ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)
10 de outubro de 2013 (*)
«Sexta Diretiva IVA — Artigos 13.°, C, e 20.° — Entrega de um bem imóvel — Direito de opção pela tributação — Direito a dedução — Retificação de deduções — Cobrança dos montantes devidos em consequência da retificação de uma dedução do IVA — Sujeito passivo devedor — Sujeito passivo diferente daquele por quem a dedução foi inicialmente efetuada e alheio à operação tributada que está na origem da dedução»
No processo C-622/11,
que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.° TFUE, apresentado pelo Hoge Raad der Nederlanden (Países Baixos), por decisão de 28 de outubro de 2011, entrado no Tribunal de Justiça em 5 de dezembro de 2011, no processo
Staatssecretaris van Financiën
contra
Pactor Vastgoed BV,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),
composto por: R. Silva de Lapuerta (relatora), presidente de secção, J. L. da Cruz Vilaça, G. Arestis, J.-C. Bonichot e A. Arabadjiev, juízes,
advogado-geral: M. Wathelet,
secretário: M. Aleksejev, administrador,
vistos os autos e após a audiência de 18 de abril de 2013,
vistas as observações apresentadas:
¾ em representação de Pactor Vastgoed BV, por M. van de Leur, belastingadviseur,
¾ em representação do Governo neerlandês, por J. Langer, C. Wissels e M. Bulterman, na qualidade de agentes,
¾ em representação da Irlanda, por E. Creedon, na qualidade de agente, assistida por C. Toland, BL,
¾ em representação do Governo finlandês, por M. Pere, na qualidade de agente,
¾ em representação da Comissão Europeia, por G. Wils e L. Lozano Palacios, na qualidade de agentes,
ouvidas as conclusões do advogado-geral na audiência de 30 de maio de 2013,
profere o presente
Acórdão
1 O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 20.° da Sexta Diretiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria coletável uniforme (JO L 145, p. 1), conforme alterada pela Diretiva 95/7/CE do Conselho, de 10 de abril de 1995 (JO L 102, p. 18, a seguir «Sexta Diretiva»).
2 O pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe o Staatssecretaris van Financiën (Secretário de Estado das Finanças) à sociedade Pactor Vastgoed BV (a seguir «Pactor Vastgoed»), a propósito da liquidação adicional do imposto sobre o volume de negócios (a seguir «IVA») a que aquela sociedade foi sujeita.
Quadro jurídico
Direito da União
3 O artigo 4.°, n.° 3, da Sexta Diretiva estipula:
«Os Estados-Membros podem também considerar sujeito passivo qualquer pessoa que realize, a título ocasional, uma operação relacionada com as atividades referidas no n.° 2 e, designadamente, uma das seguintes operações:
a) a entrega de um edifício ou de parte de um edifício e do terreno da sua implantação, efetuada anteriormente à primeira ocupação; os Estados-Membros podem definir as modalidades de aplicação deste critério às transformações de imóveis e, bem assim, a noção de terreno da sua implantação.
Os Estados-Membros podem aplicar critérios diferentes do da primeira ocupação, tais como o do prazo decorrido entre a data de conclusão do imóvel e a da primeira entrega, ou o do prazo decorrido entre a data da primeira ocupação e a da entrega posterior, desde que tais prazos não ultrapassem, respetivamente, cinco e dois anos.
Por edifício entende-se qualquer construção incorporada no terreno;
[...]»
4 O artigo 13.°, B, desta diretiva dispõe:
«Sem prejuízo de outras disposições comunitárias, os Estados-Membros isentarão, nas condições por eles fixadas com o fim de assegurar a aplicação correta e simples das isenções a seguir enunciadas e de evitar qualquer possível fraude, evasão e abuso:
[...]
g) as entregas de edifícios ou de partes de edifícios e do terreno da sua implantação, com exceção dos indicados no n.° 3, alínea a), do artigo 4.°»
h) as entregas de bens imóveis não construídos com exceção das entregas de terrenos para construção previstas no n.° 3, alínea b), do artigo 4.°»
5 Nos termos do artigo 13.°, C, da referida diretiva:
«Os Estados-Membros podem conceder aos sujeitos passivos o direito de optar pela tributação:
[...]
b) das operações referidas em B), [alíneas] d), g) e h).
Os Estados-Membros podem restringir o âmbito do direito de opção [e] fixarão as regras do seu exercício.»
6 O artigo 17.°, n.° 2, alínea a), da Sexta Diretiva, na sua redação resultante do artigo 28.°-F, estipula:
«Desde que os bens e os serviços sejam utilizados para os fins das próprias operações tributáveis, o sujeito passivo está autorizado a deduzir do imposto de que é devedor:
a) o [IVA] devido ou pago dentro do território do país em relação a bens que lhe tenham sido fornecidos ou que lhe devam ser fornecidos e a serviços que lhe tenham sido prestados ou que lhe devam ser prestados por outro sujeito passivo.»
7 O artigo 20.° da Sexta Diretiva prevê:
«1. A dedução inicialmente operada é ajustada segundo as modalidades fixadas pelos Estados-Membros, designadamente:
a) quando a dedução for superior ou inferior à dedução a que o sujeito passivo tinha direito;
b) quando, posteriormente à declaração, se verificarem alterações dos elementos tomados em consideração para a determinação do montante das deduções, designadamente no caso de anulação de compras ou de obtenção de redução nos preços; todavia, não se efetuará ajustamento no caso de operações total ou parcialmente por pagar, no caso de destruição, perda ou roubo devidamente comprovados ou justificados e no caso de afetação de bens a ofertas de pequeno valor e a amostras, nos termos do n.° 6 do artigo 5.° Todavia, os Estados-Membros podem exigir o ajustamento respeitante às operações total ou parcialmente por pagar e nos casos de roubo.
[...]
3. No caso de entrega durante o período de ajustamento, os bens de investimento são considerados afetos a uma atividade económica do sujeito passivo até ao termo do período de ajustamento. Presume-se que esta atividade económica é inteiramente tributada nos casos em que a entrega dos referidos bens é tributada; presume-se que está totalmente isenta nos casos em que a entrega se encontra isenta. O ajustamento efetua-se uma única vez relativamente a todo o restante período de ajustamento.
Todavia, os Estados-Membros podem não exigir, neste último caso, o ajustamento na medida em que o adquirente seja um sujeito passivo que utiliza os bens de investimento em questão exclusivamente para operações em relação às quais o [IVA] é dedutível.
4. Para efeitos do disposto nos n.os 2 e 3, os Estados-Membros podem:
[...]
¾ adotar as disposições necessárias no sentido de evitar que os ajustamentos impliquem qualquer vantagem injustificada;
¾ autorizar simplificações de ordem administrativa.
[...]»
8 O artigo 21.° da Sexta Diretiva, intitulado «Devedores do imposto perante o Fisco», dispõe:
«O [IVA] é devido:
1. no regime interno:
a) pelos sujeitos passivos que efetuem operações tributáveis […]. Os Estados-Membros podem igualmente prever que uma pessoa diferente do sujeito passivo seja solidariamente responsável pelo pagamento do imposto;
[...]»
9 O artigo 27.°, n.° 1, desta diretiva tem o seguinte teor:
«O Conselho, deliberando por unanimidade, sob proposta da Comissão, pode autorizar os Estados-Membros a introduzir medidas especiais em derrogação da presente diretiva para simplificar a cobrança do imposto ou para evitar certas fraudes ou evasões fiscais. As medidas destinadas a simplificar a cobrança do imposto não devem influir, a não ser de modo insignificante, sobre o montante do imposto devido no estádio de consumo final.»
10 O artigo 1.° da Decisão 88/498/CEE do Conselho, de 19 de julho de 1988, que autoriza o Reino dos Países Baixos a aplicar uma medida derrogatória do n.° 1, alínea a), do artigo 21.° da Sexta Diretiva 77/388 (JO L 269, p. 54), adotada com fundamento no artigo 27.°, n.° 1, desta diretiva, prevê que, no que se refere às operações abrangidas pelo artigo 13.°, B, alíneas g) e h), da referida diretiva, o Reino dos Países Baixos é autorizado a aplicar, em derrogação do artigo 21.°, n.° 1, alínea a), da mesma diretiva, no âmbito do regime de opção pela tributação, previsto no artigo 13.°, C, alínea b), uma norma destinada a que o comprador fique devedor do IVA.
11 A Decisão 88/498 foi revogada, com efeitos a partir de 1 de janeiro de 2008, pela Diretiva 2006/69/CE do Conselho, de 24 de julho de 2006, que altera a Diretiva 77/388 no que se refere a certas medidas destinadas a simplificar o procedimento de cobrança do imposto sobre o valor acrescentado e a lutar contra a fraude ou evasão fiscais e que revoga certas decisões que concedem derrogações (JO L 221, p. 9).
Direito neerlandês
12 O artigo 11.° da Lei relativa ao imposto sobre o volume de negócios (Wet op de omzetbelasting), de 28 de junho de 1968 (Staatsblad 1968, n.° 329), na sua versão aplicável ao litígio no processo principal (a seguir «Lei de 1968»), prevê:
«1. Nas condições estabelecidas por medida administrativa geral, estão isentas do imposto:
a) a entrega de bens imóveis e os direitos sobre bens imóveis, salvo:
1) a entrega de um edifício ou de parte de um edifício e do terreno da sua implantação, efetuada anteriormente à primeira ocupação, ou, no máximo, dois anos após a primeira ocupação, bem como a entrega de um terreno para construção;
2) as entregas, que não sejam referidas no ponto 1, a pessoas que utilizem o bem imóvel em atividades que confiram um direito total, ou quase total, à dedução do imposto por força do artigo 15.°, desde que o empresário que efetua a entrega e aquele a quem a entrega é feita tenham apresentado um pedido conjunto para esse efeito ao inspetor tributário e respeitem as demais condições estabelecidas por decisão ministerial;
[...]»
13 O artigo 12.°a desta lei enuncia:
«Se for feito uso indevido da exceção prevista no artigo 11.°, n.° 1, alínea a), ponto 2, pelo facto de a pessoa a quem foi feita a entrega não utilizar o bem imóvel para os fins para os quais foi previsto o direito a dedução total ou quase total do imposto, nos termos do artigo 15.°, o imposto relativo a essa entrega que tenha sido deduzido, nos termos do artigo 15.°, pela pessoa que fez a entrega deve ser liquidado a posteriori à pessoa a quem foi feita a entrega.»
14 O artigo 12.°, n.° 5, da referida lei prevê:
«Nos casos que sejam definidos por uma medida administrativa geral e em conformidade com as regras que sejam estabelecidas por ou por força desta medida, o imposto é, a fim de garantir uma cobrança maior, cobrado a quem a entrega foi feita ou a quem o serviço foi prestado.»
15 Nos termos do artigo 24.°ba, n.° 1, alínea a), da Decisão de execução da lei relativa ao imposto sobre o volume de negócios (Uitvoeringsbesluit omzetbelasting 1968):
«1. Os casos a que se refere o artigo 12.°, n.° 5, da [Lei de 1968] são os casos em que:
a) um bem imóvel ou um direito sobre o mesmo é entregue em aplicação do artigo 11.°, n.° 1, alínea a), ponto 2, da [Lei de 1968].»
Litígio no processo principal e questão prejudicial
16 Em 5 de janeiro de 2000, uma empresa (a seguir «fornecedor») entregou um bem imóvel à Pactor Vastgoed, que, por acordo com o fornecedor e com fundamento no artigo 11.°, n.° 1, alínea a), ponto 2, da Lei de 1968, optou pela tributação desta entrega.
17 O fornecedor tinha adquirido o referido bem alguns anos antes, tendo optado igualmente pela tributação dessa aquisição. Assim, procedeu à dedução do IVA que lhe tinha sido faturado.
18 A partir do mês de abril de 2000, a Pactor Vastgoed arrendou o referido bem imóvel, com isenção do IVA.
19 Em seguida, a Pactor Vastgoed vendeu e entregou o mesmo imóvel, no início do mês de julho de 2000. A entrega foi isenta de IVA.
20 Tendo considerado que a entrega efetuada pela Pactor Vastgoed não preenchia as condições previstas no artigo 11.°, n.° 1, alínea a), ponto 2, da Lei de 1968 e que, por conseguinte, esta entrega deveria ter sido isenta de IVA, as autoridades tributárias neerlandesas, com base no artigo 12.°a da mesma lei, emitiram um aviso de liquidação adicional do IVA a esta sociedade, relativo ao período entre 1 de janeiro e 31 de dezembro de 2000, de montante correspondente ao valor devido por força da retificação da dedução do IVA efetuada pelo fornecedor aquando da aquisição por este do bem imóvel posteriormente entregue à Pactor Vastgoed.
21 A Pactor Vastgoed reclamou desta liquidação adicional.
22 Esta reclamação foi indeferida e a Pactor Vastgoed interpôs recurso da decisão de indeferimento no Rechtbank te ’s-Gravenhage (Tribunal de Primeira Instância da Haia).
23 Como o Rechtbank te ’s-Gravenhage negou provimento ao recurso, a Pactor Vastgoed interpôs recurso da respetiva sentença no Gerechtshof te ’s-Gravenhage (Tribunal de Segunda Instância da Haia), que anulou a sentença e a liquidação adicional.
24 O Staatssecretaris van Financiën interpôs recurso de cassação do acórdão do Gerechtshof te ’s-Gravenhage para o órgão jurisdicional de reenvio.
25 Foi neste contexto que o Hoge Raad der Nederlanden decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:
«Caso a dedução de IVA inicialmente operada seja retificada nos termos do artigo 20.° da Sexta Diretiva, no sentido de ser exigida a recuperação total ou parcial do montante da dedução, a Sexta Diretiva permite que o pagamento desse montante seja exigido a uma pessoa diferente do sujeito passivo que operou a dedução no passado, mais concretamente à pessoa que adquiriu um bem a esse sujeito passivo, como previsto no artigo 12.°a da Lei [de 1968]?»
Quanto à questão prejudicial
26 Através da sua questão, o órgão jurisdicional de envio pergunta, no essencial, se a Sexta Diretiva deve ser interpretada no sentido de que se opõe a que a cobrança dos montantes devidos por força da retificação de uma dedução do IVA seja feita a uma pessoa diferente do sujeito passivo que efetuou a dedução.
27 A título preliminar, convém recordar que o Reino dos Países Baixos, por um lado, fez uso da faculdade prevista no artigo 13.°, C, primeiro parágrafo, alínea b), da Sexta Diretiva, que permite aos Estados-Membros concederem aos seus sujeitos passivos o direito de optar pela tributação das operações referidas no artigo 13.°, B, alínea g), desta diretiva, e, por outro, obteve autorização do Conselho, com fundamento no artigo 27.° da referida diretiva, de aplicar, em derrogação do artigo 21.°, n.° 1, alínea a), da mesma diretiva, uma norma destinada a que o comprador fique devedor do IVA no âmbito do regime de opção pela tributação, previsto no artigo 13.°, C, primeiro parágrafo, alínea b).
28 Foi neste contexto que as entregas do bem imóvel em causa no processo principal foram tributadas e que o IVA referente a estas entregas foi pago pelo fornecedor e, posteriormente, pela Pactor Vastgoed.
29 O processo principal tem por objeto a questão de saber se as autoridades tributárias neerlandesas podem exigir que os montantes devidos a título da retificação da dedução do IVA a que o fornecedor procedeu quando adquiriu o referido bem imóvel, posteriormente entregue à Pactor Vastgoed, sejam exigidos a esta sociedade.
30 A este respeito, importa sublinhar que a Sexta Diretiva não contém nenhuma indicação expressa sobre quem seja o devedor da dívida resultante da retificação de uma dedução do IVA.
31 Mas isto não significa que os Estados-Membros, no âmbito das modalidades que possam fixar com fundamento nos artigos 13.°, C, segundo parágrafo, e 20.°, n.° 1, da referida diretiva, tenham a liberdade de decidir qual dos sujeitos passivos deverá pagar o IVA nessas circunstâncias.
32 Com efeito, a designação do devedor dos montantes devidos por força da retificação de uma dedução do IVA não constitui uma «modalidade» na aceção desta disposição, mas sim, conforme resulta do artigo 21.° da referida diretiva, uma regra fundamental do sistema comum do IVA instituído pela mesma diretiva.
33 A este respeito, convém recordar que o mecanismo da retificação previsto pela Sexta Diretiva faz parte integrante do regime de dedução do IVA estabelecido pela mesma (v. acórdãos de 18 de outubro de 2012, TETS Haskovo, C-234/11, n.° 30, e de 29 de novembro de 2012, Gran Via Moineşti, C-257/11, n.° 39).
34 Com efeito, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, as regras previstas por esta diretiva em matéria de ajustamento das deduções têm por objetivo aumentar a precisão das deduções de modo a assegurar a neutralidade do IVA, pelo que as operações efetuadas no estádio anterior apenas continuam a dar lugar ao direito a dedução na medida em que sirvam para fornecer prestações sujeitas a esse imposto. Através dessas regras, a referida diretiva visa assim estabelecer uma relação estreita e direta entre o direito a dedução do IVA suportado a montante e a utilização dos bens ou dos serviços objeto das operações tributadas a jusante (v. acórdão de 15 de dezembro de 2005, Centralan Property, C-63/04, Colet., p. I-11087, n.° 57; e acórdãos, já referidos, TETS Haskovo, n.° 31, e Gran Via Moineşti, n.° 38).
35 Nos termos do artigo 20.°, n.° 1, alínea a), da Sexta Diretiva, a dedução inicialmente operada é ajustada quando for superior ou inferior à dedução a que o sujeito passivo tinha direito.
36 Esta disposição deve ser interpretada no sentido de que, em caso de retificação de uma dedução do IVA efetuada por um sujeito passivo, os valores devidos a este título devem ser liquidados por este sujeito passivo.
37 Uma interpretação a contrario sensu, segundo a qual a retificação de uma dedução do IVA referente a uma entrega de bens ou a uma prestação de serviços poderá ser imputada a um sujeito passivo diferente daquele que beneficiou desta entrega ou prestação de serviços, seria incompatível com os objetivos referidos no n.° 34 do presente acórdão, visados nesta matéria pela Sexta Diretiva.
38 Neste contexto, há que sublinhar que o artigo 21.°, n.° 1, alínea a), da referida diretiva prevê que o sujeito passivo devedor do IVA no regime interno é aquele que efetua uma operação tributável (v. despacho de 3 de março de 2004, Transport Service, C-395/02, Colet., p. I-1991, n.° 23). Além disso, tal como foi sublinhado pelo advogado-geral nos n.os 66 e 68 das suas conclusões, este artigo enumera taxativamente os casos em que uma pessoa diferente do sujeito passivo poderá ser devedor deste imposto.
39 Ora, a situação em causa no processo principal não corresponde a nenhum desses casos. A este respeito, conclui-se que, ao contrário do que sustenta o Governo neerlandês, a faculdade de prever que uma pessoa diferente do sujeito passivo seja solidariamente responsável pelo pagamento do imposto, reconhecida aos Estados-Membros por aquela disposição, não pode ser interpretada no sentido de permitir a imposição de uma obrigação fiscal autónoma por conta dessa pessoa.
40 Por outro lado, em caso de entregas sucessivas de um bem imóvel, como acontece no processo principal, a circunstância de um dos sujeitos passivos envolvidos não estar, aquando da entrega em que interveio, em conformidade com as modalidades de exercício do direito de opção previstas no artigo 13.°, C, segundo parágrafo, da Sexta Diretiva, não pode ter como consequência obrigar este sujeito passivo a pagar a dívida fiscal devida por força da retificação de uma dedução do IVA efetuada por outro sujeito passivo em relação a uma das referidas entregas a que aquele primeiro sujeito passivo é alheio.
41 Com efeito, numa situação como esta, a exatidão das deduções e a neutralidade do IVA, que o sistema de regularização das deduções pretende assegurar, ficariam comprometidas.
42 No que diz respeito à situação qualificada de injusta pelo Governo neerlandês e que resulta do facto de um sujeito passivo, tendo entregado um bem imóvel, ser obrigado a pagar os montantes devidos a título da retificação da dedução do IVA a que procedeu aquando da aquisição deste bem, mesmo que a pessoa a quem o entregou tenha declarado que o utilizaria para os fins das suas operações tributáveis, conclui-se que, tal como sublinhou o advogado-geral no n.° 89 das suas conclusões, embora os Estados-Membros, nos termos do artigo 13.°, C, segundo parágrafo, da Sexta Diretiva, tenham a faculdade de restringir o campo de aplicação do direito de opção e determinem as modalidades do seu exercício, não podem, no exercício desta faculdade, impor a um sujeito passivo obrigações que excedam o que é permitido pelo direito da União em matéria de IVA.
43 Ora, tal como referiu o advogado-geral no n.° 84 das suas conclusões, no processo principal, esta situação em que o fornecedor se encontra decorre da exigência da legislação neerlandesa de que o adquirente de um bem imóvel que tenha optado pela tributação o utilize para os fins das suas operações tributáveis.
44 Do mesmo modo, no que respeita ao argumento do Governo neerlandês segundo o qual o artigo 12.°a da Lei de 1968 visa impedir, em conformidade com o artigo 20.°, n.° 4, da Sexta Diretiva, que as retificações impliquem qualquer vantagem injustificada, sublinhe-se que, na medida em que, por um lado, tal como resulta dos autos apresentados neste Tribunal, a entrega do bem imóvel em causa no processo principal, em que intervieram o fornecedor e a Pactor Vastgoed, foi isenta de IVA com efeitos retroativos ao dia 5 de janeiro de 2000 e na medida em que, por outro lado, o IVA referente a esta entrega, pago e deduzido pela Pactor Vastgoed, foi anulado, esta sociedade não beneficiou de uma «vantagem injustificada» na aceção do artigo 20.°, n.° 4. Assim, aquela sociedade não poderia, com fundamento nesta disposição, ser obrigada a pagar o IVA devido por força da retificação de uma dedução efetuada pelo fornecedor aquando de uma outra transação a que ela é alheia, designadamente, a aquisição inicial do referido bem imóvel por este.
45 Por fim, é forçoso concluir que a Decisão 88/498, que autoriza o Reino dos Países Baixos a aplicar, em derrogação do artigo 21.°, n.° 1, alínea a), da Sexta Diretiva, uma norma destinada a que o comprador fique devedor do IVA no âmbito do regime de opção pela tributação, previsto no artigo 13.°, C, primeiro parágrafo, alínea b), desta diretiva, não visa que os montantes exigíveis, devidos por força da retificação de uma dedução do IVA, sejam pagos por um sujeito passivo diferente daquele que efetuou esta dedução, mas sim que, no âmbito de uma entrega de um bem imóvel, como a que está em causa no processo principal, o IVA referente a esta entrega seja pago e deduzido por um único sujeito passivo, designadamente, o adquirente do bem em causa.
46 Por conseguinte, se, no que respeita ao processo principal, a Decisão 88/498 permitiu que o fornecedor e, posteriormente, a Pactor Vastgoed fossem, na qualidade de adquirentes do bem imóvel em causa, devedores do IVA referente às operações de aquisição em causa, não justifica, porém, que a Pactor Vastgoed suporte o pagamento dos montantes devidos por força da retificação de uma dedução do IVA efetuada pelo fornecedor no âmbito de uma transação a que era alheia, designadamente, a aquisição inicial desse bem imóvel pelo fornecedor.
47 Nestas condições, deve responder-se à questão prejudicial que a Sexta Diretiva deve ser interpretada no sentido de que se opõe a que a cobrança dos montantes devidos por força da retificação de uma dedução do IVA seja feita a um sujeito passivo diferente daquele que efetuou a dedução.
Quanto às despesas
48 Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.
Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) declara:
A Sexta Diretiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria coletável uniforme, conforme alterada pela Diretiva 95/7/CE do Conselho, de 10 de abril de 1995, deve ser interpretada no sentido de que se opõe a que a cobrança dos montantes devidos por força da retificação de uma dedução do imposto sobre o valor acrescentado seja feita a um sujeito passivo diferente daquele que efetuou a dedução.
Assinaturas
* Língua do processo: neerlandês.