Avis juridique important
Acórdão do Tribunal (Sexta Secção) de 13 de Julho de 2000. - Idéal tourisme SA contra Estado Belga. - Pedido de decisão prejudicial: Tribunal de première instance de Liège - Bélgica. - IVA - Sexta Directiva 77/388/CEE - Disposições transitórias - Manutenção da isenção dos transportes aéreos internacionais de passageiros - Não isenção dos transportes internacionais de passageiros por autocarro - Discriminação - Auxílio de Estado. - Processo C-36/99.
Colectânea da Jurisprudência 2000 página I-06049
Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória
Disposições fiscais - Harmonização das legislações - Impostos sobre o volume de negócios - Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado - Faculdade de os Estados-Membros manterem certas isenções a título transitório - Alcance - Isenção dos transportes aéreos internacionais de passageiros e tributação dos transportes internacionais de passageiros por autocarro - Violação do princípio da igualdade de tratamento - Inexistência
[Directiva 77/388 do Conselho, artigo 28._, n._ 3, alínea b)]
$$Na fase actual da harmonização das legislações dos Estados-Membros relativas ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, o princípio comunitário da igualdade de tratamento não obsta à legislação de um Estado-Membro que, por um lado, em conformidade com o artigo 28._, n._ 3, alínea b), da Sexta Directiva 77/388 relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios, na versão resultante da Directiva 96/95 que altera, no que toca ao nível da taxa normal, a Directiva 77/388, continua a isentar os transportes aéreos internacionais de passageiros e, por outro, tributa os transportes internacionais de passageiros por autocarro.
(cf. n._ 40 e disp.)
No processo C-36/99,
que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177._ do Tratado CE (actual artigo 234._ CE), pelo Tribunal de première instance de Liège (Bélgica), destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre
Idéal tourisme SA
e
Estado belga,
uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação dos artigos 12._, n._ 3, e 28._, n._ 3, alínea b), da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme (JO L 145, p. 1; EE 09 F1 p. 54), na versão resultante da Directiva 96/95/CE do Conselho, de 20 de Dezembro de 1996, que altera, no que toca ao nível da taxa normal, a Directiva 77/388 (JO L 338, p. 89), bem como do artigo 92._ do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 87._ CE),
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA
(Sexta Secção),
composto por: J. C. Moitinho de Almeida, presidente de secção, R. Schintgen, C. Gulmann, G. Hirsch (relator) e V. Skouris, juízes,
advogado-geral: G. Cosmas,
secretário: D. Louterman-Hubeau, administradora principal,
vistas as observações escritas apresentadas:
- em representação da Idéal tourisme SA, por F. Herbert e S. Houx, advogados no foro de Bruxelas,
- em representação do Estado belga, por A. Snoecx, consultora na Direcção-Geral dos Assuntos Jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, do Comércio Externo e da Cooperação para o Desenvolvimento, na qualidade de agente, assistida por B. van de Walle de Ghelcke, advogado no foro de Bruxelas,
- em representação do Governo francês, por K. Rispal-Bellanger, subdirectora na Direcção dos Assuntos Jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, e D. Colas, secretário dos Negócios Estrangeiros na mesma direcção, na qualidade de agentes,
- em representação do Governo português, por L. Inez Fernandes, director do Serviço Jurídico da Direcção-Geral das Comunidades Europeias do Ministério dos Negócios Estrangeiros, A. Cortesão de Seiça Neves, jurista na mesma direcção, e R. Álvaro de Figueiredo Ribeiro, jurista na Direcção-Geral dos Transportes Terrestres, na qualidade de agentes,
- em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por H. Michard e D. Triantafyllou, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes,
visto o relatório para audiência,
ouvidas as alegações da Idéal tourisme SA, representada por F. Herbert, S. Houx e M. Pittie, advogado no foro de Bruxelas, do Estado belga, representado por B. van de Walle de Ghelcke, do Governo francês, representado por D. Colas e F. Million, encarregado de missão na Direcção dos Assuntos Jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente, e da Comissão, representada por H. Michard e D. Triantafyllou, na audiência de 29 de Março de 2000,
ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 11 de Maio de 2000,
profere o presente
Acórdão
1 Por decisão de 8 de Fevereiro de 1999, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 10 de Fevereiro seguinte, o Tribunal de première instance de Liège submeteu, nos termos do artigo 177._ do Tratado CE (actual artigo 234._ CE), duas questões prejudiciais relativas à interpretação dos artigos 12._, n._ 3, e 28._, n._ 3, alínea b), da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme (JO L 145, p. 1; EE 09 F1 p. 54), na versão resultante da Directiva 96/95/CE do Conselho, de 20 de Dezembro de 1996, que altera, no que toca ao nível da taxa normal, a Directiva 77/388 (JO L 338, p. 89, a seguir «Sexta Directiva»), bem como do artigo 92._ do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 87._ CE).
2 Estas questões foram colocadas no âmbito de um litígio que opõe a Idéal tourisme SA (a seguir «Idéal tourisme») ao Estado belga a propósito da cobrança do imposto sobre o valor acrescentado (a seguir «IVA») que incide sobre as operações de transporte internacional de passageiros por autocarro efectuadas pela Idéal tourisme.
Regulamentação comunitária
3 O artigo 28._, n._ 3, alínea b), da Sexta Directiva estabelece:
«Durante o período transitório a que se refere o n._ 4, os Estados-Membros podem:
...
b) Continuar a isentar as operações enumeradas no Anexo F, nas condições em vigor no Estado-Membro.»
4 O Anexo F da Sexta Directiva, intitulado «Lista das Operações referidas no n._ 3, alínea b), do artigo 28._», refere no seu n._ 17:
«Transportes de passageiros;
Os transportes de bens, tais como bagagens e veículos automóveis, que acompanham os passageiros ou as prestações de serviços ligados ao transporte de passageiros só serão isentos se os transportes dos referidos passageiros estiverem isentos.»
5 O artigo 15._ da Sexta Directiva, que, designadamente, rege a isenção dos transportes internacionais, prevê no seu n._ 6:
«Sem prejuízo de outras disposições comunitárias, os Estados-Membros isentarão, nas condições por eles fixadas com o fim de assegurar a aplicação correcta e simples das isenções a seguir enunciadas e de evitar qualquer possível fraude, evasão e abuso:
...
6. A entrega, transformação, reparação, manutenção, fretamento e locação de aeronaves utilizadas por companhias de navegação aérea, que se dediquem essencialmente ao tráfego internacional remunerado, e bem assim a entrega, locação, reparação e manutenção dos objectos incorporados nas referidas aeronaves ou que sejam utilizados na sua exploração.»
6 Nos termos do artigo 17._, n._ 3, alínea b), da Sexta Directiva, os Estados-Membros concedem a todos os sujeitos passivos a dedução ou o reembolso do IVA na medida em que os bens e serviços sejam utilizados para efeitos das operações isentas nos termos do artigo 15._ da mesma directiva.
7 O artigo 12._, n._ 3, da Sexta Directiva estabelece as regras para a fixação, pelos Estados-Membros, da taxa normal e das taxas reduzidas do IVA aplicáveis às operações tributáveis.
8 O artigo 92._, n._ 1, do Tratado estabelece:
«Salvo disposição em contrário do presente Tratado, são incompatíveis com o mercado comum, na medida em que afectem as trocas comerciais entre os Estados-Membros, os auxílios concedidos pelos Estados ou provenientes de recursos estatais, independentemente da forma que assumam, que falseiem ou ameacem falsear a concorrência, favorecendo certas empresas ou certas produções.»
Regulamentação nacional
9 Na Bélgica, o código do imposto sobre o valor acrescentado (a seguir «código do IVA») prevê, no seu artigo 21._, n._ 3:
«Por derrogação ao n._ 2, considera-se que o local da prestação de serviços se situa:
...
3_ no lugar onde se efectua o transporte em função das distâncias percorridas, quando a prestação tem por objecto um transporte.»
10 O artigo 1._, n._ 1, do Decreto real n._ 20, de 20 de Julho de 1970, que fixa as taxas do imposto sobre o valor acrescentado e determina a repartição dos bens e dos serviços segundo essas taxas (Moniteur belge de 31 de Julho de 1970), estabelece:
«A taxa do imposto sobre o valor acrescentado é de:
1_ 6% no que respeita aos bens e serviços constantes do quadro A do anexo ao presente decreto.»
11 Na rubrica XXV, intitulada «Transportes», do quadro A figuram:
«Os transportes de passageiros bem como das bagagens não registadas e dos animais que acompanham os passageiros.»
12 O artigo 41._, n._ 1, 1_, do código do IVA estabelece que estão isentos do IVA:
«Os transportes marítimos de passageiros; os transportes aéreos internacionais de passageiros; os transportes de bagagens e de veículos automóveis, acompanhados dos viajantes no caso dos transportes referidos no presente parágrafo 1_.»
13 O artigo 45._, n._ 1, do código do IVA encontra-se redigido da seguinte forma:
«Os sujeitos passivos podem deduzir do imposto de que são devedores os impostos que oneraram os bens e os serviços que lhe foram fornecidos, os bens que importou e as aquisições intracomunitárias de bens que efectuou, desde que os utilize para efectuar:
1_ operações tributadas;
2_ operações isentas nos termos dos artigos 39._ a 42._»
14 A referida regulamentação belga relativa à isenção dos transportes aéreos internacionais de passageiros é anterior à data de entrada em vigor da Sexta Directiva.
O litígio no processo principal e as questões prejudiciais
15 A Idéal tourisme, cuja sede se situa em Liège (Bélgica), é uma sociedade que efectua operações de transporte internacional de passageiros por autocarro.
16 Na sua declaração mensal do IVA relativa às operações do mês de Junho de 1997, a Idéal tourisme declarou à taxa de 0%, em vez de à taxa de 6% prevista pela regulamentação belga, as partes das operações de transporte internacional de passageiros por autocarro efectuadas na Bélgica. Ao fazê-lo, explicou que se considerava discriminada no plano do IVA relativamente aos transportadores aéreos internacionais de passageiros. Com efeito, segundo afirma, este último modo de transporte está isento do IVA, o que não impede as empresas de transporte aéreo de deduzirem o IVA a montante enquanto a parte dos transportes de passageiros em autocarro efectuada na Bélgica está, segundo a regulamentação belga, sujeita a IVA à taxa de 6%. Tratava-se, portanto, de uma discriminação contrária ao princípio geral da igualdade que integra os princípios gerais do direito comunitário.
17 Como a administração fiscal belga solicitou à Idéal tourisme os montantes de 554 845 BEF a título do IVA e de 55 000 BEF a título de coimas, esta, após ter liquidado essas quantias, submeteu o processo ao Tribunal de première instance de Liège a fim de obter o seu reembolso. Nesse órgão jurisdicional, a Idéal tourisme alegou que a regulamentação belga que isenta os transportes aéreos internacionais de passageiros não só viola o princípio geral da igualdade, como também constitui um auxílio de Estado na acepção do artigo 92._ do Tratado em favor das companhias de navegação aérea.
18 O Tribunal de première instance de Liège, considerando que necessitava de uma interpretação do direito comunitário para proferir a sua decisão, decidiu suspender a instância e colocar ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:
«1) A Directiva 77/388/CEE, em especial os seus artigos 12._, n._ 3 e 28._, n._ 3, alínea b), autoriza os Estados-Membros a instaurar, em detrimento das empresas de transporte de pessoas por autocarro, uma discriminação contrária ao princípio da igualdade de tratamento e da não discriminação impostos pelo direito comunitário?
2) Um regime de IVA favorável a um determinado sector económico de actividades, como o em causa no caso em apreço, pode constituir um auxílio de Estado na acepção do artigo 92._ do Tratado de Roma, mesmo que não proteja exclusivamente a indústria nacional?»
Quanto à admissibilidade das questões prejudiciais
19 O Estado belga manifesta algumas dúvidas quanto à veracidade do litígio no processo principal. Em seu entender, as questões que a Idéal tourisme sugeriu ao órgão jurisdicional de reenvio que colocasse ao Tribunal de Justiça, sem serem puramente hipotéticas, tinham, no entanto, por único objectivo obter o resultado que ainda não pôde ser alcançado pela via legislativa. Remete para o douto entendimento do Tribunal de Justiça no que respeita à admissibilidade do presente pedido prejudicial.
20 A este propósito, importa recordar que, segundo uma jurisprudência constante, compete apenas ao juiz nacional, a quem foi submetido o litígio e que deve assumir a responsabilidade pela decisão jurisdicional a tomar, apreciar, tendo em conta as especificidades do processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para poder proferir a sua decisão como a pertinência das questões que coloca ao Tribunal de Justiça (v., designadamente, acórdão de 15 de Dezembro de 1995, Bosman, C-415/93, Colect., p. I-4921, n._ 59). Não obstante, o Tribunal de Justiça considerou não poder pronunciar-se sobre uma questão prejudicial colocada por um órgão jurisdicional nacional quando é manifesto que a interpretação ou a apreciação da validade de uma regra comunitária, solicitadas pela jurisdição nacional, não têm qualquer relação com a realidade ou com o objecto do litígio no processo principal, quando o problema é hipotético ou ainda quando o Tribunal de Justiça não dispõe dos elementos de facto e de direito necessários para responder utilmente às questões que lhe são colocadas (v. acórdãos Bosman, já referido, n._ 61, e de 9 de Março de 2000, EKW e Wein & Co., C-437/97, Colect., p. 1157, n._ 52).
21 Ora, da decisão de reenvio resulta claramente que o recurso interposto pela Idéal tourisme visa o reembolso do montante do IVA que pagou ao Estado belga e, portanto, o benefício que poderia auferir com uma isenção do IVA sem, no entanto, perder o direito à dedução do IVA pago a montante.
22 Importa observar que os autos não revelam a existência de quaisquer elementos dos quais se possa inferir, de forma manifesta, que as partes no processo principal se concertaram para, através de um litígio fictício, como foi o caso do processo que esteve na origem do acórdão de 16 de Dezembro de 1981, Foglia (244/80, Recueil, p. 3045), obrigar o Tribunal de Justiça a decidir. Pelo contrário, é incontestável que as partes estão em desacordo sobre um determinado número de pontos importantes e dos autos resulta claramente que a Idéal tourisme não chegou a acordo com o Estado belga para colocar ao Tribunal de Justiça questões prejudiciais hipotéticas.
23 Quanto à pertinência da primeira questão, cabe observar que esta não é manifestamente destituída de pertinência dado que dos autos resulta que o órgão jurisdicional de reenvio considera que transportadores de passageiros por autocarro são, por referência às companhias aéreas, objecto de uma discriminação que lhe parece, a priori, contrária ao princípio comunitário da igualdade e da não discriminação.
24 Não cabe ao Tribunal de Justiça, no âmbito do exame da admissibilidade da primeira questão, apreciar esta análise.
25 Assim, há que responder à primeira questão prejudicial.
26 Em contrapartida, importa observar que a segunda questão colocada não tem, manifestamente, qualquer pertinência para efeitos da solução do litígio no processo principal.
27 Através desta segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se a isenção do IVA de que beneficiam as companhias aéreas constitui um auxílio de Estado incompatível com o direito comunitário.
28 Contudo, o litígio no processo principal não respeita à questão de saber se é esse ou não o caso, antes incidindo sobre a questão de saber se determinadas operações efectuadas pela Idéal tourisme estão ou não sujeitas ao IVA.
29 Assim, não há que responder à segunda questão prejudicial (v., neste sentido, para um processo semelhante, acórdão EKW e Wein & Co., já referido, n._ 53).
Quanto à primeira questão
30 Através da sua primeira questão, o órgão jurisdicional nacional pergunta, em substância, se o princípio da igualdade de tratamento se opõe à legislação de um Estado-Membro que, por um lado, em conformidade com o artigo 28._, n._ 3, alínea b), da Sexta Directiva, continua a isentar os transportes aéreos internacionais de passageiros e, por outro, tributa os transportes internacionais de passageiros por autocarro.
31 A Idéal tourisme alega que, enquanto sociedade de transportes por autocarro, está em concorrência directa com as companhias de navegação aérea no médio curso, ou seja, nas distâncias compreendidas entre 300/400 km e 2 500/3 000 km. A diferença de tributação não se justificava, portanto, e violava o princípio da igualdade de tratamento. Em contrapartida, segundo o Estado belga e os Governos francês e português, estes dois modos de transporte não se substituem suficientemente um ao outro para poderem ser considerados como pertencendo ao mesmo mercado. A Comissão, por seu lado, sublinha dever considerar-se que a diferença de tributação em função do tipo de meio de transporte utilizado pelo sujeito passivo, objectivamente justificada ou não, está em conformidade com a Sexta Directiva enquanto o legislador comunitário não puser termo ao regime transitório de isenção.
32 A título preliminar, cabe recordar que o artigo 28._, n._ 3, alínea b), da Sexta Directiva, em conjugação com o Anexo F da mesma directiva, autoriza, em termos claros e sem ambiguidade, os Estados-Membros a continuar a aplicar, nas mesmas condições, algumas isenções previstas na sua legislação antes da entrada em vigor da Sexta Directiva. Embora, por conseguinte, esse artigo não permita aos Estados-Membros introduzir novas isenções ou estender o alcance das isenções existentes posteriormente à data de entrada em vigor da referida directiva, em contrapartida, não obsta à redução das isenções existentes, tanto mais que a sua supressão constitui o objectivo do artigo 28._, n._ 4, da Sexta Directiva (v. acórdão de 29 de Abril de 1999, Norbury Developments, C-136/97, Colect., p. I-2491, n._ 19).
33 Daqui decorre que um Estado-Membro que, como o Reino da Bélgica, por um lado, sujeita a IVA os transportes internacionais efectuados pelas empresas de transporte de passageiros por autocarro e, por outro, continua a isentar os transportes aéreos internacionais de passageiros não podia alargar aos primeiros a isenção de que beneficiam os segundos, embora a diferença de tratamento violasse o princípio comunitário da igualdade de tratamento. Em contrapartida, podia tributar igualmente os transportes aéreos para que desaparecesse essa diferença de tratamento.
34 Mas importa observar que um Estado-Membro pode, por um lado, continuar a isentar, nas condições referidas no artigo 28._, n._ 3, alínea b), da Sexta Directiva, os transportes aéreos internacionais de passageiros e, por outro, tributar os transportes internacionais de passageiros por autocarro.
35 É verdade que o princípio da igualdade de tratamento faz parte dos princípios fundamentais do direito comunitário. Este princípio exige que as situações comparáveis não sejam tratadas de forma diferente, a menos que uma diferenciação se justifique objectivamente (acórdão de 25 de Novembro de 1986, Klensch e o., 201/85 e 202/85, Colect., p. 3477, n._ 9).
36 Tal como a Idéal tourisme correctamente sustenta, do n._ 10 do acórdão Klensch e o., já referido, resulta igualmente que os Estados-Membros, aquando da transposição de uma directiva para o seu direito nacional, são obrigados a respeitar o princípio da igualdade de tratamento.
37 Todavia, importa recordar que o regime comunitário do IVA é o resultado de uma harmonização progressiva das legislações nacionais no âmbito dos artigos 99._ e 100._ do Tratado CE (actuais artigos 93._ CE e 94._ CE). Como declarado várias vezes pelo Tribunal, esta harmonização, tal como realizada pelas sucessivas directivas e, nomeadamente, pela Sexta Directiva, só é ainda uma harmonização parcial (v. acórdão de 5 de Dezembro de 1989, ORO Amsterdam Beheer e Concerto, C-165/88, Colect., p. 4081, n._ 21).
38 Como o Estado belga indicou na audiência, a harmonização pretendida ainda não é uma realidade na medida em que a Sexta Directiva autorizou, incondicionalmente, os Estados-Membros, nos termos do artigo 28._, n._ 3, alínea b), a manterem determinadas disposições da sua legislação nacional anteriores à Sexta Directiva que, sem a referida autorização, com ela seriam incompatíveis. Assim, na medida em que um Estado-Membro mantém essas disposições, não transpõe a Sexta Directiva e não viola, portanto, nem essa directiva nem os princípios gerais comunitários que os Estados-Membros devem, de acordo com o acórdão Klensch e o., já referido, respeitar ao transpor a regulamentação comunitária.
39 Relativamente a tal situação, é ao legislador comunitário que cabe aprovar o regime comunitário das isenções do IVA e realizar assim a harmonização progressiva das legislações nacionais em matéria de IVA (v., neste sentido, acórdão de 5 de Outubro de 1999, Royscot e o., C-305/97, Colect., p. I-0000, n._ 31).
40 Há pois que responder à primeira questão no sentido de que, na fase actual da harmonização das legislações dos Estados-Membros relativas ao sistema comum do IVA, o princípio comunitário da igualdade de tratamento não obsta à legislação de um Estado-Membro que, por um lado, em conformidade com o artigo 28._, n._ 3, alínea b), da Sexta Directiva, continua a isentar os transportes aéreos internacionais de passageiros e, por outro, tributa os transportes internacionais de passageiros por autocarro.
Quanto às despesas
41 As despesas efectuadas pelos Governos francês e português e pela Comissão das Comunidades Europeias, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.
Pelos fundamentos expostos,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA
(Sexta Secção),
pronunciando-se sobre as questões submetidas pelo Tribunal de première instance de Liège, por decisão de 8 de Fevereiro de 1999, declara:
Na fase actual da harmonização das legislações dos Estados-Membros relativas ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, o princípio comunitário da igualdade de tratamento não obsta à legislação de um Estado-Membro que, por um lado, em conformidade com o artigo 28._, n._ 3, alínea b), da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme, na versão resultante da Directiva 96/95/CE do Conselho, de 20 de Dezembro de 1996, que altera, no que toca ao nível da taxa normal, a Directiva 77/388, continua a isentar os transportes aéreos internacionais de passageiros e, por outro, tributa os transportes internacionais de passageiros por autocarro.