ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)
12 de setembro de 2013 (*)
«Imposto sobre o valor acrescentado — Sexta Diretiva 77/388/CEE — Artigos 17.° e 19.° — Dedução do imposto pago a montante — Utilização de bens e de serviços tanto em operações tributadas como em operações isentas — Dedução ao pro rata — Cálculo do pro rata — Sucursais estabelecidas noutros Estados-Membros e em Estados terceiros — Não tomada em consideração do seu volume de negócios»
No processo C-388/11,
que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.° TFUE, apresentado pelo Conseil d’État (França), por decisão de 11 de julho de 2011, entrado no Tribunal de Justiça em 22 de julho de 2011, no processo
Le Crédit Lyonnais
contra
Ministre du Budget, des Comptes publics et de la Réforme de l’État,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),
composto por: A. Tizzano, presidente de secção, A. Borg Barthet, M. Ilešič, J.-J. Kasel (relator) e M. Berger, juízes,
advogado-geral: P. Cruz Villalón,
secretário: V. Tourrès, administrador,
vistos os autos e após a audiência de 27 de setembro de 2012,
vistas as observações apresentadas:
¾ em representação da Le Crédit Lyonnais, por C. Aldebert, E. Ashworth e C. Reinbold, avocats,
¾ em representação do Governo francês, por G. de Bergues e J.-S. Pilczer, na qualidade de agentes,
¾ em representação do Governo cipriota, por E. Symeonidou, na qualidade de agente,
¾ em representação do Governo do Reino Unido, por L. Seeboruth e A. Robinson, na qualidade de agentes, assistidos por R. Hill, barrister,
¾ em representação da Comissão Europeia, por C. Soulay e L. Lozano Palacios, na qualidade de agentes,
ouvidas as conclusões do advogado-geral na audiência de 28 de fevereiro de 2013,
profere o presente
Acórdão
1 O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação dos artigos 17.°, n.os 2, 3 e 5, e 19.°, n.° 1, da Sexta Diretiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria coletável uniforme (JO L 145, p. 1; EE 09 F1 p. 54; a seguir «Sexta Diretiva»).
2 Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a sociedade Le Crédit Lyonnais (a seguir «LCL»), instituição de crédito com sede em França, ao Estado francês, a respeito do cálculo do pro rata de dedução do imposto sobre o valor acrescentado (a seguir «IVA») aplicável à LCL, relativo ao período compreendido entre 1 de janeiro de 1988 e 31 de dezembro de 1990.
Quadro jurídico
Regulamentação da União
3 O artigo 2.° da Sexta Diretiva enuncia:
«Estão sujeitas ao [IVA]:
1. As entregas de bens e as prestações de serviços, efetuadas a título oneroso, no território do país, por um sujeito passivo agindo nessa qualidade;
[...]»
4 O artigo 4.°, n.os 1 e 2, desta diretiva estabelece:
«1. Por ‘sujeito passivo’ entende-se qualquer pessoa que exerça, de modo independente, em qualquer lugar, uma das atividades económicas referidas no n.° 2, independentemente do fim ou do resultado dessa atividade.
2. As atividades económicas referidas no n.° 1 são todas as atividades de produção, de comercialização ou de prestação de serviços, incluindo as atividades extrativas, agrícolas e as das profissões liberais ou equiparadas. A exploração de um bem corpóreo ou incorpóreo com o fim de auferir receitas com caráter de permanência é igualmente considerada uma atividade económica.»
5 O artigo 9.°, n.° 1, da referida diretiva tem a seguinte redação:
«Por ‘lugar da prestação de serviços’ entende-se o lugar onde o prestador dos mesmos tenha a sede da sua atividade económica ou um estabelecimento estável a partir do qual os serviços são prestados ou, na falta de sede ou de estabelecimento estável, o lugar do seu domicílio ou da sua residência habitual.»
6 O artigo 13.°, B, da Sexta Diretiva enuncia:
«Sem prejuízo de outras disposições comunitárias, os Estados-Membros isentarão, nas condições por eles fixadas com o fim de assegurar a aplicação correta e simples das isenções a seguir enunciadas e de evitar qualquer possível fraude, evasão e abuso:
[…]
d) As seguintes operações:
1. A concessão e a negociação de créditos, e bem assim a gestão de créditos efetuada por parte de quem os concedeu;
2. A negociação e a aceitação de compromissos, fianças e outras garantias, e bem assim a gestão de garantias de crédito efetuada por parte de quem concedeu esses créditos;
3. As operações, incluindo a negociação relativa a depósitos de fundos, contas-correntes, pagamentos, transferências, créditos, cheques e outros efeitos de comércio, com exceção da cobrança de dívidas;
4. As operações, incluindo a negociação, relativas a divisas, papel-moeda e moeda com valor liberatório, com exceção de moedas e notas de coleção; consideram-se de coleção as moedas de ouro, de prata ou de outro metal, e bem assim as notas, que não são normalmente utilizadas pelo seu valor liberatório ou que apresentam um interesse numismático;
5. As operações, incluindo a negociação, mas excetuando a guarda e a gestão, relativas às ações, participações em sociedades ou em associações, obrigações e demais títulos, com exclusão:
¾ dos títulos representativos de mercadorias,
¾ dos direitos ou títulos referidos no n.° 3 do artigo 5.°;
6. A gestão de fundos comuns de investimento, tal como são definidos pelos Estados-Membros;
[…]»
7 O artigo 17.° desta diretiva dispõe:
«1. O direito à dedução surge no momento em que o imposto dedutível se torna exigível.
2. Desde que os bens e os serviços sejam utilizados para os fins das próprias operações tributáveis, o sujeito passivo está autorizado a deduzir do imposto de que é devedor:
a) O [IVA] devido ou pago em relação a bens que lhe tenham sido fornecidos ou que lhe devam ser fornecidos e a serviços que lhe tenham sido prestados ou que lhe devam ser prestados por outro sujeito passivo;
b) O [IVA] devido ou pago em relação a bens importados;
c) O [IVA] devido nos termos do n.° 7, alínea a), do artigo 5.° e do n.° 3 do artigo 6.°
3. Os Estados-Membros concedem igualmente a todos os sujeitos passivos a dedução ou o reembolso do [IVA], previsto no n.° 2, na medida em que os bens e os serviços sejam utilizados para efeitos:
a) Das operações relativas às atividades económicas previstas no n.° 2 do artigo 4.°, efetuadas no estrangeiro, que teriam conferido direito à dedução se essas operações tivessem sido realizadas no território do país;
b) Das operações isentas nos termos do n.° 1, alínea i), do artigo 14.°, do artigo 15.°, e do n.° 1, B), C) e D), e do n.° 2 do artigo 16.°;
c) Das operações isentas nos termos do disposto em B), a) e d), 1 a 5, do artigo 13.°, quando o destinatário se encontre estabelecido fora da Comunidade ou quando tais operações estejam diretamente conexas com bens que se destinam a ser exportados para um país fora da Comunidade.
[…]
5. No que diz respeito aos bens e aos serviços utilizados por um sujeito passivo, não só para operações com direito à dedução, previstas nos n.os 2 e 3, como para operações sem direito à dedução, a dedução só é concedida relativamente à parte do [IVA] proporcional ao montante respeitante à primeira categoria de operações.
Este pro rata é determinado nos termos do artigo 19.°, para o conjunto das operações efetuadas pelo sujeito passivo.
Todavia, os Estados-Membros podem:
a) Autorizar o sujeito passivo a determinar um pro rata para cada setor da respetiva atividade, se possuir contabilidades distintas para cada um desses setores;
b) Obrigar o sujeito passivo a determinar um pro rata para cada setor da respetiva atividade e a manter contabilidades distintas para cada um desses setores;
c) Autorizar ou obrigar o sujeito passivo a efetuar a dedução com base na utilização da totalidade ou de parte dos bens e dos serviços;
d) Autorizar ou obrigar o sujeito passivo a efetuar a dedução, em conformidade com a regra estabelecida no primeiro parágrafo deste número, relativamente aos bens e serviços utilizados nas operações aí referidas;
e) Estabelecer que não se tome em consideração o [IVA] que não pode ser deduzido pelo sujeito passivo, quando o montante respetivo for insignificante.
[…]»
8 O artigo 19.°, n.os 1 e 2, da Sexta Diretiva dispõe:
«1. O pro rata de dedução, previsto no n.° 5, primeiro parágrafo, do artigo 17.°, resultará de uma fração que inclui:
¾ no numerador, o montante total do volume de negócios anual, líquido de [IVA], relativo às operações que conferem direito à dedução nos termos dos n.os 2 e 3 do artigo 17.°;
¾ no denominador, o montante total do volume de negócios anual, líquido do [IVA], relativo às operações incluídas no numerador e às operações que não conferem direito à dedução. Os Estados-Membros podem incluir, igualmente, no denominador, o montante das subvenções que não sejam as referidas em A, 1, a) do artigo 11.°
O pro rata é determinado numa base anual e fixado em percentagem arredondada para a unidade imediatamente superior.
2. Em derrogação do disposto no n.° 1, no cálculo de pro rata de dedução, não se toma em consideração o montante do volume de negócios relativo às entregas de bens de investimento utilizados pelo sujeito passivo na respetiva empresa. Não é igualmente tomado em consideração o montante do volume de negócios relativo às operações acessórias imobiliárias e financeiras ou às operações referidas na letra B, alínea d), do artigo 13.° quando se trate de operações acessórias. Sempre que os Estados-Membros façam uso da faculdade prevista no n.° 5 do artigo 20.°, de não exigirem o ajustamento em relação aos bens de investimento, podem incluir o produto da cessão desses bens no cálculo do pro rata de dedução.»
Regulamentação francesa
9 O artigo 271.° do Código Geral dos Impostos, na sua versão aplicável à época dos factos no processo principal (code général des impôts, a seguir «CGI»), previa:
«4. Conferem direito à dedução nas mesmas condições que se estivessem sujeitos a [IVA]:
[...]
b) os serviços bancários e financeiros isentos ao abrigo do artigo 261.° C, n.° 1, alíneas a) a e), quando são prestados a pessoas domiciliadas ou estabelecidas fora da Comunidade Económica Europeia ou são relativos a exportações de bens para países que não sejam os Estados-Membros da Comunidade.»
10 Nos termos do artigo 212.° do anexo II do CGI:
«Os sujeitos passivos que não realizem exclusivamente operações que confiram direito à dedução são autorizados a deduzir uma fração do [IVA] que tenha onerado os bens que constituem imobilizações, igual ao montante desse imposto multiplicado pelo coeficiente resultante da relação existente entre o montante anual das receitas respeitantes a operações que confiram direito à dedução e o montante anual das receitas relativas ao conjunto das operações realizadas […]»
11 O artigo 213.° do anexo II do CGI previa:
«Quando um sujeito passivo tem setores de atividade que não estão sujeitos a disposições idênticas relativamente ao [IVA], esses setores são objeto de contas separadas para efeitos da aplicação do direito à dedução.
Cada imóvel, conjunto de imóveis ou fração de imóvel composto por habitações sociais destinadas ao arrendamento cuja entrega é, em si mesma, tributável em aplicação do artigo 257.°, 7.°, 1, c, do [CGI] constitui um setor de atividade.
O montante do imposto dedutível relativo a bens comuns aos diferentes setores é determinado por aplicação da relação prevista no artigo 212.°»
12 O artigo 219.° do anexo II do CGI tinha a seguinte redação:
«Os sujeitos passivos que não efetuem exclusivamente operações que confiram direito à dedução estão autorizados a deduzir o [IVA] que onerou estes mesmos bens e serviços nos seguintes limites:
a. Quando esses bens e serviços sejam utilizados exclusivamente para a realização de operações que confiram um direito à dedução, o imposto que as onerou é dedutível;
b. Quando sejam utilizados exclusivamente para a realização de operações que não confiram um direito à dedução, o imposto que as onerou não é dedutível;
c. Quando a sua utilização conduza simultaneamente à realização de operações que conferem direito à dedução e de operações que não conferem esse direito, é dedutível uma fração do imposto que as onerou. Esta fração é determinada nas condições previstas nos artigos 212.° a 214.°»
Litígio no processo principal e questões prejudiciais
13 A LCL é uma instituição bancária com sede em França e sucursais em Estados-Membros da União Europeia e em Estados terceiros.
14 Na sequência de uma fiscalização da contabilidade da LCL relativa ao período compreendido entre 1 de janeiro de 1988 e 31 de dezembro de 1989, e de dois avisos de liquidação, a Administração Fiscal remeteu-lhe avisos de liquidação adicional, designadamente de IVA, relativos ao período mencionado. Estes avisos de liquidação adicional resultam da recusa dessa Administração, contrariamente ao que tinha feito a LCL nas suas declarações, de tomar em conta o montante dos juros dos empréstimos concedidos pela sede da LCL às suas sucursais estabelecidas fora do território francês no numerador e no denominador do pro rata de dedução previsto em matéria de IVA no artigo 212.° do anexo II do CGI.
15 Em 20 de julho de 1994, a LCL apresentou uma primeira reclamação contra os referidos avisos de liquidação adicional, alegando que o montante dos juros em causa podia ser tido em conta no cálculo do pro rata de dedução do IVA. Em 31 de dezembro de 1996, apresentou uma segunda reclamação, pedindo a restituição dos montantes que considerava ter pagado em excesso relativamente aos períodos em causa e dos montantes que tinha pagado, em 1990 e em 1991, relativamente ao período compreendido entre 1 de janeiro e 31 de dezembro de 1990, alegando que, se o montante dos juros cobrados pela sede às sucursais não podia ser tido em conta pelo facto de a sede, com as suas sucursais estrangeiras, constituir uma única entidade jurídica, então as receitas das operações que estas últimas efetuam com terceiros deveriam ser consideradas como suas e tidas em conta no cálculo do pro rata de dedução que lhe era aplicado.
16 Tendo a Administração Fiscal indeferido estas reclamações, a LCL intentou uma ação no tribunal administratif de Paris. Por sentença de 5 de outubro de 2004, a mesma foi julgada improcedente. Tendo sido igualmente negado provimento ao recurso desta decisão, a LCL interpôs no Conseil d’État um recurso de cassação.
17 Em apoio do seu recurso, a LCL alega que, para determinar o pro rata de dedução das despesas da sua sede em matéria de IVA, há que tomar em consideração as receitas das suas sucursais instaladas nos outros Estados-Membros da União e nos Estados terceiros, uma vez que estas sucursais, na sequência do acórdão de 23 de março de 2006, FCE Bank (C-210/04, Colet., p. I-2803), devem ser consideradas, juntamente com esta sede, no que respeita às relações que mantêm, como um sujeito passivo único.
18 Alega que, ao considerar, por um lado, que as sucursais estabelecidas num Estado-Membro da União estão, elas próprias, sujeitas ao IVA e têm em conta, para determinar o seu próprio pro rata, as referidas receitas, as quais não podem, por isso, fundamentar novo direito a dedução em benefício da sede, e, por outro lado, que as sucursais estabelecidas fora da União, que podem não estar sujeitas ao IVA ou estar sujeitas a outras regras, constituem «setores de atividade distintos» para o exercício do direito a dedução, a cour administrative d’appel de Paris adotou uma interpretação incompatível com o princípio comunitário da neutralidade do sistema comum do IVA.
19 Nestas circunstâncias, o Conseil d’État decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:
«1) Tendo em conta as regras relativas ao âmbito de aplicação territorial do [IVA], os n.os 2 e 5 do artigo 17.° e o artigo 19.° da Sexta Diretiva […] podem ser interpretados no sentido de que, para o cálculo do pro rata, a sede de uma sociedade estabelecida num Estado-Membro deve ter em conta as receitas auferidas por cada uma das suas sucursais estabelecidas noutro Estado-Membro e, inversamente, essas sucursais devem ter em conta o total das receitas obtidas pela sociedade que estejam abrangidas pelo âmbito de aplicação do [IVA] realizadas pela sociedade?
2) Deve ser aplicada a mesma solução às sucursais estabelecidas fora da União Europeia, designadamente no que respeita ao direito à dedução previsto pelas alíneas a) e c) do n.° 3 do artigo 17.°, quando estejam em causa operações bancárias e financeiras referidas no artigo 13.°, B, alínea d), n.os 1 a 5, que sejam realizadas em benefício de destinatários estabelecidos fora da [União]?
3) A resposta às duas primeiras questões pode variar de um Estado-Membro para outro, em função das opções oferecidas pelo último parágrafo do n.° 5 do artigo 17.°, em especial no que diz respeito à constituição de setores de atividade distintos?
4) No caso de resposta afirmativa a uma das duas primeiras questões, por um lado, há que limitar a aplicação desse pro rata ao cálculo dos direitos [a] dedução do [IVA] que tenha onerado as despesas efetuadas pela sede em benefício das sucursais estrangeiras e, por outro, a tomada em consideração das receitas obtidas no estrangeiro deve ser feita segundo as regras aplicáveis no Estado da sucursal ou no Estado da sede?»
Quanto às questões prejudiciais
Quanto à primeira questão
20 A título preliminar, recorde-se que, segundo jurisprudência constante, compete ao Tribunal de Justiça, no âmbito do processo de cooperação com os órgãos jurisdicionais nacionais, instituído pelo artigo 267.° TFUE, dar ao órgão jurisdicional de reenvio uma resposta útil que lhe permita decidir o litígio que lhe foi submetido e, nesta ótica, compete ao Tribunal de Justiça, se necessário, reformular a questão que lhe foi submetida (v., designadamente, acórdão FCE Bank, já referido, n.° 21).
21 A este respeito, cabe salientar que, com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio procura saber de que maneira deve ser determinado, por um lado, o pro rata de dedução do IVA da sede de uma sociedade estabelecida em França e, por outro, o pro rata de dedução das sucursais desta sociedade estabelecidas fora desse Estado-Membro. Ora, na medida em que o litígio no processo principal apenas incide sobre a determinação do pro rata de dedução aplicável à sede da sociedade que é sujeito passivo, não é útil pronunciar-se pormenorizadamente sobre o cálculo dos pro rata de dedução aplicáveis às sucursais desta sociedade estabelecidas fora desse Estado.
22 Por conseguinte, a primeira questão deve ser entendida como visando saber, no essencial, se os artigos 17.°, n.os 2 e 5, e 19.°, n.° 1, da Sexta Diretiva devem ser interpretados no sentido de que, para a determinação do pro rata de dedução do IVA que lhe é aplicável, uma sociedade, cuja sede esteja localizada num Estado-Membro, pode tomar em consideração o volume de negócios das suas sucursais estabelecidas noutros Estados-Membros.
23 Para responder a esta questão, importa recordar que, para determinar o alcance de uma disposição de direito da União, há que ter simultaneamente em conta os seus termos, o seu contexto e os seus objetivos (v., designadamente, acórdão de 29 de outubro de 2009, NCC Construction Danmark, C-174/08, Colet., p. I-10567, n.° 23 e jurisprudência referida).
24 A este respeito, impõe-se observar que a letra dos artigos 17.°, n.os 2 e 5, e 19.°, n.° 1, da Sexta Diretiva não permite, em si mesma, afirmar que, para a determinação do pro rata de dedução do IVA que é aplicável a uma sociedade, cuja sede está localizada num Estado-Membro, essa sociedade pode tomar em consideração o volume de negócios das suas sucursais estabelecidas noutros Estados-Membros.
25 No que respeita ao contexto em que se inserem estas disposições e aos objetivos das mesmas, importa recordar que os artigos 17.° e 19.° da Sexta Diretiva fazem parte do seu título XI, consagrado ao regime das deduções.
26 O direito à dedução, previsto nos artigos 17.° e seguintes da Sexta Diretiva, faz parte integrante do mecanismo do IVA e não pode, em princípio, ser limitado (acórdãos de 6 de outubro de 2005, Comissão/França, C-243/03, Colet., p. I-8411, n.° 28 e jurisprudência referida, e de 18 de dezembro de 2008, Royal Bank of Scotland, C-488/07, Colet., p. I-10409, n.° 14).
27 O regime das deduções visa libertar inteiramente o empresário do ónus do IVA devido ou pago no âmbito de todas as suas atividades económicas. O sistema comum do IVA garante, por conseguinte, a perfeita neutralidade quanto à carga fiscal de todas as atividades económicas, quaisquer que sejam os fins ou os resultados das mesmas, na condição de as referidas atividades estarem, em princípio, elas próprias sujeitas ao IVA (v. acórdão Royal Bank of Scotland, já referido, n.° 15 e jurisprudência referida).
28 Mais especificamente, o artigo 17.°, n.° 5, da Sexta Diretiva estabelece o regime aplicável ao direito à dedução do IVA, quando respeite a bens ou serviços utilizados pelo sujeito passivo «não só para operações com direito à dedução, previstas nos n.os 2 e 3, como para operações sem direito à dedução». Em tal caso, em conformidade com o artigo 17.°, n.° 5, primeiro parágrafo, da Sexta Diretiva, a dedução só é permitida em relação à parte do IVA que é proporcional ao montante das primeiras operações tributadas (acórdão Royal Bank of Scotland, já referido, n.° 17).
29 O direito à dedução é, por força do artigo 17.°, n.° 5, segundo parágrafo, da Sexta Diretiva, calculado segundo um pro rata determinado em conformidade com o artigo 19.° dessa mesma diretiva (acórdão Royal Bank of Scotland, já referido, n.° 18).
30 Ora, importa observar que, na medida em que o cálculo do pro rata de dedução constitui um elemento do regime das deduções, as regras segundo as quais este cálculo deve ser efetuado recaem, com o referido regime de deduções, na esfera de aplicação da legislação nacional em matéria de IVA com a qual uma atividade ou uma operação deve ter conexão fiscal.
31 Com efeito, incumbe às autoridades tributárias de cada Estado-Membro fixar, como lhes permite o artigo 17.°, n.° 5, terceiro parágrafo, da Sexta Diretiva, o método de determinação do direito à dedução, autorizando que prevejam o estabelecimento de um pro rata distinto para cada setor de atividade ou a dedução consoante a afetação de toda ou parte dos bens e serviços a uma dada atividade, ou mesmo que prevejam a exclusão do direito à dedução mediante certas condições (v., neste sentido, acórdão Royal Bank of Scotland, já referido, n.° 19).
32 A constatação feita no n.° 31 do presente acórdão é aliás corroborada pela circunstância de o modo de devolução do IVA, por dedução ou por reembolso, depender unicamente do lugar do estabelecimento do sujeito passivo (v., neste sentido, acórdão de 16 de julho de 2009, Comissão/Itália, C-244/08, n.os 25 e 33).
33 Além disso, cabe precisar que o conceito de «lugar de estabelecimento» abrange não apenas a sede do sujeito passivo mas igualmente os estabelecimentos estáveis na aceção da Sexta Diretiva que ele possa ter nos outros Estados-Membros. Assim, uma sociedade que estabeleceu a sua sede num Estado-Membro e que dispõe de um estabelecimento estável noutro Estado-Membro deve, por isso, considerar-se estabelecida neste último Estado para as atividades que aí são realizadas e já não poderá requerer o reembolso do IVA na aceção da Oitava Diretiva 79/1072/CEE do Conselho, de 6 de dezembro de 1979, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — Regras sobre o reembolso do imposto sobre o valor acrescentado aos sujeitos passivos não estabelecidos no território do país (JO L 331, p. 11; EE 09 F1 p. 84), e da Décima Terceira Diretiva 86/560/CEE do Conselho, de 17 de novembro de 1986, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — Modalidades de reembolso do imposto sobre o valor acrescentado aos sujeitos passivos não estabelecidos no território da Comunidade (JO L 326, p. 40), que aí é liquidado. Incumbe ao referido estabelecimento estável requerer, junto das autoridades tributárias desse Estado, a dedução do IVA relativo às aquisições que aí são realizadas (v., neste sentido, acórdão Comissão/Itália, já referido, n.os 33 e 35).
34 Na medida em que o Tribunal de Justiça declarou que o estabelecimento estável, na aceção da Sexta Diretiva, situado num Estado-Membro, e o estabelecimento principal, situado num outro Estado-Membro, constituem um único sujeito passivo de IVA (acórdão Comissão/Itália, já referido, n.° 38), tal implica que um único sujeito passivo está subordinado, paralelamente ao regime aplicável no Estado da sua sede, a tantos regimes de deduções nacionais quantos os Estados-Membros em que disponha de estabelecimentos estáveis.
35 Ora, dado que as modalidades de cálculo do pro rata constituem um elemento fundamental do regime das deduções, não é possível, sem pôr seriamente em causa tanto a repartição racional dos âmbitos de aplicação das legislações nacionais em matéria de IVA como a razão de ser do referido pro rata, ter-se em conta o volume de negócios realizado por todos os estabelecimentos estáveis de que o referido sujeito passivo disponha nos outros Estados-Membros, para efeitos do cálculo do pro rata aplicável ao estabelecimento principal de um sujeito passivo estabelecido num Estado-Membro.
36 Esta interpretação dos artigos 17.°, n.os 2 e 5, e 19.°, n.° 1, da Sexta Diretiva é, além disso, conforme com o objetivo destas disposições.
37 Com efeito, quanto ao princípio da neutralidade do IVA, que o regime das deduções deve aplicar, é imperioso observar que, como salientou o advogado-geral nos n.os 67 a 69 das suas conclusões, não está demonstrado que o facto de permitir a um sujeito passivo que calcule o pro rata de dedução aplicável à sua sede estabelecida num Estado-Membro determinado tomando em consideração o volume de negócios realizado pelos seus estabelecimentos estáveis estabelecidos nos outros Estados-Membros seja suscetível de garantir, em todos os casos, um melhor respeito do referido princípio relativamente a um sistema que preveja que um sujeito passivo deve determinar um pro rata de dedução separado, em cada Estado-Membro em que se possa considerar que detém um estabelecimento estável na aceção da Sexta Diretiva.
38 Em seguida, como acertadamente alegou o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, tal modo de determinar o pro rata de dedução aplicável à sede de um sujeito passivo teria como consequência fazer aumentar, para todas as aquisições efetuadas pelo referido sujeito passivo no Estado-Membro onde está localizada a sua sede, a parte de IVA que a referida sede pode deduzir ainda que uma parte dessas aquisições não tenha nenhuma conexão com as atividades dos estabelecimentos estáveis estabelecidos fora desse Estado. Assim, o valor do pro rata de dedução aplicável seria falseado.
39 Por último, tal maneira de estabelecer o pro rata de dedução é suscetível de prejudicar o efeito útil dos artigos 5.°, n.° 7, alínea a), e 6.°, n.° 3, da Sexta Diretiva, que atribuem um certo poder de apreciação aos Estados-Membros ao atenuarem os efeitos das opções destes em matéria de política fiscal.
40 À luz do conjunto destas considerações, há que responder à primeira questão que os artigos 17.°, n.os 2 e 5, e 19.°, n.° 1, da Sexta Diretiva devem ser interpretados no sentido de que, para a determinação do pro rata de dedução do IVA que lhe é aplicável, uma sociedade, cuja sede esteja localizada num Estado-Membro, não pode ter em conta o volume de negócios realizado pelas suas sucursais estabelecidas noutros Estados-Membros.
Quanto à segunda questão
41 Com a sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se, à luz do artigo 17.°, n.° 3, alíneas a) e c), da Sexta Diretiva, uma sociedade, cuja sede esteja localizada num Estado-Membro, pode ter em conta, para a determinação do pro rata de dedução do IVA que lhe é aplicável, o volume de negócios realizado pelas suas sucursais estabelecidas em Estados terceiros.
42 A este propósito, cabe recordar que, como resulta dos n.os 30 a 33 do presente acórdão, o regime das deduções se baseia no princípio da territorialidade das disposições nacionais aplicáveis e que, uma vez que um sujeito passivo dispõe de um estabelecimento estável num Estado distinto daquele em que estabeleceu a sua sede, as atividades económicas que realiza nesse Estado são consideradas, para efeitos da aplicação das disposições da Sexta Diretiva, como sendo exercidas a partir desse estabelecimento estável.
43 Ora, há que reconhecer que não existe, nem no preâmbulo nem nas disposições da Sexta Diretiva, nenhum indício que permita concluir que a circunstância de um sujeito passivo dispor de um estabelecimento estável fora da União pode ter incidência sobre o regime das deduções a que o referido sujeito passivo está subordinado no Estado-Membro em que está situada a sua sede.
44 Por conseguinte, como observou o advogado-geral no n.° 81 das suas conclusões, numa situação como a do processo principal, não se pode considerar validamente que as prestações de serviços pelos estabelecimentos estáveis estabelecidos fora da União em benefício de tomadores igualmente estabelecidos em Estados terceiros devem ser consideradas como prestadas pela própria sede.
45 Esta constatação não é posta em causa pelo argumento segundo o qual uma sociedade que tem a sua sede num Estado-Membro e que dispõe de uma sucursal num Estado terceiro deve, para efeitos de IVA, receber o mesmo tratamento fiscal que uma sociedade, igualmente estabelecida num Estado-Membro, que presta os mesmos serviços sem recorrer a tal sucursal ou que dispõe, para este fim, de uma filial no referido Estado terceiro. Com efeito, estas diferentes opções refletem situações claramente distintas e, portanto, não poderiam ter o mesmo tratamento fiscal.
46 A este respeito, importa acrescentar que os sujeitos passivos têm geralmente a liberdade de escolher as estruturas organizacionais e as modalidades transacionais que considerem mais adequadas às suas atividades económicas e com o objetivo de limitar os seus encargos fiscais (acórdão de 22 de dezembro de 2010, RBS Deutschland Holdings, C-277/09, Colet., p. I-13805, n.° 53).
47 Assim, a opção, por parte de um empresário, entre operações isentas e operações tributáveis pode estar baseada num conjunto de elementos, designadamente em considerações de natureza fiscal relativas ao regime objetivo do IVA (v. acórdão de 9 de outubro de 2001, Cantor Fitzgerald International, C-108/99, Colet., p. I-7257, n.° 33).
48 Aliás, como resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça, quando um sujeito passivo pode optar entre diferentes operações, tem o direito de escolher a estrutura da sua atividade de forma a limitar a sua dívida fiscal (v., designadamente, acórdãos de 21 de fevereiro de 2006, Halifax e o., C-255/02, Colet., p. I-1609, n.° 73, e RBS Deutschland Holdings, já referido, n.° 54).
49 Por conseguinte, há que responder à segunda questão que os artigos 17.°, n.° 3, alíneas a) e c), e 19.°, n.° 1, da Sexta Diretiva devem ser interpretados no sentido de que, para a determinação do pro rata de dedução do IVA que lhe é aplicável, uma sociedade, cuja sede esteja localizada num Estado-Membro, não pode ter em conta o volume de negócios realizado pelas suas sucursais estabelecidas em Estados terceiros.
Quanto à terceira questão
50 Com a sua terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se o artigo 17.°, n.° 5, terceiro parágrafo, da Sexta Diretiva deve ser interpretado no sentido de que permite a um Estado-Membro que adote uma regra de cálculo do pro rata de dedução por setor de atividade de uma sociedade que é sujeito passivo que a autorize a ter em conta o volume de negócios realizado por uma sucursal estabelecida noutro Estado-Membro ou num Estado terceiro.
51 Para responder a esta questão, cabe recordar que decorre da leitura conjugada dos artigos 17.°, n.° 5, e 19.°, n.° 1, da Sexta Diretiva que esta última disposição remete unicamente para o pro rata de dedução, previsto no referido artigo 17.°, n.° 5, primeiro parágrafo, e fixa, assim, uma regra de cálculo específica apenas para o pro rata visado na primeira destas duas disposições e, por extensão, para a dedução a efetuar nos termos do artigo 17.°, n.° 5, terceiro parágrafo, alínea d), da referida diretiva (v., neste sentido, acórdãos Royal Bank of Scotland, já referido, n.° 22, e de 8 de novembro de 2012, BLC Baumarkt, C-511/10, n.° 21).
52 O Tribunal de Justiça considerou igualmente que, na falta de indicações na Sexta Diretiva, cabe aos Estados-Membros instituir, dentro dos limites do respeito do direito da União e dos princípios em que assenta o sistema comum do IVA, métodos e normas para o cálculo do pro rata de dedução do IVA pago a montante. No exercício desse poder, esses Estados são obrigados a ter em conta a finalidade e a sistemática dessa diretiva (v., designadamente, acórdão BLC Baumarkt, já referido, n.° 22 e jurisprudência referida).
53 No entanto, impõe-se observar que a referência do artigo 17.°, n.° 5, terceiro parágrafo, da Sexta Diretiva a «setores da […] atividade» não pode ser interpretada como visando zonas geográficas.
54 Com efeito, como resulta do artigo 4.°, n.os 1 e 2, da Sexta Diretiva, o termo «atividades» abrange, no contexto da Sexta Diretiva, os diferentes géneros de atividade económica, tais como as atividades de produção, de comercialização ou de prestação de serviços.
55 Por conseguinte, um Estado-Membro não pode, com base no disposto no artigo 17.°, n.° 5, terceiro parágrafo, permitir a um sujeito passivo estabelecido no seu território que tenha em conta, na determinação do pro rata de dedução que é aplicável a um setor da sua atividade económica, o volume de negócios realizado por um estabelecimento estável estabelecido fora desse mesmo Estado.
56 Consequentemente, há que responder à terceira questão que o artigo 17.°, n.° 5, terceiro parágrafo, da Sexta Diretiva deve ser interpretado no sentido de que não permite a um Estado-Membro que adote uma regra de cálculo do pro rata de dedução por setor de atividade de uma sociedade que é sujeito passivo que a autorize a ter em conta o volume de negócios realizado por uma sucursal estabelecida noutro Estado-Membro ou num Estado terceiro.
Quanto à quarta questão
57 Atendendo às respostas dadas às duas primeiras questões, não há que responder à quarta questão.
Quanto às despesas
58 Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.
Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:
1) Os artigos 17.°, n.os 2 e 5, e 19.°, n.° 1, da Sexta Diretiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria coletável uniforme, devem ser interpretados no sentido de que, para a determinação do pro rata de dedução do IVA que lhe é aplicável, uma sociedade, cuja sede esteja localizada num Estado-Membro, não pode ter em conta o volume de negócios realizado pelas suas sucursais estabelecidas noutros Estados-Membros.
2) Os artigos 17.°, n.° 3, alíneas a) e c), e 19.°, n.° 1, da Sexta Diretiva 77/388 devem ser interpretados no sentido de que, para a determinação do pro rata de dedução do imposto sobre o valor acrescentado que lhe é aplicável, uma sociedade, cuja sede esteja localizada num Estado-Membro, não pode ter em conta o volume de negócios realizado pelas suas sucursais estabelecidas em Estados terceiros.
3) O artigo 17.°, n.° 5, terceiro parágrafo, da Sexta Diretiva 77/388 deve ser interpretado no sentido de que não permite a um Estado-Membro que adote uma regra de cálculo do pro rata de dedução por setor de atividade de uma sociedade que é sujeito passivo que a autorize a ter em conta o volume de negócios realizado por uma sucursal estabelecida noutro Estado-Membro ou num Estado terceiro.
Assinaturas
* Língua do processo: francês.