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Acórdão do Tribunal (Segunda Secção) de 29 de Abril de 1999. - Norbury Developments Ltd contra Commissioners of Customs & Excise. - Pedido de decisão prejudicial: Value Added Tax Tribunal, Manchester - Reino Unido. - IVA - Sexta Directiva - Disposições transitórias - Manutenção de isenções - Entrega de um terreno para construção. - Processo C-136/97.
Colectânea da Jurisprudência 1999 página I-02491
Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória
Disposições fiscais - Harmonização das legislações - Impostos sobre o volume de negócios - Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado - Faculdade que têm os Estados-Membros de manter certas isenções a título transitório - Alcance - Redução do âmbito material das isenções - Admissibilidade
(Directiva 77/388 do Conselho, artigos 4._, n._ 3, 28._, n._ 3, alínea b), e anexo F, ponto 16)
Estando em causa a entrega de um terreno para construção, um Estado-Membro tem o direito de isentar esta entrega nos termos do disposto no artigo 28._, n._ 3, alínea b), em conjugação com o ponto 16 do anexo F da Sexta Directiva 77/388, apesar de este Estado ter, por um lado, introduzido após a adopção desta directiva a possibilidade de renunciar à isenção do imposto sobre o valor acrescentado em relação a essas entregas e, por outro, reduzido o âmbito material da isenção aplicável a estas últimas, de tal forma que certas entregas anteriormente isentas são doravante sujeitas ao imposto sobre o valor acrescentado.
Com efeito, as alterações introduzidas pelo Estado-Membro não alargaram o âmbito da isenção, mas, pelo contrário, reduziram-no. Portanto, não foram introduzidas com desrespeito do teor da alínea b) do n._ 3 do artigo 28._, que, embora se oponha à introdução de novas isenções ou à extensão do alcance das isenções existentes posteriormente à data da entrada em vigor da Sexta Directiva, não obsta à sua redução, constituindo a sua supressão o objectivo do n._ 4 do artigo 28._ da directiva.
No processo C-136/97,
que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177._ do Tratado CE, pelo VAT and Duties Tribunal, Manchester Tribunal Centre (Reino Unido), destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre
Norbury Developments Ltd
e
Commissioners of Customs & Excise,
uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação do artigo 28._, n._ 3, alínea b), da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme (JO L 145, p. 1; EE 09 F1, p. 54), em conjugação com o anexo F, ponto 16, desta directiva,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA
(Segunda Secção),
composto por: G. Hirsch (relator), presidente de secção, G. F. Mancini e R. Schintgen, juízes,
advogado-geral: N. Fennelly,
secretário: D. Louterman-Hubeau, administradora principal,
vistas as observações escritas apresentadas:
- em representação do Governo do Reino Unido, por Lindsey Nicoll, do Treasury Solicitor's Department, na qualidade de agente, assistida por Kenneth Parker, QC,
- em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por Peter Oliver, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agente,
visto o relatório para audiência,
ouvidas as alegações da Norbury Developments Ltd, representada por Julian Ghosh, barrister, do Governo do Reino Unido, representado por Stephanie Ridley, do Treasury Solicitor's Department, na qualidade de agente, assistida por Kenneth Parker, e da Comissão, representada por Peter Oliver, na audiência de 11 de Junho de 1998,
ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 16 de Julho de 1998,
profere o presente
Acórdão
1 Por despacho de 2 de Abril de 1997, entrado no Tribunal de Justiça no dia 14 de Abril seguinte, o VAT and Duties Tribunal, Manchester Tribunal Centre, submeteu, nos termos do artigo 177._ do Tratado CE, uma questão prejudicial relativa à interpretação do artigo 28._, n._ 3, alínea b), da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme (JO L 145, p. 1; EE 09 F1 p. 54, a seguir «Sexta Directiva»), em conjugação com o anexo F, ponto 16, desta directiva.
2 Esta questão foi suscitada no âmbito de um litígio que opõe a Norbury Developments Ltd (a seguir «Norbury») aos Commissioners of Customs & Excise (a seguir «Commissioners»), competentes em matéria de cobrança do imposto sobre o valor acrescentado (a seguir «IVA») no Reino Unido, a respeito de uma decisão destes últimos que recusou aceitar a dedução do IVA que a Norbury pagou a montante aquando da compra de uma parcela de terreno.
A regulamentação comunitária
3 O artigo 28._, n._ 3, da Sexta Directiva dispõe:
«3. Durante o período transitório a que se refere o n._ 4, os Estados-Membros podem:
...
b) Continuar a isentar as operações enumeradas no anexo F, nas condições em vigor no Estado-Membro;
c) Conceder aos sujeitos passivos a faculdade de optarem pela tributação das operações isentas, nas condições fixadas no anexo G;
...»
4 O anexo F da Sexta Directiva, de epígrafe «Lista das operações referidas no n._ 3, alínea b), do artigo 28._», menciona, no seu ponto 16, a «entrega de edifícios e de terrenos referidos no n._ 3 do artigo 4._»
5 Nos termos do anexo G, de epígrafe «Direito de opção», da Sexta Directiva:
«1. O direito de opção referido no n._ 3, alínea c), do artigo 28._ pode ser concedido:
...
b) No caso das operações referidas no anexo F...»
6 O artigo 4._, n._ 3, alínea b), da Sexta Directiva prevê que «... Por terrenos para construção entendem-se os terrenos, urbanizados ou não, tal como são definidos pelos Estados-Membros.»
O artigo 13._, B, da Sexta Directiva, de epígrafe «Outras isenções», dispõe que os Estados-Membros isentarão «h) As entregas de bens imóveis não construídos, com excepção das entregas de terrenos para construção previstas no n._ 3, alínea b), do artigo 4._»
A regulamentação nacional
7 Na data da adopção da Sexta Directiva, o anexo 5, primeira categoria, do Finance Act 1972 isentava do IVA as vendas de imóveis, comportando todavia esta isenção um certo número de excepções. À época dos factos na causa principal, a referida isenção e as correspondentes excepções estavam previstas pelo Value Added Tax Act 1983 (lei do IVA, a seguir «VATA 1983»), na sua versão resultante do Finance Act 1989, que reduziu o âmbito das isenções, introduzindo um maior número de excepções a este e a faculdade de optar pela tributação em certos casos.
Os factos do litígio na causa principal
8 A Norbury comprou à Rivermead Homes Ltd uma parcela de terreno, sita em Chesterton, para a qual tinha obtido uma licença de construção e que seguidamente revendeu à John Kottler Ltd. Estas duas operações foram realizadas em 29 de Abril de 1994.
9 A venda do referido terreno constituía uma entrega isenta do IVA nos termos do VATA 1983. Contudo, em conformidade com as disposições deste último, a Rivermead Homes Ltd optou por renunciar à isenção e facturar o IVA sobre a venda do referido terreno, ao passo que não foi facturado qualquer IVA por ocasião da venda entre a Norbury e a John Kottler Ltd. Em 12 de Setembro de 1994, os Commissioners avaliaram em 12 443 UKL o IVA devido pela Norbury, correspondente ao imposto facturado a montante sobre o preço de compra do terreno. Nos termos dos parágrafos 2 e 3 do anexo 6 A do VATA 1983, é facto assente que a Norbury não podia exercer retroactivamente a opção que lhe permitia renunciar à isenção da operação de venda à John Kottler Ltd.
10 Todavia, a Norbury defende que, produzindo as disposições da Sexta Directiva efeito directo, a referida venda constituía uma operação tributável por força do disposto no n._ 1 do seu artigo 2._, e que, por essa razão, podia deduzir o imposto pago a montante.
11 Pelo contrário, os Commissioners sustentam que as disposições relevantes da regulamentação nacional estão conformes com o disposto na alínea b) do n._ 3 do artigo 28._, em conjugação com o disposto no ponto 16 do anexo F desta directiva, pelo que estas disposições continuavam a ser aplicáveis à data da referida operação.
12 O VAT and Duties Tribunal, Manchester Tribunal Centre, chamado a conhecer do litígio, decidiu que, após 1977, o âmbito de isenção do IVA no Reino Unido não tinha sido alargado, mas que, pelo contrário, tinha sido reduzido através da introdução de um maior número de excepções. Portanto, a questão será a de saber se esta restrição constitui um obstáculo à aplicação da alínea b) do n._ 3 do artigo 28._ da Sexta Directiva. Portanto, o referido tribunal decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:
«Estando em causa a entrega de um bem imóvel não construído, mas no qual, à data da entrega, tinha sido legalmente autorizada a construção de edifícios, por uma autorização concedida de acordo com a lei do Estado-Membro e que o tribunal considera ser um terreno para construção, pode o Reino Unido isentar a entrega nos termos do artigo 28._, n._ 3, alínea b), da Sexta Directiva? Apesar de:
a) o regime da tributação de entregas de terrenos, incluindo entregas de terrenos que sejam indiscutivelmente terrenos para construção, ter sido alterado após o Reino Unido ter consentido na adopção da Sexta Directiva em 17 de Maio de 1977, em especial após a adopção do Finance Act 1989, que introduziu a possibilidade de prescindir da isenção do IVA em relação a determinadas entregas deste tipo; e
(b) o regime da tributação de entregas de terrenos, incluindo entregas de terrenos que sejam indiscutivelmente terrenos para construção, ter sido alterado após o Reino Unido ter consentido na adopção da Sexta Directiva em 17 de Maio de 1977, em especial após a adopção do Finance Act 1989, que exige que algumas entregas desse tipo, que antes estavam isentas, sejam tributadas à taxa normal como trabalhos de engenharia civil,
e tendo em conta que:
a entrega teria sido isenta se tivesse ocorrido antes de 17 de Maio de 1977, por se enquadrar no ponto 1 da primeira categoria do anexo 5 do Finance Act 1972.»
Quanto à questão prejudicial
13 Há, liminarmente, que referir que o tribunal nacional qualificou a parcela de terreno vendida pela Norbury como terreno para construção, na acepção do artigo 4._, n._ 3, da Sexta Directiva. Uma vez que, por força desta mesma disposição, cabe aos Estados-Membros definir a noção de terreno para construção, o Tribunal de Justiça encontra-se vinculado pela apreciação do órgão jurisdicional de reenvio a este respeito, sem que haja que ter em conta a circunstância de esta definição não existir na legislação do Reino Unido.
14 A Norbury sustenta, em primeiro lugar, que a finalidade das disposições transitórias previstas no n._ 3 do artigo 28._ da Sexta Directiva é de «congelar», à data da sua adopção, ou seja, em 17 de Maio de 1977, as isenções enumeradas no seu anexo F. Segundo o próprio teor da alínea b) do n._ 3 do artigo 28._, o Reino Unido só teria o direito de continuar a isentar as entregas de terrenos para construção se as condições que existiam na data de 17 de Maio de 1977 tivessem sido mantidas.
15 Ora, segundo a Norbury, ao instituir a faculdade de renunciar à isenção no que toca às entregas de terrenos para construção, o Reino Unido alterou as condições que lhe teriam permitido manter as isenções iniciais.
16 A este respeito, basta referir que a alínea c) do n._ 3 do artigo 28._ da Sexta Directiva, em conjugação com o disposto no seu anexo G, permite expressamente aos Estados-Membros, como fez o Reino Unido, conceder aos sujeitos passivos o direito de opção pela tributação no que respeita às operações isentas em conformidade com o disposto no anexo F.
17 Seguidamente, a Norbury sustenta que a isenção prevista a título transitório pela alínea b) do n._ 3 do artigo 28._ da Sexta Directiva já não pode ser aplicada devido ao facto de o regime de tributação das entregas de terrenos para construção ter conhecido alterações fundamentais resultantes da adopção do Finance Act 1989, nos termos do qual algumas destas entregas já não são isentas. A este respeito, invoca, designadamente, o acórdão de 27 de Outubro de 1992, Comissão/Alemanha (C-74/91, Colect., p. I-5437).
18 É certo que o Tribunal de Justiça decidiu no n._ 17 do acórdão Comissão/Alemanha, já referido, que a manutenção, por um Estado-Membro, de isenções parciais não expressamente previstas pelas disposições transitórias constantes do n._ 3 do artigo 28._ da Sexta Directiva não pode ser admitida, sendo, aliás, tal manutenção contrária ao princípio da segurança jurídica. Todavia, há que ter em conta o facto de o referido acórdão ter sido proferido a respeito de uma transposição incorrecta, por um Estado-Membro, do artigo 26._ da Sexta Directiva, respeitante ao regime específico e complexo das agências de viagem e, mais especificamente, da aplicabilidade das disposições transitórias constantes dos pontos 17 e 27 do anexo F. Portanto, o acórdão Comissão/Alemanha, já referido, foi proferido em circunstâncias de facto e de direito absolutamente diferentes das do processo na causa principal e, assim sendo, a Norbury não pode utilmente invocá-lo em apoio da sua argumentação.
19 Com efeito, no processo na causa principal, o Reino Unido está, por força da alínea b) do n._ 3 do artigo 28._, em conjugação com o ponto 16 do anexo F da Sexta Directiva, autorizado a continuar a isentar as entregas de bens imóveis com as poucas excepções à manutenção da isenção enumeradas numa lista constante do anexo 5, primeira categoria, do Finance Act 1972, à qual o anexo 6, primeira categoria, do VATA 1983, na sua versão resultante do Finance Act 1989, acrescentou um certo número de outras excepções. Como decidiu o tribunal nacional, estas alterações não alargaram o âmbito da isenção, mas, pelo contrário, reduziram-no. Portanto, não foram introduzidas com desrespeito do teor da alínea b) do n._ 3 do artigo 28._, que, embora se oponha à introdução de novas isenções ou à extensão do alcance das isenções existentes posteriormente à data da entrada em vigor da Sexta Directiva, não obsta à sua redução, constituindo a sua supressão o objectivo do n._ 4 do artigo 28._ da Sexta Directiva.
20 A este respeito, uma interpretação restritiva da alínea b) do n._ 3 do artigo 28._ da Sexta Directiva, no sentido de que, embora um Estado-Membro possa manter uma isenção existente, não pode suprimi-la, ainda que apenas em parte, sem concomitantemente extinguir todas as outras isenções, seria contrária ao referido objectivo. Além disso, semelhante interpretação teria, como o advogado-geral referiu no n._ 31 das suas conclusões, efeitos nefastos para a aplicação uniforme da Sexta Directiva. Com efeito, um Estado-Membro podia encontrar-se na obrigação de manter a totalidade das isenções existentes à data da adopção da Sexta Directiva, mesmo quando entendesse simultaneamente possível, apropriado e desejável aplicar progressivamente o regime por esta previsto no domínio em questão.
21 Há, pois, que responder à questão submetida que, estando em causa a entrega de um terreno para construção, um Estado-Membro tem o direito de isentar esta entrega nos termos do disposto no artigo 28._, n._ 3, alínea b), em conjugação com o ponto 16 do anexo F da Sexta Directiva, apesar de este Estado ter, por um lado, introduzido após a adopção desta directiva a possibilidade de renunciar à isenção do IVA em relação a essas entregas e, por outro, reduzido o âmbito material da isenção aplicável a estas últimas, de tal forma que certas entregas anteriormente isentas são doravante sujeitas ao IVA.
Quanto às despesas
22 As despesas efectuadas pelo Governo do Reino Unido e pela Comissão das Comunidades Europeias, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.
Pelos fundamentos expostos,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA
(Segunda Secção),
pronunciando-se sobre a questão submetida pelo VAT and Duties Tribunal, Manchester Tribunal Centre, por despacho de 2 de Abril de 1997, declara:
Estando em causa a entrega de um terreno para construção, um Estado-Membro tem o direito de isentar esta entrega nos termos do disposto no artigo 28._, n._ 3, alínea b), em conjugação com o ponto 16 do anexo F da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme, apesar de este Estado ter, por um lado, introduzido após a adopção desta directiva a possibilidade de renunciar à isenção do imposto sobre o valor acrescentado em relação a essas entregas e, por outro, reduzido o âmbito material da isenção aplicável a estas últimas, de tal forma que certas entregas anteriormente isentas são doravante sujeitas ao imposto sobre o valor acrescentado.