Processo C-97/09
Ingrid Schmelz
contra
Finanzamt Waldviertel
(pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Unabhängiger Finanzsenat, Außenstelle Wien)
«Sexta directiva IVA – Artigos 24.°, n.° 3, e 28.°-I – Directiva 2006/112/CE – Artigo 283.°, n.° 1, alínea c) – Validade – Artigos 12.° CE, 43.° CE e 49.° CE – Princípio da igualdade de tratamento – Regime especial das pequenas empresas – Isenção de IVA – Recusa do benefício da isenção aos sujeitos passivos estabelecidos noutros Estados-Membros – Conceito de ‘volume de negócios anual’»
Sumário do acórdão
1. Livre prestação de serviços – Restrições – Legislação fiscal
[Artigo 49.° CE; Directivas do Conselho 77/388, artigos 24.°, n.° 3, e 28.°-I, e 2006/112, artigo 283.°, n.° 1, alínea c)]
2. Disposições fiscais – Harmonização das legislações – Impostos sobre o volume de negócios – Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado – Regime especial das pequenas empresas
(Directivas do Conselho 77/388, artigos 24.° e 24.°-A, e 2006/112, artigos 284.° a 287.°)
1. O artigo 49.° CE não se opõe aos artigos 24.°, n.° 3, e 28.°-I da Sexta Directiva 77/388, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios, conforme alterada pela Directiva 2006/18, nem ao artigo 283.°, n.° 1, alínea c), da Directiva 2006/112, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, que permitem aos Estados-Membros conceder às pequenas empresas estabelecidas no seu território uma isenção de imposto sobre o valor acrescentado com perda do direito a dedução, mas excluem essa possibilidade às pequenas empresas estabelecidas noutros Estados-Membros.
Na verdade, a exclusão do benefício da isenção de imposto sobre o valor acrescentado, relativamente às pequenas empresas estabelecidas fora do território de um Estado-Membro, torna menos atractivo para estas empresas prestar serviços nesse Estado-Membro e, por conseguinte, dá origem a uma restrição à livre prestações de serviços.
Todavia, nesta fase da evolução do regime do imposto sobre o valor acrescentado, o objectivo que consiste em garantir a eficácia dos controlos fiscais para lutar contra a fraude, a evasão fiscal e eventuais abusos, bem como o objectivo do regime das pequenas empresas, que visa reforçar a sua competitividade, justificam que a aplicabilidade da isenção de imposto sobre o valor acrescentado seja circunscrita às actividades das pequenas empresas estabelecidas no território do Estado-Membro em que o imposto é devido. Com efeito, a restrição do benefício da isenção de imposto sobre o valor acrescentado às pequenas empresas estabelecidas no território do Estado-Membro que a concede é adequada a garantir a realização de controlos fiscais eficazes que têm por objectivo verificar se os requisitos que permitem beneficiar da referida isenção estão efectivamente preenchidos, dado que as empresas conservam, em princípio, os documentos relativos à totalidade das suas actividades económicas no local do seu estabelecimento. Um controlo eficaz das actividades exercidas no âmbito da livre prestações de serviços por uma pequena empresa não estabelecida no referido território não está ao alcance do Estado-Membro de acolhimento.
Além disso, quanto à necessidade da limitação do benefício deste regime às pequenas empresas estabelecidas no Estado-Membro em questão, que as normas sobre a assistência administrativa previstas pelo Regulamento n.° 1798/2003, relativo à cooperação administrativa no domínio do imposto sobre o valor acrescentado e que revoga o Regulamento n.° 218/92, e da Directiva 77/799, relativa à assistência mútua das autoridades competentes dos Estados-Membros no domínio dos impostos directos, não são susceptíveis de assegurar um cruzamento útil de dados no que diz respeito às pequenas empresas que exercem actividades no território do Estado-Membro que aplica uma isenção de imposto sobre o valor acrescentado. Com efeito, por força do artigo 272.°, n.° 1, alínea d), da Directiva 2006/112, os Estados-Membros podem dispensar as pequenas empresas de todas as formalidades previstas nos artigos 213.° a 271.° desta directiva, que são destinadas a informar as autoridades fiscais dos Estados-Membros sobre as actividades tributáveis a título do imposto sobre o valor acrescentado no seu território. Portanto, as pequenas empresas, regra geral, não são fiscalmente identificadas a título do imposto sobre o valor acrescentado no Estado-Membro do seu estabelecimento e este último não dispõe de nenhum dado relativo aos seus volumes de negócios. Quanto à Directiva 77/799, esta tem por objectivo a troca de informações relativas aos impostos sobre o rendimento, o património e os prémios de seguro. Ora, se não se pode excluir que as informações relativas, nomeadamente, ao rendimento podem fornecer indicações úteis, em especial para a investigação de fraudes ao imposto sobre o valor acrescentado eventualmente cometidas, também é verdade que essas informações não incluem o volume de negócios tributável a título do imposto sobre o valor acrescentado.
(cf. n.os 51, 53, 59-61, 64-67, 71, 76, disp. 1)
2. Os artigos 24.° e 24.°-A da Directiva 77/388, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios, conforme alterada pela Directiva 2006/18, bem como os artigos 284.° a 287.° da Directiva 2006/112, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, devem ser interpretados no sentido de que o conceito de «volume de negócios anual» visa o volume de negócios realizado por uma empresa durante um ano no Estado-Membro em que está estabelecida.
(cf. n.° 77, disp. 2)
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)
26 de Outubro de 2010 (*)
«Sexta directiva IVA – Artigos 24.°, n.° 3, e 28.°-I – Directiva 2006/112/CE – Artigo 283.°, n.° 1, alínea c) – Validade – Artigos 12.° CE, 43.° CE e 49.° CE – Princípio da igualdade de tratamento – Regime especial das pequenas empresas – Isenção de IVA – Recusa do benefício da isenção aos sujeitos passivos estabelecidos noutros Estados-Membros – Conceito de ‘volume de negócios anual’»
No processo C-97/09,
que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.° CE, apresentado pelo Unabhängiger Finanzsenat, Außenstelle Wien (Áustria), por decisão de 4 de Março de 2009, entrado no Tribunal de Justiça em 10 de Março de 2009, no processo
Ingrid Schmelz
contra
Finanzamt Waldviertel,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),
composto por: V. Skouris, presidente, A. Tizzano, J. N. Cunha Rodrigues, K. Lenaerts, J.-C. Bonichot e A. Arabadjiev (relator), presidentes de secção, E. Juhász, G. Arestis, A. Borg Barthet, M. Ilešič, P. Lindh, T. von Danwitz e C. Toader, juízes,
advogada-geral: J. Kokott,
secretário: K. Malacek, administrador,
vistos os autos e após a audiência de 13 de Abril de 2010,
vistas as observações apresentadas:
– em representação do Governo austríaco, por C. Pesendorfer e J. Bauer, na qualidade de agentes,
– em representação do Governo alemão, por C. Blaschke e J. Möller, na qualidade de agentes,
– em representação do Governo grego, por M. Tassopoulou, K. Georgiadis e I. Bakopoulos, na qualidade de agentes,
– em representação do Conselho da União Europeia, por A.-M. Colaert e J.-P. Hix, na qualidade de agentes,
– em representação da Comissão Europeia, por D. Triantafyllou e B.-R. Killmann, na qualidade de agentes,
ouvidas as conclusões da advogada-geral na audiência de 17 de Junho de 2010,
profere o presente
Acórdão
1 O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a validade, à luz dos artigos 12.° CE, 43.° CE, 49.° CE e do princípio da igualdade de tratamento, dos artigos 24.°, n.° 3, e 28.°-I da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios – Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme (JO L 145, p. 1; EE 09 F1 p. 54), conforme alterada pela Directiva 2006/18/CE do Conselho, de 14 de Fevereiro de 2006 (JO L 51, p. 12, a seguir «Sexta Directiva»), bem como do artigo 283.°, n.° 1, alínea c), da Directiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de Novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO L 347, p. 1, a seguir «directiva IVA»). Este pedido tem igualmente por objecto a interpretação do artigo 24.°, n.° 2, da Sexta Directiva e do artigo 287.° da directiva IVA.
2 Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe I. Schmelz, nacional alemã residente na Alemanha, ao Finanzamt Waldviertel (a seguir «Finanzamt»), a respeito do aviso para pagamento emitido pelo Finanzamt e relativo ao imposto sobre o volume de negócios alegadamente devido por I. Schmelz a título dos períodos anuais de 2006 e 2007 pelos rendimentos resultantes da locação de um apartamento situado na Áustria.
Quadro jurídico
Regulamentação da União
Sexta Directiva
3 Nos termos do artigo 13.°, B, alínea b), da Sexta Directiva, a locação de bens imóveis está isenta do imposto sobre o valor acrescentado.
4 O artigo 24.°, n.° 2, alíneas a) e b), da Sexta Directiva, sob a epígrafe «Regime especial para pequenas empresas», que figura no título XIV relativo aos regimes especiais, permite, no essencial, que os Estados-Membros mantenham ou concedam uma isenção do imposto sobre o volume acrescentado (a seguir «IVA») aos sujeitos passivos cujo volume de negócios anual seja inferior ao contravalor em moeda nacional de 5 000 unidades de conta europeias, à taxa de câmbio em vigor no dia da adopção da Sexta Directiva.
5 Em conformidade com o ponto 2, alínea c), da secção IX, intitulada «Fiscalidade», que figura no anexo XV do Acto relativo às condições de adesão da República da Áustria, da República da Finlândia e do Reino da Suécia e às adaptações aos Tratados em que se funda a União Europeia (JO 1994, C 241, p. 21, e JO 1995, L 1, p. 1), nos termos do artigo 24.°, n.os 2 a 6, da Sexta Directiva, a República da Áustria pode isentar do IVA os sujeitos passivos cujo volume de negócios anual for inferior ao contravalor em moeda nacional de 35 000 euros.
6 O artigo 24.°, n.° 3, da Sexta Directiva dispõe:
«As noções de isenção [...] aplicam-se às entregas de bens e às prestações de serviços efectuadas pelas pequenas empresas.
Os Estados-Membros podem excluir do regime previsto no n.° 2 certas operações. […]»
7 O artigo 28.°, n.° 2, alínea j), da Sexta Directiva enuncia que «a República da Áustria pode aplicar ao arrendamento de imóveis para habitação uma das duas taxas reduzidas previstas no n.° 3, terceiro parágrafo da alínea a), do artigo 12.°, desde que essa taxa não seja inferior a 10%».
8 O artigo 28.°-I da Sexta Directiva, intitulado «Regime especial para as pequenas empresas», aditou ao artigo 24.°, n.° 3, da mesma directiva o seguinte parágrafo:
«De qualquer modo, [...] as entregas de bens e as prestações de serviços efectuadas por um sujeito passivo não estabelecido no território do país são excluídas do benefício da isenção de imposto prevista no n.° 2.»
directiva IVA
9 Nos termos do artigo 135.°, n.° 1, alínea l), da directiva IVA, os Estados-Membros isentam a locação de bens imóveis.
10 O artigo 117.°, n.° 2, da directiva IVA enuncia que a República da Áustria «pode aplicar ao arrendamento de imóveis para habitação uma das duas taxas reduzidas previstas no artigo 98.° desde que essa taxa não seja inferior a 10%».
11 Nos termos do artigo 272.°, n.° 1, alínea d), da directiva IVA, os Estados-Membros podem dispensar «os sujeitos passivos que beneficiem da isenção para as pequenas empresas prevista nos artigos 282.° a 292.°» do cumprimento de determinadas obrigações ou de todas as obrigações referidas nos capítulos 2 («Identificação»), 3 («Facturação»), 4 («Contabilidade»), 5 («Declarações») e 6 («Mapas recapitulativos») do título XI («Obrigações dos sujeitos passivos e de determinadas pessoas que não sejam sujeitos passivos») desta directiva.
12 O título XII da directiva IVA, respeitante aos «Regimes especiais», contém o capítulo 1 intitulado «Regime especial das pequenas empresas». O artigo 281.°, que figura na secção 1 desse capítulo 1, consagrada às «Regras simplificadas de tributação e de cobrança», permite, no essencial, que os «Estados-Membros que se deparem com dificuldades na aplicação do regime normal do IVA às pequenas empresas, em razão da sua actividade ou estrutura, podem [...] aplicar regras simplificadas de tributação e de cobrança do imposto […]».
13 O artigo 282.° da directiva IVA, incluído na secção 2 do referido capítulo 1, intitulada «Isenções ou reduções degressivas», precisa que as «isenções e as reduções previstas na presente secção são aplicáveis às entregas de bens e às prestações de serviços efectuadas pelas pequenas empresas».
14 Nos termos do artigo 283.°, n.° 1, alínea c), da directiva IVA, que figura na mesma secção 2, são excluídas do benefício do regime previsto nessa secção «[a]s entregas de bens e as prestações de serviços efectuadas por sujeitos passivos não estabelecidos no Estado-Membro em que o IVA é devido».
15 Em conformidade com o artigo 287.° da directiva IVA, os «Estados-Membros que tenham aderido depois de 1 de Janeiro de 1978 podem conceder uma isenção aos sujeitos passivos cujo volume de negócios anual seja, no máximo, igual ao contravalor em moeda nacional dos seguintes montantes à taxa de conversão do dia da respectiva adesão». Para a República da Áustria, esse montante foi fixado em 35 000 euros.
16 O artigo 288.° da directiva IVA enuncia:
«O volume de negócios que serve de referência para a aplicação do regime previsto na presente secção é constituído pelos seguintes montantes, líquidos de IVA:
1) O montante das entregas de bens e das prestações de serviços, desde que sejam tributadas;
2) O montante das operações isentas com direito à dedução do IVA pago no estádio anterior por força do disposto nos artigos 110.° e 111.°, no n.° 1 do artigo 125.°, no artigo 127.° e no n.° 1 do artigo 128.°;
3) O montante das operações isentas por força do disposto nos artigos 146.° a 149.°, 151.°, 152.° e 153.°;
4) O montante das operações imobiliárias, das operações financeiras referidas nas alíneas b) a g) do n.° 1 do artigo 135.° e das prestações de serviços de seguros, a menos que tais operações tenham carácter de operações acessórias.
Todavia, as cessões de bens de investimento corpóreos ou incorpóreos da empresa não são tomadas em consideração na determinação do volume de negócios.»
17 Em conformidade com os artigos 411.° e 413.° da directiva IVA, esta revogou, em especial, a Sexta Directiva e entra em vigor em 1 de Janeiro de 2007.
Legislação nacional
18 Nos termos do § 6, n.° 1, ponto 16, da Lei de 1994 relativa ao imposto sobre o volume de negócios (Umsatzsteuergesetz 1994, BGBl. 663/1994, a seguir «UStG 1994»), na sua redacção aplicável aos factos em causa no processo principal, a locação de bens imóveis está isenta do imposto sobre o volume de negócios com excepção, designadamente, da locação de bens imóveis para habitação.
19 O § 6, n.° 1, ponto 27, da UStG 1994, na sua redacção aplicável aos factos em causa no processo principal, previa que eram isentas «[a]s operações efectuadas pelos pequenos contribuintes, ou seja, os contribuintes que têm residência ou sede no território nacional e cujo volume de negócios, com base no § 1, n.° 1, pontos 1 e 2, não ultrapasse 22 000 EUR no período de tributação» durante o ano de 2006 e 30 000 euros durante o ano de 2007.
Litígio no processo principal e questões prejudiciais
20 I. Schmelz tem nacionalidade alemã e reside na Alemanha. É proprietária de um apartamento na Áustria, que arrenda por 330 euros por mês acrescidos das despesas de funcionamento.
21 Considerando que, como pequena empresária, está isenta do pagamento do imposto sobre o volume de negócios nos termos do § 6, n.° 1, ponto 27, da UStG 1994, I. Schmelz não facturou o imposto sobre a referida renda.
22 O Finanzamt entende que, por não ter a sede ou a residência na Áustria, I. Schmelz não pode beneficiar da isenção concedida às pequenas empresas. Assim, depois de ter verificado que I. Schmelz tinha auferido, pela sua actividade de locação na Áustria, volumes de negócios líquidos de 5 890,90 euros durante 2006 e de 5 936,37 euros em 2007, o Finanzamt emitiu dois avisos de liquidação em 19 de Junho e 17 de Novembro de 2008, tributando a I. Schmelz impostos sobre o volume de negócios no montante de, respectivamente, 334,93 euros e de 316,15 euros.
23 I. Schmelz interpôs recurso dos referidos avisos de liquidação no Unabhängiger Finanzsenat, Außenstelle Wien. Esse órgão jurisdicional precisou, através de uma informação complementar, que I. Schmelz declarou, em 10 de Março de 2009, não ter realizado, durante os anos em causa no processo principal, nenhum outro volume de negócios no território da União Europeia.
24 O órgão jurisdicional de reenvio, por um lado, considera que as decisões de liquidação tomadas pelo Finanzamt estão em conformidade com o direito nacional, dado que este último, por sua vez, está em conformidade tanto com as disposições da Sexta Directiva como com as da directiva IVA, e, por outro, salienta que, contrariamente a I. Schmelz, uma pessoa que tenha residência na Áustria poderia beneficiar, como pequena empresa, da isenção do imposto sobre o volume de negócios.
25 Assim, o Unabhängiger Finanzsenat, Außenstelle Wien, tem dúvidas quanto à compatibilidade destas directivas com as proibições de discriminação decorrentes do direito primário, isto é, dos artigos 12.° CE, 43.° CE e 49.° CE, bem como do princípio geral do direito da União relativo à igualdade de tratamento.
26 Também tendo dúvidas quanto à questão de saber se o montante do volume de negócios que distingue as pequenas empresas das outras empresas visa o volume de negócios realizado exclusivamente no Estado-Membro em questão ou se há que ter em conta o volume de negócios realizado em todo o território da União, o Unabhängiger Finanzsenat, Außenstelle Wien, decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:
«1) A formulação ‘bem como as entregas de bens e as prestações de serviços efectuadas por um sujeito passivo não estabelecido no território do país’, constante do artigo 24.°, n.° 3, e [do] artigo 28.°-I da [Sexta Directiva], bem como a regulamentação que transpõe esta disposição para direito nacional, violam o Tratado [CE], em particular a proibição de discriminação (artigo 12.° CE), a liberdade de estabelecimento (artigos 43.° CE e segs.), a [livre] prestação de serviços (artigos 49.° CE e segs.) ou os direitos fundamentais [da União] (o princípio da igualdade), visto que esta disposição tem por efeito excluir os cidadãos da União não estabelecidos no território do país em causa da isenção prevista no artigo 24.°, n.° 2, da Sexta Directiva (regime especial para pequenas empresas), ao passo que os cidadãos da União estabelecidos no território do país em causa podem beneficiar dessa isenção, na medida em que o Estado-Membro em causa conceda às pequenas empresas uma isenção conforme com a directiva?
2) A formulação ‘as entregas de bens e as prestações de serviços efectuadas por sujeitos passivos não estabelecidos no Estado-Membro em que o IVA é devido’, constante do artigo 283.°, n.° 1, alínea c), da [directiva IVA], bem como a regulamentação que transpõe esta disposição para direito nacional, violam o Tratado [CE], em particular a proibição de discriminação (artigo 12.° CE), a liberdade de estabelecimento (artigos 43.° CE e segs.), a [livre] prestação de serviços (artigos 49.° CE e segs.) ou os direitos fundamentais [da União] (o princípio da igualdade), visto que esta disposição tem por efeito excluir os cidadãos da União não estabelecidos no Estado-Membro em causa da isenção prevista nos artigos 282.° e seguintes da [directiva IVA] (regime especial para pequenas empresas), ao passo que os cidadãos da União estabelecidos no Estado-Membro em causa podem beneficiar dessa isenção, na medida em que o Estado-Membro em causa conceda às pequenas empresas uma isenção conforme com a [directiva IVA]?
3) Em caso de resposta afirmativa à primeira questão: a formulação ‘bem como as entregas de bens e as prestações de serviços efectuadas por um sujeito passivo não estabelecido no território do país’, constante do artigo 24.°, n.° 3, e do artigo 28.°-I da Sexta Directiva, é inválida na acepção do artigo 234.°, [primeiro parágrafo,] alínea b), CE?
4) Em caso de resposta afirmativa à segunda questão: a formulação ‘as entregas de bens e as prestações de serviços efectuadas por sujeitos passivos não estabelecidos no Estado-Membro em que o IVA é devido’, constante do artigo 283.°, n.° 1, alínea c), da [directiva IVA,] é inválida na acepção do artigo 234.°, alínea b), CE?
5) Em caso de resposta afirmativa à terceira questão: Por ‘volume de negócios anual’, na acepção do anexo XV [secção IX], [intitulada ‘Fiscalidade’, [ponto] 2, alínea c), [do Acto relativo às condições de adesão da República da Áustria, da República da Finlândia e do Reino da Suécia e às adaptações aos Tratados em que se funda a União Europeia] e do artigo 24.° da Sexta Directiva, deve entender-se o volume de negócios realizado [pela empresa] num ano no Estado-Membro em que se invoca o regime relativo às pequenas empresas ou o volume de negócios [da empresa] realizado num ano na totalidade do território da [União]?
6) Em caso de resposta afirmativa à quarta questão: por ‘volume de negócios anual’, na acepção do artigo 287.° da [directiva IVA], deve entender-se o volume de negócios realizado [pela empresa] num ano no Estado-Membro em que se invoca o regime relativo às pequenas empresas ou o volume de negócios [da empresa] realizado num ano na totalidade do território da [União]?»
Quanto à admissibilidade das questões prejudiciais
27 O Conselho da União Europeia considera que o órgão jurisdicional de reenvio não dispunha, no momento em que formulou as suas questões prejudiciais, de todos os dados necessários para avaliar a questão do estabelecimento de I. Schmelz. Com efeito, verificou-se posteriormente que a recorrente no processo principal não exercia nenhuma actividade económica na Alemanha e que não era, portanto, considerada sujeito passivo de IVA. Dado que a única actividade de I. Schmelz sujeita ao IVA consiste na locação a particulares de um apartamento situado na Áustria, o Conselho entende que é possível considerar que I. Schmelz dispõe de um estabelecimento na Áustria. Deste modo, não está demonstrado que as questões prejudiciais são pertinentes para a solução do litígio no processo principal.
28 A este propósito, recorde-se que, no âmbito do processo instituído pelo artigo 234.° CE, compete exclusivamente ao juiz nacional, a quem foi submetido o litígio e que deve assumir a responsabilidade pela decisão jurisdicional a tomar, apreciar, tendo em conta as especificidades de cada processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para poder proferir a sua decisão como a pertinência das questões que submete ao Tribunal de Justiça. Consequentemente, desde que as questões submetidas sejam relativas à interpretação e/ou à validade do direito da União, o Tribunal de Justiça é, em princípio, obrigado a pronunciar-se (v., neste sentido, acórdãos de 15 de Dezembro de 1995, Bosman, C-415/93, Colect., p. I-4921, n.° 59, e de 18 de Março de 2010, Alassini e o., C-317/08 a C-320/08, ainda não publicado na Colectânea, n.° 25).
29 Assim, o Tribunal de Justiça só pode recusar um pedido de decisão prejudicial apresentado por um órgão jurisdicional nacional quando for manifesto que a interpretação solicitada do direito da União não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objecto do litígio no processo principal, quando o problema for hipotético ou ainda quando o Tribunal não dispõe dos elementos de facto e de direito necessários para dar uma resposta útil às questões que lhe foram submetidas (acórdão Alassini e o., já referido, n.° 26).
30 Por outro lado, resulta claramente do artigo 234.°, segundo parágrafo, CE que compete ao órgão jurisdicional nacional decidir em que fase do processo deve este órgão colocar uma questão prejudicial ao Tribunal de Justiça (acórdãos de 10 de Março de 1981, Irish Creamery Milk Suppliers Association e o., 36/80 e 71/80, Recueil, p. 735, n.° 5, e de 17 de Abril de 2007, AGM-COS.MET, C-470/03, Colect., p. I-2749, n.° 45).
31 No presente caso, mesmo partindo do princípio que a informação transmitida por I. Schmelz ao órgão jurisdicional de reenvio seja exacta, não se pode de modo algum concluir que a interpretação solicitada do direito da União não tem manifestamente nenhuma relação com a realidade ou com o objecto do litígio no processo principal nem que o problema é hipotético. Com efeito, como foi precisado pelo Governo austríaco na audiência, a circunstância de I. Schmelz ter realizado as suas únicas operações tributáveis através da locação do seu apartamento não implica que as autoridades austríacas possam considerar que esta dispõe de um estabelecimento na Áustria.
32 Daqui se conclui que há que responder às questões prejudiciais submetidas pelo Unabhängiger Finanzsenat, Außenstelle Wien.
Quanto às questões prejudiciais
33 Através das suas questões prejudiciais, que estão ligadas entre si e que devem, por conseguinte, ser examinadas conjuntamente, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se os artigos 24.°, n.° 3, e 28.°-I da Sexta Directiva, bem como o artigo 283.°, n.° 1, alínea c), da directiva IVA, na medida em que permitem aos Estados-Membros conceder às pequenas empresas estabelecidas no seu território uma isenção de IVA com perda do direito a dedução, mas excluem essa possibilidade às pequenas empresas estabelecidas noutros Estados-Membros, estão em conformidade com os artigos 12.° CE, 43.° CE e 49.° CE, bem como com o princípio geral da igualdade de tratamento.
34 O órgão jurisdicional de reenvio pergunta ainda se o conceito de «volume de negócios anual» utilizado nos artigos 24.° e 24.°-A da Sexta Directiva, bem como nos artigos 284.° a 287.° da directiva IVA, abrange o volume de negócios realizado pela empresa durante um ano no Estado-Membro no qual foi apresentado o pedido de isenção de IVA ou o volume de negócios realizado durante um ano em todo o território da União.
Quanto à liberdade aplicável
35 Relativamente à liberdade aplicável às circunstâncias do litígio no processo principal, o órgão jurisdicional de reenvio faz referência às liberdades de estabelecimento e de prestação de serviços.
36 Antes de mais, a liberdade de estabelecimento, que o artigo 43.° CE reconhece aos nacionais da União e que compreende tanto o acesso às actividades não assalariadas e ao seu exercício como a constituição e a gestão de empresas, nas mesmas condições que as definidas na legislação do Estado-Membro de estabelecimento para os seus próprios nacionais, inclui, nos termos do artigo 48.° CE, para as sociedades constituídas em conformidade com a legislação de um Estado-Membro e que tenham a sua sede social, a sua administração central ou o seu estabelecimento principal no interior da União, o direito de exercer a sua actividade no Estado-Membro em causa através de uma filial, de uma sucursal ou de uma agência (acórdão de 14 de Setembro de 2006, Centro di Musicologia Walter Stauffer, C-386/04, Colect., p. I-8203, n.° 17 e jurisprudência aí referida).
37 Segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, o conceito de estabelecimento, na acepção do Tratado, é um conceito muito amplo, que implica a possibilidade de um nacional da União participar, de modo estável e contínuo, na vida económica de um Estado-Membro diferente do seu Estado de origem, e de dela tirar benefício, favorecendo assim a interpenetração económica e social no interior da União, no domínio das actividades não assalariadas (acórdão Centro di Musicologia Walter Stauffer, já referido, n.° 18 e jurisprudência aí referida).
38 No entanto, para que as disposições relativas ao direito de estabelecimento se possam aplicar, é, em princípio, necessário que seja assegurada uma presença permanente no Estado-Membro de acolhimento e, em caso de aquisição e posse de bens imobiliários, que a gestão desses bens seja activa (acórdão Centro di Musicologia Walter Stauffer, já referido, n.° 19). Essa presença permanente deve poder ser verificada com base em elementos objectivos e comprováveis, relativos, especialmente, ao grau de existência física em termos de instalações, de pessoal e de equipamentos (v., neste sentido, acórdão de 12 de Setembro de 2006, Cadbury Schweppes e Cadbury Schweppes Overseas, C-196/04, Colect., p. I-7995, n.° 67).
39 Ora, decorre da descrição dos factos fornecida pelo órgão jurisdicional de reenvio que I. Schmelz não preenche estes requisitos.
40 Consequentemente, as disposições que regulam a liberdade de estabelecimento não são aplicáveis em circunstâncias como as do litígio no processo principal.
41 Em seguida, quanto à livre prestação de serviços, por um lado, há que considerar que a locação imobiliária constitui uma prestação de serviços mediante remuneração na acepção do artigo 50.°, primeiro parágrafo, CE (v., neste sentido, acórdão de 15 de Julho de 2010, Hengartner e Gasser, C-70/09, ainda não publicado na Colectânea, n.° 32). Por outro, a circunstância de I. Schmelz arrendar durante vários anos um apartamento situado na Áustria não se opõe à aplicabilidade do artigo 49.° CE.
42 A este respeito, o Tribunal de Justiça decidiu que o conceito de serviço na acepção do Tratado pode abranger serviços de natureza muito diferente, incluindo serviços cuja prestação abrange um período prolongado, mesmo durante vários anos. Com efeito, nenhuma disposição do Tratado permite determinar, de modo abstracto, a duração ou a frequência a partir da qual o fornecimento de um serviço ou de um certo tipo de serviço noutro Estado-Membro deixa de poder ser considerado uma prestação de serviços na acepção do Tratado (v. acórdão de 11 de Dezembro de 2003, Schnitzer, C-215/01, Colect., p. I-14847, n.os 30 e 31).
43 Tendo em conta o exposto, há que considerar que a actividade locativa de I. Schmelz integra a livre prestações de serviços nos termos do artigo 49.° CE.
44 Por último, no que respeita à aplicabilidade às circunstâncias do processo principal do artigo 12.° CE, que consagra o princípio geral da proibição de qualquer discriminação em razão da nacionalidade, cumpre salientar que esta disposição só deve ser aplicada de modo autónomo a situações regidas pelo direito da União em relação às quais o Tratado CE não preveja regras específicas de não discriminação (acórdão de 21 de Janeiro de 2010, SGI, C-311/08, ainda não publicado na Colectânea, n.° 31 e jurisprudência aí referida).
45 Ora, o artigo 49.° CE, que é aplicável no litígio no processo principal, como se observou no n.° 43 do presente acórdão, prevê essas regras específicas de não discriminação. Daqui decorre que o artigo 12.° CE não deve ser aplicado às circunstâncias do processo principal.
Quanto à existência de uma restrição à livre prestação de serviços
46 Resulta de jurisprudência assente que todas as disposições do Tratado relativas à livre circulação de pessoas visam facilitar aos cidadãos da União o exercício de actividades profissionais de qualquer natureza em todo o território da União e opõem-se a medidas que possam desfavorecer esses cidadãos quando desejem exercer uma actividade económica no território de outro Estado-Membro (acórdãos Bosman, já referido, n.° 94, e de 19 de Novembro de 2009, Filipiak, C-314/08, Colect., p. I-11049, n.° 58).
47 A este respeito, importa recordar que o artigo 49.° CE exige a eliminação de qualquer restrição à livre prestação de serviços quando seja susceptível de impedir, entravar ou tornar menos atractivas as actividades do prestador estabelecido noutro Estado-Membro (v., neste sentido, acórdão de 1 de Julho de 2010, Dijkman e Dijkman-Lavaleije, C-233/09, ainda não publicado na Colectânea, n.° 23 e jurisprudência aí referida).
48 Decorre também da jurisprudência que o artigo 49.° CE proíbe não só as discriminações ostensivas, baseadas na nacionalidade, mas ainda quaisquer formas dissimuladas de discriminação que, por aplicação de outros critérios de distinção, conduzam, de facto, ao mesmo resultado. É o caso, designadamente, de uma medida que prevê uma distinção com base no critério da residência, uma vez que este critério corre o risco de actuar principalmente em detrimento dos nacionais de outros Estados-Membros, dado que, na maior parte das vezes, os não residentes são não nacionais (v. acórdão de 16 de Janeiro de 2003, Comissão/Itália, C-388/01, Colect., p. I-721, n.os 13, 14 e jurisprudência aí referida).
49 Considera-se estar na presença de restrições proibidas pelo artigo 49.° CE designadamente quando as disposições fiscais aplicáveis a actividades económicas transfronteiriças são menos vantajosas do que as aplicáveis a uma actividade económica exercida no interior das fronteiras desse Estado-Membro (v. acórdão Filipiak, já referido, n.° 62).
50 Além disso, há que sublinhar que a proibição das restrições à livre prestação de serviços aplica-se não apenas às medidas nacionais mas também relativamente às medidas adoptadas pelas instituições da União (v., por analogia, no que diz respeito à livre circulação de mercadorias, acórdão de 25 de Junho de 1997, Kieffer e Thill, C-114/96, Colect., p. I-3629, n.° 27 e jurisprudência aí referida).
51 No caso em apreço, os artigos 24.°, n.° 3, e 28.°-I da Sexta Directiva, bem como o artigo 283.°, n.° 1, alínea c), da directiva IVA, permitem aos Estados-Membros conceder às pequenas empresas estabelecidas no seu território uma isenção de IVA com perda do direito a dedução, mas excluem essa possibilidade às pequenas empresas estabelecidas noutros Estados-Membros.
52 Consequentemente, quando um Estado-Membro prevê a isenção de IVA para as pequenas empresas, as empresas desta natureza que estão estabelecidas no seu território podem, eventualmente, oferecer as suas prestações em condições mais vantajosas do que as pequenas empresas estabelecidas fora do referido território, dado que, por força das ditas disposições, é proibido aos Estados-Membros alargar o benefício da referida isenção a estas últimas empresas.
53 No caso em apreço, decorre da consideração efectuada no número anterior que a exclusão do benefício da isenção de IVA, relativamente às pequenas empresas estabelecidas fora do território austríaco, torna menos atractivo para estas empresas prestar serviços na Áustria. Por conseguinte, dá origem a uma restrição à livre prestações de serviços.
54 Além disso, como salientou a advogada-geral nos n.os 42 a 44 e 83 das suas conclusões, por um lado, essa restrição não pode ser imputada aos Estados-Membros, dado que as directivas em causa só lhes permitem aplicar a isenção de IVA às pequenas empresas estabelecidas nos respectivos territórios. Por outro lado, a possibilidade de as pequenas empresas estabelecidas fora do território do Estado-Membro no qual o IVA é devido deduzirem o imposto pago a montante pode não ser suficiente para compensar a não aplicação a essas empresas do regime de isenção de IVA, nomeadamente quando essas pequenas empresas não efectuam ou efectuam poucas operações tributáveis a montante.
55 Nestas circunstâncias, há que proceder a um exame de uma eventual justificação da referida restrição.
Quanto à justificação
56 Os Governos austríaco, alemão e grego, bem como o Conselho e a Comissão Europeia, consideram que a restrição à livre prestações de serviços que consiste numa desigualdade de tratamento entre as pequenas empresas consoante estejam ou não estabelecidas no território austríaco é justificada pela necessidade de garantir a eficácia dos controlos fiscais. Segundo esses governos e essas instituições, tais controlos só podem ser efectuados eficazmente pelo Estado-Membro em cujo território está estabelecida a pequena empresa.
57 A este respeito, decorre da jurisprudência que a necessidade de garantir a eficácia dos controlos fiscais constitui uma razão imperiosa de interesse geral, susceptível de justificar uma restrição ao exercício das liberdades fundamentais garantidas pelo Tratado (acórdão de 27 de Janeiro de 2009, Persche, C-318/07, Colect., p. I-359, n.° 52).
58 Todavia, uma medida restritiva, para poder ser justificada, deve respeitar o princípio da proporcionalidade, no sentido de que deve ser adequada a garantir a realização do objectivo que prossegue e não deve ultrapassar o necessário para o alcançar (acórdão Persche, já referido, n.° 52).
59 A este respeito, há que considerar que a restrição do benefício da isenção de IVA às pequenas empresas estabelecidas no território do Estado-Membro que a concede é adequada a garantir a realização de controlos fiscais eficazes que têm por objectivo verificar se os requisitos que permitem beneficiar da referida isenção estão efectivamente preenchidos, dado que as empresas conservam, em princípio, os documentos relativos à totalidade das suas actividades económicas no local do seu estabelecimento.
60 Por conseguinte, é com razão que os governos e as instituições que intervêm no presente processo consideram que um controlo eficaz das actividades exercidas no âmbito da livre prestações de serviços por uma pequena empresa não estabelecida no referido território não está ao alcance do Estado-Membro de acolhimento.
61 Quanto à necessidade da limitação do benefício deste regime às pequenas empresas estabelecidas no Estado-Membro em questão, os referidos governos e instituições alegam que as normas sobre a assistência administrativa que decorrem do Regulamento (CE) n.° 1798/2003 do Conselho, de 7 de Outubro de 2003, relativo à cooperação administrativa no domínio do imposto sobre o valor acrescentado e que revoga o Regulamento (CEE) n.° 218/92 (JO L 264, p. 1), e da Directiva 77/799/CEE do Conselho, de 19 de Dezembro de 1977, relativa à assistência mútua das autoridades competentes dos Estados-Membros no domínio dos impostos directos (JO L 336, p. 15; EE 09 F1 p. 94), não garantem um cruzamento útil de dados.
62 Salientam que, dado que o regime das pequenas empresas se destina a diminuir os encargos administrativos referentes às operações tributáveis, essas empresas são isentas das formalidades administrativas fiscais a título do imposto sobre o volume de negócios, de modo que o Estado-Membro de estabelecimento não dispõe de nenhum dado comunicável nos termos do Regulamento n.° 1798/2003. Acrescentam que, uma vez que a Directiva 77/799 só abrange as informações ligadas aos impostos directos, não permite recolher nem comunicar as informações relativas aos volumes de negócios das pequenas empresas.
63 A este respeito, há que salientar, por um lado, que o objectivo que consiste em garantir a eficácia dos controlos fiscais para lutar contra a fraude, a evasão fiscal e os abusos eventuais, garantia cuja necessidade é recordada no n.° 57 do presente acórdão, não pode ser alcançado quando não existem dados pertinentes. Por outro lado, como salientou a advogada-geral no n.° 33 das suas conclusões, o regime das pequenas empresas prevê simplificações administrativas que têm por objectivo reforçar a criação, a actividade e a competitividade das pequenas empresas, bem como manter um nexo razoável entre os encargos administrativos ligados ao controlo fiscal e as escassas receitas fiscais a cobrar.
64 Com efeito, por força do artigo 272.°, n.° 1, alínea d), da directiva IVA, os Estados-Membros podem dispensar as pequenas empresas de todas as formalidades previstas nos artigos 213.° a 271.° desta directiva, que são destinadas a informar as autoridades fiscais dos Estados-Membros sobre as actividades tributáveis a título do IVA no seu território.
65 Portanto, como precisou o Conselho, as pequenas empresas, regra geral, não são fiscalmente identificadas a título do IVA no Estado-Membro do seu estabelecimento e este último não dispõe de nenhum dado relativo aos seus volumes de negócios. Assim, no processo principal, o Governo alemão precisou que a pequena empresa de I. Schmelz não está fiscalmente identificada a título do IVA na Alemanha e que esse Estado-Membro não dispõe de nenhum dado relativo ao seu volume de negócios.
66 Quanto à Directiva 77/799, há que salientar que, em conformidade com o seu artigo 1.°, tem por objectivo a troca de informações relativas aos impostos sobre o rendimento, o património e os prémios de seguro. Ora, se não se pode excluir que as informações relativas, nomeadamente, ao rendimento podem fornecer indicações úteis, em especial para a investigação de fraudes ao IVA eventualmente cometidas, também é verdade que essas informações não incluem o volume de negócios tributável a título do IVA.
67 Nestas condições, foi justificadamente que os governos e as instituições partes no presente processo consideraram que as regras sobre a assistência administrativa previstas no Regulamento n.° 1798/2003 e na Directiva 77/799 não são susceptíveis de assegurar um cruzamento útil de dados no que diz respeito às pequenas empresas que exercem actividades no território do Estado-Membro que aplica uma isenção de IVA.
68 Além disso, essa penúria de informações só pode ser remediada pela introdução de formalidades como as previstas nos artigos 213.° a 271.° da directiva IVA. Ora, como foi salientado no n.° 63 do presente acórdão, o regime das pequenas empresas tem precisamente por objectivo isentar estas últimas e as Administrações Fiscais dessas formalidades.
69 Com efeito, garantir a eficácia dos controlos fiscais do volume de negócios realizado por uma pequena empresa nos Estados-Membros diferentes daquele em que está estabelecida exigiria, por um lado, aplicar às pequenas empresas e Administrações Fiscais formalidades complexas que permitissem recolher os dados pertinentes e identificar eventuais abusos, bem como, por outro, pedidos recorrentes de assistência administrativa das autoridades fiscais do Estado-Membro de estabelecimento às autoridades fiscais de todos os outros Estados-Membros da União para efeitos do cruzamento dos referidos dados.
70 Há que acrescentar que o limite do benefício da isenção de IVA apenas aos sujeitos passivos estabelecidos no Estado-Membro que instituiu essa isenção permite evitar que sujeitos passivos que exercem actividades em vários Estados-Membros sem neles estarem estabelecidos possam escapar totalmente ou em grande parte, ao abrigo de isenções aí vigentes, à tributação das suas actividades mesmo que estas, consideradas no seu todo, excedam objectivamente o nível de actividade de uma pequena empresa, o que seria inconciliável com a necessidade de unicamente encorajar, através da derrogação ao princípio da soberania fiscal que constitui esse mecanismo de isenção, as pequenas empresas.
71 Tendo em conta o exposto, afigura-se que, nesta fase da evolução do regime do IVA, o objectivo que consiste em garantir a eficácia dos controlos fiscais para lutar contra a fraude, a evasão fiscal e eventuais abusos, bem como o objectivo do regime das pequenas empresas, que visa reforçar a sua competitividade, justificam, por um lado, que a aplicabilidade da isenção de IVA seja circunscrita às actividades das pequenas empresas estabelecidas no território do Estado-Membro em que o IVA é devido e, por outro, que o volume de negócios anual a tomar em conta seja o realizado no Estado-Membro em que a empresa está estabelecida.
72 Nestas circunstâncias, há que considerar que o limite do benefício da isenção de IVA às pequenas empresas estabelecidas no Estado-Membro no qual o IVA é devido não ultrapassa o que é necessário para garantir a realização destes dois objectivos.
73 Daqui se conclui que a apreciação das questões não revelou nenhum elemento susceptível de afectar a conformidade dos artigos 24.°, n.° 3, e 28.°-I da Sexta Directiva, bem como do artigo 283.°, n.° 1, alínea c), da directiva IVA, com o artigo 49.° CE.
74 Por último, na medida em que o órgão jurisdicional de reenvio pergunta também se as disposições em causa no processo principal estão em conformidade com o princípio da igualdade de tratamento, há que recordar que foi afirmado no n.° 53 do presente acórdão que a desigualdade de tratamento em causa ocasiona uma restrição à livre prestação de serviços. Assim, é abrangida pelo âmbito de aplicação do artigo 49.° CE.
75 Ora, nestas condições, como realçou a advogada-geral no n.° 75 das suas conclusões, há que considerar que o princípio da igualdade de tratamento não deve ser aplicado de modo autónomo.
76 Em face do exposto, há que responder às questões submetidas que a sua apreciação não revelou nenhum elemento susceptível de, à luz do artigo 49.° CE, afectar a validade dos artigos 24.°, n.° 3, e 28.°-I da Sexta Directiva, bem como do artigo 283.°, n.° 1, alínea c), da directiva IVA.
77 Os artigos 24.° e 24.°-A da Sexta Directiva, bem como os artigos 284.° a 287.° da directiva IVA, devem ser interpretados no sentido de que o conceito de «volume de negócios anual» visa o volume de negócios realizado por uma empresa durante um ano no Estado-Membro em que está estabelecida.
Quanto às despesas
78 Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.
Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) declara:
1) A apreciação das questões não revelou nenhum elemento susceptível de, à luz do artigo 49.° CE, afectar a validade dos artigos 24.°, n.° 3, e 28.°-I da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios – Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme, conforme alterada pela Directiva 2006/18/CE do Conselho, de 14 de Fevereiro de 2006, bem como do artigo 283.°, n.° 1, alínea c), da Directiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de Novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado.
2) Os artigos 24.° e 24.°-A da Directiva 77/388, conforme alterada pela Directiva 2006/18, bem como os artigos 284.° a 287.° da Directiva 2006/112, devem ser interpretados no sentido de que o conceito de «volume de negócios anual» visa o volume de negócios realizado por uma empresa durante um ano no Estado-Membro em que está estabelecida.
Assinaturas
* Língua do processo: alemão.