Edição provisória
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sexta Secção)
9 de novembro de 2017 (*)
«Reenvio prejudicial — Fiscalidade — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado — Diretiva 2006/112/CE — Dissolução de uma sociedade que dá origem ao cancelamento da sua inscrição no registo para efeitos de imposto sobre o valor acrescentado (IVA) — Obrigação de liquidar o IVA sobre os ativos existentes e de pagar o IVA liquidado ao Estado — Manutenção ou alteração da lei existente à data da adesão à União Europeia — Artigo 176.°, segundo parágrafo — Efeito sobre o direito a dedução — Artigo 168.°»
No processo C-552/16,
que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.° TFUE, pelo Administrativen sad Sofia-grad (Tribunal Administrativo da cidade de Sófia, Bulgária), por decisão de 21 de outubro de 2016, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 2 de novembro de 2016, no processo
«Wind Inovation 1» EOOD, em liquidação,
contra
Direktor na Direktsia «Obzhalvane i danachno-osiguritelna praktika» — Sofia,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sexta Secção),
composto por: C. G. Fernlund (relator), presidente de secção, A. Arabadjiev e E. Regan, juízes,
advogado-geral: M. Wathelet,
secretário: A. Calot Escobar,
vistos os autos,
vistas as observações apresentadas:
– em representação do Direktor na Direktsia «Obzhalvane i danachno-osiguritelna praktika» — Sofia, por A. Georgiev, na qualidade de agente,
– em representação do Governo búlgaro, por E. Petranova e M. Georgieva, na qualidade de agentes,
– em representação da Comissão Europeia, por L. Lozano Palacios e N. Nikolova, na qualidade de agentes,
vista a decisão tomada, ouvido o advogado-geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,
profere o presente
Acórdão
1 O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação dos artigos 168.° e 176.° da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO 2006, L 347, p. 1, a seguir «Diretiva IVA»).
2 Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Wind Inovation 1 EOOD (a seguir «Wind Inovation») ao Direktor na Direktsia «Obzhalvane i danachno-osiguritelna praktika» — Sofia (Diretor da Direção «Recursos e prática tributária e da segurança social» de Sófia, Bulgária) (a seguir «Direktor»), a respeito da decisão de cancelamento da inscrição no registo desta sociedade para efeitos do imposto sobre o valor acrescentado (IVA).
Quadro jurídico
Direito da União
3 O artigo 9.°, n.° 1, da Diretiva IVA dispõe:
«Entende-se por “sujeito passivo” qualquer pessoa que exerça, de modo independente e em qualquer lugar, uma atividade económica, seja qual for o fim ou o resultado dessa atividade.
Entende-se por “atividade económica” qualquer atividade de produção, de comercialização ou de prestação de serviços, incluindo as atividades extrativas, agrícolas e as das profissões liberais ou equiparadas. É em especial considerada atividade económica a exploração de um bem corpóreo ou incorpóreo com o fim de auferir receitas com caráter de permanência.»
4 O artigo 18.° da Diretiva IVA prevê:
«Os Estados-Membros podem equiparar a entregas de bens efetuadas a título oneroso as seguintes operações:
[…]
c) [...] a detenção de bens por um sujeito passivo ou pelos seus sucessores, no caso de cessação da sua atividade económica tributável, quando esses bens tenham conferido direito à dedução total ou parcial do IVA aquando da respetiva aquisição [...]»
5 O artigo 168.° da Diretiva IVA dispõe:
«Quando os bens e os serviços sejam utilizados para os fins das suas operações tributadas, o sujeito passivo tem direito, no Estado-Membro em que efetua essas operações, a deduzir do montante do imposto de que é devedor os montantes seguintes:
a) O IVA devido ou pago nesse Estado-Membro em relação aos bens que lhe tenham sido ou venham a ser entregues e em relação aos serviços que lhe tenham sido ou venham a ser prestados por outro sujeito passivo;
[…]»
6 O artigo 176.° da Diretiva IVA enuncia:
«O Conselho, deliberando por unanimidade, sob proposta da Comissão, determina quais as despesas que não conferem direito à dedução do IVA. Em qualquer caso, são excluídas do direito à dedução as despesas que não tenham caráter estritamente profissional, tais como despesas sumptuárias, recreativas ou de representação.
Até à entrada em vigor das disposições referidas no primeiro parágrafo, os Estados-Membros podem manter todas as exclusões previstas na respetiva legislação nacional em 1 de janeiro de 1979 ou, no que respeita aos Estados-Membros que tenham aderido à Comunidade após essa data, na data da respetiva adesão.»
Direito búlgaro
Lei relativa ao imposto sobre o valor acrescentado aplicável a partir de 1 de janeiro de 2007
7 O Zakon za danak varhu dobavenata stoynost (Lei relativa ao imposto sobre o valor acrescentado, DV n.° 63, de 4 de agosto de 2006, a seguir «ZDDS») entrou em vigor em 1 de janeiro de 2007, data na qual entrou também em vigor o Tratado entre os Estados-Membros da União Europeia e a República da Bulgária e a Roménia relativo à adesão da República da Bulgária e da Roménia à União Europeia (JO 2005, L 157, p. 11).
8 O artigo 106.° do ZDDS prevê:
«1. A supressão do registo (cancelamento) na aceção da presente lei é um procedimento através do qual, a partir da data do cancelamento da inscrição no registo de uma pessoa, esta deixa de ter direito a liquidar o IVA e a deduzir o imposto pago a montante, sem prejuízo das exceções previstas na presente lei.
2. A inscrição no registo é cancelada:
1) por iniciativa da pessoa registada, quando haja motivo para o cancelamento — obrigatório ou voluntário — da inscrição no registo;
2) por iniciativa do serviço das receitas;
a) quando se conclua pela existência de um motivo para o cancelamento obrigatório da inscrição no registo;
b) no caso previsto no artigo 176.°»
9 Nos termos do artigo 107.° do ZDDS:
«Constitui motivo para o cancelamento obrigatório da inscrição no registo:
[…]
4. a dissolução da entidade nos seguintes casos:
a) dissolução de uma sociedade comercial, com ou sem liquidação;
[…]»
10 O artigo 111.° do ZDDS dispõe:
«1. Na data do cancelamento da inscrição no registo, considera-se que o sujeito passivo efetua operações, na aceção da presente lei, com todos os bens e/ou serviços existentes, a título dos quais deduziu, total ou parcialmente, o imposto pago a montante e que constituem:
1) elementos do ativo, na aceção do Zakon za schetovodstvoto (Lei relativa à contabilidade); ou
2) elementos do ativo, na aceção do Zakon za korporativnoto podohodno oblagane (Lei relativa ao imposto sobre as pessoas coletivas), diferentes dos referidos no n.° 1.
[…]
3. O imposto referido no n.° 1 é incluído no IVA devido a título do último período fiscal [...] e é pago no prazo previsto [...]»
11 O artigo 76.° do ZDDS enuncia:
«1. A pessoa registada tem direito a deduzir o IVA liquidado aquando do seu cancelamento nos termos da presente lei [sobre] os ativos tributados ao abrigo do artigo 111.°, n.° 1, existentes na data do seu subsequente registo.
2. O direito previsto no n.° 1 tem origem quando estiverem simultaneamente preenchidos os seguintes requisitos:
1) Os ativos existentes na aceção da lei relativa à contabilidade à data da posterior inscrição no registo na aceção da presente lei tiverem sido tributados no momento do cancelamento da inscrição no registo nos termos do artigo 111.°, n.° 1;
2) O imposto liquidado foi efetivamente pago ou recebido pelo serviço de receitas;
3) A pessoa tenha efetuado, efetua ou efetuará operações tributáveis na aceção do artigo 69.° com os ativos existentes referidos no n.° 1;
[…]»
Lei relativa ao imposto sobre o valor acrescentado anterior a 1 de janeiro de 2007
12 Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, o Administrativen sad Sofia-grad (Tribunal Administrativo da cidade de Sófia, Bulgária), a Lei relativa ao imposto sobre o valor acrescentado, na versão em vigor até 31 de dezembro de 2006, já previa um regime equivalente ao que figura no artigo 111.°, n.os 1 e 3, do ZDDS, que entrou em vigor em 1 de janeiro de 2007, nos termos do qual se considera que, à data do cancelamento da inscrição no registo para efeitos de IVA, a entidade efetua uma entrega de todos os ativos existentes e o imposto liquidado é incluído no IVA devido a título do último período fiscal.
13 Na versão que esteve em vigor até 31 de dezembro de 2006, a Lei relativa ao imposto sobre o valor acrescentado incluía também uma disposição equivalente à do artigo 76.°, n.° 2, ponto 2, do ZDDS, que entrou em vigor em 1 de janeiro de 2007, segundo a qual, para beneficiar do direito a dedução aquando de uma nova inscrição no registo, o imposto liquidado no momento do cancelamento da inscrição no registo deve ser efetivamente pago ou recebido pelo serviço de receitas. Contudo, a mesma lei previa, além disso, que o administrador judicial tinha o direito de decidir que a pessoa coletiva em causa continuava a estar inscrita no registo para efeitos de IVA até à data do cancelamento da sua inscrição no registo comercial.
Litígio no processo principal e questões prejudiciais
14 A Wind Inovation é uma sociedade de direito búlgaro em liquidação, cuja atividade consiste na produção de eletricidade e na realização de investimentos em projetos relacionados com o domínio da energia. A Gräss Solartechnik GmbH & Co. KG, sociedade de direito alemão, detém a totalidade do capital da Wind Innovation, da qual é, por conseguinte, sócia única.
15 A Kühling Stahl-und Metallbau GmbH, sociedade de direito alemão, detinha um crédito sobre a Gräss Solartechnik. Não tendo esta última pago a sua dívida, a Kühling Stahl-und Metallbau GmbH requereu a dissolução da Wind Inovation, em conformidade com o direito búlgaro.
16 O órgão jurisdicional de reenvio precisa que o património da sociedade dissolvida devia servir para satisfazer o credor e que, em caso de reembolso da dívida da Gräss Solartechnik, seria posto termo ao processo de liquidação de que a Wind Inovation era objeto.
17 Em conformidade com as disposições do ZDDS, a Wind Inovation apresentou um pedido de cancelamento da sua inscrição no registo para efeitos de IVA.
18 A Administração Fiscal constatou que a cessação da atividade da Wind Inovation e a sua passagem à situação de liquidação judicial tinham sido averbadas no registo comercial em 7 de agosto de 2015. Em 25 de agosto de 2015, esta Administração lavrou um ato de cancelamento da inscrição no registo da Wind Inovation para efeitos de IVA, que foi retroativamente datado ao dia 7 de agosto de 2015.
19 Tendo sido notificada do ato de cancelamento da inscrição no registo, a Wind Inovation apresentou, em 27 de agosto de 2015, um novo pedido de inscrição no registo para efeitos de IVA indicando que não tinha cessado a sua atividade comercial e que, inclusivamente, no momento da inscrição da sua situação de liquidação judicial no registo comercial, o seu volume de negócios ultrapassava em várias vezes o limiar para a inscrição obrigatória no registo para efeitos de IVA, a saber, 50 000 leva búlgaros (BGN) (cerca de 25 000 euros). A sociedade voltou a ser inscrita no referido registo em 12 de setembro de 2015.
20 A Wind Inovation liquidou o IVA referente aos ativos existentes em 7 de agosto de 2015 e incluiu-o, enquanto IVA devido, na sua declaração relativa a esse mesmo mês.
21 Em seguida, a Wind Inovation apresentou junto do Direktor uma reclamação contra o ato de cancelamento da inscrição no registo para efeitos de IVA. Tendo esta reclamação sido julgada improcedente, a Wind Inovation interpôs recurso no Administrativen sad Sofia-grad (Tribunal Administrativo da cidade de Sófia).
22 Este último órgão jurisdicional pergunta se a alteração introduzida na legislação nacional em 1 de janeiro de 2007, que visava a eliminação da faculdade de o administrador judicial decidir se a pessoa coletiva dissolvida continua a estar inscrita no registo para efeitos de IVA até à data do cancelamento da sua inscrição no registo comercial, constitui uma violação do artigo 176.°, segundo parágrafo, da Diretiva IVA.
23 O referido órgão jurisdicional sublinha que da eliminação desta faculdade resulta uma obrigação para a sociedade dissolvida de liquidar o IVA sobre os ativos existentes e de pagar efetivamente o mesmo às autoridades tributárias. Acrescenta que a sociedade em causa deve imediatamente registar-se de novo quando a sua atividade económica prossiga e pergunta se o cancelamento obrigatório da inscrição no registo para efeitos de IVA, que dá lugar à liquidação do IVA sobre os ativos existentes e ao pagamento efetivo do montante liquidado ao Estado, constitui um requisito adicional do exercício do direito à dedução do IVA pago a montante e, por conseguinte, uma restrição do direito à dedução não prevista pela Diretiva IVA.
24 Foi nestas condições que o Administrativen sad Sofia-grad (Tribunal Administrativo da cidade de Sófia) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:
«1) Deve o artigo 176.°, segundo parágrafo, da [Diretiva IVA] ser interpretado no sentido de que se opõe ao cancelamento obrigatório do registo para efeitos de IVA com fundamento numa alteração [do ZDDS], em vigor desde 1 de janeiro de 2007, nos termos [do] qual é revogada a possibilidade de o liquidatário nomeado pelo tribunal decidir que a pessoa coletiva, cuja dissolução foi ordenada por decisão judicial, continua registada até ao cancelamento da sua inscrição no registo comercial, nos termos [do] ZDDS, e que, em vez disso, prevê que a dissolução da sociedade comercial, com ou sem liquidação, é fundamento para o cancelamento obrigatório da inscrição no registo para efeitos de IVA?
2) Deve o artigo 176.°, segundo parágrafo, da [Diretiva IVA] ser interpretado no sentido de que se opõe ao cancelamento obrigatório da inscrição no registo para efeitos de IVA com fundamento numa alteração [do ZDDS], em vigor desde 1 de janeiro de 2007, nos casos em que, no momento desse cancelamento obrigatório e em relação à pessoa a ele sujeita, se verifiquem os pressupostos para uma nova inscrição obrigatória no registo do IVA, essa pessoa seja parte em contratos em vigor e declare que não cessou atividades e que continua a exercer uma atividade comercial, desde que o sujeito passivo deva pagar efetivamente o imposto calculado e devido aquando do cancelamento obrigatório, de modo a ter o direito à dedução do imposto pago a montante sobre os ativos existentes, tributados no momento do cancelamento da inscrição no registo e ainda existentes no momento da nova inscrição no registo? Caso seja permitido o cancelamento obrigatório da inscrição no registo nas referidas condições, pode o direito à dedução do imposto pago a montante sobre os ativos tributados no momento do cancelamento da inscrição no registo, existentes no momento da nova inscrição no registo e através dos quais a pessoa gera ou irá gerar um volume de negócios tributável, ser associado ao pagamento efetivo do imposto aos cofres do Estado ou é permitido proceder à compensação do imposto calculado no momento do cancelamento da inscrição no registo com o crédito de imposto fixado no momento da nova inscrição no registo para efeitos de IVA, uma vez que o imposto terá de ser pago pela pessoa que obterá o direito à dedução?»
Quanto às questões prejudiciais
Observações preliminares
25 As questões submetidas têm por objeto uma regulamentação nacional que prevê o cancelamento obrigatório da inscrição no registo para efeitos de IVA de uma sociedade cuja dissolução foi decretada por decisão judicial e que altera a lei que estava em vigor na data de adesão do Estado-Membro em causa à União Europeia, prevendo que este cancelamento da inscrição no registo e as obrigações que deste resultam de liquidar o IVA devido ou pago a montante sobre os ativos existentes e de o pagar ao Estado já não podem ser reportados, pelo administrador judicial da sociedade, à data do cancelamento da inscrição desta última no registo comercial.
26 O órgão jurisdicional de reenvio pergunta se esta alteração introduz uma restrição ao direito à dedução que não existia no momento da adesão do Estado-Membro em causa à União e que seria, por conseguinte, contrária ao artigo 176.°, segundo parágrafo, da Diretiva IVA.
27 Nos termos desta disposição, que prevê uma derrogação das regras em matéria do direito à dedução do IVA, os Estados-Membros que aderiram à União depois de 1 de janeiro de 1979 podem manter todas as exclusões ao direito à dedução previstas na sua legislação nacional na data da sua adesão à União.
28 Contudo, no caso em apreço, nada permite determinar que a regulamentação nacional, sendo facto assente que esta tem por objeto o cancelamento da inscrição no registo para efeitos de IVA em caso de dissolução de uma pessoa coletiva com ou sem liquidação, introduz uma exclusão abrangida por esta derrogação.
29 Por conseguinte, para determinar se uma medida como a que está em causa no processo principal introduz uma restrição do direito à dedução contrária à Diretiva IVA, há que analisá-la à luz do mecanismo do direito à dedução estabelecido por esta diretiva, nomeadamente no seu artigo 168.°
30 Assim, com as suas questões, que há que examinar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se a Diretiva IVA, nomeadamente o seu artigo 168.°, se opõe a uma legislação nacional como a que está em causa no processo principal, nos termos da qual o cancelamento obrigatório do registo para efeitos de IVA de uma sociedade cuja dissolução foi decretada por uma decisão judicial implica, mesmo quando a sociedade dissolvida continua a ser parte dos contratos em vigor e declara não ter cessado a sua atividade durante a sua liquidação, a obrigação de liquidar o IVA devido ou pago a montante sobre os ativos existentes na data desta dissolução e de o pagar ao Estado, e que, deste modo, subordina o direito à dedução ao cumprimento desta obrigação.
Quanto à interpretação do artigo 168.° da Diretiva IVA
31 Para responder às questões submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio, há que recordar que, segundo a jurisprudência, a existência de uma atividade económica justifica, em aplicação do artigo 9.°, n.° 1, da Diretiva IVA, a qualificação de sujeito passivo, ao qual esta diretiva reconhece o direito à dedução (v., neste sentido, acórdão de 3 de março de 2005, Fini H, C-32/03, EU:C:2005:128, n.° 19).
32 De acordo com jurisprudência constante, este direito à dedução previsto no artigo 168.° da Diretiva IVA faz parte integrante do mecanismo do IVA e não pode, em princípio, ser limitado. Este direito é imediatamente exercido em relação à totalidade dos impostos que tenham onerado as operações efetuadas a montante (acórdãos de 12 de janeiro de 2006, Optigen e o., C-354/03, C-355/03 e C-484/03, EU:C:2006:16, n.° 53, e de 29 de outubro de 2009, SKF, C-29/08, EU:C:2009:665, n.° 55).
33 O regime das deduções visa, com efeito, desonerar inteiramente o empresário do encargo do IVA devido ou pago no quadro de todas as suas atividades económicas e garantir a neutralidade perfeita quanto à carga fiscal de todas as atividades económicas, independentemente dos respetivos fins ou resultados dessas atividades, desde que estas estejam, em princípio, elas próprias sujeitas a IVA (acórdãos de 22 de fevereiro de 2001, Abbey National, C-408/98, EU:C:2001:110, n.° 24, e de 3 de março de 2005, Fini H, C-32/03, EU:C:2005:128, n.° 25).
34 Resulta do artigo 168.° da Diretiva IVA que na medida em que o sujeito passivo, agindo nessa qualidade no momento em que adquire um bem ou um serviço, utilize esse bem ou esse serviço para as necessidades das suas operações tributadas está autorizado a deduzir o IVA devido ou pago em relação ao referido bem ou ao referido serviço (acórdão de 14 de setembro de 2017, Iberdrola Inmobiliaria Real Estate Investments, C-132/16, EU:C:2017:683, n.° 27).
35 Nestas condições, importa considerar que o direito à dedução está associado ao exercício de uma atividade económica.
36 Em caso de cessação da atividade económica tributável de uma sociedade, com exceção dos casos de transmissão para uma sociedade da totalidade ou de parte de uma universalidade dos bens referidos no artigo 19.° da Diretiva IVA, esta diretiva prevê expressamente no seu artigo 18.°, alínea c), que a detenção de bens por um sujeito passivo ou pelos seus sucessores pode ser equiparada a entregas de bens efetuadas a título oneroso, quando esses bens tenham conferido direito a uma dedução.
37 O Tribunal de Justiça sublinhou que este artigo 18.°, alínea c), se refere ao caso da cessação da atividade económica tributável em geral, sem fazer uma distinção segundo as causas ou as circunstâncias desta cessação, ressalvada a exceção mencionada no número anterior, e que, por conseguinte, também abrange a cessação da atividade económica tributável resultante do cancelamento do sujeito passivo no registo do IVA (acórdão de 8 de maio de 2013, Marinov, C-142/12, EU:C:2013:292, n.os 26 e 28).
38 Com efeito, o Tribunal de Justiça recordou que o referido artigo 18.°, alínea c), tem por objetivo principal evitar que bens que conferiram direito a dedução sejam objeto de um consumo final não tributado em consequência da cessação da atividade económica tributável, independentemente dos seus motivos ou das suas circunstâncias (acórdão de 8 de maio de 2013, Marinov, C-142/12, EU:C:2013:292, n.° 27).
39 Estas considerações aplicam-se, por conseguinte, a uma cessação da atividade económica resultante de uma decisão judicial e que implica o cancelamento obrigatório do registo para efeitos de IVA da sociedade em causa. Em conformidade com o artigo 18.°, alínea c), da Diretiva IVA, os Estados-Membros podem considerar que, nesta situação, o sujeito passivo efetua uma entrega a si mesmo da qual decorre a obrigação de liquidar o IVA devido ou pago a montante e de o pagar ao Estado.
40 Conforme decorre dos próprios termos do artigo 18.°, alínea c), da Diretiva IVA e do objetivo prosseguido por esta disposição, esta análise só é válida, contudo, numa situação na qual a atividade económica tributável do interessado tenha cessado e na qual este último já não efetua operações tributáveis.
41 Quando o interessado prossegue com a sua atividade económica, os Estados-Membros não dispõem da faculdade prevista neste artigo 18.°, alínea c).
42 No caso em apreço, o órgão jurisdicional de reenvio sublinha que o processo principal diz respeito a uma sociedade dissolvida e em liquidação, que, contudo, continua a efetuar certas operações económicas e gera um volume de negócios substancial, o que a obriga, segundo o direito nacional, a pedir novamente a sua inscrição no registo para efeitos de IVA.
43 Neste contexto, a obrigação de liquidar o IVA devido sobre os ativos da referida sociedade existente na data da sua dissolução e de pagar este imposto ao Estado para poder beneficiar do direito à dedução do imposto liquidado não é justificada pela vontade de evitar um consumo final não tributado.
44 O Tribunal de Justiça já declarou anteriormente que a questão de saber se o IVA devido sobre as vendas anteriores ou posteriores dos bens em causa foi ou não pago à Administração Fiscal é irrelevante para efeitos do direito do sujeito passivo a deduzir o IVA pago a montante (acórdão de 12 de janeiro de 2006, Optigen e o., C-354/03, C-355/03 e C-484/03, EU:C:2006:16, n.° 54). Como alega o Direktor, o facto de exigir à sociedade em causa o pagamento efetivo do IVA devido constitui, para esta sociedade, um obstáculo à dedução do IVA pago a montante, uma vez que obriga a referida sociedade a utilizar os fundos e obriga as autoridades tributárias a restituir-lhe esses fundos aquando da sua nova inscrição no registo, ao passo que outros operadores que detêm ativos os podem utilizar para as suas atividades económicas sem serem obrigados a efetuar semelhante pagamento.
45 Por outro lado, decorre dos números 30, 31 e 35 do acórdão de 3 de março de 2005, Fini H (C-32/03, EU:C:2005:128), que, tratando-se de uma despesa, como uma despesa de arrendamento, relativa a uma prestação que serviu para uma atividade comercial efetuada por uma pessoa coletiva que cessou a sua atividade e que está em liquidação, o direito à dedução do IVA devido sobre esta despesa deve ser reconhecido quando a referida despesa esteja direta e imediatamente relacionada com essa atividade, desde que seja provada a ausência de intenção fraudulenta ou abusiva.
46 Por conseguinte, numa situação como a que está em causa no processo principal, na qual a sociedade foi objeto de uma decisão judicial que decretou a cessação da atividade para a qual foi criada, mas na qual é pacífico que esta sociedade continuou, durante a sua liquidação, a gerar um volume de negócios através da realização de operações económicas, deve considerar-se que a referida sociedade tem a qualidade de sujeito passivo e, por conseguinte, não pode, para poder deduzir o IVA liquidado sobre os ativos existentes, ser obrigada a pagar o montante de IVA assim liquidado.
47 Tal obrigação constitui uma restrição do direito à dedução contrária ao artigo 168.° da Diretiva IVA.
48 Atendendo a todas as considerações que precedem, há que responder às questões submetidas nos seguintes termos:
– A Diretiva IVA deve ser interpretada no sentido de que não se opõe a uma legislação nacional nos termos da qual o cancelamento obrigatório da inscrição no registo para efeitos de IVA de uma sociedade cuja dissolução foi decretada por decisão judicial determina a obrigação de liquidar o IVA devido ou pago a montante sobre os ativos existentes na data da dissolução desta sociedade e de o pagar ao Estado, desde que esta deixe de efetuar operações económicas a partir da sua dissolução.
– A Diretiva IVA, nomeadamente o seu artigo 168.°, deve ser interpretada no sentido de que se opõe a uma legislação nacional como a que está em causa no processo principal, nos termos da qual o cancelamento obrigatório da inscrição no registo para efeitos de IVA de uma sociedade cuja dissolução foi decretada por uma decisão judicial determina, mesmo quando esta sociedade continue a efetuar operações económicas durante a sua liquidação, a obrigação de liquidar o IVA devido ou pago a montante sobre os ativos existentes na data desta dissolução e de o pagar ao Estado, e que, deste modo, subordina o direito à dedução ao cumprimento desta obrigação.
Quanto às despesas
49 Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.
Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Sexta Secção) declara:
1) A Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, deve ser interpretada no sentido de que não se opõe a uma legislação nacional nos termos da qual o cancelamento obrigatório da inscrição no registo para efeitos de imposto sobre o valor acrescentado (IVA) de uma sociedade cuja dissolução foi decretada por decisão judicial determina a obrigação de liquidar o IVA devido ou pago a montante sobre os ativos existentes na data da dissolução desta sociedade e de o pagar ao Estado, desde que esta deixe de efetuar operações económicas a partir da sua dissolução.
2) A Diretiva 2006/112, nomeadamente o seu artigo 168.°, deve ser interpretada no sentido de que se opõe a uma legislação nacional como a que está em causa no processo principal, nos termos da qual o cancelamento obrigatório da inscrição no registo para efeitos de IVA de uma sociedade cuja dissolução foi decretada por uma decisão judicial determina, mesmo quando esta sociedade continue a efetuar operações económicas durante a sua liquidação, a obrigação de liquidar o IVA devido ou pago a montante sobre os ativos existentes na data desta dissolução e de o pagar ao Estado, e que, deste modo, subordina o direito à dedução ao cumprimento desta obrigação.
Assinaturas
* Língua do processo: búlgaro.