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CONCLUSÕES DA ADVOGADA-GERAL

JULIANE KOKOTT

apresentadas em 14 de Julho de 2005 1(1)

Processo C-265/04

Margaretha Bouanich

(pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Kammarrätten, Sundsval, Suécia)

«Livre circulação de capitais (artigos 56.° CE e 58.° CE) – Legislação fiscal – Tributação dos rendimentos da cessão de acções – Resgate de acções pela sociedade emissora – Possibilidade de dedução dos custos de aquisição pelos accionistas com domicílio no estrangeiro – Convenção em matéria de dupla tributação»





I –    Introdução

1.     No presente processo está em causa a legislação em vigor na Suécia relativa à tributação dos rendimentos da cessão de acções, aplicável quando uma sociedade anónima com sede na Suécia – por exemplo, no âmbito de uma redução do capital – readquire acções aos seus próprios accionistas. Trata-se, em substância, da questão de saber se as disposições sobre a livre circulação de capitais (artigos 56.° CE e 58.° CE) proíbem que seja dado aos accionistas com domicílio ou residência habitual na Suécia um tratamento diferente do reservado aos accionistas que não têm domicílio ou residência habitual na Suécia, na medida em que os primeiros têm direito à dedução dos seus custos de aquisição das acções (2) do montante a tributar, ao passo que aos segundos isso não é permitido (3).

2.     Além disso, há que esclarecer se um eventual tratamento desigual pode ser compensado por meio de disposições mais favoráveis, resultantes de uma convenção em matéria de dupla tributação vigente entre a Suécia e o Estado do domicílio do accionista em questão.

II – Quadro legal

A –    Direito comunitário

3.     O quadro legal comunitário deste processo é determinado pelas disposições sobre livre circulação de capitais.

4.     A proibição geral das restrições aos movimentos de capitais entre os Estados-Membros, bem como entre os Estados-Membros e países terceiros, está consagrada no artigo 56.°, n.° 1, CE:

«No âmbito das disposições do presente capítulo, são proibidas todas as restrições aos movimentos de capitais entre Estados-Membros e entre Estados-Membros e países terceiros.»

5.     Quanto às possibilidades de actuação que os Estados-Membros mantêm, remete-se para o artigo 58.° CE, que determina, designadamente, o seguinte:

«1.      O disposto no artigo 56.° não prejudica o direito de os Estados-Membros:

a)      Aplicarem as disposições pertinentes do seu direito fiscal que estabeleçam uma distinção entre contribuintes que não se encontrem em idêntica situação no que se refere ao seu lugar de residência ou ao lugar em que o seu capital é investido;

[...]

3.      As medidas e os procedimentos a que se referem os n.os 1 e 2 não devem constituir um meio de discriminação arbitrária, nem uma restrição dissimulada à livre circulação de capitais e pagamentos, tal como definida no artigo 56.°»

B –    Direito nacional

6.     No que respeita às disposições pertinentes do direito sueco, há que referir, por um lado, a lei do imposto sobre os dividendos (4) e, por outro, a convenção em vigor sobre dupla tributação entre a Suécia e a França. Para o que aqui interessa, as respectivas disposições são a seguir resumidas.

A lei sueca relativa ao imposto sobre os dividendos

7.     Quando uma sociedade anónima sueca resgata acções de um accionista seu residente na Suécia, o montante pago a esse accionista é tributado na Suécia como lucros da cessão. Para um particular, isso significa que é aplicada uma taxa do imposto de 30% sobre o lucro da cessão após dedução dos custos de aquisição.

8.     Pelo contrário, se a pessoa singular a quem são resgatadas as acções não tiver domicílio ou residência habitual na Suécia, o montante que lhe é pago é considerado repartição de dividendos. Nos termos dos artigos 1.°, 2.°, n.° 2, 4.° e 5.° da lei sueca relativa ao imposto sobre os dividendos é aplicável a esse montante uma taxa de 30 %, não podendo ser deduzidos os custos de aquisição (5). O artigo 7.° da lei relativa ao imposto sobre os dividendos determina que um administrador central de valores, ao proceder à repartição dos dividendos, deve reter o imposto sobre os dividendos, enquanto imposto de retenção na fonte, se não resultar das informações disponíveis relativas ao beneficiário dos dividendos que este não está sujeito ao imposto.

9.     Caso sobre os dividendos tenha sido cobrado um imposto superior ao que deveria ter sido cobrado por força de uma convenção destinada a evitar a dupla tributação, o artigo 27.° da lei relativa ao imposto sobre os dividendos prevê o direito à restituição.

Convenção franco-sueca em matéria de dupla tributação

10.   O artigo 10.°, n.° 1, da convenção em vigor em matéria de dupla tributação entre a França e a Suécia (6) determina que os dividendos de sociedades com sede num dos Estados contratantes pagos a pessoas com domicílio no outro Estado contratante são tributados neste último Estado.

11.   Resulta do artigo 10.°, n.° 2, desta convenção em matéria de dupla tributação que esses dividendos são igualmente tributados no Estado contratante onde a sociedade que os distribui tem a sede. Mas se o beneficiário efectivo desses dividendos for uma pessoa singular com domicílio no outro Estado contratante o imposto não excederá 15% do montante bruto dos dividendos.

12.   Nos termos do artigo 10.°, n.° 5, da convenção em matéria de dupla tributação, pela expressão «dividendos» na acepção das disposições referidas entendem-se os rendimentos, designadamente, de acções, assim como os rendimentos que a estes sejam equiparados no Estado onde a sociedade que distribui os dividendos tem sede nos termos da legislação aplicável à data da entrada em vigor da convenção.

13.   Resulta do artigo 13.°, n.° 6, da convenção em matéria de dupla tributação que os lucros da cessão de acções como as que aqui estão em causa são tributados apenas no Estado contratante onde o cedente tem o seu domicílio.

14.   Segundo informação do órgão jurisdicional de reenvio, a convenção em matéria de dupla tributação entre a Suécia e a França é baseada num modelo de convenção da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OCDE) (7), sobre o qual a OCDE elaborou igualmente notas explicativas (8).

15.   Resulta das notas explicativas (9) ao artigo 10.° do modelo de convenção da OCDE (10) que devem ser considerados dividendos não só a repartição dos lucros decidida pela assembleia geral anual dos accionistas mas também outros benefícios quantificáveis em dinheiro, tais como acções gratuitas, lucros de liquidação e dividendos dissimulados.

16.   Nas notas explicativas (11) ao artigo 13.° do modelo de convenção da OCDE (12) indica-se que, em caso de cessão de participações de uma sociedade, no contexto da redução do seu capital social ou da liquidação dessa sociedade, a diferença entre o preço da cessão e o valor nominal das participações sociais pode, no Estado da sede da sociedade ser considerada não como lucros provenientes da cessão mas como repartição de lucros acumulados. Por conseguinte, o artigo 13.° da convenção em matéria de dupla tributação não impede a tributação dessa repartição à taxa do imposto prevista no artigo 10.°

III – Matéria de facto e processo principal

17.   Margaretha Bouanich tem o seu domicílio em França. Foi accionista da sociedade anónima sueca Förvaltnings AB Ratos. Em 2 de Dezembro de 1998, vendeu a esta sociedade as acções que detinha no valor de 8 639 402 SEK. Em aplicação da lei sueca relativa ao imposto sobre os dividendos e da convenção em matéria de dupla tributação foi aplicada ao montante desembolsado, a título de retenção na fonte, a taxa de 15%, o que corresponde a 1 295 910,30 SEK.

18.   Na sequência disso, Margaretha Bouanich apresentou uma reclamação à administração fiscal competente (13) e pediu a restituição da totalidade do imposto retido sobre os dividendos. A título subsidiário, pediu a restituição da parte do imposto calculada com base no valor nominal das acções resgatadas, o qual, desta forma, corresponde igualmente a uma tributação desse valor nominal.

19.   A administração fiscal, em 28 de Setembro de 1999, julgou procedente o pedido subsidiário formulado na reclamação de Margaretha Bouanich e restituiu-lhe o imposto sobre os dividendos no montante de 166 999 SEK.

20.   Margaretha Bouanich interpôs recurso da decisão da administração fiscal para o Länsrätt i Dalarnas län (14) pedindo-lhe que declarasse que o imposto sobre os dividendos não deveria incidir sobre o pagamento em causa e também que lhe fosse restituída a parte restante do imposto retido na fonte.

21.   Por acórdão de 29 de Março de 2001, o Länsrätt negou provimento ao recurso. Margaretha Bouanich interpôs recurso do acórdão para o órgão jurisdicional de reenvio, o Länsrätt para o Kammarrätt i Sundsvall (15).

IV – Pedido de decisão prejudicial e tramitação processual no Tribunal de Justiça

22.   O Kammarrätten i Sundsvall solicitou ao Tribunal de Justiça que se pronuncie, a título prejudicial, sobre as três questões seguintes.

1)      Os artigos 56.° CE e 58.° CE permitem que um Estado-Membro tribute como dividendos os montantes relativos ao resgate de acções, pagos por uma sociedade anónima com sede nesse Estado-Membro, sem direito a dedução dos custos de aquisição das acções resgatadas, se o pagamento for feito a um accionista que não tem domicílio nem residência habitual nesse Estado-Membro, sabendo-se que os pagamentos correspondentes a um resgate efectuado por essa mesma sociedade a um accionista com domicílio ou residência habitual no mesmo Estado são tributados como rendimento de capital, com direito a dedução dos custos de aquisição das acções resgatadas?

2)      Em caso de resposta negativa à primeira questão, quando uma convenção em matéria de dupla tributação entre o Estado-Membro onde a sociedade anónima tem a sua sede e o Estado-Membro onde o accionista tem domicílio estabelece, em caso de resgate de acções, em relação aos montantes recebidos pelo respectivo accionista, uma taxa de imposto inferior à que é paga no primeiro Estado-Membro e, além disso, por referência às notas explicativas ao modelo da OCDE de convenção em matéria fiscal, um accionista no outro Estado-Membro pode deduzir o montante correspondente ao valor nominal das acções objecto de resgate, os artigos referidos na questão anterior permitem que, nestas circunstâncias, um Estado-Membro aplique uma legislação como a acima descrita?

3)      Os artigos 43.° CE e 48.° CE permitem que um Estado-Membro aplique uma legislação como a acima descrita?»

23.   Apresentaram observações escritas no processo no Tribunal de Justiça Margaretha Bouanich, o Governo sueco e a Comissão.

V –    Quanto à compatibilidade de uma legislação como a sueca com as disposições sobre livre circulação de capitais (primeira questão prejudicial)

24.   Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, em substância, se as disposições sobre a livre circulação de capitais (artigos 56.° CE e 58.° CE) se opõem a uma legislação nacional como a sueca, segundo a qual um Estado-Membro, em caso de resgate de acções próprias por uma sociedade com sede neste Estado-Membro, os accionistas com domicílio ou residência habitual podem deduzir os seus custos de aquisição dos rendimentos a tributar, provenientes da cessão de acções, ao passo que aos accionistas sem domicílio ou residência habitual nesse Estado-Membro isso não é permitido. Os efeitos de uma convenção em matéria de dupla tributação eventualmente existente não são objecto desta questão mas sim da segunda questão.

25.   Segundo jurisprudência assente, embora a fiscalidade directa seja da competência dos Estados-Membros, estes últimos devem, todavia, exercer essa competência no respeito do direito comunitário (16), isto é igualmente em conformidade com as disposições sobre a livre circulação de capitais (artigos 56.° CE e seguintes).

A –    Conceito de circulação de capitais

26.   O Tratado CE não define o conceito de circulação de capitais. Em geral, pode entender-se por circulação de capitais uma transferência em dinheiro ou em espécie para além das fronteiras de um Estado-Membro, que não esteja relacionada com um fornecimento de bens ou uma prestação de serviços e, portanto, entre no âmbito da livre circulação de pagamentos (17). Além disso, a «Nomenclatura dos movimentos de capitais» constante do anexo I da Directiva 88/361 (18), ainda que não contenha uma lista exaustiva das transacções possíveis, tem indubitavelmente um valor indicativo para a definição do conceito de circulação de capitais (19).

27.   Consequentemente, a livre circulação de capitais abrange não só a aquisição sem restrições de participações em sociedades nacionais por investidores estrangeiros (20), mas igualmente a sua liquidação ou cessão, o repatriamento do produto dessa liquidação ou a utilização desse produto, no local, dentro dos limites das obrigações comunitárias (21).

28.   Assim, quando um accionista cede as acções de que é titular – por exemplo, devido a uma redução do capital – à sociedade anónima emissora, esta operação está igualmente abrangida pela livre circulação de capitais, tal como a aquisição originária dessas acções pelo referido accionista.

B –    Restrições à circulação de capitais

29.   O artigo 56.°, n.° 1, CE estabelece o princípio da proibição de todas as restrições à circulação de capitais entre Estados-Membros.

Conceito de restrição

30.   Qualquer medida que dificulte ou torne menos atractiva a transferência transfronteiriça de capitais e possa, portanto, dissuadir o investidor de efectuar essa transferência, constitui uma restrição ao movimento de capitais (22). O conceito de restrição à circulação de capitais corresponde, nessa medida, ao conceito de restrição que o Tribunal de Justiça desenvolveu no âmbito das outras liberdades fundamentais (23).

31.   Tal como as outras liberdades fundamentais, a livre circulação de capitais contém, além do mais, uma proibição de discriminação, ou seja, uma proibição de tratamento desigual dos operadores nos mercados financeiros em razão da sua nacionalidade, domicílio ou do local do investimento sem justificação objectiva. É certo que tal proibição de discriminação não consta actualmente da redacção do artigo 56.°, n.° 1, CE – ao contrário do que acontecia anteriormente com o artigo 67.°, n.° 1, do Tratado CE – e resulta, quando muito, indirectamente do artigo 58.°, n.° 3, CE. Desta circunstância não se pode, todavia, inferir que a referida liberdade fundamental tenha actualmente, após a liberalização total da circulação de capitais, menor alcance do que anteriormente. Pelo contrário, a proibição de discriminação constitui o núcleo de cada uma das liberdades fundamentais e, por conseguinte, considera-se subentendida no artigo 56.°, n.° 1, CE (24).

Qualificação jurídica de uma legislação como a sueca

32.   Uma legislação como a sueca aplica aos sujeitos passivos que tenham adquirido acções de uma sociedade com sede na Suécia disposições diferentes consoante tenham domicílio na Suécia ou não. Com efeito, em caso de resgate de acções próprias pela sociedade anónima emissora é permitido aos accionistas domiciliados na Suécia deduzirem os seus custos de aquisição, ou seja, o preço da acção (25) no momento da sua aquisição, acrescido, eventualmente, de gastos, do pagamento tributável recebido pela cessão, ao passo que isso não é permitido aos accionistas não domiciliados. Isso constitui tratamento desigual dos operadores nos mercados financeiros em razão do seu domicílio (26).

33.   Ao mesmo tempo, uma legislação como a sueca implica igualmente uma restrição à circulação de capitais. É certo que esta legislação não tem directamente por objecto a aquisição ou a cessão de participações sociais, mas apenas o tratamento fiscal dos rendimentos provenientes do investimento ou então dos rendimentos decorrentes da liquidação. Uma vez que o objectivo de um investimento de capital consiste geralmente em obter rendimentos líquidos, o tratamento fiscal dos lucros ou dos rendimentos influencia igualmente o interesse que suscita o próprio investimento de capital (27). Se os investidores não domiciliados na Suécia que adquiriram acções de uma sociedade com sede na Suécia, em caso de resgate das acções pela sociedade emissora, não puderem deduzir os seus custos de aquisição dos seus rendimentos tributáveis na Suécia, isso diminuirá normalmente o rendimento líquido que recebem e, portanto, torna-se menos atractivo para eles um investimento transfronteiriço na Suécia.

34.   Esta legislação, além disso, também tem efeitos restritivos para as sociedades anónimas com sede na Suécia, porque as impede de recolherem capitais de fora da Suécia, uma vez que para pessoas sem domicílio na Suécia a aquisição de acções de uma sociedade com sede na Suécia é, pelos motivos expostos, fiscalmente desfavorável.

C –    Justificação

35.   A livre circulação de capitais, enquanto princípio fundamental do Tratado, só pode ser limitada por uma legislação nacional se esta for justificada pelas razões referidas no artigo 58.°, n.° 1, CE, ou por razões imperiosas de interesse geral e que se apliquem a qualquer pessoa ou empresa que exerça uma actividade no território do Estado-Membro de acolhimento. Além disso, para ser desse modo justificada, a legislação nacional deve ser adequada a garantir a realização do objectivo que prossegue e não ultrapassar o necessário para o alcançar, a fim de respeitar o critério da proporcionalidade (28).

36.   No presente processo não há elementos de que uma legislação como a sueca possa ser justificada por razões imperiosas de interesse geral. Porém, há que ter em consideração uma justificação com base no artigo 58.°, n.° 1, alínea a), CE (29), que permite que os Estados-Membros apliquem as disposições pertinentes do seu direito fiscal que estabeleçam uma distinção entre contribuintes que não se encontrem em idêntica situação no que se refere ao seu local de residência ou ao local onde o seu capital é investido (30).

37.   O artigo 58.°, n.° 1, alínea a), CE, enquanto excepção ao princípio fundamental da livre circulação de capitais, deve ser objecto de interpretação estrita, e não pode ser interpretado no sentido de que qualquer legislação fiscal que faça uma distinção entre os contribuintes em função do lugar onde investem os seus capitais é automaticamente compatível com o Tratado. Efectivamente, a própria excepção prevista no artigo 58.°, n.° 1, alínea a), CE está, por sua vez, limitada pelo artigo 58.°, n.° 3, CE, que prevê que as disposições nacionais visadas no n.° 1 desse artigo «não devem constituir um meio de discriminação arbitrária, nem uma restrição dissimulada à livre circulação de capitais e pagamentos, tal como definida no artigo 56.°» (31).

38.   Há, portanto, que distinguir entre o tratamento desigual permitido ao abrigo do artigo 58.°, n.° 1, alínea a), CE e as discriminações arbitrárias proibidas pelo n.° 3 desse mesmo artigo. Resulta da jurisprudência que, para que uma desigualdade de tratamento possa ser considerada compatível com as disposições do Tratado relativas à livre circulação de capitais essa desigualdade deve dizer respeito a situações não comparáveis objectivamente ou deve justificar-se por razões imperiosas de interesse geral (32). Além disso, para poder ser justificada, a diferença de tratamento entre diferentes categorias de sujeitos passivos não deve ir além do que é necessário para alcançar o objectivo prosseguido pela legislação em causa (33).

39.   Segundo as informações disponíveis, pode partir-se do princípio de que os accionistas com domicílio na Suécia e os accionistas aí não domiciliados se encontram em situação comparável. Independentemente do domicílio dos accionistas, em caso de resgate das suas acções pela sociedade emissora, os custos de aquisição suportados estão directamente relacionados com os lucros obtidos posteriormente através da cessão. A utilização de capital constitui precisamente a condição para a obtenção dos rendimentos da cessão, em caso de resgate das acções. Nessa medida, o caso vertente é semelhante ao do processo Gerritse, no qual o Tribunal de Justiça partiu do princípio de que as situações dos residentes e dos não residentes no território eram comparáveis, na medida em que estavam em causa despesas profissionais directamente relacionadas com a obtenção dos seus rendimentos (34). Se, no processo Gerritse não havia razão objectiva para recusar aos não residentes a dedução das suas despesas profissionais, também no caso vertente não se vislumbra qualquer razão objectiva para recusar aos accionistas não domiciliados na Suécia a dedução dos seus custos de aquisição (35).

40.   Uma legislação como a sueca não conduz, portanto, a um tratamento desigual permitido na acepção do artigo 58.°, n.° 1, alínea a), CE, mas sim a uma discriminação arbitrária proibida pelo artigo 58.°, n.° 3, CE.

41.   À luz do exposto, concluo que as disposições sobre a livre circulação de capitais (artigos 56.° CE e 58.° CE) opõem-se a uma legislação nacional segundo a qual um Estado-Membro, em caso de resgate de acções próprias por uma sociedade anónima com sede nesse Estado-Membro, permite aos accionistas com domicílio ou residência habitual nesse Estado-Membro a dedução dos seus custos de aquisição dos seus rendimentos tributáveis provenientes da cessão, ao passo que não o permite aos accionistas que não tenham domicílio ou residência habitual nesse Estado-Membro.

VI – Quanto aos efeitos de uma convenção em matéria de dupla tributação (segunda questão prejudicial)

42.   Com a segunda questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, em substância, se a resposta à primeira questão se altera de algum modo se for tomada em consideração uma convenção em matéria de dupla tributação que preveja um limite máximo da carga fiscal aplicável ao accionista que não tem domicílio ou residência habitual no Estado-Membro em causa e, se for interpretado à luz das notas explicativas ao modelo de convenção da OCDE relevante, possibilita a dedução do valor nominal das acções dos rendimentos tributáveis provenientes da cessão.

43.   Para responder a esta questão há que proceder por fases. Em primeiro lugar, há que apreciar a questão preliminar de saber se as convenções sobre dupla tributação podem mesmo ser invocadas para apreciar a compatibilidade de uma legislação nacional com as liberdades fundamentais (a este respeito, ver secção A, infra). Em seguida, há que apurar se a restrição à livre circulação de capitais pode ser totalmente eliminada pela convenção em matéria de dupla tributação concretamente aplicável (a este respeito, ver secção B, infra).

A –    Quanto à pertinência de uma convenção em matéria de dupla tributação em geral

44.   A Comissão parece defender a falta de pertinência, em geral, de uma convenção em matéria de dupla tributação como a convenção franco-sueca quando se trata de apreciar a compatibilidade de uma legislação fiscal nacional com as liberdades fundamentais (36). A Comissão baseia-se nos acórdãos «avoir fiscal» (37) e Saint-Gobain (38). Margaretha Bouanich argumenta em termos semelhantes e invoca o acórdão Eurowings Luftverkehr (39).

45.   Não partilho desta opinião.

46.   A eliminação da dupla tributação na Comunidade é um dos objectivos do Tratado; isso é em boa medida demonstrado pela redacção do artigo 293.°, segundo travessão, CE. Na falta de medidas de unificação ou de harmonização comunitária, os Estados-Membros continuam a ser competentes para determinar os critérios de tributação dos rendimentos e do património, com vista a eliminar, eventualmente por via convencional, a dupla tributação. Neste contexto, os Estados-Membros são livres de fixar, no âmbito das convenções bilaterais celebradas para evitar a dupla tributação, os factores de ligação para efeitos da repartição da competência fiscal (40).

47.   Quanto ao exercício da soberania fiscal assim repartida, os Estados-Membros não podem, no entanto, deixar de respeitar regras comunitárias (41). Isso tem, em especial, duas consequências. Em primeiro lugar, um Estado-Membro não pode fazer depender o cumprimento das suas obrigações decorrentes do direito comunitário, e sobretudo, o respeito das liberdades fundamentais, directamente aplicáveis, de uma condição de reciprocidade ou de uma convenção celebrada com outro Estado (reserva de reciprocidade) (42). Em segundo lugar, um tratamento fiscal desfavorável contrário a uma liberdade fundamental não pode ser justificado pela eventual existência de outras vantagens que não tenham nada a ver com o caso concreto (remissão para outras vantagens) (43).

48.   No caso vertente, não são objecto de debate nem a reserva de reciprocidade nem a remissão para outras vantagens.

49.   Por um lado, não há elementos para sustentar a existência de uma reserva de reciprocidade, seja de que forma for. Com efeito ao contrário do processo «avoir fiscal», aqui não se tenta explicar nem sequer justificar um tratamento desfavorável de um cidadão comunitário por não existir uma convenção em matéria de dupla tributação entre os Estados-Membros em questão (44). Pelo contrário, a questão que se coloca é em sentido oposto, ou seja, trata-se de saber se em observância de uma convenção em matéria de dupla tributação já existente e, assim, tendo em conta todas as disposições legais aplicáveis na Suécia naquele caso concreto, se pode falar em tratamento desfavorável.

50.   Por outro lado, também não se tenta fundamentar aqui uma compensação, seja de que forma for, do tratamento desfavorável dos accionistas sem domicílio na Suécia nos termos da lei relativa ao imposto sobre os dividendos com outras eventuais vantagens. Com efeito, diversamente do processo «avoir fiscal» e de outros processos semelhantes (45) não se trata aqui da tomada em consideração de pretensas vantagens remotas que nada têm a ver com o caso concreto, mas sim de considerar os efeitos no caso concreto das disposições legais efectivamente aplicáveis na Suécia. Entre essas disposições encontra-se igualmente, segundo a exposição do órgão jurisdicional de reenvio, a convenção franco-sueca sobre dupla tributação. Com efeito, ao responder ao pedido de decisão prejudicial, o Tribunal de Justiça deve basear-se no quadro jurídico que serve de ponto de partida ao órgão jurisdicional de reenvio no seu despacho de reenvio (46).

51.   Por conseguinte, há que ter em consideração as disposições de uma convenção em matéria de dupla tributação aplicável ao caso concreto, como a convenção franco-sueca, quando se trata de apreciar a compatibilidade de uma regulamentação fiscal nacional com as liberdades fundamentais.

B –    Quanto aos efeitos da convenção em matéria de dupla tributação

52.   Falta examinar se uma convenção em matéria de dupla tributação como a convenção franco-sueca garante efectivamente que está excluída qualquer desvantagem para os accionistas não domiciliados na Suécia.

Comparação do tratamento fiscal reservado aos accionistas com domicílio na Suécia com o dos accionistas aí não domiciliados

53.   Segundo as indicações do órgão jurisdicional de reenvio, em relação ao tratamento fiscal de um accionista como Margaretha Bouanich, que não tem domicílio na Suécia, atendendo à convenção em matéria de dupla tributação, inferem-se as considerações que a seguir se expõem (47).

54.   Os rendimentos da cessão obtidos por um accionista não domiciliado na Suécia pagos por uma sociedade anónima emissora com sede na Suécia na sequência do resgate das suas acções são considerados na Suécia como dividendos. Os artigos 13.°, n.° 6, e 10.°, n.° 5, da convenção em matéria de dupla tributação, interpretados à luz das notas explicativas aos artigos 10.° e 13.° do modelo de convenção da OCDE, abrem essa possibilidade.

55.   Quando os accionistas com domicílio em França recebem pagamentos de sociedades com sede na Suécia esses pagamentos são, em princípio, tributados em França (artigo 10.°, n.° 1, da convenção em matéria de dupla tributação ). É certo que eles podem ser tributados igualmente na Suécia, dentro de certos limites (artigo 10.°, n.° 2, da convenção em matéria de dupla tributação).

56.   Segundo a lei relativa ao imposto sobre os dividendos, um accionista como Margaretha Bouanich deveria ser tributado na Suécia pelo valor total das suas acções que foram objecto de resgate pela sociedade anónima que as emitiu, à taxa de 30%. Por conseguinte, sobre um rendimento da cessão, no montante de 100, deveria ser retido na fonte imposto no valor de 30.

57.   A convenção em matéria de dupla tributação melhora a situação da accionista em dois aspectos.

58.   Em primeiro lugar, o valor nominal das acções é dedutível do montante a tributar (isto resulta da convenção em matéria de dupla tributação, interpretada à luz das notas explicativas ao artigo 13.° do modelo da OCDE). Quando o rendimento da cessão for de 100 e o valor nominal das acções de 50, só é tributável na Suécia o montante de 50, o que, à taxa do imposto de 30%, dá lugar a um imposto sobre os dividendos de 15. Pelo contrário, quando o valor nominal das acções for 10, o mesmo rendimento da cessão de 100 é tributado na Suécia sobre um montante de 90, o que, à taxa do imposto de 30%, dá lugar a um imposto sobre os dividendos no valor de 27.

59.   Em segundo lugar, nos termos do artigo 10.°, n.° 2, da convenção em matéria de dupla tributação, aplica-se à carga fiscal um limite máximo de 15% do montante bruto, ou seja, no caso vertente, 15% dos rendimentos da cessão. No caso de um rendimento recebido no valor de 100, o imposto sobre os dividendos efectivamente devido reduz-se a um máximo de 15, mesmo quando o imposto efectivamente calculado (48) seja superior.

60.   Pelo contrário, a situação de um accionista com domicílio na Suécia, segundo as indicações do órgão jurisdicional de reenvio, apresenta-se do seguinte modo: aplica-se-lhe igualmente uma taxa do imposto de 30%, mas ele pode deduzir dos rendimentos da cessão os seus custos de aquisição, ou seja, o preço da acção (49) no momento da sua aquisição, eventualmente acrescido de despesas. Assim, quando os rendimentos da cessão forem de 100 e os custos de aquisição de 60, só é tributado o montante de 40, o que, à taxa do imposto de 30%, dá lugar a imposto no valor de 12. Mas quando os custos de aquisição forem de 30, os mesmos rendimentos da cessão de 100 são tributados na Suécia sobre o montante de 70, o que, à taxa do imposto de 30%, dá lugar a um imposto sobre os dividendos no valor de 21.

61.   Assim, conclui-se provisoriamente que, apesar de ser aplicada, como ponto de partida, aos accionistas domiciliados na Suécia e aos accionistas aí não domiciliados a mesma taxa do imposto de 30%, a carga fiscal efectiva dos accionistas com domicílio na Suécia depende dos seus custos de aquisição, ao passo que a dos accionistas não domiciliados na Suécia varia consoante o valor nominal das acções resgatadas e, além disso, para estes há um limite máximo de 15% dos rendimentos da cessão.

Apreciação

62.   Na apreciação destes factos não pode deixar de se ter em conta que, regra geral, existe uma diferença substancial entre o valor nominal de uma acção e os custos de aquisição suportados pelo accionista com a aquisição dessas acções. Não é raro os custos de aquisição serem significativamente mais elevados do que o valor nominal dessas acções. Mesmo quando a convenção em matéria de dupla tributação permite aos accionistas não domiciliados na Suécia a dedução do valor nominal das acções, isso não conduz, por regra, à equiparação total aos accionistas domiciliados na Suécia, mas estes podem deduzir os seus custos de aquisição – frequentemente mais elevados – dos rendimentos tributáveis provenientes da cessão, de modo que, finalmente, estes terão um montante menos elevado a tributar.

63.   Neste contexto, a possibilidade, decorrente da convenção em matéria de dupla tributação, de os accionistas não domiciliados na Suécia deduzirem o valor nominal das acções não pode ser considerada equivalente à possibilidade de dedução dos custos de aquisição conferida aos accionistas domiciliados na Suécia.

64.   Resulta, no entanto, da proibição das restrições à circulação de capitais (artigo 56.°, n.° 1, CE) e, em especial, da proibição de discriminação arbitrária dos investidores em razão da residência (artigo 58.°, n.° 3, CE), que num caso como o presente, os accionistas não domiciliados na Suécia, em caso de resgate das suas acções pela sociedade emissora com sede na Suécia, não podem receber um tratamento fiscal menos favorável do que os accionistas domiciliados na Suécia (50).

65.   Compete ao órgão jurisdicional de reenvio apreciar se, no caso presente, a dedução do valor nominal das acções e o limite máximo de 15% (51) para accionistas não domiciliados na Suécia dá lugar a um resultado equivalente à dedução dos custos de aquisição no que respeita aos accionistas domiciliados na Suécia (52). Se não for esse o caso, o órgão jurisdicional nacional deve garantir a eficácia plena do direito comunitário – no caso vertente, a livre circulação de capitais e a protecção dos direitos conferidos a cada sujeito pelo direito comunitário; para esse fim, deve, se necessário, deixar de aplicar, em virtude dos seus próprios poderes de decisão, qualquer disposição do direito nacional que se lhe oponha, assim como as disposições de uma convenção em matéria de dupla tributação, na medida em que tais disposições impeçam um tratamento igual entre os accionistas com domicílio na Suécia e os accionistas aí não domiciliados (53).

66.   Refira-se, de passagem, que a limitação da carga fiscal na Suécia ao máximo de 15% dos rendimentos da cessão, prevista na convenção em matéria de dupla tributação (artigo 10.°, n.° 2, da convenção) não conduz de modo nenhum necessariamente a uma melhoria da situação dos accionistas não domiciliados na Suécia.

67.   Com efeito, por um lado, por força dessa disposição, um accionista não domiciliado na Suécia é tratado mais favoravelmente do que um accionista com domicílio na Suécia, quando muito, se os seus custos de aquisição – em termos nominais – forem inferiores a metade dos rendimentos obtidos com a cessão; em contrapartida, é prejudicado quando os custos de aquisição forem superiores a metade dos rendimentos obtidos (54).

68.   Por outro lado, há que ter em conta que os dividendos ou os rendimentos da cessão, recebidos pelos accionistas não domiciliados na Suécia estão ainda sujeitos, em geral, à tributação nos países do domicílio; isso é permitido igualmente no caso vertente pela convenção franco-sueca em matéria de dupla tributação (v. artigo 10.°, n.° 1). Através do limite máximo de 15% previsto na convenção em matéria de dupla tributação (v. artigo 10.°, n.° 2), os Estados-Membros contratantes participantes limitam reciprocamente apenas as respectivas soberanias fiscais e influenciam, deste modo, a repartição recíproca das receitas fiscais (55).

69.   À luz do exposto, há que concluir o seguinte:

Quando, em caso de resgate de acções próprias por uma sociedade anónima com sede num Estado-Membro, é aplicável ao tratamento fiscal de accionistas sem domicílio nem residência habitual nesse Estado-Membro uma convenção em matéria de dupla tributação celebrada entre esse Estado-Membro e outro Estado-Membro, compete ao órgão jurisdicional nacional garantir em cada caso concreto que os accionistas em questão não sejam, em última instância, tratados desfavoravelmente em relação aos accionistas com domicílio ou residência habitual no primeiro Estado-Membro. Para esse fim, o órgão jurisdicional nacional deve, se necessário, deixar de aplicar, em virtude dos seus próprios poderes de decisão, qualquer disposição de direito nacional que se lhe oponha, assim como quaisquer disposições da convenção em matéria de dupla tributação, na medida em que tais disposições impeçam um tratamento igual entre os accionistas com domicílio ou residência habitual no primeiro Estado-Membro e os accionistas que aí não tenham domicílio ou residência habitual.

VII – Quanto à relação entre liberdade de estabelecimento e a livre circulação de capitais (terceira questão prejudicial)

70.   Com a sua terceira questão prejudicial o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se uma legislação como a sueca é compatível com a liberdade de estabelecimento (artigos 43.° CE e 48.° CE).

71.   Pode haver interferências entre o âmbito de aplicação da liberdade de estabelecimento e o âmbito de aplicação da livre circulação de capitais na medida em que o investimento de capitais pode ser funcional em relação ao estabelecimento noutro Estado-Membro, por exemplo, através de filiais ou sucursais (56). A existência do artigo 58.°, n.° 2, CE, bem como a fórmula contida no artigo 43.°, segundo parágrafo, CE, «sem prejuízo do disposto no capítulo relativo aos capitais» indicam que nesses casos nenhuma das liberdades fundamentais é suprimida, mas que ambas podem aplicar-se simultaneamente (57). Nessa medida, o artigo 58.°, n.° 2, CE garante que as duas liberdades fundamentais estão sujeitas aos mesmos limites (58).

72.   É certo que nem todas as participações transfronteiriças numa empresa estão abrangidas pelo âmbito de aplicação da liberdade de estabelecimento. Pelo contrário, uma participação societária só está abrangida nesta liberdade fundamental quando é conferida ao accionista em questão «uma influência certa sobre as decisões dessa sociedade [que] lhe permite que determine as respectivas actividades» (59). Com efeito, a liberdade de estabelecimento abrange, nos termos do artigo 43.°, segundo parágrafo, CE, «tanto o acesso às actividades não assalariadas e o seu exercício, como a constituição e a gestão de empresas e designadamente de sociedades [noutro Estado-Membro]». Por outras palavras, o sócio – individualmente ou com outros sócios – deve exercer o controlo da empresa. Pelo contrário, quando estejam ligados à sua participação apenas os direitos de protecção dos sócios minoritários, só são aplicáveis as disposições relativas à livre circulação de capitais e não as relativas à liberdade de estabelecimento (60).

73.   No caso presente, as informações do órgão jurisdicional nacional não fornecem elementos que sustentam que Margaretha Bouanich tivesse, através do seu lote de acções, uma influência determinante na Förvaltnings AB Ratos. Nestas circunstâncias, há que considerar que a liberdade de estabelecimento (artigo 43.° CE) não se aplica. Portanto, não é necessário responder à terceira questão prejudicial.

VIII – Conclusão

74.   À luz das considerações precedentes, proponho que o Tribunal de Justiça responda às questões prejudiciais do Kammarrätten Sundsvall do seguinte modo:

«1)      As disposições relativas à livre circulação de capitais (artigos 56.° CE e 58.° CE) opõem-se a uma legislação nacional nos termos da qual um Estado-Membro, em caso de resgate de acções próprias por uma sociedade anónima com sede nesse Estado-Membro, permite aos accionistas com domicílio ou residência habitual nesse Estado-Membro deduzir os seus custos de aquisição dos rendimentos tributáveis provenientes da cessão de acções, ao passo que isso não é permitido aos accionistas que não têm domicílio ou residência habitual nesse Estado-Membro.

2)      Quando, em caso de resgate de acções próprias por uma sociedade anónima com sede num Estado-Membro, é aplicável, para efeitos do tratamento fiscal de accionistas que não têm domicílio nesse Estado-Membro, uma convenção em matéria de dupla tributação celebrada entre esse Estado-Membro e outro Estado-Membro, compete ao órgão jurisdicional nacional garantir em cada caso concreto que os accionistas em questão não sejam, em última instância, tratados desfavoravelmente em relação aos accionistas com domicílio ou residência habitual no primeiro Estado-Membro. Para esse fim, o órgão jurisdicional nacional deve, se necessário, deixar de aplicar, em virtude dos seus próprios poderes de decisão, qualquer disposição de direito nacional que se lhe oponha, assim como quaisquer disposições da convenção em matéria de dupla tributação, na medida em que tais disposições impeçam um tratamento igual entre os accionistas com domicílio ou residência habitual no primeiro Estado-Membro e os accionistas que aí não tenham domicílio ou residência habitual.»


1 – Língua original: alemão.


2 – Entende-se habitualmente por «custos de aquisição» o preço de uma acção (ou seja, o seu valor comercial ou o seu preço de emissão) no momento da sua aquisição, acrescido das eventuais despesas.


3 – Do ponto de vista do direito comunitário, é indiferente para a apreciação do caso que a legislação nacional siga o critério do domicílio ou o critério da residência habitual da pessoa. Por conseguinte, e para simplificar, passamos a referir somente o domicílio, considerando-se que as referências que lhe são feitas valem igualmente para o critério da residência habitual.


4 – Lag 1970:624 om kuponskatt (a seguir «lei relativa ao imposto sobre os dividendos»).


5 – Isto pressupõe que os dividendos pagos não correspondem a rendimentos provenientes de uma actividade empresarial desenvolvida num estabelecimento estável na Suécia.


6 – Convenção entre o Governo da República Francesa e o Governo do Reino da Suécia para evitar a dupla tributação e prevenir a evasão fiscal em matéria de impostos sobre o rendimento e a fortuna (título em francês: Convention entre le Gouvernement de la République française et le Gouvernement du Royaume de Suède en vue d’éviter les doubles impositions et de prévenir l’évasion fiscale en matière d’impôts sur le revenu et sur la fortune), assinada em Estocolmo em 27 de Novembro de 1990, publicada em francês no JORF de 8 de Abril de 1992 (com rectificações no JORF de 22 de Agosto de 1992) e disponível na mesma língua em http://www.finances.gouv.fr/minefi/europe/index.htm (consultado pela última vez em 26 de Maio de 2005).


7 – Modelo de convenção da OCDE para evitar a dupla tributação no domínio dos impostos sobre o rendimento e a fortuna (título em inglês: OECD Income and Capital Model Convention). Na data da celebração da convenção em matéria de dupla tributação entre a França e a Suécia era aplicável o modelo de convenção de 11 de Abril de 1977 (ISBN-Nr. 92-64-11693-1), cujo conteúdo corresponde, no entanto, – na parte para aqui pertinente – ao novo modelo de convenção da OCDE de 28 de Janeiro de 2003 (título em inglês: OECD Model Convention with respect to taxes on income and on capital, disponível no sítio Internet da OCDE, consultado pela última vez em 30 de Maio de 2005, em: http://www.oecd.org/document/37/0,2340,en_2649_33747_1913957_1_1_1_1,00.html).


8 –     Model Tax Convention on Income and on Capital, Colectânea de folhas soltas da OCDE, disponível em http://www.oecdbookshop.org/oecd/display.asp?lang=EN&sf1=identifiers&st1=232002081p1 (consultado pela última vez em 30 de Maio de 2005), na versão de Janeiro de 2003.


9 – N.° 27 das notas explicativas ao modelo de convenção da OCDE de 1977. Para o que aqui interessa, o conteúdo destas notas explicativas é idêntico ao do n.° 28 das notas explicativas ao modelo de convenção da OCDE na versão de Janeiro de 2003, referida pelo órgão jurisdicional de reenvio no seu despacho de reenvio.


10 – O artigo 10.° da convenção em matéria de dupla tributação orienta-se por este artigo.


11 – N.° 31 das notas explicativas ao modelo de convenção da OCDE de 1977, cujo conteúdo é idêntico ao n.° 31 das notas explicativas ao modelo de convenção da OCDE na versão de Janeiro de 2003.


12 – O artigo 13.° da convenção em matéria de dupla tributação orienta-se por este artigo.


13 – Anterior Skattemyndigheten e actual Skatteverket.


14 – Tribunal administrativo da província de Dalarna.


15 – Órgão jurisdicional administrativo de recurso.


16 – Acórdãos de 14 de Fevereiro de 1995, Schumacker (C-279/93, Colect., p. I-225, n.° 21); de 11 de Agosto de 1995, Wielockx (C-80/94, Colect., p. I-2493, n.° 16); de 29 de Abril de 1999, Royal Bank of Scotland (C-311/97, Colect., p. I-2651, n.° 19); de 6 de Junho de 2000, Verkooijen (C-35/98, Colect., p. I-4071, n.° 32); de 15 de Julho de 2004, Weidert e Paulus (C-242/03, ainda não publicado na Colectânea, n.° 12); de 7 de Setembro de 2004, Manninen (C-319/02, Colect., p. I-7498, n.° 19); e de 10 de Março de 2005, Laboratoires Fournier (C-39/04, ainda não publicado na Colectânea, n.° 14).


17 – Pelo contrário, a livre circulação de pagamentos (artigo 56.°, n.° 2, CE, anterior artigo 73.°-B, n.° 2, do Tratado CE) visa permitir ao devedor de uma quantia em dinheiro, no âmbito de um fornecimento de bens ou de uma prestação de serviços ou igualmente no contexto de um investimento de capitais, cumprir voluntariamente essa obrigação contratual sem restrições indevidas e ao credor receber livremente esse pagamento (acórdãos de 22 de Junho de 1999, ED, C-412/97, Colect., p. I-3845, e de 31 de Janeiro de 1984, Luisi e Carbone, 286/82 e 26/83, Recueil, p. 377, n.os 21 e 22).


18 – Directiva 88/361/CEE do Conselho, de 24 de Junho de 1988 para a execução do artigo 67.° do Tratado (JO L 178, p. 5).


19 – V. acórdão de 16 de Março de 1999, Trummer e Mayer (C-222/97, Colect., p. I-1661, n.° 21); os acórdãos ditos «golden-shares», de 4 de Junho de 2002, Comissão/Portugal (C-367/98, Colect., p. I-4731, n.° 37), Comissão/França (C-483/99, Colect., p. I-4781, n.° 36), e Comissão/Bélgica (C-503/99, Colect., p. I-4809, n.° 37), bem como os acórdãos de 2 de Junho de 2005, Comissão/Itália (C-174/04, ainda não publicado na Colectânea, n.° 27), e de 5 de Julho de 2005, D. (C-376/03, ainda não publicado na Colectânea, n.° 24).


20 – A este respeito, podem servir como ponto de referência os títulos I e III da Nomenclatura dos movimentos de capitais (já referida no n.° 26 destas conclusões).


21 – Neste sentido, quarto travessão da introdução das Notas explicativas da Nomenclatura dos movimentos de capitais (já referida no n.° 26 destas conclusões), bem como acórdão Trummer e Mayer (já referido na nota 19, n.° 22).


22 – Neste sentido, acórdão Trummer e Mayer (já referido na nota 19, n.° 26); v., igualmente, as minhas conclusões de 18 de Março de 2004 no processo Manninen (C-319/02, Colect., p. I-7498, n.° 28).


23 – V. acórdãos fundamentais de 11 de Julho de 1974, Dassonville (8/74, Recueil, p. 837, n.° 5); de 25 de Julho de 1991, Säger (C-76/90, Colect., p. I-4221, n.° 12); e de 30 de Novembro de 1995, Gebhard (C-55/94, Colect., p. I-4165, n.° 37); e ainda as minhas conclusões no processo Manninen (já referidas na nota 22, n.° 28).


24 – Neste sentido, v., igualmente, acórdãos ditos «golden-shares», já referidos na nota 19, Comissão/Portugal (n.° 44) e Comissão/França (n.° 40), em que o Tribunal de Justiça declara que o artigo 56.°, n.° 1, CE (anterior artigo 73.°-B do Tratado CE) proíbe de forma geral as restrições aos movimentos de capitais entre os Estados-Membros, e que essa proibição vai além da eliminação de um tratamento desigual dos operadores nos mercados financeiros em razão da nacionalidade. Daí resulta que a livre circulação de capitais implica igualmente uma proibição desse tratamento desigual.


25 – Valor comercial ou preço de emissão.


26 – Uma vez que a maioria dos accionistas que têm domicílio ou residência habitual na Suécia têm igualmente nacionalidade sueca, e que, pelo contrário, os accionistas que não têm domicílio ou residência habitual na Suécia não têm essa nacionalidade, a legislação sueca dá lugar, além disso, indirectamente a um tratamento desigual dos operadores nos mercados financeiros em razão da sua nacionalidade.


27 – Nesse sentido, v., igualmente, as minhas conclusões no processo Manninen (já referidas na nota 22, n.° 29).


28 – V. acórdãos ditos «golden-shares», Comissão/Portugal (n.° 49), Comissão/França (n.° 45) e Comissão/Bélgica (n.° 45), bem como o recente acórdão Comissão/Itália (n.° 35), já referidos na nota 19; no mesmo sentido, acórdão de 14 de Março de 2000, Église de scientologie (C-54/99, Colect., p. I-1335, n.° 18).


29 – Segundo a declaração n.° 7 anexa ao Tratado de Maastricht, esta disposição só é aplicável a legislações fiscais nacionais em vigor no final de 1993. A este respeito, para a Suécia seria determinante a data da adesão, ou seja, 1 de Janeiro de 1995. Na falta de informações contrárias quanto ao quadro jurídico nacional, pressupõe-se que nessa data já estava em vigor a versão aplicável no processo principal da lei relativa ao imposto sobre os dividendos.


30 – No mesmo sentido, v. jurisprudência assente relativa às outras liberdades fundamentais, acórdãos Schumacker (n.os 31 a 34) e Royal Bank of Scotland (n.° 27), já referidos na nota 16.


31 – Acórdão Manninen (já referido na nota 16, n.° 28); no mesmo sentido, v. acórdão Église de scientologie (já referido na nota 28, n.° 18), relativo ao artigo 58.°, n.° 1, alínea b), CE.


32 – Acórdãos Manninen (n.° 29) e Verkooijen (n.° 43 e jurisprudência referida), já referidos na nota 16.


33 – No mesmo sentido, acórdão Manninen (já referido na nota 16, n.° 29).


34 – Acórdão de 12 de Junho de 2003, Gerritse (C-234/01, Colect., p. I-5933, n.° 27), relativo à livre prestação de serviços.


35 – Em termos semelhantes, acórdãos Royal Bank of Scotland (já referido na nota 16, n.os 27 e segs.), e de 21 de Setembro de 1999, Saint-Gobain ZN (C-307/97, Colect., p. I-6161, n.os 48 e 49), nos quais o Tribunal de Justiça chegou à conclusão de que constitui discriminação conceder um benefício fiscal aos residentes e não o conceder aos não residentes.


36 – No n.° 41 das suas observações escritas, a Comissão alega que o respeito do direito comunitário não pode depender do conteúdo de uma convenção em matéria de dupla tributação celebrada entre dois Estados-Membros; além disso, a restrição (de uma liberdade fundamental) não pode ser justificada pelo facto de o interessado possivelmente gozar de outros benefícios fiscais.


37 – Acórdão de 28 de Janeiro de 1986, Comissão/França (270/83, Colect., p. 273, n.° 26).


38 – Já referido na nota 35, n.° 54.


39 – Acórdão de 26 de Outubro de 1999, Eurowings Luftverkehr (C-294/97, Colect., p. I-7447).


40 – Acórdãos de 12 de Maio de 1998, Gilly (C-336/96, Colect., p. I-2793, n.os 16, 24 e 30); Saint-Gobain (já referido na nota 35, n.° 57); e D. (já referido na nota 19, n.° 52).


41 – Acórdão Saint-Gobain (já referido na nota 35, n.° 58); no mesmo sentido, acórdão D. (já referido na nota 19, n.° 52).


42 – Acórdão «avoir fiscal» (já referido na nota 37, n.° 26). V., no mesmo sentido, acórdão de 26 de Setembro de 1996, Data Delecta (C-43/95, Colect., p. I-4661, n.° 21). Quanto à proibição de uma reserva de reciprocidade, v. acórdão de 25 de Outubro de 1979, Comissão/Itália (159/78, Recueil, p. 3247, n.° 23), bem como o acórdão recente de 30 de Junho de 2005, Tod’s (C-28/04, ainda não publicado na Colectânea, n.° 34).


43 – Acórdãos «avoir fiscal» (já referido na nota 37, n.° 21); Saint-Gobain (já referido na nota 35, n.° 54); Eurowings Luftverkehr (já referido na nota 39, n.° 44); e Verkooijen (já referido na nota 16, n.° 61); v., além disso, acórdãos de 27 de Junho de 1996, Asscher (C-107/94, Colect., p. I-3089, n.os 51 a 54); de 12 de Dezembro de 2002, De Groot (C-385/00, Colect., p. I-11819, n.° 97); e de 15 de Julho de 2004, Lenz (C-315/02, ainda não publicado na Colectânea, n.° 43).


44 – No processo «avoir fiscal», a República Francesa argumentava que deveriam ser celebradas convenções entre os Estados-Membros em questão com vista à eliminação do tratamento desfavorável em causa; v. conclusões do advogado-geral F. G. Mancini de 16 de Outubro de 1985, no processo Comissão/França, dito «avoir fiscal» (270/83, Recueil, especialmente pp. 273 e segs., n.° 7).


45 – Quer no processo «avoir fiscal» (acórdão já referido na nota 37, n.° 21) quer nos processos Asscher (acórdão referido na nota 43, n.os 51 a 54), Saint-Gobain (acórdão referido na nota 35, n.° 54), Eurowings Luftverkehr (acórdão referido na nota 39, n.° 44), De Groot (acórdão referido na nota 43, n.° 97), Verkooijen (acórdão referido na nota 16, n.° 61), e Lenz (acórdão referido na nota 43, n.° 43), eram invocadas as vantagens gerais sem qualquer pertinência e que não tinham directamente nada a ver com a aplicação ao caso concreto das disposições legais controvertidas aos respectivos processos principais. Isso é especialmente manifesto no n.° 44 do acórdão Eurowings Luftverkehr, em que se tentou compensar as desvantagens fiscais existentes num Estado-Membro com vantagens fiscais noutro Estado-Membro; de modo semelhante, acórdão De Groot (n.° 97 conjugado com o n.° 38). V., ainda, acórdão Asscher (n.os 51 a 54), relativo à pretensão de compensar determinadas desvantagens na tributação com pretensas vantagens nas obrigações de segurança social.


46 – Acórdão Tod’s, já referido na nota 42, n.° 14, e jurisprudência aí referida.


47 – V., igualmente, n.os 7 a 16 das presentes conclusões. Ao responder ao pedido de decisão prejudicial, o Tribunal de Justiça baseia-se unicamente nos dados facultados pelo órgão jurisdicional de reenvio. Este é o único competente para interpretar a convenção em matéria de dupla tributação.


48 – 30% dos rendimentos da cessão menos o valor nominal das acções.


49 – Valor comercial ou preço de emissão.


50 – V., a este respeito, o exposto sobre a primeira questão prejudicial, n.os 24 a 41 destas conclusões.


51 – Artigo 10.°, n.° 2, da convenção em matéria de dupla tributação.


52 – Em termos semelhantes, acórdão Gerritse (já referido na nota 34, n.os 52 a 54).


53 – Existe jurisprudência assente neste sentido; v. acórdãos de 9 de Março de 1978, Staatliche Finanzverwaltung/Simmenthal (106/77, Recueil, p. 245, n.os 21 a 24); de 19 de Junho de 1990, Factortame (C-213/89, Colect., p. I-2433, n.os 18 a 20); e de 7 de Fevereiro de 1991, Nimz (C-184/89, Colect., p. I-297, n.° 19). V., quanto à inaplicabilidade de uma convenção entre dois Estados-Membros que viola o Tratado, acórdãos de 10 de Novembro de 1992, Exportur (C-3/91, Colect., p. I-5529, n.° 8), e de 20 de Maio de 2003, Ravil (C-469/00, Colect., p. I-5053, n.° 37).


54 – No caso de um rendimento de 100 e de custos de aquisição de 50, a carga fiscal do accionista com domicílio na Suécia é de 15 (montante tributável: 50, taxa do imposto: 30%, v., supra, n.os 7 e 60 destas conclusões). O accionista não domiciliado na Suécia deve igualmente, no máximo, nos termos do artigo 10.°, n.° 2, da convenção em matéria de dupla tributação, um imposto de 15, independentemente de poder deduzir ou não os seus custos de aquisição ou o valor nominal das acções. O limite máximo de 15% dos rendimentos da cessão só é vantajoso para o accionista não domiciliado na Suécia quando se podem deduzir os custos de aquisição ou um valor nominal inferior a 50, pois deste modo, uma parte dos rendimentos da cessão, superior a 50, está sujeita na Suécia a uma taxa de 30% do imposto sobre os dividendos.


55 – V., quanto a este ponto, n.° 46 destas conclusões.


56 – V., neste sentido, em especial, capítulo I, n.os 1 e 2, da Nomenclatura dos movimentos de capitais, assim como as respectivas notas explicativas, sobretudo a nota explicativa do conceito de «investimento directo» (quanto ao valor indicativo desta Nomenclatura para a definição do conceito de movimentos de capitais, v. n.° 26 destas conclusões). Nas conclusões do advogado-geral S. Alber de 14 de Outubro de 1999, no processo Baars (C-251/98, Colect., p. I-2787, n.os 12 a 30), é referida mais jurisprudência a este respeito.


57 – Neste sentido, v., igualmente, as minhas conclusões de 3 de Março de 2005 no processo Comissão/Itália (C-174/04, ainda não publicadas na Colectânea, n.° 22).


A jurisprudência, quanto a este ponto, não oferece uma imagem uniforme. Assim, o Tribunal de Justiça declarou expressamente, por exemplo, no acórdão de 1 de Junho de 1999, Konle (C-302/97, Colect., p. I-3099, n.° 22), no que se refere à aquisição de um imóvel para efeitos de estabelecimento, que são aplicáveis as duas liberdades fundamentais. Pelo contrário, o acórdão de 5 de Novembro de 2002, Überseering (C-208/00, Colect., p. I-9919, n.° 77), pode ser entendido no sentido de que há um relação de especialidade entre as duas liberdades fundamentais. E, noutros processos ainda, o facto de apenas uma das duas liberdades fundamentais ter sido examinada parece dever-se a razões de economia processual; v., nessa medida, acórdãos de 8 de Março de 2001, Metallgesellschaft e o. (C-397/98 e C-410/98, Colect., p. I-1727), e de 13 de Julho de 2000, Albore (C-423/98, Colect., p. I-5965), bem como os acórdãos ditos «golden-shares», Comissão/Portugal (n.° 56), Comissão/França (n.° 56) e Comissão/Bélgica (n.° 59), já referidos na nota 19.


A aplicabilidade paralela das duas liberdades fundamentais é afirmada, aliás, pelo advogado-geral S. Alber nas suas conclusões no processo Baars (já referido na nota 55, n.os 12 e segs., embora limitada a «restrições directas» das duas liberdades fundamentais, v., em especial, n.° 30) e do advogado-geral A. La Pergola nas suas conclusões de 24 de Junho de 1999 no processo Verkooijen (Colect., p. I-4071, n.os 35, 38 e 45).


58 – Com o artigo 58.°, n.° 2, CE, pretende-se igualmente impedir que nacionais de países terceiros que não possam invocar a liberdade de estabelecimento contornem, com base nas disposições sobre livre circulação de capitais, determinadas barreiras permitidas pelo direito comunitário ao seu estabelecimento num Estado-Membro. Pelo contrário, as restrições à circulação de capitais, permitidas com base na reserva do artigo 43.°, segundo parágrafo, CE («sem prejuízo do disposto no capítulo relativo aos capitais»), também têm implicações na liberdade de estabelecimento.


59 – Acórdão de 13 de Abril de 2000, Baars (C-251/98, Colect., p. I-2787, n.° 22); no mesmo sentido, acórdãos Überseering (já referido na nota 56, n.° 77), e de 21 de Novembro de 2002, X e Y (C-436/00, Colect., p. I-10829, n.° 37).


60 – Pelo contrário, quando a participação societária confere a um sócio influência decisiva sobre uma empresa, são pertinentes, para além da liberdade de estabelecimento, as disposições relativas à livre circulação de capitais. V., a este respeito, as notas explicativas da Nomenclatura sobre os movimentos de capitais (já referida na nota 26 destas conclusões): delas resulta que os investimentos directos em sociedades anónimas, sujeitos à livre circulação de capitais conferem «a esses accionistas [...] a possibilidade de participarem efectivamente na gestão dessa[s] sociedade[s] ou no seu controlo». Um critério semelhante é utilizado no acórdão Baars (já referido na nota 58, n.° 22) para descrever uma operação sujeita à liberdade de estabelecimento.