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ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

13 de novembro de 2012 (*)

«Artigos 49.° TFUE e 63.° TFUE — Distribuição de dividendos — Imposto sobre as sociedades — Processo C-446/04 — Test Claimants in the FII Group Litigation — Interpretação de um acórdão — Prevenção da dupla tributação económica — Equivalência dos métodos de isenção e de imputação — Conceitos de ‘taxa de tributação’ e de ‘níveis de tributação diferentes’ — Dividendos provenientes de países terceiros»

No processo C-35/11,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.° TFUE, apresentado pela High Court of Justice (England & Wales), Chancery Division (Reino Unido), por decisão de 20 de dezembro de 2010, entrado no Tribunal de Justiça em 21 de janeiro de 2011, no processo

Test Claimants in the FII Group Litigation

contra

Commissioners of Inland Revenue,

The Commissioners for Her Majesty’s Revenue & Customs,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

composto por: V. Skouris, presidente, K. Lenaerts (relator), vice-presidente, A. Tizzano, L. Bay Larsen, T. von Danwitz, A. Rosas, presidentes de secção, U. Lõhmus, E. Levits, A. Ó Caoimh, J.-C. Bonichot e A. Arabadjiev, juízes,

advogado-geral: N. Jääskinen,

secretário: L. Hewlett, administradora principal,

vistos os autos e após a audiência de 7 de fevereiro de 2012,

vistas as observações apresentadas:

¾        em representação de Test Claimants in the FII Group Litigation, por G. Aaronson, QC, e P. Farmer, barrister,

¾        em representação do Governo do Reino Unido, por S. Ossowski, na qualidade de agente, assistido por K. Bacon, barrister,

¾        em representação do Governo alemão, por T. Henze e K. Petersen, na qualidade de agentes,

¾        em representação da Irlanda, por D. O’Hagan, na qualidade de agente, assistido por A. Collins, SC, e por N. McNicholas, BL,

¾        em representação do Governo francês, por G. de Bergues e N. Rouam, na qualidade de agentes,

¾        em representação do Governo neerlandês, por C. Wissels e B. Koopman, na qualidade de agentes,

¾        em representação da Comissão Europeia, por R. Lyal e W. Mölls, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado-geral na audiência de 19 de julho de 2012,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação dos artigos 49.° TFUE e 63.° TFUE.

2        Este pedido foi apresentado no âmbito da aplicação do acórdão de 12 de dezembro de 2006, Test Claimants in the FII Group Litigation (C-446/04, Colet., p. I-11753), e visa obter esclarecimentos relativos a diversos números do referido acórdão.

 Quadro jurídico do Reino Unido

3        Nos termos da legislação fiscal em vigor no Reino Unido, os lucros realizados num exercício contabilístico por qualquer sociedade residente nesse Estado-Membro, bem como por qualquer sociedade não residente nesse Estado-Membro, mas que aí exerça uma atividade comercial por intermédio de uma sucursal ou de uma agência, estão sujeitos ao imposto sobre as sociedades no dito Estado.

4        Desde 1973, o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte aplica um sistema de tributação dito de «imputação parcial», segundo o qual, para evitar a dupla tributação económica, quando uma sociedade residente distribui lucros, uma parte do imposto sobre as sociedades pago por essa sociedade é imputada aos seus acionistas. Até 6 de abril de 1999, esse sistema baseava-se, por um lado, no pagamento antecipado do imposto sobre as sociedades pela sociedade que procede à distribuição e, por outro, na concessão de um crédito de imposto aos acionistas beneficiários da distribuição de dividendos, acrescido, para as sociedades beneficiárias residentes no Reino Unido, de uma isenção do imposto sobre as sociedades relativamente aos dividendos recebidos de uma sociedade também residente nesse Estado-Membro.

 Pagamento antecipado do imposto sobre as sociedades

5        Nos termos da section 14 da Lei de 1988 relativa aos impostos sobre o rendimento e sobre as sociedades (Income and Corporation Taxes Act 1988, a seguir «ICTA»), na sua versão aplicável à época dos factos do processo principal, uma sociedade residente no Reino Unido que distribua dividendos aos seus acionistas deve proceder ao pagamento do imposto sobre as sociedades antecipado («advance corporation tax», a seguir «ACT»), calculado com base no montante ou no valor da distribuição efetuada.

6        Uma sociedade pode imputar o ACT pago a título de uma distribuição efetuada num determinado exercício contabilístico ao montante de que é devedora a título do imposto sobre as sociedades («mainstream corporation tax») relativo a esse exercício, dentro de um determinado limite. Se a dívida fiscal de uma sociedade a título de imposto sobre as sociedades for insuficiente para permitir a imputação total do ACT, o excedente de ACT pode ser transferido quer para um exercício anterior ou posterior quer para as filiais dessa sociedade, as quais podem imputá-lo ao montante que elas próprias devem a título de imposto sobre as sociedades. As filiais para as quais o ACT excedentário pode ser transferido só podem ser filiais residentes no Reino Unido.

7        Um grupo de sociedades com sede social nesse Estado-Membro pode também optar pelo regime da tributação de grupo, que permite às sociedades pertencentes a esse grupo adiar o pagamento do ACT até que a sociedade-mãe do referido grupo proceda a uma distribuição de dividendos.

 Situação dos acionistas residentes que recebem dividendos de sociedades residentes

8        Nos termos da section 208 da ICTA, uma sociedade residente no Reino Unido que recebe dividendos de uma sociedade também residente nesse Estado-Membro não está sujeita ao imposto sobre as sociedades por esses dividendos.

9        Além disso, nos termos da section 231(1) da ICTA, toda a distribuição de dividendos sujeita ao ACT efetuada por uma sociedade residente a outra sociedade residente dá lugar a um crédito de imposto, a favor desta última sociedade, correspondente à fração do montante de ACT pago pela primeira sociedade.

10      Nos termos da section 238(1) da ICTA, o dividendo recebido e o crédito de imposto constituem, em conjunto, o «rendimento de investimento isento» («franked investment income» ou «FII») da sociedade beneficiária.

11      Uma sociedade residente no Reino Unido que tenha recebido de outra sociedade residente dividendos cuja distribuição lhe conferiu o direito a um crédito de imposto pode deduzir o montante de ACT pago por essa outra sociedade do montante de ACT que ela própria deve pagar quando proceder a uma distribuição de dividendos aos seus próprios acionistas, de modo que só paga o ACT excedente.

 Situação dos acionistas residentes que recebem dividendos de sociedades não residentes

12      Quando uma sociedade residente no Reino Unido recebe dividendos de uma sociedade não residente, está sujeita ao imposto sobre as sociedades por esses dividendos.

13      Nesse caso, a sociedade beneficiária dos referidos dividendos não tem direito a um crédito de imposto e os dividendos recebidos não são qualificados de rendimentos de investimento isentos. Em contrapartida, nos termos das sections 788 e 790 da ICTA, tem direito à dedução do montante correspondente ao imposto pago pela sociedade que procede à distribuição no seu Estado de residência, concedida quer ao abrigo da legislação em vigor no Reino Unido quer ao abrigo de uma convenção para evitar a dupla tributação celebrada por este com aquele outro Estado.

14      Assim, a legislação nacional permite imputar ao imposto sobre as sociedades devido pela sociedade residente beneficiária dos dividendos as retenções na fonte operadas sobre esses dividendos distribuídos por uma sociedade não residente. Se a referida sociedade residente beneficiária controlar, direta ou indiretamente, ou for uma filial de uma sociedade que controle, direta ou indiretamente, 10% ou mais dos direitos de voto da sociedade que procede à distribuição, o direito à dedução estende-se ao imposto sobre as sociedades estrangeiro correspondente, pago sobre os lucros com base nos quais os dividendos são pagos. Esse imposto pago no estrangeiro só pode ser objeto de dedução até ao limite do montante devido no Reino Unido a título de imposto sobre as sociedades pelo rendimento em causa.

15      São aplicáveis disposições análogas por força das convenções para evitar a dupla tributação celebradas pelo Reino Unido.

16      Uma sociedade residente que proceda a uma distribuição de dividendos aos seus próprios acionistas está sujeita ao ACT.

17      Relativamente à possibilidade de imputar o ACT pago a título dessa distribuição ao montante de que a referida sociedade residente é devedora a título de imposto sobre as sociedades, o facto de receber dividendos de uma sociedade não residente pode gerar um excedente de ACT, nomeadamente por a distribuição de dividendos por uma sociedade não residente não conferir, como referido no n.° 13 do presente acórdão, um crédito de imposto suscetível de ser deduzido ao montante de ACT que a sociedade residente deve pagar quando distribui dividendos aos seus próprios acionistas.

 Regime dos dividendos de rendimentos estrangeiros

18      A partir de 1 de julho de 1994, uma sociedade residente que recebesse dividendos de uma sociedade não residente podia decidir, ao distribuir dividendos aos seus próprios acionistas, que os mesmos fossem qualificados de dividendos de rendimentos estrangeiros («foreign income dividend», a seguir «FID»), sobre os quais era devido ACT, mas que permitiam a essa sociedade pedir o reembolso do ACT pago em excesso, na medida em que os FID atingissem o nível dos dividendos de origem estrangeira recebidos.

19      Enquanto o ACT devia ser pago nos catorze dias seguintes ao trimestre no decurso do qual o dividendo tinha sido pago, o excedente de ACT passava a ser reembolsável no momento em que a sociedade residente se tornava devedora de imposto sobre as sociedades, ou seja, nove meses depois do fim do exercício contabilístico.

20      O sistema do ACT, incluindo o sistema dos FID, deixou de ser aplicado às distribuições de dividendos efetuadas a partir de 6 de abril de 1999.

 Factos na origem do litígio e questões prejudiciais

21      A High Court of Justice (England & Wales), Chancery Division, procura, em primeiro lugar, obter esclarecimentos relativamente ao n.° 56 e ao n.° 1 do dispositivo do acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido. Recorda que o Tribunal de Justiça declarou, nos n.os 48 a 53, 57 e 60 desse acórdão, que uma legislação nacional que aplique aos dividendos de origem nacional o método de isenção e aos dividendos de origem estrangeira o método de imputação não é contrária aos artigos 49.° TFUE e 63.° TFUE, na medida em que a taxa de tributação sobre os dividendos de origem estrangeira não seja superior à taxa de tributação aplicada aos dividendos de origem nacional e que o crédito de imposto seja, pelo menos, igual ao montante pago no Estado-Membro da sociedade que procede à distribuição, tendo por limite o montante do imposto aplicado no Estado-Membro da sociedade beneficiária.

22      As demandantes no processo principal observaram no Tribunal de Justiça, como resulta do n.° 54 do acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido, que, «nos termos da legislação em vigor no Reino Unido, no caso de uma distribuição de dividendos de origem nacional, a sociedade beneficiária está isenta do imposto sobre as sociedades relativo a esses dividendos, independentemente do imposto pago pela sociedade que procede à distribuição, ou seja, também quando esta última, por lhe serem concedidas deduções fiscais, não é devedora do imposto ou paga um imposto sobre as sociedades inferior à taxa nominal aplicável no Reino Unido». A este respeito, o Tribunal de Justiça declarou, nos n.os 55 e 56 do referido acórdão:

«55      Estes factos não foram contestados pelo Governo do Reino Unido, que todavia sustenta que a aplicação de níveis de tributação diferentes à sociedade que procede à distribuição e à sociedade beneficiária só ocorre em circunstâncias verdadeiramente excecionais, que não se verificam no processo principal.

56      A este respeito, incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar se a taxa de tributação é efetivamente idêntica e se os níveis de tributação diferentes não se verificam apenas em determinados casos devido a uma alteração da matéria coletável na sequência de determinadas deduções excecionais.»

23      No seguimento do acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido, as demandantes no processo principal apresentaram na High Court of Justice (England & Wales), Chancery Division, provas periciais destinadas a demonstrar que o nível de tributação efetivo dos lucros das sociedades residentes era inferior à taxa de tributação nominal na maioria dos casos e que essa situação não podia, por conseguinte, ser qualificada de excecional.

24      Os demandados no processo principal não contestaram os elementos de prova das demandantes relativos ao nível de tributação efetivo das sociedades residentes. Pelo contrário, consideraram que a verificação a efetuar pelo órgão jurisdicional nacional por força do n.° 56 do acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido, não tinha nenhuma relação com os níveis de tributação efetivos. Atendendo ao facto de que, nas suas observações escritas apresentadas no Tribunal de Justiça, o Reino Unido mencionou a dedução prevista na legislação nacional a favor das pequenas empresas, os demandados alegaram que competia ao órgão jurisdicional de reenvio examinar unicamente se as diferenças de taxas de tributação nominais aplicáveis às sociedades residentes que procedem à distribuição de dividendos, por um lado, e às sociedades residentes beneficiárias de dividendos, por outro, só se verificam em circunstâncias excecionais.

25      O órgão jurisdicional de reenvio entende que lhe incumbe verificar o nível de tributação efetivo aplicável aos lucros distribuídos por sociedades residentes, mas considera, no entanto, necessário submeter esta questão ao Tribunal de Justiça.

26      Em segundo lugar, o órgão jurisdicional de reenvio pretende obter esclarecimentos sobre os n.os 2 e 4 do dispositivo do acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido. Pergunta se esses números se aplicam apenas quando uma sociedade residente no Reino Unido recebe diretamente dividendos de uma filial não residente que pagou imposto sobre sociedades sobre os lucros subjacentes aos dividendos distribuídos no seu Estado de residência ou se também se aplicam quando a filial não residente não pagou ela própria nenhum imposto — ou pagou um imposto muito baixo — e os dividendos foram distribuídos a partir de lucros que englobam dividendos pagos por uma subfilial residente num Estado-Membro a partir de lucros a título dos quais foi pago o imposto sobre as sociedades nesse Estado.

27      Para este efeito, o órgão jurisdicional de reenvio explica que, frequentemente, a filial não residente não paga nenhum imposto no seu Estado de residência sobre os lucros a partir dos quais são pagos os dividendos à sua sociedade-mãe residente. Tal deve-se, principalmente, ao recurso generalizado, por parte dos grupos internacionais, a sociedades holding intermediárias que pagam pouco ou nenhum imposto sobre os seus lucros. Os Estados em que estas sociedades holding estão sediadas concedem frequentemente uma dedução para evitar a dupla tributação pelo imposto suportado sobre os lucros distribuídos.

28      Em terceiro lugar, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se o n.° 2 do dispositivo do acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido, se limita aos casos em que a sociedade residente que recebe dividendos de uma sociedade não residente paga, ela própria, o ACT ou se o referido número desse acórdão também é válido nos casos em que a referida sociedade residente opta pelo regime de tributação de grupo. No âmbito desse regime, o ACT é pago por uma sociedade residente situada a montante na estrutura do grupo. O órgão jurisdicional de reenvio pretende também saber se, nesta última hipótese, que é excluída pelo Tribunal de Justiça no n.° 10 do acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido, se deve concluir pela existência de uma violação do direito da União de forma que, por força dos princípios enunciados pelo Tribunal de Justiça no acórdão de 9 de novembro de 1983, San Giorgio (199/82, Recueil, p. 3595), a sociedade a montante que efetivamente pagou o ACT tem um direito ao reembolso.

29      Segundo os demandados no processo principal, no caso em apreço, o ACT pago por essa sociedade foi legalmente exigido, pelo que os prejuízos sofridos pela referida sociedade só podem ser objeto de uma ação de indemnização se estiverem reunidas as condições enunciadas pelo Tribunal de Justiça no acórdão de 5 de março de 1996, Brasserie du pêcheur e Factortame (C-46/93 e C-48/93, Colet., p. I-1029).

30      Em quarto lugar, o órgão jurisdicional de reenvio recorda que a primeira questão prejudicial submetida no acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido, se cingia aos dividendos recebidos de sociedades residentes noutros Estados-Membros. No entanto, quando o processo regressou à High Court of Justice (England & Wales), Chancery Division, as demandantes no processo principal sustentaram que, à luz da evolução da jurisprudência do Tribunal de Justiça, o regime em vigor no Reino Unido era também contrário ao artigo 63.° TFUE, na medida em que se aplicava aos dividendos recebidos de filiais residentes em países terceiros. Segundo as demandantes, o artigo 63.° TFUE é aplicável porquanto a legislação do Reino Unido se aplica independentemente da medida da participação detida pelo interessado na sociedade residente num país terceiro que procede à distribuição.

31      Os demandados consideram, no entanto, que o artigo 63.° TFUE não é aplicável quando a sociedade residente num Estado-Membro exerce uma influência efetiva nas decisões de uma sociedade residente num país terceiro e está em posição de determinar as suas atividades. Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, os acórdãos de 24 de maio de 2007, Holböck (C-157/05, Colet., p. I-4051), de 18 de dezembro de 2007, A (C-101/05, Colet., p. I-11531) e de 17 de setembro de 2009, Glaxo Wellcome (C-182/08, Colet., p. I-8591), corroboram a tese das demandantes no processo principal.

32      Em quinto lugar, o órgão jurisdicional de reenvio pretende obter esclarecimentos sobre o n.° 3 do dispositivo do acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido, respeitante à legislação relativa ao ACT, mencionada no n.° 6 do presente acórdão, que permite que uma sociedade-mãe residente no Reino Unido transfira o excedente de ACT para as suas filiais residentes de forma que o ACT possa ser imputado ao montante devido por essas filiais a título de imposto sobre as sociedades. As demandantes no processo principal sustentaram que a referida legislação era contrária ao artigo 49.° TFUE na medida em que esta possibilidade estava reservada às filiais residentes no Reino Unido. Consideraram que, ao optar por aplicar estas normas, o Reino Unido tinha a obrigação de prever uma dedução análoga, como um reembolso do ACT, que pudesse ser objeto de compensação com o imposto sobre as sociedades pago pelas filiais estabelecidas na União Europeia.

33      No n.° 115 do acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido, o Tribunal de Justiça iniciou o exame desta questão referindo que «[…] os debates no Tribunal de Justiça se limitaram à questão da impossibilidade de uma sociedade residente transferir um excedente de ACT para filiais não residentes para que estas possam imputá-lo ao imposto sobre as sociedades de que são devedoras no Reino Unido devido às atividades exercidas neste último Estado-Membro».

34      A resposta dada no n.° 139 e no n.° 3 do dispositivo do referido acórdão não visa, portanto, os casos em que a sociedade não residente estava unicamente sujeita ao imposto sobre as sociedades no Estado-Membro da sua residência. O órgão jurisdicional de reenvio pretende, por conseguinte, saber se a resposta que figura no n.° 3 do dispositivo do acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido, é diferente quando as filiais não residentes a favor das quais não tenha podido ser feita nenhuma transferência de um excedente de ACT não são tributadas no Estado-Membro da sociedade-mãe.

35      Nestas condições, a High Court of Justice (England & Wales), Chancery Division, decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      As menções a ‘taxa de tributação’ e a [‘níveis de tributação diferentes’] no [n.º] 56 do acórdão [Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido]:

a)      dizem respeito apenas às taxas de tributação nominais ou legais; ou

b)      dizem respeito às taxas de tributação efetivamente pagas, bem como às taxas de tributação nominais ou legais; ou

c)      dizem respeito a algo diferente, e se sim, a quê?

2)      [A] resposta dada [à segunda e quarta questões submetidas] no âmbito do processo que deu origem ao acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido, é diferente] se:

a)      o imposto estrangeiro sobre sociedades não [for] pago (ou não [for] totalmente pago) pela sociedade não residente que distribuiu dividendos à sociedade residente, que são pagos a partir [de] lucros [que englobam] dividendos [distribuídos] pela sua filial direta ou indireta domiciliada num Estado-Membro e que foram pagos a partir [de] lucros sobre os quais incidiu o imposto pago nesse Estado; e/ou

b)      se o pagamento [do ACT] não for efetuado pela sociedade residente que recebe os dividendos da sociedade não residente, mas […] pela sua sociedade-mãe residente, direta ou indireta, sobre a posterior distribuição de lucros da sociedade beneficiária, os quais [incluem] direta ou indiretamente […] os dividendos?

3)      Nas circunstâncias descritas na [segunda questão, alínea b),] a sociedade que paga o ACT tem direito a [propor uma ação] de reembolso do imposto indevidamente cobrado (acórdão San Giorgio[, já referido]), ou [apenas uma ação de indemnização] dos prejuízos (acórdão Brasserie du pêcheur e Factortame[, já referido])?

4)      Quando a legislação nacional em questão não se aplica exclusivamente às situações em que a sociedade-mãe exerce uma influência decisiva [na] sociedade que [distribui] dividendos, […] uma sociedade residente [pode] invocar o artigo 63.°[…] TFUE [...] relativamente aos dividendos recebidos da filial [na] qual exerce influência decisiva e que [é] residente num país terceiro?

5)      A resposta do Tribunal de Justiça dada à [terceira questão submetida] no âmbito do processo que deu origem ao acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido,] também se aplica quando as filiais não residentes [a favor das] quais [não poderia ser efetuada] nenhuma transferência […] não estão sujeitas a imposto sobre as sociedades no Estado-Membro da sociedade-mãe?»

 Quanto às questões prejudiciais

 Quanto à primeira questão

36      Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se os artigos 49.° TFUE e 63.° TFUE devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação de um Estado-Membro que aplique o método de isenção aos dividendos de origem nacional e o método de imputação aos dividendos de origem estrangeira, quando, no referido Estado-Membro, o nível de tributação efetivo dos lucros das sociedades é genericamente inferior à taxa de tributação nominal.

37      Relativamente a uma regulamentação fiscal, como a que está em causa no processo principal, destinada a evitar a dupla tributação económica dos lucros distribuídos, há que recordar que a situação de uma sociedade acionista que recebe dividendos de origem estrangeira é comparável à de uma sociedade acionista que recebe dividendos de origem nacional, na medida em que, em ambos os casos, os lucros realizados podem, em princípio, ser objeto de uma tributação em cadeia (acórdãos Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido, n.° 62, e de 10 de fevereiro de 2011, Haribo Lakritzen Hans Riegel e Österreichische Salinen, C-436/08 e C-437/08, Colet., p. I-305, n.° 59).

38      Nestas condições, os artigos 49.° TFUE e 63.° TFUE impõem a um Estado-Membro que aplica um sistema de prevenção da dupla tributação económica, no caso dos dividendos pagos a residentes por sociedades residentes, que conceda um tratamento equivalente aos dividendos pagos a residentes por sociedades não residentes (v. acórdãos, já referidos, Test Claimants in the FII Group Litigation, n.° 72, e Haribo Lakritzen Hans Riegel e Österreichische Salinen, n.° 60).

39      Em seguida, há que recordar que o Tribunal de Justiça declarou que um Estado-Membro é, em princípio, livre de evitar a tributação em cadeia dos dividendos recebidos por uma sociedade residente mediante a aplicação do método de isenção, quando os dividendos sejam pagos por uma sociedade residente, e do método de imputação, quando sejam pagos por uma sociedade não residente. Com efeito, estes dois métodos são equivalentes desde que, no entanto, a taxa de tributação dos dividendos de origem estrangeira não seja superior à taxa de tributação aplicada aos dividendos de origem nacional e que o crédito de imposto seja, pelo menos, igual ao montante pago no Estado da sociedade que procede à distribuição, até ao limite do montante do imposto aplicado no Estado-Membro da sociedade beneficiária (v. acórdãos Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido, n.os 48 e 57; Haribo Lakritzen Hans Riegel e Österreichische Salinen, já referido, n.° 86; e de 15 de setembro de 2011, Accor, C-310/09, Colet., p. I-8115, n.° 88; e despacho de 23 de abril de 2008, Test Claimants in the CFC and Dividend Group Litigation, C-201/05, Colet., p. I-2875, n.° 39).

40      A este propósito, importa sublinhar que, uma vez que o direito da União, no seu estado atual, não prescreve critérios gerais para a repartição de competências entre os Estados-Membros no que respeita à eliminação da dupla tributação no interior da União (acórdãos de 14 de novembro de 2006, Kerckheart e Morres, C-513/04, Colet., p. I-10967, n.° 22, e de 8 de dezembro de 2011, Banco Bilbao Vizcaya Argentaria, C-157/10, Colet., p. I-13023, n.° 31 e jurisprudência referida), todos os Estados-Membros permanecem livres para organizar os respetivos sistemas de tributação de lucros distribuídos desde que, no entanto, o sistema em causa não comporte discriminações proibidas pelo Tratado FUE. Ora, uma obrigação de o Estado-Membro em que reside a sociedade beneficiária dos dividendos isentar os dividendos de origem estrangeira do imposto sobre as sociedades afetaria a competência do Estado-Membro em causa para tributar, no respeito pelo princípio da não discriminação, os lucros assim distribuídos à taxa estabelecida pela sua própria legislação.

41      Como resulta do n.° 54 do acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido, as demandantes no processo principal contestaram a equivalência dos métodos de isenção e de imputação, alegando que, por força da legislação em vigor no Reino Unido, no caso de uma distribuição de dividendos de origem nacional, a sociedade beneficiária está isenta do imposto sobre as sociedades relativo a esses dividendos independentemente do imposto pago pela sociedade que procede à distribuição, ou seja, também quando esta última, em virtude das deduções de que beneficia, não é devedora de imposto ou paga um imposto sobre as sociedades inferior à taxa nominal aplicável no Reino Unido.

42      No n.° 56 do acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido, o Tribunal de Justiça convidou, então, o órgão jurisdicional de reenvio a verificar se a taxa de tributação é efetivamente idêntica e se os níveis de tributação diferentes só se verificam em determinados casos devido a uma alteração da matéria coletável na sequência de determinadas deduções excecionais.

43      Com efeito, deve considerar-se que a taxa de tributação dos dividendos de origem estrangeira será superior à taxa de tributação aplicada aos dividendos de origem nacional na aceção da jurisprudência citada no n.° 39 do presente acórdão e, portanto, que a equivalência dos métodos de isenção e de imputação estará comprometida nas circunstâncias seguintes.

44      Em primeiro lugar, se a sociedade residente, que distribui os dividendos, estiver sujeita a uma taxa de tributação inferior à taxa de tributação nominal a que está sujeita a sociedade residente que recebe os referidos dividendos, a isenção fiscal desta última sociedade relativamente aos dividendos de origem nacional dará origem a uma tributação dos lucros distribuídos inferior à que resulta da aplicação do método da imputação aos dividendos de origem estrangeira recebidos pela mesma sociedade residente, mas desta vez de uma sociedade não residente também sujeita a uma tributação reduzida dos seus lucros, nomeadamente, em virtude de uma taxa de tributação nominal mais baixa.

45      Com efeito, a aplicação do método da isenção dará origem a uma tributação dos lucros de origem nacional distribuídos à taxa de tributação nominal inferior aplicável à sociedade que procede à distribuição de dividendos, ao passo que a aplicação do método da imputação aos dividendos de origem estrangeira dará origem a uma tributação dos lucros distribuídos à taxa de tributação nominal superior aplicável à sociedade beneficiária de dividendos.

46      Em segundo lugar, a equivalência entre a isenção fiscal dos dividendos distribuídos por uma sociedade residente e a aplicação de um método de imputação aos dividendos distribuídos por uma sociedade não residente que, à semelhança do previsto na legislação em causa no processo principal, tenha em conta o nível de tributação efetivo dos lucros no Estado de origem fica igualmente prejudicada no caso de os lucros da sociedade residente, que distribui os dividendos, estarem sujeitos, no Estado-Membro de residência, a um nível de tributação efetivo inferior à taxa de tributação nominal aplicável nesse Estado.

47      Com efeito, a isenção fiscal dos dividendos de origem nacional não dá origem a nenhuma responsabilidade fiscal por parte da sociedade residente que recebe os referidos dividendos, independentemente do nível de tributação efetivo a que estão sujeitos aos lucros a partir dos quais os dividendos foram pagos. Pelo contrário, a aplicação do método de imputação aos dividendos de origem estrangeira fará com que a sociedade beneficiária residente incorra numa responsabilidade fiscal suplementar no caso de o nível de tributação efetivo a que estão sujeitos os lucros da sociedade que procede à distribuição de dividendos não atingir a taxa de tributação nominal a que estão sujeitos os lucros da sociedade residente beneficiária dos dividendos.

48      Por conseguinte, contrariamente ao método de isenção, o método de imputação não permite transmitir para a sociedade acionista o benefício das deduções concedidas a montante, em matéria de imposto sobre as sociedades, à sociedade que procede à distribuição de dividendos.

49      Nestas condições, a verificação que o Tribunal de Justiça solicitou ao órgão jurisdicional de reenvio, no n.° 56 do acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido, diz respeito, simultaneamente, às taxas de tributação nominais aplicáveis e aos níveis efetivos de tributação. Com efeito, «a taxa de tributação» a que se refere o mesmo n.° 56 diz respeito à taxa de tributação nominal e «os níveis de tributação diferentes […] devido a uma alteração da matéria coletável» dizem respeito aos níveis de tributação efetivos. É, nomeadamente, devido às deduções que reduzem a matéria coletável que o nível de tributação efetivo pode ser inferior à taxa de tributação nominal.

50      No que se refere a uma eventual diferença entre a taxa de tributação nominal e o nível de tributação efetivo a que está sujeita a sociedade residente que procede à distribuição de dividendos, decorre, na verdade, do n.° 56 do acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido, que a equivalência dos métodos de isenção e de imputação não fica, desde logo, prejudicada quando se verificam situações excecionais em que os dividendos de origem nacional estão isentos, apesar de os lucros a partir dos quais esses dividendos foram pagos não terem sido sujeitos, na sua totalidade, a um nível de tributação efetivo correspondente à taxa de tributação nominal. No entanto, o Tribunal de Justiça precisou que competia ao órgão jurisdicional de reenvio determinar o caráter excecional ou não da diferença entre o nível de tributação efetivo e a taxa de tributação nominal.

51      Resulta da sua decisão que o órgão jurisdicional de reenvio procedeu à verificação que lhe foi pedida no n.° 56 do acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido. Constatou, deste modo, que, no caso do processo principal, a mesma taxa de tributação nominal é aplicável tanto aos lucros da sociedade residente que procede à distribuição de dividendos como aos da sociedade residente beneficiária. Em contrapartida, resulta da decisão de reenvio que a circunstância evocada no n.° 46 do presente acórdão se verifica, e não de maneira excecional. Com efeito, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, no Reino Unido, o nível de tributação efetivo dos lucros das sociedades residentes é inferior à taxa de tributação nominal na maioria dos casos.

52      Daqui decorre que a aplicação do método de imputação aos dividendos de origem estrangeira, como previsto pela legislação em causa no processo principal, não garante um tratamento fiscal equivalente ao resultante da aplicação do método de isenção aos dividendos de origem nacional.

53      Uma vez que, relativamente a um norma fiscal, como a que está em causa no processo principal, destinada a prevenir a dupla tributação económica dos lucros distribuídos, a situação de uma sociedade acionista que receba dividendos de origem estrangeira é comparável à de uma sociedade acionista que receba dividendos de origem nacional, na medida em que, em ambos os casos, os lucros realizados podem, em princípio, ser objeto de uma tributação em cadeia (v. acórdãos, já referidos, Test Claimants in the FII Group Litigation, n.° 62, e Haribo Lakritzen Hans Riegel e Österreichische Salinen, n.° 59), a diferença de tratamento fiscal entre as duas categorias de dividendos não é justificada por uma diferença de situação pertinente.

54      Consequentemente, uma legislação como a que está em causa no processo principal constitui uma restrição à liberdade de estabelecimento e aos movimentos de capitais, em princípio, proibida pelos artigos 49.° TFUE e 63.° TFUE.

55      Segundo jurisprudência constante, essa restrição só pode ser admitida se se justificar por uma razão imperiosa de interesse geral. Mas é ainda necessário, nesse caso, que seja adequada para garantir a realização do objetivo em causa e que não ultrapasse o necessário para atingir esse objetivo (v. acórdãos de 29 de novembro de 2011, National Grid Indus, C-371/10, Colet., p. I-12273, n.° 42, e de 1 de dezembro de 2011, Comissão/Bélgica, C-250/08, Colet., p. I-12341, n.° 51).

56      A este respeito, o Governo do Reino Unido sustentou no processo que deu origem ao acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido, que a legislação em causa no processo principal era objetivamente justificada pela necessidade de assegurar a coerência do regime fiscal nacional.

57      Deve recordar-se que o Tribunal de Justiça já admitiu que a necessidade de preservar a coerência de um sistema fiscal pode justificar uma restrição ao exercício das liberdades de circulação garantidas pelo Tratado (acórdãos de 28 de janeiro de 1992, Bachmann, C-204/90, Colet., p. I-249, n.° 21; de 7 de setembro de 2004, Manninen, C-319/02, Colet., p. I-7477, n.° 42; de 23 de outubro de 2008, Krankenheim Ruhesitz am Wannsee-Seniorenheimstatt, C-157/07, Colet., p. I-8061, n.° 43; e Comissão/Bélgica, já referido, n.° 70).

58      No entanto, segundo jurisprudência constante, é necessário que se demonstre a existência de um nexo direto entre a vantagem fiscal em causa e a compensação dessa vantagem através da cobrança de determinado imposto (acórdão Comissão/Bélgica, já referido, n.° 71 e jurisprudência referida), devendo o caráter direto deste nexo ser apreciado à luz do objetivo prosseguido pela legislação em causa (acórdãos de 27 de novembro de 2008, Papillon, C-418/07, Colet., p. I-8947, n.° 44; e de 18 de junho de 2009, Aberdeen Property Fininvest Alpha, C-303/07, Colet., p. I-5145, n.° 72).

59      Tendo em conta o objetivo prosseguido pela legislação em causa no processo principal, existe um nexo direto entre, por um lado, a vantagem fiscal concedida, ou seja, o crédito de imposto no caso de dividendos de origem estrangeira e a isenção fiscal para os dividendos de origem nacional, e, por outro, o imposto já cobrado sobre os lucros distribuídos.

60      Quanto ao caráter proporcionado da restrição, há que referir que, embora a aplicação do método de imputação aos dividendos de origem estrangeira e do método de isenção aos dividendos de origem nacional possa ser justificada para evitar uma dupla tributação económica dos lucros distribuídos, não é, no entanto, necessário, para manter a coerência do sistema fiscal em causa, ter em conta, por um lado, o nível de tributação efetivo aplicado aos lucros distribuídos para efeitos do cálculo da vantagem fiscal no âmbito da aplicação do método de imputação e, por outro, apenas a taxa de tributação nominal aplicada aos lucros distribuídos no âmbito do método de isenção.

61      Com efeito, a isenção fiscal de que beneficia uma sociedade residente que receba dividendos de origem nacional é concedida independentemente do nível de tributação efetivo aplicado aos lucros a partir dos quais os dividendos foram distribuídos. A dita isenção, na medida em que se destina a evitar uma dupla tributação económica dos benefícios distribuídos, baseia-se, assim, no pressuposto de que a sociedade que procede à distribuição de dividendos é tributada em relação aos referidos lucros à taxa de tributação nominal. Assemelha-se, por conseguinte, à concessão de um crédito de imposto calculado com referência à dita taxa de tributação nominal.

62      Para assegurar a coerência do regime fiscal em causa, uma legislação nacional que tenha especialmente em conta, também no âmbito do método de imputação, a taxa de tributação nominal a que estão sujeitos os lucros subjacentes aos dividendos distribuídos é adequada para prevenir a dupla tributação económica dos lucros distribuídos e garantir a coerência interna do regime fiscal e, ao mesmo tempo, menos lesiva da liberdade de estabelecimento e da livre circulação de capitais.

63      A este respeito, importa assinalar que, no n.° 99 do acórdão Haribo Lakritzen Hans Riegel e Österreichische Salinen, já referido, o Tribunal de Justiça, após ter recordado que, em princípio, os Estados-Membros podem prevenir a tributação em cadeia de dividendos recebidos por uma sociedade residente através da aplicação do método de isenção aos dividendos de origem nacional e do método de imputação aos dividendos de origem estrangeira, constatou que a legislação nacional em causa tinha em conta, para efeitos do cálculo do montante do crédito do imposto no âmbito do método de imputação, a taxa de tributação nominal aplicável no Estado onde se encontrava estabelecida a sociedade que procede à distribuição de dividendos.

64      É verdade que, no âmbito da aplicação do método de imputação, o cálculo de um crédito de imposto com base na taxa de tributação nominal a que estão sujeitos os lucros subjacentes aos dividendos distribuídos pode ainda gerar um tratamento fiscal menos favorável dos dividendos de origem estrangeira, resultante, em especial, da existência nos Estados-Membros de normas diferentes relativas à determinação da matéria coletável para o imposto sobre as sociedades. No entanto, deve considerar-se que tal tratamento desfavorável, quando ocorre, resulta do exercício paralelo por diferentes Estados-Membros da sua competência fiscal, que é compatível com o Tratado (v., neste sentido, acórdãos Kerckhaert e Morres, já referido, n.° 20, e de 15 de abril de 2010, CIBA, C-96/08, Colet., p. I-2911, n.° 25).

65      Atendendo às considerações precedentes, há que responder à primeira questão que os artigos 49.° TFUE e 63.° TFUE devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação de um Estado-Membro que aplica o método de isenção aos dividendos de origem nacional e o método de imputação aos dividendos de origem estrangeira, quando, por um lado, o crédito de imposto de que beneficia a sociedade beneficiária dos dividendos no âmbito do método de imputação for equivalente ao montante do imposto efetivamente pago pelos lucros subjacentes aos dividendos distribuídos e, por outro, o nível de tributação efetivo dos lucros das sociedades no Estado-Membro em causa for, em geral, inferior à taxa de tributação nominal prevista.

 Quanto à segunda questão

66      Com a sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se as respostas dadas pelo Tribunal de Justiça à segunda e quarta questões no acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido, também são válidas, por um lado, quando o imposto sobre as sociedades estrangeiro a que estão sujeitos os lucros subjacentes aos dividendos distribuídos não tiver sido, ou não tiver sido inteiramente, pago pela sociedade não residente que pagou os referidos dividendos à sociedade residente, mas por uma sociedade residente num Estado-Membro, filial direta ou indireta da primeira sociedade, e, por outro, quando o ACT não tiver sido pago pela sociedade residente que recebeu os dividendos de uma sociedade não residente, mas pela sua sociedade-mãe residente no âmbito do regime da tributação de grupo.

67      No acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido, o Tribunal de Justiça respondeu à segunda e quarta questões que os artigos 49.° TFUE e 63.° TFUE se opõem:

¾        a uma legislação de um Estado-Membro que permite a uma sociedade residente que recebe dividendos de outra sociedade residente deduzir ao montante de que é devedora, a título de pagamento antecipado do imposto sobre as sociedades, o montante do referido imposto pago antecipadamente pela segunda sociedade, ao passo que, no caso de uma sociedade residente que recebe dividendos de uma sociedade não residente, essa dedução não é permitida no que diz respeito ao imposto correspondente aos lucros distribuídos pago por esta última sociedade no seu Estado de residência;

¾        a uma legislação de um Estado-Membro que, ao mesmo tempo que isenta do pagamento antecipado do imposto sobre as sociedades as sociedades residentes que distribuem aos seus acionistas dividendos provenientes de dividendos de origem nacional que receberam, concede às sociedades residentes que distribuem aos seus acionistas dividendos provenientes de dividendos de origem estrangeira que receberam a faculdade de optarem por um regime que lhes permite recuperar o imposto sobre as sociedades pago antecipadamente, mas, por um lado, obriga essas sociedades a pagar o referido imposto antecipado e, seguidamente, a pedir o respetivo reembolso e, por outro, não concede um crédito de imposto aos seus acionistas, ao passo que estes teriam direito a esse crédito de imposto no caso de uma distribuição efetuada por uma sociedade residente com base em dividendos de origem nacional.

68      Em primeiro lugar, importa recordar que, por força da legislação em causa no processo principal, quando os dividendos são distribuídos fora do regime da tributação de grupo, a sociedade residente que procede à distribuição está obrigada a pagar o ACT, que constitui uma forma de pagamento antecipado do imposto sobre as sociedades. Por consequência, os dividendos distribuídos sobem na hierarquia do grupo como rendimento de investimento isento, no sentido de que lhes é associado um crédito de imposto, no valor do ACT. O crédito de imposto é imputado à obrigação de as sociedades a montante na hierarquia do grupo pagarem o ACT quando da posterior distribuição de dividendos à sua sociedade-mãe imediata ou a acionistas externos. Assim, quando um dividendo é pago fora do regime de tributação de grupo, a responsabilidade pelo ACT cabe ao nível mais baixo das sociedades residentes no Reino Unido.

69      O Governo do Reino Unido considera que não é contrário aos artigos 49.° TFUE e 63.° TFUE que o imposto sobre as sociedades a que estão sujeitos os lucros subjacentes aos dividendos de origem estrangeira não possa ser deduzido do ACT devido pela sociedade-mãe residente no Reino Unido quando a filial residente noutro Estado-Membro que pagou os dividendos à sociedade-mãe residente do Reino Unido não tenha pagado, ela própria — ou não tenha pagado na totalidade — o imposto sobre as sociedades pelos lucros distribuídos, mas que esse imposto tenha sido pago por uma filial direta ou indireta da primeira filial igualmente residente num Estado-Membro. Segundo esse governo, se a sociedade não residente que distribui dividendos à sua sociedade-mãe residente no Reino Unido não tiver pagado, ela própria, o imposto sobre as sociedades a título dos lucros distribuídos, não existe tributação em cadeia dos dividendos transfronteiriços suscetível de justificar uma dedução fiscal.

70      Esta argumentação não pode ser acolhida.

71      Para o efeito, deve recordar-se que uma sociedade residente que recebe dividendos de origem estrangeira se encontra, no que se refere ao objetivo de prevenção da dupla tributação económica visado pela legislação em causa no processo principal, numa situação comparável à de uma sociedade residente que recebe dividendos de origem nacional. Tendo em conta este objetivo, resulta das respostas dadas à segunda e quarta questões do acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido, que os artigos 49.° TFUE e 63.° TFUE se opõem a uma legislação de um Estado-Membro que não tem em conta o imposto sobre as sociedades já pago pelos lucros distribuídos, apenas no que diz respeito aos dividendos de origem estrangeira.

72      Como resulta do n.° 62 do presente acórdão, com efeito, a obrigação imposta a uma sociedade residente por uma legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, de pagar o ACT quando da distribuição de lucros provenientes de dividendos de origem estrangeira só se justifica na medida em que o referido imposto antecipado corresponda ao montante destinado a compensar a taxa de tributação nominal inferior a que estão sujeitos os lucros subjacentes aos dividendos de origem estrangeira relativamente à taxa de tributação nominal aplicável aos lucros da sociedade residente.

73      Ora, a este respeito, é irrelevante que a sociedade não residente que paga os dividendos à sua sociedade-mãe residente seja, ela própria, sujeito passivo do imposto sobre as sociedades, desde que, no entanto, os lucros distribuídos tenham sido sujeitos ao imposto sobre as sociedades.

74      As respostas à segunda e quarta questões submetidas no âmbito do processo que deu origem ao acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido, não são, pois, afetadas pela constatação de que o imposto sobre as sociedades estrangeiro a que estão sujeitos os lucros subjacentes aos dividendos distribuídos não foi, ou não foi inteiramente, pago pela sociedade não residente que distribuiu os referidos dividendos à sociedade residente, mas por uma sociedade residente num Estado-Membro, filial direta ou indireta da primeira sociedade.

75      Em segundo lugar, no que se refere ao regime da tributação de grupo, como o que está em causa no litígio no processo principal, deve recordar-se que, quando os dividendos tenham sido pagos por uma sociedade residente no âmbito do dito regime, estes não foram objeto de uma obrigação a título do ACT e não foram considerados como rendimento de investimento isento na esfera da sociedade residente que os recebeu.

76      Isso significa que, sempre que os dividendos foram transmitidos a montante na hierarquia do grupo sem qualquer obrigação de pagar o ACT, quando a última sociedade-mãe residente procedeu ao pagamento dos dividendos aos acionistas externos ao grupo, não dispunha de nenhum crédito de imposto a imputar à sua obrigação de pagar ACT e, consequentemente, ficou obrigada ao respetivo pagamento a título destes dividendos. No entanto, as disposições do sistema de ACT permitem à última sociedade-mãe transferir para as suas filiais residentes qualquer excedente de ACT a seu cargo e imputá-lo à responsabilidade fiscal global do grupo (v. acórdão de 8 de março de 2001, Metallgesellschaft e o., C-397/98 e C-410/98, Colet., p. I-1727, n.os 21 a 25).

77      Segundo o Governo do Reino Unido, a legislação nacional relativa ao regime da tributação de grupo é compatível com os artigos 49.° TFUE e 63.° TFUE uma vez que a sociedade residente que recebe dividendos de uma sociedade não residente beneficia de uma isenção de ACT. Não estando a referida sociedade residente obrigada ao pagamento de qualquer ACT, o sistema não pode resultar em nenhuma dupla tributação económica.

78      A este respeito, há que concluir que o regime da tributação de grupo tem por efeito transferir o pagamento do ACT — isto é, do imposto sobre as sociedades antecipado — a montante na hierarquia do grupo. No âmbito de um regime desta natureza, a obrigação, nomeadamente, de a sociedade-mãe residente do grupo pagar o ACT no momento da distribuição de dividendos aos acionistas externos ao grupo é que apresenta o risco de gerar uma dupla tributação económica, no que se refere à parte dos lucros distribuídos correspondente a dividendos de origem estrangeira.

79      Com efeito, o pagamento do ACT sobre os lucros correspondentes a dividendos de origem estrangeira pela última sociedade-mãe residente do grupo tem como consequência, como sublinham as demandantes no processo principal e a Comissão Europeia, que os lucros distribuídos são tributados uma segunda vez a título do imposto sobre as sociedades. Esta tributação não pode ser imputada à obrigação fiscal da filial não residente que distribui esses lucros. Inversamente, num contexto puramente interno, o excedente de ACT pago pela sociedade-mãe residente pode ser transferido e imputado ao imposto sobre as sociedades de que as filiais residentes do grupo são devedoras.

80      Atendendo ao objetivo de prevenção da dupla tributação económica visado pela legislação em causa no processo principal, há que considerar que os artigos 49.° TFUE e 63.° TFUE se opõem também a uma legislação como a que está em causa no processo principal na medida em que a mesma, no âmbito do regime da tributação de grupo e no que respeita aos dividendos de origem estrangeira, não tem em conta o imposto sobre as sociedades já pago sobre os lucros distribuídos.

81      As respostas à segunda e quarta questões submetidas no âmbito do processo que deu origem ao acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido, são, consequentemente, as mesmas quando o ACT não tenha sido pago pela sociedade residente que recebe os dividendos de uma sociedade não residente, mas pela sua sociedade-mãe residente no âmbito do regime da tributação de grupo.

82      Nestas condições, há que responder à segunda questão que as respostas dadas pelo Tribunal de Justiça à segunda e quarta questões submetidas no âmbito do processo que deu origem ao acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido, são também válidas quando:

¾        o imposto sobre as sociedades estrangeiro a que estão sujeitos os lucros subjacentes aos dividendos distribuídos não tenha sido, ou não tenha sido inteiramente, pago pela sociedade não residente que pagou os referidos dividendos à sociedade residente, mas por uma sociedade residente num Estado-Membro, filial direta ou indireta da primeira sociedade;

¾        o ACT não tenha sido pago pela sociedade residente que recebeu os dividendos de uma sociedade não residente, mas pela sua sociedade-mãe residente no âmbito do regime da tributação de grupo.

 Quanto à terceira questão

83      Com a sua terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se o direito da União deve ser interpretado no sentido de que uma sociedade-mãe que, no âmbito do regime da tributação de grupo, foi obrigada a pagar o ACT sobre a parte do seu lucro proveniente de dividendos de origem estrangeira, em violação das normas do direito da União, pode propor uma ação de reembolso do imposto indevidamente cobrado ou se apenas se pode prevalecer de uma ação de indemnização por perdas e danos.

84      A este respeito, deve recordar-se que o direito de obter o reembolso dos impostos cobrados por um Estado-Membro em violação do direito da União é a consequência e o complemento dos direitos conferidos aos particulares pelas disposições do direito da União que proíbem tais impostos. Por conseguinte, o Estado-Membro tem, em princípio, de reembolsar os impostos cobrados em violação do direito da União (acórdão de 6 de setembro de 2011, Lady & Kid e o., C-398/09, Colet., p. I-7375, n.° 17 e jurisprudência referida).

85      Ora, resulta da resposta à segunda questão que uma legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, destinada a prevenir a dupla tributação económica dos lucros distribuídos é incompatível com o direito da União na medida em que essa legislação, no âmbito do regime da tributação de grupo e no que respeita aos dividendos provenientes de outros Estados, não tenha em conta o imposto sobre as sociedades já pago sobre os lucros a partir dos quais os referidos dividendos foram pagos.

86      Como resulta dos n.os 62 e 72 do presente acórdão, a obrigação imposta a uma sociedade residente de pagar o ACT quando da distribuição de lucros provenientes de dividendos de origem estrangeira só se justifica na medida em que o referido imposto antecipado corresponda ao montante destinado a compensar a taxa de tributação nominal inferior a que estão sujeitos os lucros subjacentes aos dividendos de origem estrangeira relativamente à taxa de tributação nominal aplicável aos lucros da sociedade residente.

87      Por conseguinte, há que responder à terceira questão que o direito da União deve ser interpretado no sentido de que uma sociedade-mãe residente num Estado-Membro que, no âmbito do regime da tributação de grupo, como o que está em causa no processo principal, tenha sido obrigada a pagar o ACT sobre parte dos lucros provenientes de dividendos de origem estrangeira, em violação das normas do direito da União, pode propor uma ação de reembolso desse imposto indevidamente cobrado na medida em que este ultrapasse o imposto sobre as sociedades adicional que o Estado-Membro em causa podia legalmente cobrar para compensar a taxa de tributação nominal inferior a que estão sujeitos os lucros subjacentes aos dividendos de origem estrangeira relativamente à taxa de tributação nominal aplicável aos lucros da sociedade-mãe residente.

 Quanto à quarta questão

88      Com a sua quarta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se o direito da União deve ser interpretado no sentido de que uma sociedade residente num Estado-Membro que detenha uma participação numa sociedade residente num país terceiro, que lhe confere uma influência certa nas decisões desta última sociedade e lhe permite determinar as suas atividades, pode invocar o artigo 63.° TFUE para pôr em causa a conformidade com o direito da União de uma legislação do referido Estado-Membro relativa ao tratamento fiscal de dividendos de origem estrangeira, não exclusivamente aplicável às situações em que a sociedade-mãe exerce uma influência decisiva na sociedade que procede à distribuição dos dividendos.

89      A este respeito, há que recordar que o tratamento fiscal de dividendos é suscetível de estar abrangido pelo âmbito de aplicação do artigo 49.° TFUE, relativo à liberdade de estabelecimento, e do artigo 63.° TFUE, relativo à livre circulação de capitais (acórdãos, já referidos, Haribo Lakritzen Hans Riegel e Österreichische Salinen, n.° 33, e Accor, n.° 30).

90      Quanto à questão de saber se uma legislação nacional está abrangida por uma ou outra das liberdades de circulação, resulta de jurisprudência bem assente que se deve ter em conta o objeto da legislação em causa (acórdãos de 12 de setembro de 2006, Cadbury Scheweppes e Cadbury Scheweppes Overseas, C-196/04, Colet., p. I-7995, n.os 31 a 33; de 12 de dezembro de 2006, Test Claimants in Class IV of the Act Group Litigation, C-374/04, Colet., p. I-11673, n.os 37 e 38; de 13 de março de 2007, Test Claimants in the Thin Cap Group Litigation, C-524/04, Colet., p. I-2107, n.os 26 a 34; Haribo Lakritzen Hans Riegel e Österreichische Salinen, já referido, n.° 34; e Accor, já referido, n.° 31).

91      Uma legislação nacional que apenas é aplicável às participações que permitem exercer uma influência certa sobre as decisões duma sociedade e determinar as respetivas atividades está abrangida pelo âmbito de aplicação do artigo 49.° TFUE, relativo à liberdade de estabelecimento (v. acórdãos Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido, n.° 37; de 21 de outubro de 2010, Idryma Typou, C-81/09, Colet., p. I-10161, n.° 47; Accor, já referido, n.° 32; e de 19 de julho de 2012, Scheunemann, C-31/11, n.° 23).

92      Em contrapartida, disposições nacionais aplicáveis a participações efetuadas com a única finalidade de realizar uma aplicação financeira sem intenção de influenciar a gestão e o controlo da empresa devem ser examinadas exclusivamente à luz da liberdade de circulação de capitais (acórdãos, já referidos, Haribo Lakritzen Hans Riegel e Österreichische Salinen, n.° 35; Accor, n.° 32; e Scheunemann, n.° 23).

93      A legislação nacional em causa no processo principal é aplicável não apenas aos dividendos recebidos por uma sociedade residente com base numa participação que confere uma influência certa nas decisões da filial que procede à distribuição dos ditos dividendos e que permite determinar as respetivas atividades mas também aos dividendos recebidos com base numa participação que não confere essa influência. Uma vez que a legislação nacional se refere a dividendos com origem num Estado-Membro, o objeto da dita legislação não permite, por conseguinte, determinar se a mesma está abrangida, de forma preponderante, pelo âmbito de aplicação do artigo 49.° TFUE ou do artigo 63.° TFUE.

94      Nestas circunstâncias, o Tribunal de Justiça tem em conta os elementos factuais do caso concreto para determinar se a situação visada pelo litígio no processo principal está abrangida pelo âmbito de aplicação de uma ou outra das referidas disposições (v., neste sentido, acórdãos Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido, n.os 37 e 38; de 26 de junho de 2008, Burda, C-284/06, Colet., p. I-4571, n.os 71 e 72; e de 21 de janeiro de 2010, SGI, C-311/08, Colet., p. I-487, n.os 33 a 37).

95      Assim, no n.° 37 do acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido, o Tribunal de Justiça declarou que os processos escolhidos como processos «piloto» no âmbito do litígio pendente no órgão jurisdicional de reenvio são relativos a sociedades residentes no Reino Unido que receberam dividendos de sociedades estabelecidas noutros Estados-Membros que controlam a 100%. Uma vez que se trata de uma participação que confere ao seu detentor uma influência certa nas decisões da sociedade que procede à distribuição de dividendos e lhe permite determinar as respetivas atividades, o Tribunal de Justiça considerou que as disposições do Tratado relativas à liberdade de estabelecimento são aplicáveis aos referidos processos «piloto».

96      No entanto, num contexto como o que está em causa no processo principal, relativo ao tratamento fiscal de dividendos originários de um país terceiro, importa considerar que o exame do objeto de uma legislação nacional é suficiente para apreciar se o tratamento fiscal de dividendos originários de um país terceiro está abrangido pelo âmbito de aplicação das disposições do Tratado relativas à livre circulação de capitais.

97      Com efeito, uma vez que o capítulo do Tratado relativo à liberdade de estabelecimento não contém nenhuma disposição que estenda o âmbito de aplicação das suas disposições a situações que respeitem ao estabelecimento de uma sociedade de um Estado-Membro num país terceiro ou ao de uma sociedade de um país terceiro num Estado-Membro (v. acórdãos Holböck, já referido, n.° 28; de 3 de outubro de 2006, Fidium Finanz, C-452/04, Colet., p. I-9521, n.° 25; e Scheunemann, já referido, n.° 33; e despachos de 10 de maio de 2007, A e B, C-102/05, Colet., p. I-3871, n.° 29, e Test Claimants in the CFC and Dividend Group Litigation, já referido, n.° 88), uma legislação relativa ao tratamento fiscal de dividendos originários de países terceiros não é suscetível de se enquadrar no âmbito de aplicação do artigo 49.° TFUE.

98      Quando resulte do objeto de uma legislação nacional desta natureza que a mesma só é aplicável às participações que permitam exercer uma influência certa sobre as decisões da sociedade em causa e determinar as respetivas atividades, os artigos 49.° TFUE e 63.° TFUE não podem ser invocados (acórdão Test Claimants in the Thin Cap Group Litigation, já referido, n.os 33, 34, 101 e 102, e despacho de 10 de maio de 2007, Lasertec, C-492/04, Colet., p. I-3775, n.os 22 e 27; v., também, despacho A e B, já referido, n.os 4 e 25 a 28).

99      Pelo contrário, uma legislação nacional relativa ao tratamento fiscal de dividendos de um país terceiro, que não se aplique exclusivamente às situações em que a sociedade-mãe exerce uma influência decisiva na sociedade que procede à distribuição dos dividendos, deve ser apreciada à luz do artigo 63.° TFUE. Por conseguinte, uma sociedade residente num Estado-Membro pode invocar esta disposição para questionar a legalidade de uma legislação deste tipo, independentemente da dimensão da participação que detém na sociedade que procede à distribuição de dividendos estabelecida num país terceiro (v., neste sentido, acórdão A, já referido, n.os 11 e 27).

100    Uma vez que o Tratado não estende a liberdade de estabelecimento aos países terceiros, importa evitar que a interpretação do artigo 63.°, n.° 1, TFUE, no que diz respeito às relações com países terceiros, permita que os operadores económicos que não se enquadram no âmbito de aplicação territorial da liberdade de estabelecimento beneficiem dela. Esse risco não existe numa situação como a que está em causa no processo principal. Com efeito, a legislação do Estado-Membro em causa não visa as condições de acesso ao mercado de uma sociedade do referido Estado-Membro num país terceiro ou de uma sociedade de um país terceiro no referido Estado-Membro. Essa legislação diz respeito unicamente ao tratamento fiscal de dividendos que decorrem de investimentos que o seu beneficiário efetuou numa sociedade estabelecida num país terceiro.

101    Importa acrescentar que a argumentação dos Governos do Reino Unido, alemão, francês e neerlandês, segundo a qual a liberdade aplicável ao tratamento fiscal de dividendos originários de países terceiros depende não só do objeto da legislação nacional em causa no processo principal mas também das circunstâncias particulares do processo principal, produziria efeitos incompatíveis com o artigo 64.°, n.° 1, TFUE.

102    Com efeito, resulta desta disposição que estão abrangidos, em princípio, pelo artigo 63.° TFUE, relativo à livre circulação de capitais, os movimentos de capitais que impliquem um estabelecimento ou investimentos diretos. Estes últimos conceitos referem-se a uma forma de participação numa empresa através da detenção de ações que confere a possibilidade de participar efetivamente na sua gestão e no seu controlo (v. acórdãos, já referidos, Glaxo Wellcome, n.° 40, e Idryma Typou, n.° 48).

103    Segundo a jurisprudência, as restrições aos movimentos de capitais que envolvem um estabelecimento ou investimentos diretos na aceção do artigo 64.°, n.° 1, TFUE abrangem não só as medidas nacionais que, quando aplicadas a movimentos de capitais com destino a países terceiros ou deles provenientes, restringem o estabelecimento ou os investimentos mas também as que restringem os pagamentos de dividendos deles decorrentes (acórdãos, já referidos, Test Claimants in the FII Group Litigation, n.° 183, e Holböck, n.° 36).

104    Atendendo às considerações precedentes, há que responder à quarta questão que o direito da União deve ser interpretado no sentido de que uma sociedade residente num Estado-Membro e que detenha uma participação numa sociedade residente num país terceiro que lhe confere uma influência certa nas decisões desta última sociedade e lhe permite determinar as suas atividades pode invocar o artigo 63.° TFUE para pôr em causa a conformidade com esta disposição de uma legislação do referido Estado-Membro relativa ao tratamento fiscal de dividendos originários do referido país terceiro, não exclusivamente aplicável às situações em que a sociedade-mãe exerce uma influência decisiva na sociedade que procede à distribuição dos dividendos.

 Quanto à quinta questão

105    Com a sua quinta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende, no essencial, saber se a resposta dada pelo Tribunal de Justiça à terceira questão submetida no processo que deu origem ao acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido, também se aplica quando as filiais estabelecidas noutros Estados-Membros, a favor das quais não pôde ser efetuada nenhuma transferência do ACT, não sejam tributadas no Estado-Membro da sociedade-mãe.

106    Há que recordar que o Tribunal de Justiça concluiu, no acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido, em resposta à terceira questão do órgão jurisdicional de reenvio, que o artigo 49.° TFUE se opõe a uma legislação de um Estado-Membro que permite que uma sociedade residente transfira para filiais residentes o montante do ACT que não pode ser imputado ao imposto sobre as sociedades devido por essa primeira sociedade a título de determinado exercício contabilístico ou de exercícios contabilísticos anteriores ou posteriores, a fim de que essas filiais possam imputá-lo ao imposto sobre as sociedades de que são devedoras, mas que não permite a uma sociedade residente transferir esse montante para filiais não residentes quando estas sejam tributadas nesse Estado-Membro sobre os lucros que aí tenham realizado.

107    As demandantes no processo principal sustentam que esta resposta do Tribunal de Justiça também é válida quando os lucros de filiais não residentes que não possam ser objeto dessa transferência do excedente de ACT não sejam tributados no Estado-Membro da sociedade-mãe, mas sejam tributados noutros Estados-Membros. Em seu entender, seria contrário aos objetivos prosseguidos pela legislação nacional em causa limitar o mecanismo da transferência do excedente de ACT às filiais sujeitas a imposto no Reino Unido. O regime nacional em causa no processo principal deveria prever a possibilidade de confrontar o ACT pago pela sociedade-mãe com o imposto sobre as sociedades estrangeiro suportado pela filial que distribui os dividendos e deveria permitir o reembolso do excedente de ACT para evitar uma tributação em cadeia das sociedades do grupo.

108    A este respeito, como sublinha a Comissão, há que distinguir entre o ACT cobrado ilegalmente pelo Estado-Membro em causa, em violação das liberdades consagradas pelo Tratado, e o ACT que, como resulta dos n.os 62 e 72 do presente acórdão, pode ser legitimamente cobrado a uma sociedade residente que tenha recebido dividendos de origem estrangeira porque corresponde ao imposto sobre as sociedades adicional devido para compensar a taxa de tributação nominal inferior a que foram sujeitos os lucros subjacentes aos dividendos de origem estrangeira relativamente à taxa de tributação nominal aplicável aos lucros da sociedade residente.

109    Resulta da resposta dada à terceira questão do presente processo que o ACT cobrado ilegalmente deve ser reembolsado.

110    Em contrapartida, no que respeita ao ACT correspondente ao imposto sobre as sociedades adicional que o Estado-Membro em causa tinha o direito de cobrar, há que recordar que o ACT é um pagamento antecipado do imposto sobre as sociedades no Reino Unido. O direito de ceder o excedente de ACT a filiais garante que um grupo de sociedades tributadas no Reino Unido não pague imposto — pelo simples facto da existência do ACT — em montante superior à dívida fiscal global com origem no Reino Unido. O alargamento do referido direito às sociedades não residentes que não estão sujeitas a imposto no Reino Unido, que conduziria ao reembolso do excedente de ACT, privaria, de facto, o Reino Unido do direito de cobrar um imposto adicional pelos dividendos de origem estrangeira pagos a partir de lucros que estão sujeitos a uma taxa de tributação nominal inferior à aplicável no Reino Unido e comprometeria, desta forma, uma repartição equilibrada do poder de tributação entre os Estados-Membros (v., neste sentido, acórdão de 30 de junho de 2011, Meilicke e o., C-262/09, Colet., p. I-5669, n.° 33 e jurisprudência referida).

111    Por conseguinte, há que responder à quinta questão que a resposta dada pelo Tribunal de Justiça à terceira questão submetida no âmbito do processo que deu origem ao acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido, não se aplica quando as filiais estabelecidas noutros Estados-Membros, a favor das quais não pode ser efetuada nenhuma transferência de ACT, não sejam tributadas no Estado-Membro da sociedade-mãe.

 Quanto às despesas

112    Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) declara:

1)      Os artigos 49.° TFUE e 63.° TFUE devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação de um Estado-Membro que aplica o método de isenção aos dividendos de origem nacional e o método de imputação aos dividendos de origem estrangeira, quando, por um lado, o crédito de imposto de que beneficia a sociedade beneficiária dos dividendos no âmbito do método de imputação for equivalente ao montante do imposto efetivamente pago pelos lucros subjacentes aos dividendos distribuídos e, por outro, o nível de tributação efetivo dos lucros das sociedades no Estado-Membro em causa for, em geral, inferior à taxa de tributação nominal prevista.

2)      As respostas dadas pelo Tribunal de Justiça à segunda e quarta questões submetidas no âmbito do processo que deu origem ao acórdão de 12 de dezembro de 2006, Test Claimants in the FII Group Litigation (C-446/04), são também válidas quando:

¾        o imposto sobre as sociedades estrangeiro a que estão sujeitos os lucros subjacentes aos dividendos distribuídos não tenha sido, ou não tenha sido inteiramente, pago pela sociedade não residente que pagou os referidos dividendos à sociedade residente, mas por uma sociedade residente num Estado-Membro, filial direta ou indireta da primeira sociedade;

¾        o imposto sobre as sociedades antecipado não tenha sido pago pela sociedade residente que recebeu os dividendos de uma sociedade não residente, mas pela sua sociedade-mãe residente no âmbito do regime da tributação de grupo.

3)      O direito da União deve ser interpretado no sentido de que uma sociedade-mãe residente num Estado-Membro que, no âmbito do regime da tributação de grupo, como o que está em causa no processo principal, tenha sido obrigada a pagar o imposto sobre as sociedades antecipado sobre parte dos lucros provenientes de dividendos de origem estrangeira, em violação das normas do direito da União, pode propor uma ação de reembolso desse imposto indevidamente cobrado na medida em que este ultrapasse o imposto sobre as sociedades adicional que o Estado-Membro em causa podia legalmente cobrar para compensar a taxa de tributação nominal inferior a que estão sujeitos os lucros subjacentes aos dividendos de origem estrangeira relativamente à taxa de tributação nominal aplicável aos lucros da sociedade-mãe residente.

4)      O direito da União deve ser interpretado no sentido de que uma sociedade residente num Estado-Membro e que detenha uma participação numa sociedade residente num país terceiro que lhe confere uma influência certa nas decisões desta última sociedade e lhe permite determinar as suas atividades pode invocar o artigo 63.° TFUE para pôr em causa a conformidade com esta disposição de uma legislação do referido Estado-Membro relativa ao tratamento fiscal de dividendos originários do referido país terceiro, não exclusivamente aplicável às situações em que a sociedade-mãe exerce uma influência decisiva na sociedade que procede à distribuição dos dividendos.

5)      A resposta dada pelo Tribunal de Justiça à terceira questão submetida no âmbito do processo que deu origem ao acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido, não se aplica quando as filiais estabelecidas noutros Estados-Membros, a favor das quais não pode ser efetuada nenhuma transferência do imposto sobre as sociedades antecipado, não sejam tributadas no Estado-Membro da sociedade-mãe.

Assinaturas


** Língua do processo: inglês.