Edição provisória
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)
8 de outubro de 2020 (*)
«Reenvio prejudicial — Imposto sobre o valor acrescentado (IVA) — Diretiva 2006/112/CE — Artigo 135.o, n.o 1, alínea a) — Isenção das operações de seguro — Serviços de gestão de fundos de pensões prestados à empresa fiduciária pelos gestores de investimentos — Exclusão de qualquer indemnização contra a materialização do risco — Regime profissional de pensões — Prática fiscal nacional — Exercício de uma atividade de seguro — Entidades autorizadas — Entidades que não dispõem dessa autorização — Conceito de “operações de seguro”»
No processo C-235/19,
que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.° TFUE, pela Court of Appeal [England & Wales (Civil Division)] [Tribunal de Recurso (Inglaterra e País de Gales) (Secção Civil), Reino Unido], por Decisão de 5 de março de 2019, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 18 de março de 2019, no processo
United Biscuits (Pensions Trustees) Limited,
United Biscuits Pension Investments Limited
contra
Commissioners for Her Majesty’s Revenue and Customs,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),
composto por: J.-C. Bonichot (relator), presidente de secção, L. Bay Larsen, C. Toader, M. Safjan e N. Jääskinen, juízes,
advogado-geral: P. Pikamäe,
secretário: A. Calot Escobar,
vistos os autos,
vistas as observações apresentadas:
– em representação da United Biscuits Pension Investments Limited e da United Biscuits (Pensions Trustees) Limited, por D. Scorey, QC, C. Millard, solicitor, e M. Jones, barrister,
– em representação do Governo do Reino Unido, por Z. Lavery, na qualidade de agente, assistida por T. Ward, QC, e A. Macnab, barrister,
– em representação da Comissão Europeia, por R. Lyal e A. Armenia, na qualidade de agentes,
ouvidas as conclusões do advogado-geral na audiência de 14 de maio de 2020,
profere o presente
Acórdão
1 O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 135.°, n.° 1, alínea a), da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO 2006, L 347, p. 1).
2 Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a United Biscuits (Pension Trustees) Ltd (a seguir «United Biscuits Pension») e a United Biscuits Pension Investments Ltd (a seguir «UB») à Commissioners for Her Majesty’s Revenue & Customs (Administração Fiscal e Aduaneira do Reino Unido) a respeito da sujeição ao imposto sobre o valor acrescentado (IVA) de serviços de gestão de fundos de pensões.
Quadro jurídico
Direito da União
Disposições relativas ao IVA
3 Nos termos do artigo 2.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2006/112, estão sujeitas ao IVA «[a]s prestações de serviços efetuadas a título oneroso no território de um Estado-Membro por um sujeito passivo agindo nessa qualidade».
4 O artigo 131.o da Diretiva 2006/112, que figura no capítulo 1, sob a epígrafe «Disposições gerais», do título IX, intitulado «Isenções», desta diretiva, enuncia:
«As isenções previstas nos capítulos 2 a 9 aplicam-se sem prejuízo de outras disposições comunitárias e nas condições fixadas pelos Estados-Membros a fim de assegurar a aplicação correta e simples das referidas isenções e de evitar qualquer possível fraude, evasão ou abuso».
5 O artigo 135.o, n.o 1, da Diretiva 2006/112, que figura no capítulo 3, sob a epígrafe «Isenções em benefício de outras atividades», do título IX desta diretiva, prevê:
«Os Estados-Membros isentam as seguintes operações:
a) As operações de seguro e de resseguro, incluindo as prestações de serviços relacionadas com essas operações efetuadas por corretores e intermediários de seguros;
[…]»
6 Esta disposição corresponde ao artigo 13.o, B, alínea a), da Sexta Diretiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria coletável uniforme (JO 1977, L 145, p. 1; EE 09 F1 p. 54; a seguir «Sexta Diretiva»), que foi aplicável até 31 de dezembro de 2006.
Disposições em matéria de seguros
7 A Primeira Diretiva 79/267/CEE do Conselho, de 5 de março de 1979, relativa à coordenação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas, respeitantes ao acesso à atividade de seguro direto de vida e ao seu exercício (JO 1979, L 63, p. 1), conforme alterada pela Diretiva 2002/12/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de março de 2002 (JO 2002, L 77, p. 11) (a seguir «Primeira Diretiva relativa ao seguro de vida»), dispunha, no seu artigo 1.o:
«A presente diretiva diz respeito ao acesso à atividade não assalariada do seguro direto praticada por empresas estabelecidas num Estado-Membro ou que aí [se] pretendam [estabelecer], bem como ao exercício das seguintes atividades:
1. Os seguintes seguros, quando decorrem de um contrato:
a) O ramo “Vida” […];
b) O seguro de renda;
c) Os seguros complementares praticados por empresas de seguros de vida […];
d) O seguro praticado na Irlanda e no Reino Unido, denominado “permanent health insurance” (seguro de doença a longo prazo, não rescindível);
2. As seguintes operações, quando decorrem de um contrato, desde que estejam submetidas à fiscalização das autoridades administrativas competentes para a fiscalização dos seguros privados e desde que sejam autorizadas no país de exercício:
[...]
c) As operações de gestão de fundos coletivos de reforma, isto é, as operações que consistem na gestão, pela empresa em causa, de investimentos e, nomeadamente, dos ativos representativos das reservas de organismos que liquidam prestações em caso de morte, em caso de vida, ou em caso de cessação ou redução de atividades;
d) As operações indicadas na alínea c), quando conjugadas com uma garantia de seguro respeitante quer à manutenção do capital, quer à obtenção de um juro mínimo;
[...]
3. As operações dependentes da duração da vida humana, definidas ou previstas na legislação dos seguros sociais, desde que sejam praticadas ou geridas em conformidade com a legislação de um Estado-Membro por empresas de seguros, suportando elas próprias o risco inerente.»
8 Nos termos do artigo 6.° da referida diretiva:
«O acesso às atividades abrangidas pela presente diretiva depende da concessão de uma autorização administrativa prévia.
[...]»
9 O artigo 7.o, n.o 2, da Primeira Diretiva relativa ao seguro de vida enunciava:
«A autorização é dada por ramo de seguros, nos termos do anexo. A autorização abrange o ramo na sua totalidade, salvo se o requerente apenas pretender cobrir parte dos riscos incluídos nesse ramo.
[...]»
10 O artigo 8.o, n.o 1, da referida diretiva previa:
«O Estado-Membro de origem exigirá que as empresas de seguros que solicitem a autorização:
[…]
b) Limitem o seu objeto social às atividades previstas na presente diretiva e às operações que delas diretamente decorrem, com exclusão de qualquer outra atividade comercial.»
11 O anexo da mesma diretiva continha uma lista intitulada «Classificação por ramo», que mencionava, no seu ponto VII, «[a]s operações de gestão de fundos coletivos de reforma mencionados no ponto 2, alínea c) e d), do artigo 1.o».
12 A Primeira Diretiva relativa ao seguro de vida foi revogada e substituída pela Diretiva 2002/83/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de novembro de 2002, relativa aos seguros de vida (JO 2002, L 345, p. 1). O artigo 2.o da Diretiva 2002/83 reproduzia as disposições enunciadas no artigo 1.o da Primeira Diretiva relativa ao seguro de vida. O artigo 5.o, n.o 2, da Diretiva 2002/83 reproduzia o conteúdo do artigo 7.o, n.o 2, da Primeira Diretiva relativa ao seguro de vida. O anexo I da Diretiva 2002/83, intitulado «Classificação por ramo», mencionava, no seu ponto VII, «[a]s operações de gestão de fundos coletivos de reforma mencionados no ponto 2, alíneas c) e d), do artigo 2.o».
13 Por seu lado, a Diretiva 2002/83 foi revogada e substituída pela Diretiva 2009/138/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de novembro de 2009, relativa ao acesso à atividade de seguros e resseguros e ao seu exercício (Solvência II) (JO 2009, L 335, p. 1) (a seguir «Diretiva Solvência II»). O artigo 2.o, n.o 3, desta última reproduz o conteúdo do artigo 1.o da Primeira Diretiva relativa ao seguro de vida, em termos essencialmente idênticos.
14 O artigo 14.°, n.° 1, da Diretiva Solvência II, sob a epígrafe «Princípio da autorização», dispõe:
«O acesso à atividade de seguro direto ou de resseguro abrangida pela presente diretiva depende da concessão de uma autorização prévia.»
15 O artigo 15.o, n.o 2, da Diretiva Solvência II tem a seguinte redação:
«Sem prejuízo do disposto no artigo 14.o, a autorização é concedida para um dos ramos de seguro direto enumerados na parte A do anexo I ou no anexo II. A autorização abrange o ramo na sua totalidade, salvo se o requerente apenas pretender cobrir parte dos riscos incluídos nesse ramo.»
16 O anexo II da Diretiva Solvência II, intitulado «Ramos de seguros de vida», menciona, no seu ponto VII, «[a]s operações de gestão de fundos coletivos de reforma mencionadas no artigo 2.o, n.o 3, alínea b), subalíneas iii) e iv)».
Direito do Reino Unido
17 Resulta do pedido de decisão prejudicial que, em conformidade com a legislação britânica sobre as autorizações das empresas de seguros, as prestações de serviços de gestão de fundos de pensões, incluindo as relativas a regimes profissionais de pensões com benefícios definidos, pertenciam à categoria de «operações de seguro» quando executadas por empresas autorizadas a efetuar operações de seguro nos termos da Insurance Companies Act (Lei das Empresas Seguradoras) (a seguir «empresas seguradoras»).
18 As empresas seguradoras estavam, além disso, sujeitas à fiscalização das autoridades administrativas competentes para a supervisão dos seguros privados. As prestações de serviços de gestão de fundos de pensões podiam igualmente ser prestadas por operadores autorizados ao abrigo de outras regulamentações (a seguir «empresas não seguradoras»).
19 No que diz respeito ao IVA relativo a essas prestações de serviços, resulta dos elementos dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça que, no período em causa, a Administração Fiscal do Reino Unido aplicou regras diferentes consoante os serviços fossem fornecidos por empresas seguradoras ou por empresas não seguradoras. Antes de 1 de janeiro de 2005, esse tratamento diferenciado decorria das disposições legislativas que limitavam o benefício da isenção das operações de seguro aos prestadores que tivessem obtido uma autorização na qualidade de empresas seguradoras. Na sequência de uma alteração legislativa que entrou em vigor nessa data, a Administração Fiscal continuou, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, a limitar o benefício dessa isenção às prestações de serviços de gestão de fundos de pensões fornecidas por empresas seguradoras, apesar de tal limitação já não estar em conformidade com a lei.
Litígio no processo principal e questão prejudicial
20 A United Biscuits Pension é a empresa fiduciária de um regime profissional de pensões instituído a favor dos trabalhadores da United Biscuits (UK) Ltd. A United Biscuits (UB) é a antiga empresa fiduciária de um fundo de investimento coletivo no qual foram investidos os ativos desse regime no período compreendido entre 1989 e 2006.
21 Os fiduciários sucessivos do referido fundo recorreram aos serviços de gestores. Estes últimos eram tanto empresas seguradoras como empresas não seguradoras.
22 Entre os serviços prestados, aqueles que foram faturados por empresas não seguradoras não puderam, por força das regras ou das práticas em vigor no Reino Unido, ser isentos de IVA, facto que é contestado pela United Biscuits Pension e pela UB.
23 Estas últimas, na qualidade de fiduciárias, nomeadamente, do fundo de pensões, após terem solicitado, em vão, à Administração Fiscal do Reino Unido o reembolso do IVA em causa, intentaram uma ação na High Court of Justice (England & Wales), Chancery division [Tribunal Superior de Justiça (Inglaterra e País de Gales) (Secção da Chancelaria), Reino Unido].
24 Por Acórdão de 30 de novembro de 2017, o referido órgão jurisdicional julgou a sua ação improcedente baseando-se no facto de o direito nacional não prever a isenção para o período em causa.
25 Chamado a pronunciar-se sobre um recurso desta decisão, o órgão jurisdicional de reenvio interroga-se sobre a questão de saber se o direito de União permite isentar de IVA as prestações de serviços de gestão de fundos de pensões.
26 Nestas condições, a Court of Appeal [England & Wales (Civil Division)] [Tribunal de Recurso (Inglaterra e País de Gales) (Secção Civil), Reino Unido] decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:
«São os serviços de gestão de fundos de pensões prestados [às recorrentes] por a) empresas seguradoras e/ou por b) empresas não seguradoras “operações de seguro”, na aceção do artigo 135.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva [2006/112] (anteriormente, artigo 13.°, B, alínea a), da Sexta Diretiva)?»
Quanto à questão prejudicial
27 A título preliminar, cumpre destacar que, embora o período de tributação em causa no processo principal seja abrangido consecutivamente pela Sexta Diretiva e pela Diretiva 2006/112, na medida em que o artigo 135.°, n.° 1, alínea a), da Diretiva 2006/112 é idêntico ao artigo 13.°, B, alínea a), da Sexta Diretiva, é possível responder à questão prejudicial com base apenas na mais recente destas duas disposições, em vigor à data do presente acórdão.
28 Com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 135.°, n.° 1, alínea a), da Diretiva 2006/112 deve ser interpretado no sentido de que serviços de gestão de investimentos prestados ao abrigo de um regime profissional de pensões, com exclusão de qualquer indemnização contra a materialização do risco, podem ser qualificados de «operações de seguro», na aceção desta disposição e, por conseguinte, ser abrangidos pela isenção de IVA prevista na referida disposição a favor dessas operações.
29 A este respeito, importa recordar que os termos utilizados para designar as isenções previstas no artigo 135.°, n.° 1, da Diretiva IVA devem ser interpretados estritamente, uma vez que constituem derrogações ao princípio geral de que o IVA é cobrado sobre cada prestação de serviços efetuada a título oneroso por um sujeito passivo (Acórdão de 17 de março de 2016, Aspiro, C-40/15, EU:C:2016:172, n.° 20).
30 No tocante às operações de seguro referidas nessa disposição, estas caracterizam-se, como é geralmente admitido e segundo jurisprudência constante, pelo facto de o segurador, mediante o pagamento prévio de um prémio pelo segurado, se comprometer a fornecer a este último, em caso de realização do risco coberto, a prestação acordada no momento da celebração do contrato (v. Acórdão de 17 de março de 2016, Aspiro, C-40/15, EU:C:2016:172, n.° 22 e jurisprudência referida).
31 No caso em apreço, o órgão jurisdicional de reenvio indica, e o mesmo foi confirmado na audiência, que os serviços contratados prestados às recorrentes no processo principal consistiam apenas na gestão de investimentos por sua conta, com exclusão de qualquer indemnização contra a materialização do risco.
32 É pacífico que tais prestações de serviços não satisfazem os critérios mencionados nos n.os 29 e 30 do presente acórdão, justificando-se a isenção prevista no artigo 135.°, n.° 1, alínea a), da Diretiva 2006/112 essencialmente pela dificuldade em determinar a matéria coletável correta de IVA para os prémios de seguro relativos à cobertura do risco.
33 Contrariamente ao que sustentam as recorrentes no processo principal, não é possível extrair da jurisprudência do Tribunal de Justiça ou do direito da União em matéria de seguros nenhum outro critério de conexão ao conceito de «operações de seguro», na aceção do artigo 135.°, n.° 1, alínea a), da Diretiva 2006/112.
34 No que respeita à jurisprudência do Tribunal de Justiça, as recorrentes no processo principal invocam o n.° 18 do Acórdão de 25 de fevereiro de 1999, CPP (C-349/96, EU:C:1999:93), e o n.° 30 do Acórdão de 8 de março de 2001, Skandia (C-240/99, EU:C:2001:140).
35 É verdade que em tais números se afirma, em substância, que nada autoriza uma interpretação diferente do termo «seguro» consoante figure nas diretivas em matéria de seguro ou nas relativas ao IVA.
36 Todavia, tal como sublinhou o advogado-geral nos n.os 71 a 75 das suas conclusões no presente processo, afigura-se que os referidos números, lidos no contexto específico dos acórdãos em que se inserem, dizem respeito, em bom rigor, a modalidades de execução do seguro, como as prestações em espécie ou a existência de um intermediário entre o segurador e o segurado. Em contrapartida, o Tribunal de Justiça, que se referiu ao termo «seguro» em geral e não ao conceito de «operações de seguro», na aceção do sistema comum do IVA, não pretendeu estabelecer uma conexão necessária e intrínseca entre este último e eventuais categorias jurídicas que figuram nas diretivas em matéria de seguro. Por conseguinte, ambos os acórdãos mencionados pelas recorrentes no processo principal retomam e aplicam os critérios enunciados nos n.os 29 e 30 do presente acórdão sem os pôr em causa ou os complementar à luz do direito da União em matéria de seguros.
37 Além disso, uma análise precisa das disposições pertinentes das diretivas não pode sustentar a ideia de que prestações de gestão de fundos de pensões, como as que estão em causa no processo principal, são suscetíveis de ser abrangidas pelo âmbito de aplicação do artigo 135.°, n.° 1, alínea a), da Diretiva 2006/112.
38 Com efeito, por força da própria redação do artigo 1.° da Primeira Diretiva relativa ao seguro de vida, reproduzido, em substância, pelas diretivas que a substituíram, as atividades de seguro de vida referidas nessas disposições incluem quer os «seguros» mencionados no n.° 1 desse artigo, quer as «operações» mencionadas nos n.os 2 e 3 do referido artigo.
39 Ora, entre essas «operações» figuram «as operações de gestão de fundos coletivos de reforma».
40 Tal como salientou o advogado-geral, em substância, no n.° 58 das suas conclusões, embora os «seguros» mencionados no n.° 1 desse artigo constituam atividades de seguro na aceção corrente do termo, as «operações» são atividades próximas e estreitamente ligadas a essas atividades de seguro. Trata-se de operações acessórias abrangidas pela Primeira Diretiva relativa ao seguro de vida e pela legislação que a substitui, sem que, no entanto, constituam «seguros» na aceção das diretivas em matéria de seguros.
41 Deste modo, o legislador da União pretendeu, para efeitos de aplicação das diretivas em matéria de seguro, não considerar prestações como as que estão em causa no processo principal como «seguros».
42 Contrariamente ao que sustentam as recorrentes no processo principal, tal conclusão não pode ser infirmada à luz da redação dos anexos das diretivas em matéria de seguro, pelo facto de estes mencionarem a gestão de fundos de reforma como atividades de seguro.
43 É verdade que, a este respeito, pode resultar uma ambiguidade do facto de alguns destes anexos empregarem, nos seus títulos, os termos «ramos de seguro» ou «ramo de seguros de vida».
44 Todavia, essa ambiguidade não resiste a uma análise contextual das disposições em causa.
45 No que respeita ao título em língua inglesa do anexo da Primeira Diretiva relativa ao seguro de vida, importa observar, como sublinhou o advogado-geral no n.° 60 das suas conclusões, que só as versões em língua dinamarquesa e inglesa qualificam no seu título os ramos de «ramos de seguro», enquanto as versões em língua alemã, francesa, italiana e neerlandesa só fazem referência aos «ramos» de atividade, sugerindo que a «gestão de fundos coletivos de reforma», que figura no ponto VII desse anexo, constitui um ramo de atividade e não um ramo de seguro.
46 Segundo jurisprudência constante, as disposições do direito da União devem ser interpretadas e aplicadas de modo uniforme à luz das versões redigidas em todas as línguas da União Europeia. Em caso de divergência entre as diferentes versões linguísticas de um texto da União, a disposição em questão deve ser interpretada em função da economia geral e da finalidade da regulamentação de que constitui um elemento (Acórdão de 8 de dezembro de 2005, Jyske Finans, C-280/04, EU:C:2005:753, n.° 31).
47 A este respeito, e isto é igualmente válido para o título do anexo I da Diretiva 2002/83 e do anexo II da Diretiva Solvência II, cumpre recordar que a razão de ser da classificação feita no anexo dessas diretivas consiste em determinar, nomeadamente, as atividades que são objeto da autorização obrigatória prevista por tais disposições para o acesso às atividades no território de um Estado-Membro.
48 Esta autorização é exigida, tal como resulta de uma leitura conjugada dos artigos 1.° e 6.° da Primeira Diretiva relativa ao seguro de vida, que não foram objeto de alterações substanciais nas diretivas subsequentes, para «as atividades previstas na presente diretiva».
49 Ora, tal como foi referido nos n.os 38 e seguintes do presente acórdão, essas atividades consistem quer em «seguros» quer em «operações» acessórias, entre as quais figura a gestão de fundos de pensões.
50 Por conseguinte, é coerente, à luz da economia geral das diretivas em matéria de seguro, que a classificação das atividades estabelecida pelas referidas diretivas nos seus anexos inclua as atividades de seguro e de gestão de fundos de pensões, sem que tal classificação possa ser interpretada no sentido de que equipara tais operações aos seguros.
51 À luz das considerações precedentes, há que responder à questão submetida que o artigo 135.°, n.° 1, alínea a), da Diretiva 2006/112 deve ser interpretado no sentido de que serviços de gestão de investimentos prestados ao abrigo de um regime profissional de pensões, com exclusão de qualquer indemnização contra a materialização do risco, não podem ser qualificados de «operações de seguro», na aceção desta disposição, e, por conseguinte, não podem ser abrangidos pela isenção de IVA prevista na referida disposição a favor dessas operações.
Quanto às despesas
52 Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.
Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:
O artigo 135.°, n.° 1, alínea a), da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, deve ser interpretado no sentido de que serviços de gestão de investimentos prestados ao abrigo de um regime profissional de pensões, com exclusão de qualquer indemnização contra a materialização do risco, não podem ser qualificados de «operações de seguro», na aceção desta disposição, e, por conseguinte, não podem ser abrangidos pela isenção de imposto sobre o valor acrescentado (IVA) prevista na referida disposição a favor dessas operações.
Assinaturas
* Língua do processo: inglês.