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Edição provisória

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sétima Secção)

8 de fevereiro de 2024 (*)

«Reenvio prejudicial — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) — Diretiva 2006/112/CE — Artigo 98.° — Faculdade de os Estados-Membros aplicarem uma taxa reduzida de IVA a determinadas entregas de bens e prestações de serviços — Anexo III, ponto 12 — Taxa reduzida de IVA aplicável ao alojamento em hotéis e estabelecimentos do mesmo tipo — Aplicação desta taxa apenas aos estabelecimentos de alojamento que disponham de um certificado de classificação — Princípio da neutralidade fiscal»

No processo C-733/22,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.° TFUE, pelo Varhoven administrativen sad (Supremo Tribunal Administrativo, Bulgária), por Decisão de 18 de novembro de 2022, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 29 de novembro de 2022, no processo

Direktor na Direktsia «Obzhalvane i danachno-osiguritelna praktika» — Sofia pri Tsentralno upravlenie na Natsionalnata agentsia za prihodite

contra

«Valentina Heights» EOOD,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sétima Secção),

composto por: F. Biltgen, presidente de secção, N. Wahl e M. L. Arastey Sahún (relatora), juízes,

advogado-geral: M. Szpunar,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação do Direktor na Direktsia «Obzhalvane i danachno-osiguritelna praktika» — Sofia pri Tsentralno upravlenie na Natsionalnata agentsia za prihodite, por E. Pavlova,

–        em representação da «Valentina Heights» EOOD, por D. D. Dimitrova, advokat,

–        em representação da Comissão Europeia, por A. Armenia e D. Drambozova, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado-geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 98.°, n.° 2, e do anexo III, ponto 12, da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO 2006, L 347, p. 1) (a seguir «Diretiva IVA»).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe o Direktor na Direktsia «Obzhalvane i danachno-osiguritelna praktika» — Sofia pri Tsentralno upravlenie na Natsionalnata agentsia za prihodite (diretor da Direção «Recursos e Práticas em Matéria de Fiscalidade e de Segurança Social» de Sófia da Administração Central da Autoridade Tributária Nacional, Bulgária; a seguir «Direktor») à «Valentina Heights» EOOD, a respeito da aplicação da taxa reduzida do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) às atividades desta sociedade durante um período em que não dispunha de certificado de classificação para o estabelecimento de alojamento que gere.

 Quadro jurídico

 Direito da União

3        O artigo 96.° da Diretiva do IVA dispõe:

«Os Estados-Membros aplicam uma taxa normal de IVA fixada por cada Estado-Membro numa percentagem do valor tributável que é idêntica para a entrega de bens e para a prestação de serviços.»

4        O artigo 98.°, n.os 1 e 2, desta diretiva, prevê:

«1.      Os Estados-Membros podem aplicar uma ou duas taxas reduzidas.

2.      As taxas reduzidas aplicam-se apenas às entregas de bens e às prestações de serviços das categorias constantes do Anexo III.

[...]»

5        O artigo 135.° da referida diretiva tem a seguinte redação:

«1.      Os Estados-Membros isentam as seguintes operações:

[...]

l)      A locação de bens imóveis.

2.      Não beneficiam da isenção prevista na alínea l) do n.° 1 as seguintes operações:

a)      As operações de alojamento, tal como definidas na legislação dos Estados-Membros, realizadas no âmbito do setor hoteleiro ou de setores com funções análogas, incluindo as locações de campos de férias ou de terrenos para campismo;

[...]»

6        O anexo III da Diretiva IVA contém a lista das entregas de bens e das prestações de serviços a que se podem aplicar as taxas reduzidas de IVA previstas no artigo 98.° desta diretiva. O ponto 12 deste anexo menciona os seguintes serviços:

«Alojamento em hotéis e estabelecimentos do mesmo tipo, incluindo alojamento de férias e utilização de parques de campismo e de caravanismo.»

 Direito búlgaro

 Lei do IVA

7        Nos termos do artigo 66.° da zakon za danak varhu dobavenata stoynost (Lei do Imposto sobre o Valor Acrescentado) (DV n.° 63, de 4 de agosto de 2006), na sua versão aplicável ao litígio no processo principal (a seguir «Lei do IVA»):

«(1)      A taxa do imposto é de 20 % para:

1.      as entregas tributáveis, com exceção das expressamente indicadas como tributáveis à taxa zero.

[...]

(2)      [...] A taxa de imposto aplicável ao alojamento em hotéis e estabelecimentos do mesmo tipo, incluindo o alojamento de férias e a utilização de parques de campismo e de caravanismo, é de 9 %.

[...]»

8        O § 1, n.° 45, das Disposições Complementares da Lei do IVA prevê que, para efeitos desta lei, entende-se por «alojamento» os «serviços turísticos básicos na aceção do n.° 69 [do § 1] das Disposições Complementares da [zakon za turizma (Lei do Turismo) (DV n.° 30, de 26 de março de 2013)], com exclusão da prestação de um serviço turístico geral».

 Regulamento de Aplicação da Lei do IVA

9        O artigo 40.° do pravilnik za prilagane na zakona za danak varhu dobavenata stoynost (Regulamento de Aplicação da Lei do IVA) (DV n.° 76, de 15 de setembro de 2006), sob a epígrafe «Alojamento em hotéis», dispõe, no seu n.° 1:

«Para provar as prestações referidas no artigo 66.°, n.° 2, da Lei [do IVA], quando o serviço é prestado por uma pessoa que disponibiliza alojamento em estabelecimentos turísticos, esta deve dispor de:

1.      uma cópia do registo das chegadas dos turistas;

2.      um certificado de classificação do estabelecimento turístico;

3.      uma fatura da prestação de serviços, salvo se a emissão desta fatura não for obrigatória nos termos do artigo 113.°, n.° 3, da Lei [do IVA].»

 Lei do Turismo

10      O artigo 111.° da Lei do Turismo tem a seguinte redação:

«(1)      No território búlgaro, a atividade de hotelaria ou de restauração só pode ser exercida em estabelecimentos turísticos classificados nos termos da presente lei.

(2)      [...] A classificação é efetuada pelo [ministara na turizma (ministro do Turismo, Bulgária)] e pelos presidentes dos municípios ou pelos funcionários autorizados por eles, para os tipos de estabelecimentos e as categorias especificadas na presente lei.

[...]»

11      Nos termos do artigo 113.°, n.° 1, desta lei:

«Pode exercer a atividade de hotelaria ou de restauração quem:

[...]

3.      disponha de pessoal com a qualificação profissional e linguística necessária, bem como com a experiência exigida para o pessoal dirigente.»

12      O artigo 114.°, n.os 1 e 2, da referida lei prevê:

«Quem exercer a atividade de hotelaria e/ou de restauração em estabelecimentos turísticos [...] tem de:

1.      prestar serviços turísticos num estabelecimento turístico classificado ou num estabelecimento para o qual tenha sido emitido um certificado provisório decorrente da abertura de um procedimento de classificação;

2.      prestar serviços turísticos num estabelecimento turístico que satisfaça os requisitos da categoria que lhe é atribuída [...]»

13      O artigo 133.°, n.° 1, da mesma lei dispõe:

«A categoria dos estabelecimentos de alojamento e dos seus estabelecimentos suplementares de restauração e de entretenimento [...] é determinada com base no cumprimento dos requisitos mínimos obrigatórios em matéria de construção, de renovação e de equipamento, de serviço, de serviços propostos e de qualificação profissional e linguística do pessoal [...]»

14      O § 1 das Disposições Complementares da Lei do Turismo prevê:

«Para efeitos da presente lei, entende-se por: [...]

[...]

69.      “Serviços turísticos básicos”: o alojamento, a restauração e o transporte.

[...]»

15      Nos termos do § 121 das Disposições Transitórias e Finais da Lei que Altera e Completa a Lei do Turismo:

«Para os estabelecimentos turísticos classificados antes de 26 de março de 2013 [data de entrada em vigor da Lei do Turismo], os documentos de classificação devem ser apresentados em 2019.»

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

16      A Valentina Heights é uma sociedade de direito búlgaro cujo objeto social compreende, nomeadamente, as atividades de turismo, de restauração, de hotelaria e de organização de viagens. Foi registada para efeitos da Lei do IVA em 13 de dezembro de 2016.

17      Esta sociedade foi sujeita a uma inspeção fiscal relativa ao período compreendido entre 13 de dezembro de 2016 e 29 de fevereiro de 2020. No decurso desta inspeção, comprovou-se que, durante esse período, a referida sociedade tinha arrendado um complexo turístico de apartamentos também denominado «Valentina Heights» (a seguir «complexo turístico em causa»), situado na cidade de Bansko (Bulgária) e pertencente a particulares. Segundo os contratos de gestão de bens imóveis privados que fazem parte deste complexo, os proprietários destes bens aceitaram que a Valentina Heights gerisse, mantivesse e arrendasse em seu nome os referidos bens a terceiros. Assim, durante o referido período, esta sociedade exerceu uma atividade de alojamento no referido complexo. As receitas desta atividade foram contabilizadas através de caixas registadoras eletrónicas ligadas à Autoridade Tributária e por transferência bancária. A sociedade faturou IVA à taxa de 9 % sobre as operações realizadas.

18      A Valentina Heights apresentou um certificado datado de 15 de fevereiro de 2013, emitido pelo presidente do Município de Bansko, que classificava o complexo turístico em causa como uma casa de hóspedes com uma capacidade de 9 quartos e 19 camas.

19      Em 18 de novembro de 2016, esta sociedade apresentou ao ministerstvo na turizma (Ministério do Turismo, Bulgária) um pedido de classificação do referido complexo na categoria «três estrelas», com uma capacidade declarada de 23 quartos e 46 camas.

20      Por Despacho de 7 de março de 2019, o presidente do Município de Bansko revogou a classificação de casa de hóspedes concedida pelo certificado acima referido.

21      Em 27 de setembro de 2019, a Valentina Heights apresentou ao Ministério do Turismo um pedido de classificação de uma cafetaria pertencente ao complexo turístico em causa na categoria «duas estrelas».

22      Em 22 de julho, 1 de outubro e 16 de outubro de 2019, bem como em 16 e 18 de setembro de 2020, esta sociedade apresentou aditamentos aos documentos anexos aos pedidos de classificação referidos nos n.os 19 e 21 do presente acórdão.

23      Por Despacho de 21 de setembro de 2020, o zamestnik-ministara na turizma (vice-ministro do Turismo, Bulgária) iniciou um procedimento de classificação destes estabelecimentos turísticos e emitiu, para o complexo turístico em causa e para a respetiva cafetaria, certificados provisórios válidos até 21 de janeiro de 2021.

24      Em 4 de dezembro de 2020, os serviços de receitas da teritorialna direktsia na Natsionalnata agentsia za prihodite (Direção Territorial da Agência Nacional das Receitas Públicas, Bulgária) emitiram, para os períodos fiscais dos meses de março de 2019 e junho de 2019, bem como para o período compreendido entre agosto de 2019 e fevereiro de 2020, uma liquidação adicional do IVA declarado, confirmada por Decisão do Direktor de 22 de fevereiro de 2021.

25      Nesta liquidação adicional, foi salientado que a Valentina Heights dispunha do certificado referido no n.° 18 do presente acórdão para o período compreendido entre 15 de fevereiro de 2013 e 7 de março de 2019. Constatou-se assim que, após esta última data, esta sociedade não dispunha de certificado de classificação para o complexo turístico em causa e que, por conseguinte, tinha declarado erradamente o IVA à taxa de 9 % nas faturas que emitiu após a referida data. Por este motivo, a referida sociedade não cumpria o artigo 40.°, n.° 1, ponto 2, do Regulamento de Aplicação da Lei do IVA, que prevê que, para provar a existência de prestações de serviços que beneficiam da taxa reduzida de IVA de 9 %, o prestador de serviço deve dispor, nomeadamente, deste certificado. Assim, nos termos do artigo 66.°, n.° 1, da Lei do IVA, foi calculado um montante adicional de IVA, para sujeitar à taxa normal de IVA de 20 % os serviços que a Valentina Heights tinha prestado sem dispor de um certificado de classificação.

26      Por Sentença de 6 de dezembro de 2021, o Administrativen sad Blagoevgrad (Tribunal Administrativo de Blagoevgrad, Bulgária) deu provimento ao recurso interposto pela Valentina Heights da referida liquidação adicional. Esse órgão jurisdicional salientou que esta sociedade tinha efetuado todas as diligências necessárias para obter um certificado de classificação, uma vez que tinha apresentado, em 2016 e em 2019, respetivamente, os pedidos referidos nos n.os 19 e 21 do presente acórdão, mas o Ministério do Turismo não tinha emitido atempadamente os certificados de classificação pedidos, atendendo a que este só emitiu os certificados provisórios em 23 de setembro de 2020. Deste modo, o referido tribunal considerou que, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça resultante, em especial, do Acórdão de 22 de outubro de 1998, Madgett e Baldwin (C-308/96 e C-94/97, EU:C:1998:496), o regime especial de tributação das prestações de serviços de turismo devia ser aplicado com base na natureza da atividade exercida e não com base num registo regulado por uma lei especial, neste caso a Lei do Turismo.

27      O Direktor interpôs recurso de cassação da referida sentença no Varhoven administrativen sad (Supremo Tribunal Administrativo, Bulgária), que é o órgão jurisdicional de reenvio, alegando que a prestação de serviços em estabelecimentos turísticos que não dispõem de um certificado de classificação ou de um certificado provisório não deve ser considerada um alojamento, na aceção do artigo 66.°, n.° 2, da Lei do IVA, nem deve beneficiar de uma taxa de tributação reduzida.

28      A este respeito, o órgão jurisdicional de reenvio recorda que resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça, nomeadamente do Acórdão de 6 de maio de 2010, Comissão/França (C-94/09, EU:C:2010:253, n.° 28), que, quando um Estado-Membro decide fazer uso da possibilidade que lhe confere o artigo 98.°, n.os 1 e 2, da Diretiva IVA, de aplicar uma taxa reduzida de IVA a uma categoria de prestações constante do anexo III desta diretiva, tem a possibilidade de limitar a aplicação dessa taxa reduzida de IVA a elementos concretos e específicos dessa categoria, desde que respeite o princípio da neutralidade fiscal.

29      Além disso, esse órgão jurisdicional salienta que a Diretiva IVA não define o conceito de «[a]lojamento em hotéis e estabelecimentos do mesmo tipo», na aceção do anexo III, ponto 12, desta diretiva.

30      O órgão jurisdicional de reenvio observa que, em contrapartida, o artigo 135.°, n.° 2, primeiro parágrafo, alínea a), da Diretiva IVA dispõe que não beneficiam da isenção relativa à locação de bens imóveis «[a]s operações de alojamento, tal como definidas na legislação dos Estados-Membros, realizadas no âmbito do setor hoteleiro ou de setores com funções análogas». De acordo com este órgão jurisdicional, resulta daqui que as operações de alojamento devem estar em conformidade com as definições que constam da legislação dos Estados-Membros. Ora, o § 1, n.° 45, das Disposições Complementares da Lei do IVA define o conceito de «alojamento» por referência à Lei do Turismo.

31      Por conseguinte, interroga-se sobre se se pode considerar que o facto de a legislação búlgara sujeitar o alojamento em hotéis e estabelecimentos do mesmo tipo a requisitos de classificação limita a aplicação da taxa reduzida a aspetos concretos e específicos, na aceção da jurisprudência do Tribunal de Justiça, ou se a taxa reduzida para a tributação deste alojamento para efeitos de IVA deve ser aplicada com base na natureza da atividade exercida e não com base na classificação exigida pela Lei do Turismo.

32      Nestas circunstâncias, o Varhoven administrativen sad (Supremo Tribunal Administrativo) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1      Deve o artigo 98.°, n.° 2, em conjugação com o Anexo III, ponto 12, da Diretiva [IVA], ser interpretado no sentido de que a taxa reduzida de imposto sobre o valor acrescentado prevista nesta disposição para o alojamento em hotéis e estabelecimentos do mesmo tipo pode ser aplicada quando esses estabelecimentos não estão classificados numa categoria nos termos da legislação nacional do Estado-Membro [do órgão jurisdicional de reenvio?]

2      Em caso de resposta negativa a esta questão, deve o artigo 98.°, n.° 2, em conjugação com o Anexo III, ponto 12, da Diretiva [IVA], ser interpretado no sentido de que permite uma aplicação seletiva da taxa reduzida a aspetos concretos e específicos de uma determinada categoria de prestação de serviços, quando a condição para o efeito consista no facto de o alojamento em hotéis e estabelecimentos do mesmo tipo só poder ser efetuado em estabelecimentos de alojamento classificados numa categoria em conformidade com a legislação nacional do Estado-Membro [do órgão jurisdicional de reenvio] ou para os quais tenha sido emitido um certificado provisório de instauração de um procedimento para classificação numa categoria[?]»

 Quanto às questões prejudiciais

33      Com as suas questões, que importa examinar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 98.°, n.° 2, da Diretiva IVA, em conjugação com o anexo III, ponto 12, desta diretiva, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional nos termos da qual a taxa reduzida de IVA aplicável ao alojamento em hotéis e estabelecimentos do mesmo tipo está sujeita à obrigação de estes estabelecimentos disporem de um certificado de classificação ou de um certificado de classificação provisório.

34      Nos termos do artigo 96.° da Diretiva IVA, cada Estado-Membro aplica a mesma taxa normal de IVA às entregas de bens e às prestações de serviços.

35      Em derrogação a este princípio, o artigo 98.° desta diretiva prevê a possibilidade de se aplicarem taxas reduzidas de IVA. Para este efeito, o anexo III da referida diretiva enumera, de modo exaustivo, as categorias de entregas de bens e de prestações de serviços a que se podem aplicar taxas reduzidas.

36      Mais concretamente, o anexo III, ponto 12, da Diretiva IVA permite aos Estados-Membros aplicar uma taxa reduzida de IVA ao «[a]lojamento em hotéis e estabelecimentos do mesmo tipo, incluindo alojamento de férias e utilização de parques de campismo e de caravanismo».

37      A Diretiva IVA não contém uma definição do conceito de «[a]lojamento em hotéis e estabelecimentos do mesmo tipo», que consta deste anexo III, ponto 12.

38      No entanto, o artigo 135.°, n.° 2, primeiro parágrafo, alínea a), da Diretiva IVA dispõe que não beneficiam da isenção de IVA prevista para a locação de bens imóveis, pelo artigo 135.°, n.° 1, alínea l), desta diretiva, «[a]s operações de alojamento, tal como definidas na legislação dos Estados-Membros, realizadas no âmbito do setor hoteleiro ou de setores com funções análogas, incluindo as locações de campos de férias ou de terrenos para campismo».

39      A este respeito, há que observar que o anexo III, ponto 12, da Diretiva IVA está formulado, em substância, em termos equivalentes aos do artigo 135.°, n.° 2, primeiro parágrafo, alínea a), desta diretiva.

40      Como especifica esta última disposição, as operações de alojamento efetuadas, nomeadamente, no âmbito do setor hoteleiro devem ser entendidas «tal como definidas na legislação dos Estados-Membros». Ora, o órgão jurisdicional de reenvio observa que o direito búlgaro define o conceito de «alojamento» por referência à Lei do Turismo, nos termos da qual os estabelecimentos de alojamento devem dispor de um certificado de classificação ou de um certificado de classificação provisório.

41      O Tribunal de Justiça já declarou que, para definir as operações de alojamento que devem ser tributadas em derrogação da isenção da locação de bens imóveis, de acordo com este artigo 135.°, n.° 2, primeiro parágrafo, alínea a), os Estados-Membros gozam de uma margem de discricionariedade. Compete-lhes, por conseguinte, na transposição desta disposição, introduzir critérios que lhes pareçam adequados para estabelecer a distinção entre as operações tributáveis e as que não o são (v., neste sentido, Acórdão de 16 de dezembro de 2010, Macdonald Resorts, C-270/09, EU:C:2010:780, n.° 50 e jurisprudência referida).

42      A este respeito, no caso em apreço, resulta da decisão de reenvio que, na liquidação adicional mencionada no n.° 25 do presente acórdão, as autoridades tributárias consideraram que, durante o período em que a Valentina Heights não dispunha de um certificado de classificação, os serviços que esta sociedade prestou deviam ter sido faturados à taxa normal de IVA, a saber, à taxa de 20 %, e não à taxa reduzida de 9 %. Assim, há que observar que, embora estes serviços tenham sido prestados num estabelecimento não classificado nos termos da Lei do Turismo, as referidas autoridades tributárias consideraram que estes constituíam operações de alojamento efetuadas no âmbito do setor hoteleiro. Com efeito, se assim não fosse, as referidas prestações teriam sido isentas de IVA, em conformidade com o artigo 135.°, n.° 1, alínea l), da Diretiva IVA.

43      Em seguida, quanto à questão de saber se os Estados-Membros podem subordinar a possibilidade de aplicar uma taxa reduzida de IVA à condição de os estabelecimentos em causa disporem de um certificado de classificação ou de um certificado de classificação provisório, há que recordar que, como resulta da redação do artigo 98.° da Diretiva IVA, a aplicação de uma ou de duas taxas reduzidas não é obrigatória. Constitui uma possibilidade reconhecida aos Estados-Membros, em derrogação do princípio segundo o qual é aplicável a taxa normal (Acórdão de 9 de março de 2017, Oxycure Belgium, C-573/15, EU:C:2017:189, n.° 25). Por conseguinte, os Estados-Membros podem, em princípio, optar por aplicar uma taxa reduzida de IVA a determinadas prestações de serviços de alojamento referidas no anexo III, ponto 12, da Diretiva IVA, não deixando de aplicar a taxa normal a outras prestações de serviço (v., neste sentido, Acórdão de 27 de junho de 2019, Belgisch Syndicaat van Chiropraxie e o., C-597/17, EU:C:2019:544, n.° 45 e jurisprudência referida).

44      O exercício da possibilidade de proceder a uma aplicação seletiva da taxa reduzida de IVA reconhecida aos Estados-Membros está sujeito à dupla condição de, por um lado, isolar apenas, para efeitos de aplicação da taxa reduzida, aspetos concretos e específicos da categoria de prestações em causa e, por outro, respeitar o princípio da neutralidade fiscal (Acórdão de 27 de fevereiro de 2014, Pro Med Logistik e Pongratz, C-454/12 e C-455/12, EU:C:2014:111, n.° 45 e jurisprudência referida).

45      Para determinar, antes de mais, se o alojamento em estabelecimentos classificados constitui um aspeto concreto e específico da categoria relativa ao alojamento em hotéis e em estabelecimentos do mesmo tipo, cumpre apreciar se se trata de uma prestação de serviços identificável em si mesma, separadamente das outras prestações desta categoria (v., neste sentido, Acórdão de 27 de fevereiro de 2014, Pro Med Logistik e Pongratz, C-454/12 e C-455/12, EU:C:2014:111, n.° 47 e jurisprudência referida).

46      A Comissão Europeia alega, nas suas observações escritas, que é o que acontece no caso dos autos, tendo em conta o quadro jurídico específico previsto na Bulgária para a classificação de estabelecimentos turísticos, que lhes impõe uma série de obrigações. Menciona, nomeadamente, o artigo 113.°, n.° 1, ponto 3, da Lei do Turismo, que prevê a obrigação de dispor de pessoal com a qualificação profissional e linguística necessária, bem como com a experiência exigida para o pessoal dirigente, ou o artigo 133.°, n.° 1, desta lei, que prevê que a categoria dos estabelecimentos de alojamento é determinada com base no respeito de requisitos mínimos obrigatórios em matéria, nomeadamente, de construção, de renovação e de equipamento, bem como de serviços propostos.

47      Tendo em conta estas obrigações, a Comissão faz referência ao Acórdão de 27 de fevereiro de 2014, Pro Med Logistik e Pongratz (C-454/12 e C-455/12, EU:C:2014:111), que dizia respeito à questão de saber se o transporte urbano de passageiros de táxi constituía um aspeto concreto e específico dos serviços prestados pelas empresas de transporte de passageiros e das respetivas bagagens, e no qual o Tribunal de Justiça salientou que o quadro jurídico aplicável às empresas de táxi era muito mais vinculativo do que o aplicável às empresas de aluguer de viaturas com motorista.

48      Ora, no caso dos autos, contrariamente às características do processo que deu origem ao acórdão referido no número anterior, parece decorrer do quadro jurídico nacional, como resulta não só das informações fornecidas na decisão de reenvio mas também da própria redação da segunda questão prejudicial, que, na Bulgária, todos os estabelecimentos de alojamento devem ser objeto de uma classificação ao abrigo da Lei do Turismo, sem a qual não podem exercer legalmente a sua atividade. Se for efetivamente assim, o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar, o alojamento em estabelecimentos não classificados não seria um outro tipo de prestação abrangida pela categoria prevista no anexo III, ponto 12, da Diretiva IVA, mas um alojamento não conforme com a legislação nacional.

49      Tal violação do quadro jurídico nacional poderia eventualmente implicar, em conformidade com a legislação nacional, sanções, nomeadamente administrativas.

50      Em contrapartida, numa situação como esta, a aplicação da taxa normal de IVA ao alojamento em estabelecimentos não classificados não pode ser justificada, uma vez que, na Bulgária, todo o «[a]lojamento em hotéis e estabelecimentos do mesmo tipo», na aceção do anexo III, ponto 12, da Diretiva IVA, deve ser, por definição e sem prejuízo das verificações a efetuar pelo órgão jurisdicional de reenvio, um alojamento em estabelecimentos classificados. Por conseguinte, tal alojamento em estabelecimentos classificados não pode constituir um aspeto concreto e específico da categoria visada neste ponto 12, identificável separadamente de outras prestações abrangidas por esta e que consistem em fornecer alojamento em estabelecimentos não classificados, dado que tais prestações não são autorizadas pela legislação nacional.

51      Por outras palavras, na medida em que a obrigação de classificação prevista pela legislação búlgara diz respeito a todas as prestações de «[a]lojamento em hotéis e estabelecimentos do mesmo tipo», na aceção do anexo III, ponto 12, desta diretiva, não se pode considerar que esta legislação limita a aplicação da taxa reduzida de IVA a aspetos concretos e específicos desta categoria de prestações (v., neste sentido, Acórdão de 22 de setembro de 2022, The Escape Center, C-330/21, EU:C:2022:719, n.° 38), uma vez que abrange todas as prestações da referida categoria.

52      Caberá ao órgão jurisdicional de reenvio verificar, à luz da legislação nacional e das circunstâncias de facto que lhe foram submetidas, se o alojamento num estabelecimento classificado pode constituir um aspeto concreto e específico da mesma categoria (v., neste sentido, Acórdão de 27 de fevereiro de 2014, Pro Med Logistik e Pongratz, C-454/12 e C-455/12, EU:C:2014:111, n.° 51).

53      Na hipótese de chegar à conclusão de que é esse o caso, o órgão jurisdicional de reenvio deve, num segundo momento, verificar se a aplicação seletiva da taxa reduzida de IVA apenas aos estabelecimentos de alojamento que são objeto de classificação nos termos da Lei do Turismo viola o princípio da neutralidade fiscal.

54      Este princípio opõe-se a que bens ou prestações de serviços semelhantes, que estão em concorrência entre si, sejam tratados de maneira diferente do ponto de vista do IVA. Para determinar se os bens ou as prestações de serviços são semelhantes, há que ter principalmente em conta o ponto de vista do consumidor médio. Os bens ou as prestações de serviços são semelhantes quando apresentem propriedades análogas e satisfaçam as mesmas necessidades do consumidor, em função de um critério de comparabilidade na utilização, e quando as diferenças existentes não influenciem de modo considerável a decisão do consumidor médio de recorrer a um ou a outro dos referidos bens ou prestações de serviços (Acórdão de 27 de junho de 2019, Belgisch Syndicaat van Chiropraxie e o., C-597/17, EU:C:2019:544, n.os 47 e 48 e jurisprudência referida).

55      Assim, se se considerar que o alojamento num estabelecimento classificado constitui uma prestação de serviços identificável em si mesma, separadamente do alojamento num estabelecimento não classificado, há que examinar se o facto de dispor de um certificado de classificação é suscetível de criar, aos olhos do consumidor médio, uma diferença entre os estabelecimentos classificados e os estabelecimentos não classificados, na medida em que cada um deles seja suscetível de responder a necessidades distintas do referido consumidor e, deste modo, de ter uma influência determinante na decisão deste de optar por um ou outro destes tipos de alojamento.

56      É certo que não se pode deixar de observar que a classificação de um estabelecimento pelas autoridades nacionais é, em princípio, suscetível de fornecer uma garantia, aos olhos do consumidor médio, quanto ao nível, ao alcance e à qualidade dos serviços que lhe serão prestados quando da sua estada num hotel ou num estabelecimento semelhante. Contudo, não se pode excluir que outros elementos mais facilmente acessíveis e suscetíveis de serem atualizados de modo regular, como as avaliações, as fotografias e os comentários deixados por outros clientes em plataformas de reserva em linha como as utilizadas pela Valentina Heights, também possam ter uma influência determinante na escolha do consumidor médio, ou mesmo uma influência mais determinante do que a própria classificação. Esta é, no entanto, uma verificação que incumbe, sendo caso disso, ao órgão jurisdicional de reenvio efetuar (Acórdão de 27 de fevereiro de 2014, Pro Med Logistik e Pongratz, C-454/12 e C-455/12, EU:C:2014:111, n.° 59), se considerar, após análise, que, à luz da legislação nacional e das circunstâncias de facto que lhe foram submetidas, o alojamento num estabelecimento classificado pode constituir um aspeto concreto e específico do «[a]lojamento em hotéis e estabelecimentos do mesmo tipo», na aceção do anexo III, ponto 12, da Diretiva IVA.

57      A este respeito, também importa salientar que as duas condições, mencionadas no n.° 44 do presente acórdão, às quais está sujeita a possibilidade de proceder a uma aplicação seletiva da taxa reduzida de IVA visam assegurar que os Estados-Membros só façam uso desta possibilidade em condições que garantam, nomeadamente, a prevenção de qualquer eventual fraude, evasão ou abuso (v., neste sentido, Acórdão de 27 de fevereiro de 2014, Pro Med Logistik e Pongratz, C-454/12 e C-455/12, EU:C:2014:111, n.° 45 e jurisprudência referida).

58      No âmbito das verificações a que deve, sendo caso disso, proceder, o órgão jurisdicional de reenvio pode ter em conta o facto de que, no caso em apreço, a Valentina Heights parece ter exercido a mesma atividade de modo estável, tanto quando dispunha de um certificado de classificação, eventualmente provisório, como quando não dispunha desse certificado. Além disso, resulta da decisão de reenvio que, durante o período controlado pela Direção Territorial da Agência Nacional das Receitas Públicas, que compreende um período de quase um ano em que esta sociedade não dispunha de certificado de classificação, as receitas das atividades da referida sociedade foram contabilizadas através de caixas registadoras eletrónicas ligadas à Autoridade Tributária. Trata-se, deste modo, não de um estabelecimento que nunca preencheu as condições para ser classificado e que opera fora do controlo desta autoridade, mas de um estabelecimento cujo certificado de classificação caducou sem que o novo certificado pedido em 18 de novembro de 2016, ou seja, mais de dois anos antes da caducidade do certificado anterior, tivesse sido emitido, e isto independentemente da questão de saber se o atraso na emissão deste novo certificado era imputável à inação do Ministério do Turismo ou ao facto de os documentos apresentados pela mesma sociedade estarem incompletos.

59      Por último, quanto ao facto de a falta temporária de classificação violar a Lei do Turismo, importa recordar que, segundo jurisprudência constante, o princípio da neutralidade fiscal se opõe, em matéria de cobrança de IVA, a uma diferenciação generalizada entre as transações ilícitas e as transações lícitas (Acórdão de 27 de abril de 2023, Fluvius Antwerpen, C-677/21, EU:C:2023:348, n.° 28 e jurisprudência referida).

60      Tendo em conta todas as considerações precedentes, há que responder às questões submetidas que artigo 98.°, n.° 2, da Diretiva IVA, em conjugação com o anexo III, ponto 12, desta diretiva, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional nos termos da qual a taxa reduzida de IVA aplicável ao alojamento em hotéis e estabelecimentos do mesmo tipo está sujeita à obrigação de estes estabelecimentos disporem de um certificado de classificação ou de um certificado de classificação provisório, no caso de esta legislação não limitar a aplicação da taxa reduzida de IVA a aspetos concretos e específicos da categoria dos serviços de alojamento em hotéis e estabelecimentos do mesmo tipo, ou, na hipótese de limitar esta aplicação a tais aspetos concretos e específicos, não respeitar o princípio da neutralidade fiscal.

 Quanto às despesas

61      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Sétima Secção) declara:

O artigo 98.°, n.° 2, da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, em conjugação com o anexo III, ponto 12, desta diretiva,

deve ser interpretado no sentido de que:

se opõe a uma legislação nacional nos termos da qual a taxa reduzida de imposto sobre o valor acrescentado (IVA) aplicável ao alojamento em hotéis e estabelecimentos do mesmo tipo está sujeita à obrigação de estes estabelecimentos disporem de um certificado de classificação ou de um certificado de classificação provisório, no caso de esta legislação não limitar a aplicação da taxa reduzida de IVA a aspetos concretos e específicos da categoria dos serviços de alojamento em hotéis e estabelecimentos do mesmo tipo, ou, na hipótese de limitar esta aplicação a tais aspetos concretos e específicos, não respeitar o princípio da neutralidade fiscal.

Assinaturas


*      Língua do processo: búlgaro.