificados da marca Gibbs. Cada cupão contém também instruções aos retalhistas quanto ao modo como deve ser remetido por estes à Gibbs para obterem o respectivo reembolso e quanto ao prazo de que dispõem para o efeito.
6 No que respeita aos cupões de desconto compreendidos no "plano especial retalhistas", a Gibbs associa-se com um retalhista na organização de um plano de promoção de um produto em especial, ou determinada linha de produtos. A operação é limitada no tempo. O retalhista imprime os cupões após a celebração de um contrato com a Gibbs e distribui-os ao público. Também neste caso cada cupão tem um valor nominal (por exemplo, 15 pence) e especifica o ou os produtos relativamente aos quais pode ser apresentado como pagamento parcial do preço. O nome do retalhista figura igualmente no cupão, que só pode ser utilizado nos seus estabelecimentos.
7 Quer o comprador dos produtos fabricados pela Gibbs seja um grossista ou um retalhista, a Gibbs contabiliza esse fornecimento a determinado preço, incluindo o IVA, que factura ao comprador, e isto em ambas as variantes do sistema de cupões de desconto acima descritas. O montante facturado por este fornecimento é determinado independentemente de qualquer plano de promoção em curso ou futuro. Deste modo, o grossista ou o retalhista, ao adquirir as mercadorias à Gibbs, pode não saber que estas estão ou vão ser incluídas num plano de promoção mediante cupões de desconto. Nesta fase, é mesmo possível que não exista ou não esteja previsto qualquer plano.
8 Se for caso disso, as vendas do grossista ao retalhista são facturadas ao preço por grosso, que também não é influenciado por uma eventual campanha de promoção.
9 O retalhista põe à venda as mercadorias designadas aos preços marcados. Quando o "plano de base" é aplicado, o cliente que adquire o produto especificado no cupão pode apresentá-lo ao retalhista, que o pode aceitar. Neste caso, o montante cobrado pelo retalhista será o preço marcado, diminuído do montante do desconto (15 pence), conservando o retalhista o cupão. O retalhista não é, porém, obrigado a aceitar o cupão em vez dos 15 pence. Em contrapartida, no âmbito do "plano especial retalhistas", o retalhista associado à Gibbs está contratualmente obrigado a aceitar o cupão em lugar dos 15 pence em dinheiro.
10 Além disso, no âmbito do "plano de base", os pedidos de reembolso são dirigidos directamente à Gibbs pelo retalhista. Apenas o retalhista e a Gibbs são partes nesta transacção. O retalhista tem direito ao reembolso desde que apresente prova de que adquiriu o produto em quantidades suficientes, de que o adquiriu directamente à Gibbs ou a um grossista e de que o adquiriu antes ou durante a campanha de promoção. Em contrapartida, no caso do "plano especial retalhistas", o reembolso ao retalhista deve ser efectuado pela Gibbs independentemente de o produto ter sido vendido por essa sociedade antes ou durante o plano de promoção.
11 No sistema dos "cupões de reembolso", o cupão é impresso na embalagem do produto fabricado pela Gibbs. Este cupão inclui a proposta da Gibbs de restituir ao consumidor, desde que sejam satisfeitas determinadas condições, uma parte do preço de venda por este pago ao retalhista, correspondendo esta parte do preço ao valor nominal do cupão, o qual constitui também para o consumidor uma prova de compra. O consumidor que adquire este produto tem o direito de enviar o cupão directamente à Gibbs ou aos seus agentes, que procederão ao prometido reembolso em dinheiro.
O litígio no processo principal
12 Em 24 de Agosto de 1992, a Unilever, sociedade-mãe da Gibbs, requereu aos Commissioners o reembolso de 883 894 UKL, em seu entender erradamente cobradas, a partir de 1984, a título de IVA sobre o valor dos cupões de desconto e de reembolso. A Unilever considerava, com efeito, que o reembolso do valor nominal dos cupões constituía um desconto retroactivo e, por isso, que a matéria colectável com base na qual foi calculado o IVA devido pela Gibbs, enquanto sujeito passivo, deveria ser reduzida nessa medida.
13 Concluindo pela inexistência de desconto retroactivo, os Commissioners indeferiram essa reclamação por decisões de 5 de Maio de 1993, no que respeita aos cupões de desconto, e de 8 de Outubro de 1993, no que respeita aos cupões de reembolso.
14 No que diz respeito, em especial, aos cupões de desconto, os Commissioners entenderam que os montantes correspondentes constituíam um elemento da contrapartida recebida pelo retalhista pelo fornecimento dos bens ao cliente. Sendo pagos pela Gibbs, estes montantes teriam constituído uma contrapartida recebida "de um terceiro" que, nos termos do artigo 11. , parte A, n. 1, da Sexta Directiva, deveria ter sido incluída na matéria colectável do IVA relativo ao fornecimento efectuado pelo retalhista.
15 Quanto aos cupões de reembolso, os Commissioners entenderam que, como o consumidor era directamente reembolsado pelo fabricante, através do envio do pedido adequado, o retalhista era alheio a essa transacção. Não existia, por isso, nexo directo entre, por um lado, o fornecimento de mercadorias pelo fabricante ao retalhista ou ao grossista e, por outro, o montante que o consumidor recebia do fabricante em troca dos cupões.
16 A Gibbs recorreu destas decisões para o Value Added Tax Tribunal, London, que ordenou a apensação dos dois recursos.
17 Tendo dúvidas quanto à interpretação a dar ao direito comunitário, o Value Added Tax Tribunal, London, suspendeu a instância e submeteu ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:
"1) Cupões de desconto
O que deve entender-se, à luz dos artigos 11. , parte A, n. 1, alínea a), e 11. , parte C, n. 1, da Sexta Directiva, por 'matéria colectável' de um fornecedor originário na situação da Elida Gibbs (tal como é descrita no n. 4 da decisão interlocutória), na qual se verifica, nomeadamente, que:
a) o fornecedor originário é um 'fabricante' que garante a emissão dum cupão de desconto reembolsável pelo 'valor nominal' (tal como se indica no cupão) e que constitui encargo do fabricante em benefício do retalhista;
b) o cupão, que é distribuído a potenciais consumidores no decurso duma campanha de promoção de vendas, pode ser aceite pelo retalhista quando um consumidor lhe compra determinados produtos;
c) o fabricante vendeu esses mesmos produtos ao 'preço do fornecedor original' directamente ao retalhista ou a um grossista, e
d) o retalhista aceita o cupão na venda desses produtos ao consumidor e apresenta-o ao fabricante que lhe paga o respectivo valor nominal,
a matéria colectável do fabricante é o preço de venda do fabricante ou esse preço diminuído do valor nominal do cupão?
Será diferente a resposta à questão anterior se a venda do fornecedor originário for feita a um grossista e não a um retalhista?
2. Cupões de reembolso
À luz das referidas disposições da Sexta Directiva, o que deve entender-se por 'matéria colectável' dum fornecedor originário na situação da Elida Gibbs (tal como é descrita no n. 4 da decisão interlocutória), na qual se verifica, nomeadamente, que:
a) no decurso dum sistema de promoções, o fornecedor originário (' o fabricante' ) vende determinados produtos ao 'preço do fabricante' directamente ao retalhista ou a um grossista;
b) na embalagem desses produtos está impresso um cupão de reembolso de um 'valor nominal' em dinheiro que dá direito ao consumidor que prove ter comprado um desses produtos e satisfaça outras condições impressas no cupão a apresentá-lo ao fabricante para que este lhe pague o valor nominal, e
c) um consumidor compra esses produtos a um retalhista, apresenta o cupão ao fabricante, que lhe paga o respectivo valor nominal,
a matéria colectável do fabricante é o preço de venda do fabricante ou esse preço diminuído do valor nominal do cupão?
Será diferente a resposta à questão anterior se a venda do fornecedor originário for feita a um grossista e não a um retalhista?"
Considerações gerais
18 Antes de responder às questões submetidas, deve recordar-se de forma sucinta o princípio de base do sistema do IVA e o mecanismo segundo o qual funciona.
19 O princípio de base reside no facto de o sistema do IVA ter como objectivo onerar unicamente o consumidor final. Consequentemente, a matéria colectável do IVA a cobrar pelas autoridades fiscais não pode ser superior à contrapartida efectivamente paga pelo consumidor final, sobre a qual foi calculado o IVA que recai sobre esse consumidor.
20 Assim, no acórdão de 1 de Abril de 1982, Hong-Kong Trade (89/81, Recueil, p. 1277, n. 6), o Tribunal de Justiça considerou que resulta da Primeira Directiva 67/227/CEE do Conselho, de 11 de Abril de 1967, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios (JO 1967, 71, p. 1301; EE 09 F1 p. 3), que um dos princípios de base em que assenta o sistema do IVA é a neutralidade, no sentido de que no interior de cada país mercadorias semelhantes suportem a mesma carga fiscal, qualquer que seja a extensão do circuito de produção e de distribuição.
21 Este princípio de base esclarece o papel e as obrigações dos sujeitos passivos dentro do mecanismo instituído para a cobrança do IVA.
22 Com efeito, o IVA não onera os sujeitos passivos, mas, ao intervirem no processo de produção e de distribuição anterior à fase de tributação final, qualquer que seja o número de transacções que tenham lugar, estes apenas são obrigados, em cada fase desse processo, a cobrar o imposto por conta da administração fiscal e a entregar a esta os respectivos montantes.
23 A fim de garantir a perfeita neutralidade do mecanismo relativamente aos sujeitos passivos, a Sexta Directiva prevê, no título XI, um regime de deduções destinado a isentar os sujeitos passivos de montantes de IVA indevidos. Como o Tribunal de Justiça salientou no acórdão de 5 de Maio de 1982, Schul (15/81, Recueil, p. 1409, n. 10), um elemento de base do sistema do IVA consiste no facto de, em cada transacção, este imposto só ser exigível após dedução do montante do IVA que tenha incidido directamente sobre o custo dos diversos elementos constitutivos do preço dos bens e serviços e de o mecanismo das deduções estar concebido de modo que só os sujeitos passivos são autorizados a deduzir do IVA de que são devedores o IVA que já onerou os bens e serviços a montante.
24 Resulta do que antecede que, tendo em conta, em cada caso, o mecanismo do IVA, o seu funcionamento e o papel dos intermediários, a administração fiscal não pode, em definitivo, cobrar um montante superior ao que foi pago pelo consumidor final.
25 É com base nestas considerações que devem ser conjuntamente analisadas as questões submetidas pelo Value Added Tax Tribunal, London.
Quanto às questões prejudiciais
26 Nos termos do artigo 11. , parte A, n. 1, alínea a), da Sexta Directiva, no território do país a matéria colectável é constituída, no caso de entregas de bens, por tudo o que constitui a contrapartida que o fornecedor recebeu ou deve receber do adquirente.
27 Segundo jurisprudência constante, esta contrapartida constitui o valor "subjectivo", ou seja, efectivamente cobrado em cada caso concreto, e não um valor calculado segundo critérios objectivos (acórdãos de 23 de Novembro de 1988, Naturally Yours Cosmetics, 230/87, Colect., p. 6365, n. 16, e de 27 de Março de 1990, Boots Company, C-126/88, Colect., p. I-1235, n. 19).
28 Num caso como o do processo principal, o fabricante, que restituiu ao retalhista o valor do cupão de desconto, ou ao consumidor final o valor do cupão de reembolso, recebe, no final da operação, um montante que corresponde ao preço de venda dos seus artigos pago pelos grossistas ou pelos retalhistas, diminuído do valor desses cupões. Não é, por isso, conforme com a directiva que a matéria colectável com base na qual é calculado o IVA devido pelo fabricante, enquanto sujeito passivo, seja mais elevada do que o montante por este recebido a final. Se assim fosse, não seria respeitado o princípio da neutralidade do IVA relativamente aos sujeitos passivos, entre os quais se inclui o fabricante.
29 Consequentemente, a matéria colectável aplicável ao fabricante enquanto sujeito passivo deve ser constituída pelo montante correspondente ao preço a que vendeu as mercadorias aos grossistas ou aos retalhistas, diminuído do valor dos cupões.
30 Esta interpretação é corroborada pelo artigo 11. , parte C, n. 1, da Sexta Directiva, que, a fim de garantir a neutralidade da posição do sujeito passivo, dispõe que, em caso de anulação, rescisão, resolução, não pagamento total ou parcial ou redução do preço, depois de efectuada a operação, a matéria colectável é reduzida em conformidade, nas condições fixadas pelos Estados-Membros.
31 É certo que esta disposição se refere ao caso habitual das relações contratuais directamente estabelecidas entre duas partes contratantes, e que sofrem uma alteração posterior. Não é menos verdade que constitui expressão do princípio da neutralidade da posição dos sujeitos passivos, acima realçado. Consequentemente, resulta desta disposição que, para garantir o respeito do princípio da neutralidade, no cálculo da matéria colectável do IVA há que ter em conta o caso de um sujeito passivo que, não estando contratualmente vinculado ao consumidor final, mas sendo o primeiro elo de uma cadeia de operações que conduz a este último, lhe concede, por intermédio dos retalhistas, um desconto ou lhe restitui directamente o valor dos cupões. De contrário, a administração fiscal cobraria ao sujeito passivo, a título de IVA, um montante superior ao efectivamente pago pelo consumidor final.
32 Esta interpretação não é contrariada pelos argumentos invocados pelos Governos do Reino Unido, alemão e helénico, segundo os quais a dedução à matéria colectável dos descontos directamente concedidos, ou dos reembolsos directamente feitos ao consumidor pelo fornecedor inicial, após o fornecimento a um grossista ou a um retalhista, pode perturbar o funcionamento do mecanismo do IVA e tornar o sistema impraticável, uma vez que obrigaria cada um dos grossistas ou retalhistas da cadeia comercial a reajustar retroactivamente o preço e, consequentemente, o montante do IVA pago ao respectivo fornecedor e exigiria, por parte deste, a emissão de facturas rectificadas.
33 Efectivamente, o sistema do IVA não é perturbado por essa dedução, uma vez que não é necessário reajustar a matéria colectável relativa às transacções intermédias. Pelo contrário, a matéria colectável mantém-se inalterável, dado que, no que respeita a essas transacções, a aplicação do princípio da neutralidade é garantida recorrendo ao regime de dedução constante do título XI da Sexta Directiva, que permite aos operadores intermédios da cadeia de distribuição, como os grossistas e os retalhistas, deduzirem à sua própria matéria colectável os montantes pagos por cada um ao respectivo fornecedor a título de IVA sobre a correspondente operação e restituir assim à administração fiscal a parte do IVA correspondente à diferença entre o preço por cada um pago ao respectivo fornecedor e o preço a que a mercadoria foi entregue ao comprador.
34 Tendo em conta as considerações que antecedem, deve responder-se à primeira questão submetida que o artigo 11. , parte A, n. 1, alínea a), e parte C, n. 1, da Sexta Directiva deve ser interpretado no sentido de que, quando a) um fabricante emite um cupão de desconto, reembolsável pelo montante indicado no cupão pelo fabricante ou por conta deste, em benefício do retalhista; b) esse cupão, distribuído a um cliente potencial no âmbito de uma campanha de promoção de vendas, pode ser aceite pelo retalhista como pagamento de determinado artigo; c) o fabricante vendeu esse artigo directamente ao retalhista ao "preço do fornecedor original", e d) o retalhista aceita o cupão do cliente aquando da venda do artigo e o apresenta ao fabricante, deste recebendo o montante indicado, a matéria colectável é igual ao preço de venda praticado pelo fabricante, diminuído do montante indicado no cupão e reembolsado. O mesmo se passa se o fabricante fornecer inicialmente os artigos a um grossista, em vez de os fornecer directamente a um retalhista.
35 Deve responder-se à segunda questão submetida que o artigo 11. , parte A, n. 1, alínea a), e parte C, n. 1, da Sexta Directiva deve ser interpretado no sentido de que, quando a) no âmbito de um plano de promoção, o fabricante vende artigos directamente ao retalhista a "preço do fabricante"; b) um cupão de reembolso de um montante indicado na respectiva embalagem confere ao cliente, caso faça prova da compra de um desses artigos e satisfaça outras condições referidas no cupão, o direito de o apresentar ao fabricante e de receber em troca o montante indicado e c) um cliente compra um artigo desse tipo a um retalhista, apresenta o cupão ao fabricante e recebe deste o montante indicado, a matéria colectável é igual ao preço de venda praticado pelo fabricante, diminuído do montante indicado, no cupão e reembolsado. O mesmo se passa se o fabricante fornecer inicialmente os artigos a um grossista, em vez de os fornecer directamente a um retalhista.
Quanto às despesas
36 As despesas efectuadas pelos Governos do Reino Unido, alemão, helénico, francês e italiano, bem como pela Comissão das Comunidades Europeias, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.
Pelos fundamentos expostos,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sexta Secção),
pronunciando-se sobre as questões submetidas pelo Value Added Tax Tribunal, London, por decisão de 30 de Novembro de 1994, declara:
1) O artigo 11. , parte A, n. 1, alínea a), e parte C, n. 1, da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios ° Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme, deve ser interpretado no sentido de que, quando a) um fabricante emite um cupão de desconto, reembolsável pelo montante indicado no cupão pelo fabricante ou por conta deste, em benefício do retalhista; b) esse cupão, distribuído a um cliente potencial no âmbito de uma campanha de promoção de vendas, pode ser aceite pelo retalhista como pagamento de determinado artigo; c) o fabricante vendeu esse artigo directamente ao retalhista ao "preço do fornecedor original", e d) o retalhista aceita o cupão do cliente aquando da venda do artigo e o apresenta ao fabricante, deste recebendo o montante indicado, a matéria colectável é igual ao preço de venda praticado pelo fabricante, diminuído do montante indicado no cupão e reembolsado. O mesmo se passa se o fabricante fornecer inicialmente os artigos a um grossista, em vez de os fornecer directamente a um retalhista.
2) O artigo 11. , parte A, n. 1, alínea a), e parte C, n. 1, da Sexta Directiva deve ser interpretado no sentido de que, quando a) no âmbito de um plano de promoção, o fabricante vende artigos directamente ao retalhista a "preço do fabricante"; b) um cupão de reembolso de um montante indicado na respectiva embalagem confere ao cliente, caso faça prova da compra de um desses artigos e satisfaça outras condições referidas no cupão, o direito de o apresentar ao fabricante e de receber em troca o montante indicado, e c) um cliente compra um artigo desse tipo a um retalhista, apresenta o cupão ao fabricante e recebe deste o montante indicado, a matéria colectável é igual ao preço de venda praticado pelo fabricante, diminuído do montante indicado no cupão e reembolsado. O mesmo se passa se o fabricante fornecer inicialmente os artigos a um grossista, em vez de os fornecer directamente a um retalhista.